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COLABORADOR DE LUXO

texto: Sergio Pugliese | charge: Claudio Duarte


Homenagem de Claudio Duarte ao craque PC Caju.

Homenagem de Claudio Duarte ao craque PC Caju.

O Museu da Pelada está comemorando a entrada de mais um colaborador de luxo: o ilustrador, caricaturista e artista múltiplo Cláudio Duarte, que acaba de lançar o site www.ocabide.com.br. Confiram!!!! Sua estreia aqui é com uma homenagem ao padrinho do Museu, PC Caju. Cláudio é um dos traços mais requisitados do Brasil. No Globo, sua arte passou por todas as editorias, mas também ilustra livros, camisetas e o que mais surgir pela frente!!!! O cara é fera!!!!!!!! Além de tudo é um boleiro clássico, bola no chão, olhar periférico, estilo puro!!!! Enfim, Cláudio é um amigo daqueles que nos orgulhamos ter por perto!!!!!!!! Volta e meia ele surgirá no Museu com seu estilo único. Bem-vindo, amigão!!!!!!!!!!!!!

www.claudioduarteilustracao.com/

REGISTRO DE PATENTES NO FUTEBOL

Por Serginho5Bocas

Se no futebol existisse um órgão nos moldes do INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), provavelmente o Brasil seria o líder de patentes. Até que me provem o contrário, foi por essas bandas que se viu pela primeira vez a maioria das jogadas e gols mais espetaculares que o planeta já se encantou.
 
Para começar a conversa vou falar de uma jogada que é mal vista pelos torcedores, mais teve seu maior executor aqui no Brasil, o “chute de bico”, especialidade do jogador Feitiço, que sabia tanto desta técnica que até o “sem pulo” era dado com esta parte do pé sem nenhum pudor, segundo o mesmo, para pegar mais força e precisão. Não dá para afirmar que ele inventou as duas jogadas, mais ninguém fez mais gols deste tipo do que Feitiço, atacante do Santos.
 
A famosa “bicicleta”, que alguns dizem ter sido inventada pelo desconhecido jogador brasileiro Petrolino de Brito, foi imortalizada e ganhou fama de verdade nos pés do homem borracha, o Diamante Negro ou Leônidas da Silva, que apresentou a jogada em 1932 ainda pelo Bonsucesso. Mas foi na Copa de 1938 que ele deixou todos espantados ao executar a jogada e ter feito um gol anulado equivocadamente.
 
Didi, o mestre, o mister futebol, melhor jogador da Copa de 1958, foi outro que se notabilizou pela classe e categoria e é claro pela sua invenção, a “folha seca”. Didi cobrava a falta da entrada da área com um chute em que a bola subia por cima da barreira e caia rapidamente cheia de efeito enganando os goleiros.
 
Rivelino, o “Reizinho do Parque”, foi o rei do “elástico”, aquela jogada em que ele levava a bola para um lado com a parte externa do pé e quando o adversário se movimentava para o lado indicado, ele trazia a bola de volta com a parte interna, enganando o marcador. Ele mesmo confessa não ter inventado a jogada, mas sim Sergio Echigo, um companheiro de clube. Mas foi Riva, certamente, quem apresentou o lindo drible para o mundo do futebol.

O rei Pelé não ficou famoso por ter inventado uma jogada especificamente, mas sim pelo conjunto da obra, ou seja, porque aperfeiçoou várias delas. A bicicleta do rei era a perfeição, sua cabeçada era primorosa e precisa, desde a subida, depois a testada seca de olho aberto e quase sempre em direção ao chão, dificultando a vida dos goleiros. Entretanto, foi na Copa de 70 que Pelé se superou, exibindo jogadas inéditas, tiradas da cartola, que tiravam o fôlego de quem o via em ação.
 
Seu quase gol num chute do meio de campo contra a Tchecoslováquia foi fantástico, seu drible sem bola no goleiro do Uruguai foi fenomenal, espetacular e ainda contra o mesmo Uruguai, Mazurcwieviski bate o tiro de meta e sem deixar a bola bater no chão, Pelé devolve de voleio, obrigando o goleiro a uma defesa inesperada. Sem falar da cabeçada de manual que obrigou a Banks fazer a maior defesa da Copa de 1970. Até quando Pelé não fazia o gol era belo, o criador e suas criaturas podem ser vistas no Youtube.

