por Péris Ribeiro
I) O ano é o de 1962. E, por aqui, a crise é iminente! Tanto que, em Brasília, um presidente balançado parece irremediavelmente sem saída.
Porém, graças às irrefreáveis pernas tortas do genial Mané Garrincha, o Brasil sai do Chile bicampeão mundial.
E João Goulart – o presidente ameaçado – se sustenta um tanto mais no poder.
II) Ainda o Chile. Ainda a Copa do Mundo de 1962. Extasiado com o que via, o pouco afeito Presidente andino Jorge Alessandri apenas pergunta:
– Ele, esse Garrincha… De que planeta ele vem, afinal?
III) Por sua vez, tão afeita às cerimônias repletas de pompa, a Rainha Elizabeth parecia particularmente feliz, naquela tarde de sábado. E não esconderia, tempos depois, que ali andou vivendo um de seus inesquecíveis momentos de soberana.
É que em pleno Estádio de Wembley, debaixo das palmas quase ensurdecedoras da multidão, havia acabado de passar às mãos do jovem capitão Bobby Moore a lendária Copa Jules Rimet.
Inglaterra, campeã do mundo de 1966!
God …save the Queen!
IV) O clima é de terror. O nazismo apavora. Então, como que numa tentativa de amenizar o gigantesco pesadelo daquela II Grande Guerra, um jogo de futebol opõe onze combalidossoviéticos de Kiev e onze saudáveis alemães do III Reich.
Só que, aí, é o inesperado que rouba a cena. Surpreendentemente, os de Kiev vencem. E, como prêmio pela suprema audácia, são fuzilados sumariamente. Em plena praça pública.
Mas, como que saído do nada, eis que o orgulho soviético se sobrepõe. Os onze mártires viram heróis. Ali mesmo! Naquela mesma praça pública! E tornam-se definitivamente, em símbolos da luta pela liberdade de um povo há anos oprimido.
V) Mais de três décadas são passadas. E o que se vê, naquela noite, é uma alegria incontida tomar conta da imensa União Soviética. É que o surpreendente time do Dínamo – até então, orgulho apenas da gente da cidade de Kiev, na Ucrânia –, acaba de se sagrar campeão mais uma vez.
Só que, agora, o seu feito assume proporções inimagináveis. Tudo porque, desta vez, o Dínamo foi bem mais longe. É o grande campeão da Copa das Copas de toda a Europa.
O herói do momento é um habilidoso camisa onze: veloz, driblador e artilheiro. É o loiro Oleg Blokhin, que mostra um jogo capaz de encantar multidões. Porém, naquele exato instante, o que existe no coração de cada soviético é um sentimento que vai além. Bem mais além.
É como se em meio à loucura de uma festa que parece não ter fim, todos fizessem uma longa viagem no tempo. Em cada coração, o que ecoa é uma profunda e respeitosa reverência aos onze mártires de Kiev.
A bestialidade inominável dos soldados de Hitler, acaba de perder a sua derradeira batalha.
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