por Idel Halfen
O desequilíbrio pelo qual passa o futebol brasileiro tem origem basicamente em dois focos: as gestões dos clubes e a desproporcional distribuição das receitas de transmissão que perdurou por anos.
Os que defendem a desproporcionalidade mencionada alegam que seria injusto um time com mais torcida receber o mesmo montante do que outro com torcida menor, argumento que até tem sua dose de coerência, mas que perde força ao ser confrontado com o modelo das ligas norte-americanas, no qual a competitividade é privilegiada sob a alegação de que ela é fundamental para o incremento do faturamento, fazendo assim com que todos recebam mais.
Embora eu tenda a preferir os modelos que favoreçam o “equilíbrio” deixando para a gestão a busca por melhores desempenhos tanto operacionais como esportivos e consequentemente faturar mais, não dedicarei mais linhas a respeito no presente artigo, voltando à análise para a correlação “tamanho de torcida vs. receitas”, valendo lembrar, a título de provocação, que o tamanho de população de um país não se reflete perfeitamente no seu PIB.
Passemos então para as pesquisas relativas aos tamanhos das torcidas, as quais reputo como questionáveis em função do dimensionamento da amostra e da metodologia utilizada que, entre outras falhas, não consegue com a devida assertividade segmentar o torcedor por níveis de engajamento, ou seja, não identifica o potencial de propensão a consumir produtos do clube. A divergência de resultados entre os diversos institutos corroboram para essa crítica.
Não podemos também desprezar que o fator globalização se torna um problema, pois o universo das pesquisas costuma contemplar o país onde ela está sendo realizada, ignorando assim os potencias “consumidores” residentes em outros países, visto ser cada vez mais factível que estrangeiros venham a ser simpatizantes de equipes de outros países. Peguemos aqui o exemplo do Real Madrid, cuja torcida na Espanha tem algo entre sete e oito milhões de torcedores, cerca de 30% da população “torcedora” do país, entretanto, só no Facebook são mais de 100 milhões de seguidores. Ao confrontarmos esses números com o vice-campeão da Libertadores de 2021, vemos pesquisas apontando para uma torcida na faixa de 40 milhões e o número de seguidores na mesma plataforma não chegando a 15 milhões.
Claro que basear a análise simplesmente nos números de seguidores nas redes sociais oferece falhas, visto depender dos respectivos graus de atratividade do conteúdo, além de não permitir estabelecer se há algum tipo de impulsionamento. Acrescente-se a essas condições, o fato de não conseguir precisar quais “seguidores” são “torcedores” e com que grau de engajamento.
Diante da complexidade da apuração desses números, fizemos um exercício que permitiu confrontar o tamanho das torcidas brasileiras, através de média aritmética entre os números do Datafolha e os da Pluri, com as receitas recorrentes destes clubes (direitos de transmissão, marketing e bilheteria, aqui incluído o sócio-torcedor), conforme pode ser visto no quadro acima, onde se percebe que entre os catorze clubes avaliados há quase uma inversão total no rankeamento dessas duas variáveis, isto é, o clube com menos torcedores é o que consegue a maior receita per capita.
Todavia, como as receitas dos direitos de transmissão carregam componentes ligados ao desempenho do time e ao número de jogos transmitidos – o que pouco está ligado ao tamanho da torcida -, optamos por acrescentar outro comparativo expurgando os direitos de transmissão das receitas recorrentes, ou seja, consideramos apenas bilheteria e marketing que, em tese, deveriam ser influenciados pelo número de torcedores.
Sob essa última ótica, ainda que pareça menos enviesada, o rankeamento pouco se altera.
Tais números nos permitem supor três causas, além, evidentemente, das consequentes interseções entre elas:
1 – quanto maior o tamanho da torcida, maior o desequilíbrio no que diz respeito ao poder aquisitivo dos torcedores;
2 – por não identificarem o grau de engajamento dos torcedores, a quantidade destes tem pouca influência no faturamento, visto muitos que se declaram fãs de algum time, na verdade não consomem e não contribuem para a arrecadação.
3 – as pesquisas, mesmo no que tange à parte quantitativa, não são adequadas à mensuração do tamanho das torcidas.
Tendo a acreditar que seja um mix destas causas, o que não tira a crítica em relação à distribuição errada do passado, a qual traz sequelas que talvez durem para sempre.
Como corrigir? A criação de uma liga que pensasse no coletivo poderia ser uma solução, porém sua viabilidade dependeria, sobremaneira, da gestão dos clubes, não sendo sequer admitida a possibilidade de as organizações terem à frente gestores da mesma estirpe dos que aumentaram exponencialmente seus passivos e/ou que não entendam a importância da sustentabilidade da indústria.
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