por Paulo-Roberto Andel
Fim de noite após uma jornada cansativa, banho tomado, paro para comer um queijo quente e ligo a TV. A emoção surge no ato: uma decisão por pênaltis – tiros livres diretos cobrados da marca do pênalti, como gostava de dizer Mário Vianna, referência da arbitragem e do radialismo brasileiro.
Guarani e Vila Nova, no Brinco de Ouro da Princesa, disputando a sobrevivência na Copa do Brasil, a mais legal e emocionante competição brasileira a meu ver.
Enfim, deu Vila Nova por 5 a 4, com o protagonismo de Georgemy, goleiro do Vila Nova, que defendeu uma cobrança e abriu caminho para a classificação. A história de Georgemy já dá um livro: foi goleiro de seleção nas divisões de base, jogou em Portugal, sonhou em suceder Fábio no Cruzeiro e, por fim, jogou no Guarani e deixou o clube depois de uma falha. Nunca mais tinha voltado ao Brinco até este jogo. O futebol é assim, cheio de idas e vindas, cair e levantar-se, seguir em frente.
Georgemy queria suceder Fábio, que parecia eterno no gol do Cruzeiro e, num súbito, agora defende o Fluminense. O novo goleiro tricolor barrou Marcos Felipe, considerado um dos melhores goleiros do Brasil em 2021. Georgemy e Marcos têm idades próximas, cerca de 26 anos. Fábio, decano, já passou dos 41 e sabe que vive o desfecho da carreira. Ah, o futebol, que dá dez vezes mais voltas do que o mundo.
Do Vila Nova eu lembro de longe. Tinha o Danival, que jogava muita bola e veio do Atlético, e o Erivelto, outra fera, do Fluminense – nos tempos da Máquina – e do Cruzeiro. Se fosse hoje, os dois certamente estariam num Manchester City, United ou PSG, por exemplo. Tinha também o Tulica, centroavante rompedor que depois passou pelo Fluminense, infelizmente falecido anos atrás. Quando o Vila Nova jogava no Serra Dourada era bonito demais.
E o Guarani? O velho Bugre do meu coração tem nomes: Neneca, Mauro, Gomes, Édson e Miranda; Zé Carlos, Renato e Zenon; Capitão, Careca e Bozó, liderados por Carlos Alberto Silva. Os cinquentões e sessentões sabem o quanto Zé Carlos jogou, monstruosamente. Renato e Zenon – este, o craque do super bigode indefectível até hoje sem um fio branco (risos). Brincadeira, que jogadores. Depois Zenon ainda fez uma dupla com Sócrates no Corinthians. Dizer o quê? Careca era o terror. Craque. Finalizador e craque. Por azar, não foi o camisa 9 da Seleção de sonho de 1982, que vai fazer quarenta anos e continua celebrada pelo mundo afora.
Se o Serra Dourada era bonito com a turma do Vila Nova, imagine o maior time da história do Guarani abraçado por sua torcida lotando o Brinco de Ouro da Princesa, recheado de craques e vencendo o poderoso Palmeiras de Leão e companhia? Foi assim em 1978, depois em 1982, depois em 1988. O Guarani é grande e faz uma falta enorme nos grandes jogos.
Logo depois do belo Bugre de 1978, houve um efêmero mas inesquecível Palmeiras inesquecível em 1979: Gilmar, Rosemiro, Beto Fuscão, Polozi e Pedrinho; Pires, Mococa e Jorge Mendonça; Jorginho, César e Baroninho. Telê Santana. Uma lembrança puxa a outra. O título não veio, mas o Verdão jogou tanto que Telê foi parar na Seleção Brasileira e, por dois anos e meio, o Brasil teve tanto prestígio mundial que se fala daquele tempo até hoje. Ganhar é bom demais, mas há um certo tempo também era importante jogar bem, jogar com talento, escrever a história com palavras bem cuidadas.
Sai o sonho, entra a realidade. O queijo quente acabou, o noticiário começou, está na hora de dormir.
@pauloandel
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