por Paulo-Roberto Andel
Mal acabavam de fazer o primeiro jogo, os garotos dos dois times juvenis se apinhavam perto das escadas. Nada de descer para tomar banho: eles queriam era ver os craques entrarem em campo.
Cem mil pessoas, cinquenta mil de cada lado mais ou menos.
Dos dois lados, dezenas de bandeiras imensas enfileiradas, prontas para serem desfraldadas assim que os times entrassem.
Quinze pras cinco da tarde. De repente, entre os gritos das torcidas, havia certo silêncio e alguma aflição, alguma coisa que mexia com o peito.
De repente, no belo placar de lâmpadas amarelas, estava escrito “SU-DERJ IN-FORMA: ÁR-BI-TRO”. Pronto, todo mundo vaiava. Um barulhão. Em meio ao caos, no alto-falante uma voz abafada e inesquecível narrava o que se lia.
Cinco para as cinco. O coração parece que vai sair pela boca. Num súbito, o lado de cá explode num grito de alegria: entra um time todo de branco e, de repente, não dá para enxergar quase nada porque tudo em volta está no meio de uma grande nuvem branca. Um sinal de paz. E logo em seguida explode o lado de lá, com outro mar de bandeiras tremulando e centenas de rolos de papel higiênico desfraldadas.
É um oceano de barulho, mas dá para ouvir direitinho o que se canta lá e cá. Aquela aflição no peito bate com força total feito a pancada nos bumbos logo acima na arquibancada.
Aparece o nosso escudo no placar de lâmpadas e gritamos como se fosse um gol. Quando é a vez do escudo deles, aí berram com toda força. É uma festa fascinante, pra arrombar a retina de quem vê, como na letra imortal de Chico Buarque.
Cinco da tarde. Eu tenho onze anos de idade. Meu pai me segura pela mão na velha arquibancada de concreto cinza, onde quase não podemos nos mexer. Estou coberto de pó de arroz. Daqui a pouco eu vou ganhar um cachorro quente e uma coca-cola. Vai ser dada a saída.
Por uma hora e meia, sou o garoto mais feliz do mundo: estou no maior estádio do mundo, em meio a uma multidão, vendo o melhor futebol do mundo. No placar do Maracanã, aparece o nome do craque do meu time, ele tem a camisa 5. Vai enfrentar uma barra pesada: o 2, outro 5, o 7, o 8, o 9, o 10. Enfim, um grande clássico.
Parece que foi ontem, mas faz muito tempo. Há muito tempo eu não tenho a mão do meu pai para apertar, nem me junto a cem mil pessoas que sequer cabem onde, um dia, esteve o maior estádio do mundo.
Onde estão os craques?
Bandeirão, não pode. Fumaça, não pode.
Não há mais o velho placar de lâmpadas, nem milhares de pessoas humildes, às vezes desdentadas, que sorriam feito crianças ao ver algum nome escrito com as luzes.
Não há nem os garotos juvenis para se apinhar nos túneis da felicidade.
Vida que segue, diria o mestre João Saldanha, ao menos presente de espírito, mas para sempre.
@pauloandel
0 comentários