Tivemos ainda a felicidade de ver o surgimento de uma das mais belas jogadas conjuntas do futebol, a “tabelinha”, que teve em Pelé e Coutinho sua mais famosa combinação de todos os tempos. Os dois enfileiravam adversários com suas tabelas em alta velocidade e eram tão parecidos fisicamente e em termos técnicos que confundiam qualquer defesa. Falcão e Escurinho também fizeram uma “tabelinha” histórica na semifinal do brasileiro de 1976 contra o Atlético Mineiro, coisa de almanaque.

Sócrates consagrou a jogada de “calcanhar”, até gol ele marcou desta forma, era uma saída inteligente para as situações mais difíceis. Zico, seu grande parceiro, já no final da carreira fez um gol “escorpião”, uma “chilena” com o corpo paralelo ao solo, pelo Kashima Antles. Lance que seria quase impossível contar para um cego, como bem definiu o uruguaio Eduardo Galeano.

Bater na bola de “três dedos”, de “rosca” ou mesmo de “trivela”, provavelmente foi Nelinho que “patenteou” a jogada de mestre. Imprimia uma qualidade na batida, que misturava força e efeito sem precedentes, enlouquecendo os goleiros pelo mundo afora. Neste quesito, no entanto, tivemos ainda dois vice-reis: Eder e Marcelinho Carioca não deixaram a desejar.
 
E quem é que não lembra da “lambreta” que Kaneco, o ponta do Santos, imortalizou e é copiada até hoje como um dos mais sensacionais dribles do futebol, que o diga o cracaço Falcão do futebol de salão.


Vestindo a camisa do Real Madrid, Zidane aplica seu drible característico.

Vestindo a camisa do Real Madrid, Zidane aplica seu drible característico.

No exterior, para não dizer que não falei das flores,  vale citar a “cavadinha” de Panenka da Tchecoslováquia que valeu título na final da EuroCopa de seleções de 1976, bem copiada por Djalminha e Loco Abreu mais recentemente. Destaca-se também a a “carretilha” ou em francês “roulete” de Zidane e o antológico gol “olímpico” feito de uma cobrança de córner direta, que o craque sérvio Petkovic adorava realizar. Dizem que um jogador argentino chamado Cesáreo Onzari fez o gol na celeste uruguaia logo após eles terem conquistado o ouro nas Olimpíadas, daí a fim de ironizar os rivais uruguaios, surgiu o nome de batismo da jogada.
 
Foram muitas as jogadas inventadas sem que pudéssemos conhecer o autor de cada proeza, belas artes como o famoso “drible da vaca” que pontas e laterais adoravam utilizar pelos flancos dos campinhos de pelada e o que falar então da plasticidade de um belo “lençol” ou da suavidade de uma “caneta”?
 
Muitas foram as jogadas maravilhosas que fizeram o futebol brasileiro se distinguir no mundo com sua arte peculiar, que encantou as mais exigentes plateias e por este motivo deixou um legado aos fãs do futebol arte em todo o mundo. Mas por incrível que pareça, tem muito brasileiro tentando desvirtuar nossas raízes, mas estou certo que eu e muita gente resiste bravamente, defendendo esta escola maravilhosa e fundamental para a pratica do bom futebol.
 
Daí o motivo desta singela homenagem a este esporte que sou apaixonado e não canso de admirar, mesmo que em outras praças…

O ARRASTÃO

Por Sergio Pugliese


Os amigos da pelada, no Canaveral. Emir (em pé),  Flávio Bigode, Eduardinho, Albertão Ahmed e Vico.

Os amigos da pelada, no Canaveral. Emir (em pé),  Flávio Bigode, Eduardinho, Albertão Ahmed e Vico.

Ninguém suporta mais tanta violência na cidade. São arrastões, balas perdidas, brigas de trânsito, falta de respeito generalizada. Numa dessas resenhas, a equipe do Museu da Pelada ouviu uma história que poderia ter virado tragédia, mas se transformou num caso tipicamente carioca, envolvendo boleiros. 

O papo no carro era divertido. Também pudera, Albertão, Tico Tico e Shrek juntos garantem boas risadas, animam qualquer rodinha, prolongam qualquer conversa. Albertão estava mais afiado do que nunca!

