por Paulo-Roberto Andel
Meu amigo Catalano, também escritor, tem uma tese a respeito do futebol “moderno”: se uma boa equipe tiver dois grandes jogadores abrindo ataques pelas pontas, mais um finalizador de respeito, triturará os adversários no mundo inteiro. Sigo o relator.
Até os anos 1980, todos os times usavam pontas. Depois disso, a prioridade do futebol-força fez com que a posição fosse extinta, pois todos têm que marcar e recompor. Some-se a isso a besteirada de neologismos ocos (agudo, intensidade etc), mais retrancas para tentar garantir os empregos dos treinadores por algum tempo e pronto: chegamos ao cenário atual onde colocamos três times entre os quatro melhores da Libertadores, mas não brilhamos. A Seleção Brasileira é líder disparada nas eliminatórias, mas não encanta em nada.
É certo que os temas e focos mudam. Sem sombra de dúvida, o futebol de hoje exige um condicionamento físico intenso, muito maior do que antes. E os pontas precisam voltar para garantir a dinâmica de jogo. Ok, tudo bem, mas por que a evolução física deveria significar o fim do nosso talento?
Não faz sentido algum.
O Brasil dominou o cenário do futebol quando desenvolveu uma característica própria que nenhum outro país tinha em quantidade: talento individual, drible, passe, lançamentos, soluções surpreendentes. Até hoje somos respeitados por causa disso, e quando jogadores como Neymar encantam multidões em certas ocasiões, é porque exibem resquícios daquele talento.
E onde entram os velhos pontas nessa história? Com os dribles. Tivemos pontas. fantásticos que entortavam marcadores e apavoravam as defesas, cruzando de forma mortífera já de dentro da área. Hoje em dia o sujeito dá um balão do meio de campo e não entende como a defesa rival desarma tudo.
Não entendam estas linhas como um manifesto saudosista, porque este não é o objetivo delas. O que reclamo é: por que temos que abrir mão da nossa qualidade técnica, o bem mais precioso que temos para voltarmos ao topo do mundo? Ele pode ser reabilitado, desde que aplicado às escolas de formação de jogadores, até que voltemos a mostrar talento em campo. Não é difícil, mas exige vontade política. Quem disse que não podemos aliar condição física e excelência técnica?
Sem o drible, o futebol brasileiro perdeu sua essência. Muito disso veio quando passamos a massacrar os pontas, a eliminar a troca do camisa 10 pelo cão de guarda marcador, a fazer do volante um brucutu. E a quem interessava esse discurso? Aos adversários, claro.
Colocando gente que sabe de bola nas divisões de base, talvez possamos reverter essa pasmaceira em alguns anos. Gente que possa fazer o papel de grandes nomes que tivemos, tais como Cilinho, Carlinhos, Faria e Neca, verdadeiros ourives da bola. Caso contrário, continuaremos a ver jogos cada vez mais chochos, chamados de “grandes espetáculos”.
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