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BRUNO LAGE OU LAJE?

por Zé Roberto Padilha

Segundo nosso Aurélio, mais sabido que o Google, Lage não existe na língua portuguesa. Aquele material duro, seguro, que veio para revestir a estrutura do Botafogo, após Luis Castro e Caçapa, se escreve com J. É Laje.

Já Lage, com G, segundo a língua dos treinadores portugueses, se refere a um cidadão de frágil estrutura, inseguro, incapaz de perceber uma infiltração surgindo pelo lado esquerdo chamada Bruno Henrique.

E no lugar de reforçar suas paredes laterais direita, escala uma vulnerável Segovinha, que cerca, reveste, mas não segura um tremor que corre e dribla em alta velocidade.

Quando os brasileiros se reúnem para erguer uma Laje no fim de semana para seus amigos, rola uma cerveja depois, uma carne que desnuda um gesto único, bacana e solidário.

Porém, quando a estrela solitária busca, na loja de material de construção, um treinador para consolidar sua belíssima campanha, e compra desculpas, materiais que não suportam a pressão, melhor ter cuidado.

A casa pode cair.

LAGE SENTE A PRESSÃO

por Elso Venâncio, o repórter Elso

A falta de equilíbrio do português Bruno Lage, técnico do Botafogo, merece reflexões. No primeiro tropeço em casa, ele coloca o cargo à disposição e cria uma crise que não havia no clube.

Lage assumiu o comando há menos de dois meses e afirma que se sente pressionado. Como assim? Pressão, numa equipe líder, com dez pontos à frente do segundo colocado e a situação sob controle?

Se pensasse em sair, deveria procurar a diretoria e não tornar público um assunto que passa a ser um convite para possíveis desdobramentos. Ele já dirigiu o Benfica, tem quase 50 anos de idade e se dizer ansioso pela responsabilidade de ganhar um título, o do Campeonato Brasileiro, aguardado pela torcida há 28 anos, demonstra o tamanho do seu descontrole.

A insatisfação, ao contrário do que ele disse, não é com o elenco, mas, sim, com os equívocos que ele próprio vem cometendo. O Botafogo se posicionava sem dar espaços e saía com força e velocidade impressionantes no contra-ataque. É fundamental manter essa estrutura do time. Di Plácido fora? O Flamengo ganhou o jogo pelo lado esquerdo, seu mais forte setor, com Ayrton Lucas, Gerson e Bruno Henrique, superando o garoto JP Galvão, mal improvisado, e Matias Segovia. As fortes jogadas pelas pontas desapareceram. Tchê Tchê testado como ponta??? Bruno Lage não reconhece os seus erros.

Não dá para entender, ainda, a crescente preocupação do Botafogo sempre que enfrenta o Flamengo. Os rubro-negros é que carregavam essa compulsão, nos anos 60 e 70:

“Fui à feira com a patroa e gastei o bicho” – brincava o lendário goleiro Manga, nas vésperas do clássico.

Tendo Garrincha, Didi, Nilton Santos e Cia., e depois a geração de Gerson, Jairzinho e Paulo Cezar Caju, a expectativa de vitória era grande:

“Nosso maior rival é o Botafogo” – afirmava Antônio Augusto Dunchee de Abranches, o presidente campeão do mundo, em 1981, pelo Flamengo. “Não admito perder para eles” – completava.

A torcida do Botafogo, que hoje contesta bastante o comandante português, vem dando um show à parte. Ingressos esgotam-se rapidamente. Lamento o descaso com o torcedor. Jogo às 21h, em um sábado, no Estádio Nilton Santos, é uma afronta a quem paga ingresso. Não apenas pelos horários malucos. Qualquer desatualizado ficaria surpreso com algumas perguntas:

“O Vasco não pode jogar no Maracanã?”

“Nem em São Januário?”

“O Maracanã está fechado por causa do gramado?”

“Os clássicos, agora, são disputados aos sábados?”

“Técnicos portugueses dominam o Campeonato Brasileiro?”

“O auxiliar do Sampaoli agrediu o jogador Pedro, do Flamengo, no vestiário?”

“A CBF quer um italiano dirigindo a seleção brasileira?”