– Se velocidade ganhasse jogo, o Bolt seria convocado para a seleção – implicou com Tico Tico, pontinha arisco.

De família árabe, Albertão Ahmed é craque, joga fácil e tem cacife para fazer suas críticas. Paraibano de Quipapá, Tico Tico poderia ter o estilo dos velhos pontas, tipo Mauricinho, Nilton Batata e Joãozinho, do Cruzeiro, porque dribla bem e chuta forte, mas falta o tempero. E o carioca Shrek….bem Shrek é um bom motorista e mesmo assim tem recebido multas além da conta. Quando Albertão iniciava mais uma frase de efeito, Shrek freou bruscamente.

– Ferrou, arrastão!!!!! – gritou Tico Tico, enquanto tentava esconder seu meio metro de corpo sob o banco do motorista.

– Dá uma ré rápida, ô roda presa – ordenou Albertão.

Shrek e Tico Tico deveriam funcionar como seguranças de Albertão, empresário de sucesso. Precavido, muitos carnês para pagar, ele ainda contava com duas outras feras, Serginho e Enágio, num carro na retaguarda.

– Como vou dar ré se esses dois pregos estão colados na minha traseira? – reclamou Shrek.

Em segundos, cinco homens cercaram os carros. Com fuzis e fisionomias apavorantes, mandaram todos descerem. Tico Tico preferiu esconder seu canivete sob o tapete do carro. Parecia que Albertão passara Super Bonder na carteira. Ela não desgrudava de sua axila por nada e precisou Enágio arrancá-la e entregá-la aos bandidos.

– Esquece Betão, não te pertence mais!

– De que lado você está, paraíba desalmado? – disparou Betão, fulo da vida.

Um dos homens chegou a apontar a arma para o empresário.

– Calma, rapaziada, esse homem é o nosso ganha pão!!! – suplicou Enágio, meio-campo estilo cachorro em mudança.

Os bandidos entraram no carro e sumiram na Avenida 24 de Maio. Era fim de tarde e Albertão ficou encarando o quarteto, cabisbaixo, trêmulo. De repente, lembrou-se de algo e gritou:

– PQP, meu tênis estava no carro!!! Meu tênis!!!! Meu tênis!!!! – berrava, enquanto sentava-se, desolado, ao meio-fio.

Os quatro sabiam da loucura do patrão pelo tênis Nike preto, 46, comprado em Madri, encaixe perfeito, difícil encontrar igual no Brasil. Só sob encomenda. E no dia seguinte, cedinho, ele tinha uma pelada apostada com Guido, estrela do Caldeirão do Albertão. Valia cerveja e churrasco. Foram para a delegacia com Albertão choramingando “meu tênis, meu tênis!”….. Ele não estava preocupado com o carrão, dinheiro e roupas levados pelos gatunos. O tempo o ensinou a dar valor às pequenas coisas da vida. Bon vivant, passara por altos e baixos, já havia sido o rei do Hippopotamus, aprontado na alta sociedade e perdido amigos na fase das vacas magras. Hoje, bem de vida, prefere curtir os filhos, a pelada e os pastéis do Bar do Adão, do parceiro Rominho.

– Hilux localizada no Méier!!!! – gritou um policial, no fundo da delegacia.

– Prenderam os safados? – quis saber Tico Tico.

– O que foi, virou macho agora projeto de pigmeu? – ironizou Albertão.

Voaram para o local!!!! Mas para desapontamento de Albertão, o par de tênis não estava na mala.

– Merda!!!!!!!!!! – gritou para espanto do policial.

Aquilo não ficaria assim e, dono de gráfica, levou todos para a empresa e mandou imprimir centenas de cartazes oferecendo recompensa a quem devolvesse o par de Nike.

– O Disque Denúncia não vai acreditar quando ouvir essa – resmungava Serginho enquanto colava um cartaz no poste.


Albertão Ahmed colando cartaz no poste

Albertão Ahmed colando cartaz no poste

Ligaram alguns engraçadinhos oferecendo Kichutes, Congas e um All Star de cada cor. A operação falhou. Albertão foi dormir triste, mas por outro lado percebeu que seus valores são outros, suas prioridades mudaram. No dia seguinte, de birra, jogou descalço e divertiu os amigos na resenha relembrando o caso e falando sobre sua única certeza na vida: precisa substituir com urgência os seguranças.