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PELÉ EM NATAL: GOLS, GOZAÇÕES, PROVOCAÇÕES

1 / janeiro / 2023

por Rubens Lemos

Foram três partidas em campo e uma jogada empresarial. Nas quatro vezes em que Pelé esteve em Natal, seria redundante escrever que a cidade parou. Pelé pisou primeiro no modestíssimo palco do Estádio Juvenal Lamartine, em amistoso contra o América dia 12 de dezembro de 1971, empreitada da antiga agência Dumbo Promoções que causou prejuízo de R$ 70 mil a preço de 2022.

Natal, em 1971, era a solitária capital a não ter visto o Rei do Futebol e promotor de eventos Carlinhos Silva entendeu que era hora de unir história e lucro. Naquele ano, Pelé se despedira da seleção brasileira e seguia atuando com brilho no Santos.

Excluído da festa, o ABC tratou de boicotá-la. Dirigentes alvinegros espalharam o boato de que haveria outra partida a preços simbólicos e não mais que 4 mil pessoas saíram de casa na tarde chuvosa de um domingo com ares melancólicos. Pelé e o Santos ficaram hospedados no Hotel dos Reis Magos, posto abaixo pela decadência e tiveram toda a paciência possível com fãs e puxa-sacos que impediram o astro de dar mísero mergulho na convidativa piscina da ampla área de lazer.

Em campo, Pelé não esteve ligado, se deixando levar pela marcação do nervoso quarto-zagueiro Ivo. O América se encheu de brios e fez 1×0 na primeira etapa com o atacante paraense Amorim. O Santos seguiu bocejando até o técnico Orlando Peçanha, beque da seleção brasileira campeã de 1958, encher os jogadores de esporros. Edu empatou aos 15 minutos do segundo tempo. Faltando menos de um minuto para acabar o jogo, o árbitro Jáder Correia marcou falta na entrada da área da trave dos fundos do Juvenal Lamartine.
Entra o cômico em cena. O lateral-direito Pimentel Batata implorou a Pelé para que chutasse para fora, para “que o bicho fosse bom para os de casa” e o América ganhasse fama nacional. Mudo, Pelé bateu com estilo no ângulo superior do goleiro Jairo, fazendo 2×1 e dando tapinha nas costas do inconformado Batata: “Garoto, futebol é assim”. O jovem zagueiro rubro, em prantos, protestava: “Você é um Rei, mas não é humano”.

O Santos venceu com Cejas; Orlando Lelé, Paulo, Oberdan e Rildo; Léo Oliveira e Dicá(Nenê); Jáder, Pelé, Edu e Ferreira. O América perdeu com Jairo; Pimentel Batata, Cláudio, Ivo e Duda; Osmar e Gobat; Bagadão, Tuta(Zé Roberto), Petinha e Amorim. Técnico: Pinguela.

Pelé foi embora levando cajus e deixando a camisa 10 para exposição na lendária loja Formosa Síria na Avenida Rio Branco e depois leilão com renda revertida para a Companhia Nacional das Escolas da Comunidade. Recebeu título de cidadão natalense e potiguar.

No dia 29 de novembro de 1972, pelo primeiro Campeonato Brasileiro com a presença de um clube potiguar na divisão principal, Pelé voltou a fazer gol na vitória por 2×0 sobre o ABC diante de 49.150 pagantes, terceiro maior público da história do Estádio Castelo Branco(que passaria a ser chamado de João Machado em 1989 até ser demolido em 2011 para a Copa do mundo de 2014). Edu marcou o outro gol.

O confronto foi cercado de expectativa pelo encontro de Pelé com Alberi, o Deus provincial. Lendas urbanas criaram um lençol de Alberi em Pelé e uma caneta do Rei no Negão, os dois lances desmentidos pelo capitão do ABC, o zagueiro Edson. “Não houve nada disso. Pelé nem estava a fim de jogo e Alberi entrou tenso. Eu dividi com força a bola com Pelé, ele ganhou e fez o gol”, contou Edson em depoimento ao livro Memórias Póstumas do Estádio Assassinado, sobre o Castelão(Machadão).

Além da tietagem de políticos, o duelo foi marcado por uma foto de Pelé com Alberi, e o show do ponta-esquerda Edu. O Santos venceu de Cláudio; Turcão, Vicente, Paulo e Murias; Léo Oliveira, Afonsinho e Pelé; Jair da Costa, Brecha(Pitico) e Edu. ABC: Tião; Sabará, Edson, Quelé e Anchieta(Preta); Maranhão, Orlando e Alberi; Libânio, Baltazar(Everaldo) e Petinha.

No ano seguinte, Pelé ficou irritado com provocações de origem duvidosa e liderou o massacre do Santos sobre o América pelo Campeonato Brasileiro por 6×1, sendo três gols dele. Alunos do curso de Comunicação Social convidaram o Rei para o programa Xeque-Mate, da TV Universitária e, educadamente, Pelé disse não.

Na manhã do jogo, ele estava à beira da piscina do Hotel dos Reis Magos, fustigado por fãs, quando um grupo de jovens vestindo vermelho e portando bandeiras do América passou a xingá-lo de velho e míope. Pelé pediu para esperar pela noite no gramado. Os baderneiros, contam não poucas testemunhas, eram, na verdade, torcedores do ABC, à época suspenso de competições nacionais desejosos de um fracasso rubro. O América vinha fazendo ótima campanha, conquistando a Taça Almir de melhor desempenho entre clubes do Norte e do Nordeste.

Aos 20 minutos do primeiro tempo, Pelé já impunha 4×0 para desespero do público local. Fez questão de ficar em campo os 90 minuto e armou os gols de Mazinho, Eusébio e Brecha. O mais castigado pelos dribles de Pelé foi o capitão e maior zagueiro da história americana, Scala, companheiro do Rei nas Eliminatórias para a Copa de 1970.

Na terceira e última partida de Pelé em Natal, o Santos atuou com Cejas; Hermes, Carlos Alberto Torres(Bianchi), Vicente e Zé Carlos; Clodoaldo e Léo Oliveira(Brecha); Mazinho, Eusébio, Pelé e Edu. América: Ubirajara, Mário Braga, Scala, Djalma e Cosme; Afonsinho e Careca; Almir(Bagadão), João Daniel(Santa Cruz), Hélcio Jacaré e Gilson Porto.

No dia 1º de abril de 1974, em meios aos apelos infrutíferos para disputar a Copa da Alemanha, Pelé veio a Natal de paletó branco e reluzente camisa vermelha assinar os documentos e receber a escritura de um terreno de 1.400 metros no filé imobiliário da praia de Ponta Negra, generosamente doado pelo governador Cortez Pereira. Ouviu piadas irritantes de assessores, entrou no Galaxie do governador e seguiu ao Aeroporto de Parnamirim, onde embarcou para Recife(PE).

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