Para concluir, uma constatação: faltam dezessete rodadas e o Botafogo está com a mão na taça. Só perde a competição caso continue imaginando crises que não existem.

ROBERTO DINAMITE, QUIXOTESCO

por Rubens Lemos

Uma data, entre tantas, desagradáveis em minha vida é o dia 8 de janeiro. Dia da morte de Roberto Dinamite, maior ídolo do Vasco, o espelho de um clube democrático, o primeiro a aceitar negros vestindo sua camisa. Há nove meses, reverso de uma gestação. 

Roberto Dinamite é uma ausência punitiva. Seu sorriso triste e a simplicidade de pureza natural, foram embora e o jeito é sair procurando fotos na galeria da internet e imagens definitivas no Youtube. 

Pelo menos duas vezes por semana, procuro rever gols de Roberto Dinamite, o ídolo semelhante ao humilde torcedor. 

Meu ritual, jamais repetitivo, é a homenagem que presto a quem tornava meu céu menos cinza, impondo o azul da felicidade a quem só tinha o futebol para se agasalhar das dores cotidianas. 

A infância, primavera quando chega, outono quando vai embora, me apresentou ao artilheiro do Vasco, único homem a contracenar com Zico nas tardes de clássico no Maracanã ocupado por 120, até 160 mil almas em tensão e delírio. 

Centurião da grande área, Roberto Dinamite me fez vibrar com o título estadual de 1977, primeira sensação de superioridade a mim consentida. O Vasco venceu o Flamengo nos pênaltis por 5×4 e um tabu de sete anos era jogado no lixo das aflições  impiedosas. 

A partir de 1978 e até 1982, Roberto Dinamite fazia de suas chuteiras, lanças para o desigual combate ao Flamengo, que começava a empolgar o país com um timaço que ganhou um título mundial, uma Libertadores, três brasileiros e quatro cariocas. 

Roberto Dinamite, quixotesco, construía vitórias que, de tão impossíveis, podem ser lembradas no medíocre texto ora em gestação. Em 1979, o Vasco enfiou 4×2 no Flamengo com três gols do Camisa 10 da Colina, como também era chamado pelos locutores da época. 

Em 1981, roubaram o Vasco como se a sina que agora é imposta nos dias atuais, fosse uma regra escrita em regulamentos ou estatutos. O Flamengo precisava empatar a primeira partida para ser campeão carioca. Roberto Dinamite não deixou, aqueceu o gelo do chope rubro-negro, fazendo os gols do 2×0. 

O segundo jogo foi debaixo de uma tromba d`água no Maracanã. O empate em 0x0 persistia, os 22 jogadores parecia campeões subaquáticos, quando, aos 42 minutos, uma bola espirra até Roberto Dinamite. Chute rasteiro, bola por baixo do excepcional goleiro Raul. Acabava a vantagem, taça sairia no pau a pau. 

O Flamengo deu um olé no Vasco no primeiro tempo. Um público de 161.989 fanáticos dividiu o Maracanã. Adílio abriu o placar aos 20 minutos, Nunes ampliaria para 2×0 quatro minutos depois. O Vasco reagiria na etapa final. Marcou um gol com o patético atacante Ticão aos 38 minutos do segundo tempo e pressionava o adversário que tinha a superioridade e o triunfalismo da diferença técnica. 

O Flamengo – que tinha um time que nunca precisaria de arbitragem, conteve a superioridade vascaína quando um ladrilheiro invadiu o gramado, fez baderna diante do policiamento apático e, congelado o Vasco, comemorou o campeonato.

Cercado por jogadores de bom nível – nenhum craque -, Roberto Dinamite comandou com raça e amor, o título que diminuiu a pose do Flamengo. O Vasco venceu de 1×0, gol do ponta-esquerda Marquinho, mas o fato é que Roberto Dinamite significava os 11 em campo. 

Na seleção brasileira, foi sacaneado pelo menos duas vezes. Em 1978, só foi à Copa da Argentina porque Nunes, o preferido do técnico Cláudio Coutinho, se machucou. Roberto Dinamite, paciência dos pássaros aprisionados, entrou no time contra a Áustria e fez o gol da vitória por 1×0. 

