por Claudio Lovato, de Santa Catarina
Lucas. Aqui da arquibancada, eu o observo. Ele nunca é o primeiro a ser escolhido. Nem o segundo, nem o terceiro. Normalmente, a vez dele chega quando metade dos jogadores de cada time já está escolhida. Eu percebo sua tensão crescente conforme o número de jogadores ainda não escolhidos vai diminuindo, e ninguém até o momento disse seu nome e ninguém por enquanto lhe apontou o dedo.
Lucas sofre com isso, mas nem tanto. Sofreria mais se fosse o último, e há sempre alguém que é o último. Mas ele nunca é o último, nunca. E isso faz com que o meu coração também fique mais leve, ou menos pesado.
Então vão para a partida, e nem todos correspondem, em campo, à categorização que lhes fora carimbada na testa e no coração quando da escolha. Os primeiros escolhidos nem sempre são os melhores quando a bola está rolando, e, volta e meia, os últimos a serem chamados superam-se e fazem bons jogos. Bons jogos, nada mais que isso, e Lucas tem sentido esse gosto com certa frequência.
Ainda no campo, assim que os jogos terminam, Lucas me procura com o olhar. Eu fico de pé e aceno e sorrio e estou cheio de orgulho, não pelo desempenho técnico dele em campo, mas por tudo o que ele enfrentou até esse momento: a espera pelo instante em que um dos craques do time, um dos dois caras que estão fazendo as escolhas, olha para ele, diz seu nome (em voz alta, mas nem tão alta assim) e, com um das mãos, a essa altura já com manifesto descaso, faz o sinal de “vem”; o esforço para jogar o melhor possível e, talvez, ser reconhecido por isso; a esperança de conseguir colocar mais um tijolo na construção do respeito que deseja que os companheiros sintam por ele; e a sensação de desafio superado cada vez que consegue chegar ao fim do jogo sem ter sido motivo de críticas pesadas por parte de seus companheiros mais velhos e mais qualificados. Lucas então sente-se vitorioso à sua maneira.
Isso guarda muitas semelhanças com o que ocorria comigo na idade dele. E também depois, já rapazote, e mais adiante, jovem adulto, e pela vida afora, até hoje, na meia-idade. Nem tanto nem tão pouco. Nem o primeiro nem o último.
Lucas e eu, no entanto, somos a primeira escolha um do outro, isso é certo. Ele, o meu menino. E eu, o velho dele. Quem sabe ele terá mais momentos memoráveis do que eu tive, oxalá ele faça coisas mais relevantes do que eu fiz, talvez ele desenvolva uma personalidade mais marcante do que a minha, mas também fico pensando que isso tanto faz. O que importa, creio eu (e Lucas também crê, desconfio; crê do jeito dele, do jeito de um menino) é a plenitude do espírito depois daquele passe certinho que você deu para o seu companheiro, um passe caprichado, uma beleza de passe capaz de reiterar a você mesmo que você sempre foi e sempre será a sua primeira escolha, ou a escolha que vem ainda antes da primeira, a escolha essencial, aquela que lhe mantém vivo e curioso em relação ao que está por vir.
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