por Elso Venâncio
Você se recorda dos gols de falta? Qual foi o seu gol inesquecível marcado de bola parada?
Zico, Didi, Rivellino, Jair da Rosa Pinto, Roberto Dinamite, Nelinho, Juninho Pernambucano, Ronaldinho Gaúcho, Marcelinho Carioca, Zenon, Rogério Ceni, Éder, Dicá, Jorge Mendonça – e por aí vai… Incontáveis são os grandes cobradores que o futebol brasileiro gerou. Sem câmeras de TV – muito menos VAR –, os zagueiros batiam sem pena, mas evitavam cometer faltas próximas à área. Era muito arriscado.
O futebol sempre teve choques fortes a todo momento. Contusões graves aconteciam em profusão. Pelé, marcado com violência, passou a ser ainda mais respeitado quando começou a revidar.
Fora do Rio, eu passava sempre o dia nos hotéis onde o Flamengo se concentrava. Apurava as notícias, conferia o time que estava escalado, fazia algumas entrevistas e ia para o estádio. No Pacaembu, mantinha uma rotina. Como chegava três horas antes de a bola rolar, ficava de papo com o popular Luizão, o mais antigo funcionário do histórico complexo esportivo. Ficamos amigos:
– Meu filho, nesse gramado – apontava com o dedo – vi Pelé fazer genialidades, mas também o vi quebrar muitas pernas.”
Vamos voltar às faltas, que, por sinal, o Rei cobrava como poucos. Para começar, Zico. Em plena final da Taça Libertadores de 1981, contra o Cobreloa, no Estádio Centenário, em Montevidéu. O inesquecível Jorge Curi, na Rádio Globo, de repente chama o repórter de campo Kleber Leite:
– Daí para o Zico é pênalti, Cury.
E era mesmo. Mas o Galo treinava à exaustão. Mais de 100 faltas por dia. Só diminuía a intensidade na véspera dos jogos.
Há poucos dias, jantei em São Paulo com três amigos. Entre eles estava José Carlos Brunoro. Perguntei a ele o porquê de não termos mais gols de falta:
– Os fisiologistas não permitem que os jogadores treinem. Podem estourar um músculo.
A meu ver, atleta profissional tem que ter personalidade. E não ficar acatando ordens absurdas.
Não satisfeito, recorro a Paulo Cezar Lima, o Caju:
– E a decisiva bola parada? – questionei.
– Falta treino! A preguiça é geral.
Paulo Cezar, o lúcido e corajoso colunista da Revista Placar e do Museu da Pelada, foi o único que alertou sobre os pênaltis perdidos na final da Supercopa do Brasil. Foram nove cobranças desperdiçadas. O gol é enorme, fica escancarado! Os profissionais têm altos salários… Como se explica isso? Que diferença para a final da Liga Inglesa, por exemplo, no último título do Liverpool.
Caju, um dos monstros sagrados do nosso futebol – e que tem total autoridade para falar o que quiser –, faz nova observação:
– E os coletivos?
Na sexta-feira tinha o apronto. Noventa minutos de bola rolando; profissionais contra juniores. Didi treinava a Máquina Tricolor nas Laranjeiras. O Mestre, em campo, de chuteiras, participava:
– Volta. Toca em mim. Posse de bola é nossa… O controle do jogo é com a gente.
Naquele timaço, os garotos que eram promessas, como Edinho e Pintinho, se concentravam com os profissionais. Nada mais justo. É assim que os meninos crescem. Vendo de perto suas referências.
Acompanhei Telê Santana em 1986, na Toca da Raposa e depois no Flamengo, entre 1988 e 1989. Nos coletivos, ele ia para o campo de calção, chuteiras e apito. No final, cobranças de falta e pênaltis.
Hoje, os treinos são táticos. Os professores fazem a preparação na metade do campo e tome retranca, com raras exceções, nas partidas. A substituição é sempre a mesma. Se faz um gol, tira um atacante e coloca um homem no meio. Se leva, o contrário.
Não podemos fugir das nossas características, da nossa escola. Temos, sim, que treinar os fundamentos e não contratar por contratar portugueses sem expressão ou títulos, que invadem a três por dois o país do futebol.
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