Telê Santana foi um carrasco de Roberto Dinamite. Convocou o melhor centroavante do Brasil no final de 1981, ele correspondeu. 

Roberto Dinamite foi esquecido e viajou a Espanha em 1982 para passear. Reserva de Serginho Chulapa foi castigo. Para penitência da seleção dita maravilhosa. Com Roberto Dinamite, não perderíamos para a Itália.  

Até 1992, aos 38 anos, o Vasco não se confundia, se agigantava na imagem emotiva de Roberto Dinamite. Dele, serei órfão até morrer. E depois.  Quer saber? Arrancaram de mim um pedaço. Ele se chama Roberto Dinamite. 

O EXEMPLO JOGA AO LADO

por Zé Roberto Padilha

A última vez que fui a um Fla x Flu, 2×1 para o Fluminense, voltei impressionado com a entrega do Gabigol. Ele lutou contra a zaga tricolor o tempo todo, discutiu com o árbitro, deu um chega pra lá no gandula e mostrou em campo uma garra incomum.

Sabe quando você deixa o estádio e diz: “Esse joga no meu time!”?

Desde então, talvez com a ascensão de Pedro, que foi se aproximando não só da posse da camisa 9, mas dos seus impressionantes números entre gols e assistências, Gabigol foi caindo de produção. As trocas de comando, os apagões contra Cuiabá e Bragantino, em nada ajudaram.

E a luta deixou a bola e se perdeu nos bastidores que a cercam. Gabigol perdeu o foco. E nunca mais foi o mesmo.

Porém, existe uma esperança para ele, cria do clube que tem um segredo Belmiro debaixo da sua Vila, capaz de revelar Robinho, Lucas Lima, Ganso, Neymar e nos conceder uma majestade, o Rei Pelé: se espelhar em German Cano, o argentino que joga ao lado.

Com 27 anos contra 35 do artilheiro tricolor, Gabigol pode retomar a idolatria que exerceu um dia se seguir os exemplos do Cano.

Humilde, pai de familia, não-sócio dos prazeres efêmeros que os cercam, obcecado 90 minutos na missão que lhe foi confiada, de empurrar a bola trabalhada desde o Fábio até as redes, Cano não desperdiça tempo com futilidades. Seu tempo é dedicado à procura do gol.

E entre a maturidade do Cano e sua imaturidade, são oito anos. Se quiser, dá tempo de entrar para a história do Flamengo, ser perpetuado nas bandeiras que apenas desfraldam Zico e Junior.

Ou entrar pelo cano e se tornar um outro camisa 9 esquecido.

“UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” – CAPÍTULO 25

por Eduardo Lamas Neiva

Ao fim da homenagem de José Messias a Garrincha, houve rápida dispersão. Zé Ary, como ótimo mestre de cerimônias que vinha se revelando, fez a bola girar com um novo tema lançado para os nossos amigos.

Garçom: – O futebol tem cada expressão, né? Tem umas que acho muito curiosas e não sei de onde vieram. Zebra, por exemplo…

João Sem Medo: – Zé Ary, a expressão foi criada pelo técnico Gentil Cardoso na década de 60. Gentil, que é também o autor da frase “quem desloca recebe e quem pede tem preferência”, era técnico da Portuguesa da Ilha do Governador e antes de um jogo em 64 contra o Vasco disse que se seu time vencesse seria como dar a zebra no jogo do bicho.

Garçom: – Não tem zebra no jogo do bicho!

João Sem Medo: – Pois, então. A Portuguesa venceu por 2 a 1 e o termo ficou pra sempre.

Ceguinho Torcedor: – É, João, mas você criou várias também. Algumas eram do Neném Prancha e você levou pro rádio, não foi?

João Sem Medo: – Neném Prancha foi meu treinador na praia. Meu, do Heleno de Freitas, do Sandro Moreyra… Lembra disso, né? (fala em direção a Neném Prancha, que concorda com um gesto) Ele era, ou melhor, é um grande frasista. Diz as mais famosas, Neném!

Neném Prancha se levanta pra se dirigir a João e ao público.

