por Elso Venâncio
Edmundo foi um dos maiores atacantes que acompanhei de perto no futebol. Ídolo do Vasco e do Palmeiras, era hábil, rápido e jogava com o coração na ponta das chuteiras. Sempre o primeiro a entrar em campo para treinar e um dos últimos a sair. Nas concentrações, só deixava o quarto para fazer as refeições.
Foi o ‘garotinho’ Osmar Santos, locutor esportivo palmeirense, quem lhe deu o apelido mais famoso. Na Rádio Globo paulista, chamava-o de ‘Animal’, sinônimo de craque do jogo. Raí e Cafu, entre outros, não gostavam da alcunha, mas Edmundo, incentivado pela torcida, encarnou bem o personagem. Em 1993, contra o Vitória, no Palestra Itália, a torcida, empolgada com sua atuação e os dois gols marcados na vitória por 2 a 0, iniciou o coro uníssono na arquibancada, grito esse que contagiou o estádio:
– Au, Au, Au, Edmundo é Animal!!!
Em 1997, Edmundo foi o melhor jogador do mundo. Porém, como a Fifa só tem olhos para a Europa, não enxergou o óbvio. O Vasco, tricampeão brasileiro naquele ano, era comandado por seu camisa 10. Autor de 42 gols em 51 jogos, Edmundo estraçalhava adversários. Recorde histórico em partidas da Série A no Brasil, fez os seis gols da vitória por 6 a 0 sobre o União São João, de Araras, em São Januário. Na sequência, humilhou o Flamengo: marcou três na goleada de 4 a 1, com direito a Maracanã lotado. Nessa partida, presenciei uma das maiores atuações individuais no estádio. Edmundo, de quebra, superou o atacante Reinaldo, autor de 28 gols pelo Atlético Mineiro no Brasileirão de 1977. Com seu último gol sobre o Rubro-Negro, chegava a 29. Era, disparado, o craque do Campeonato.
Um dos maiores absurdos da história do futebol foi ver Edmundo na reserva durante a Copa de 1998, na França. Com ele e Ronaldo Fenômeno no ataque, o Brasil teria enormes possibilidades de título. Certamente, a dupla arrasaria os oponentes, um a um.
Em 1994, Bebeto e Romário eram os principais atacantes do mundo. Quatro anos depois, Edmundo e Ronaldo respondiam como os maiores do planeta, mas apenas o camisa 9 foi titular. Zagalo preferiu Bebeto em fim de carreira. O acaso, sarcástico, ainda entraria em campo para impedir Edmundo de jogar a grande final.
No dia da decisão do Mundial, no que saiu a escalação, um susto interplanetário: Edmundo no lugar de Ronaldo, que sequer estava no estádio. Isso a uma hora do jogo. Ninguém entendeu nada.
Na tribuna do Stade de France, a equipe da Rádio Globo, formada por José Carlos Araújo, Washington Rodrigues, Eraldo Leite e eu, todos estupefatos. Ao nosso lado ficava a cabine da TV Globo, com Galvão Bueno e Pelé em polvorosa. Galvão pegou a escalação na mão, olhou para mim e, gritando, perguntou espantadíssimo:
– O que está havendo? Ronaldo não joga?
Ainda repetiu, como que para tentar acreditar:
– O que está havendo?
Ligo para o celular do Gilmar Rinaldi, que passava pela pista de atletismo a caminho do vestiário.
– Ronaldo não joga, Gilmar?
Ele me responde com uma única palavra:
– Joga.
E desliga o telefone.
Ronaldo chega ao estádio com Lídio Toledo. O time estava no aquecimento. Ricardo Teixeira é chamado para uma reunião de emergência com Zagallo, Zico e o próprio Lídio. A última palavra é do médico, que afirma categoricamente que Ronaldo está bem e pode, sim, jogar.
Ninguém teve peito de barrar Ronaldo, o garoto-propaganda da poderosa Nike. Em campo, porém, o Fenômeno provou estar mesmo abalado após a convulsão que sofrera horas antes, na concentração. Seus companheiros visivelmente sentiram o drama do rapaz. Muita pressão sobre seus ombros de apenas 21 anos.
Nisso, o destino, com seus mistérios, tirou de Edmundo a chance de, quem sabe, ser protagonista de uma final de Copa do Mundo.
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