Neném Prancha: – Obrigado, João. Bom, algumas das que criei foram “Jogador de futebol tem que ir na bola com a mesma disposição com que vai num prato de comida”; “Futebol é muito simples: quem tem a bola ataca; quem não tem defende”; “Se concentração ganhasse jogo, o time do presídio não perdia uma partida”; “Se macumba ganhasse jogo, o Campeonato Baiano terminava empatado”, “Futebol é uma caixinha de surpresa” e outras.

João, os amigos, o público, todo mundo aplaude no bar Além da Imaginação.

Garçom: – Esta última tem tudo a ver com a da zebra.

Sobrenatural de Almeida: – Caixinha de surpresa, zebra, isso tudo no futebol só existe por causa do papai aqui. Em 26, o São Cristóvão derrubou o favoritismo de Vasco, Flamengo e Fluminense e foi o campeão carioca.

Garçom: – Por falar em zebra, vamos então ouvir novamente o grande Zeca Baleiro, que é torcedor do Maranhão Atlético Clube, o famoso MAC, de São Luís? “Deu zebra” é o nome da música.

Terminada a música nas caixas de som do bar, Ceguinho retoma a pelota.

Ceguinho Torcedor: – O São Cristóvão foi campeão em 26 porque foi um clube à frente do seu tempo. Mario Filho, o Criador das Multidões, relatou isso no seu livro eterno: “O negro no futebol brasileiro”. Já naquela época o São Cri-Cri tinha um ônibus e seus atletas treinavam correndo nas areias da praia de Copacabana de chuteira e meiões. Os atletas do São Cristóvão chegando uniformizados à praia pareciam os aliados desembarcando na Normandia no Dia D!

João Sem Medo: – Um dia inesquecível, meus amigos! Tive a honra de desembarcar na Normandia ao lado do Marechal Montgomery.

Alguns na plateia não conseguem segurar o riso, mas João não percebeu ou fingiu que não ouviu. Sobrenatural de Almeida aproveitou a deixa no vácuo e retomou o assunto.

Sobrenatural de Almeida: – Olha, senhoras e senhores, além de uma forcinha minha, o segredo mesmo do São Cristóvão era o mingau da Negra Balbina e as gemadas com ovos da granja de Álvaro Novais. Coisa de outro mundo! Hahahaha

Ceguinho Torcedor: – Aquele era um time com saúde de vaca premiada!

Idiota da Objetividade: – O São Cristóvão foi campeão carioca de 1926 com uma campanha de catorze vitórias, dois empates e duas derrotas. O título veio após uma goleada de 5 a 1 sobre o Flamengo, que seria o quinto colocado, no antigo estádio da Rua Paissandu. A equipe que entrou em campo para a última partida formou com Paulino; Póvoa e Zé Luiz; Julinho, Henrique e Alberto; Osvaldo, Jaburu, Vicente, que foi o artilheiro do campeonato, com 25 gols, Baianinho e Teófilo. Participaram da campanha também Doca, Mendonça, Martins e Luis Vinhaes, que depois se tornou o técnico do time. Foram ao todo 70 gols marcados e 37 sofridos.

João Sem Medo: – É bom lembrarmos que, sete décadas depois, o São Cristóvão revelou o Ronaldo, que passou a ser chamado de Fenômeno na Itália.

Garçom: – Verdade, seu João! Vamos aproveitar então para fazer uma homenagem ao São Cristóvão?

Todos concordam.

Garçom: – Quase todo o time campeão de 26 está aqui. Peço que se levantem e sejam aplaudidos, por favor.

São muito aplaudidos, especialmente o artilheiro Vicente, quando apresentado.

Garçom: – Bom, vamos chamar ao palco um dos grandes cantores da história da nossa música para cantar a Marcha ou hino popular do São Cristóvão, composta por Lamartine Babo, que já se apresentou aqui e também merece aplausos. Com as senhoras e os senhores: Silvio Caldas.

Lamartine, primeiro, Silvio Caldas, depois, agradecem os aplausos.

Silvio Caldas: – Muito obrigado. Com muita honra gravei o hino deste clube tão tradicional do futebol brasileiro. Ainda mais porque eu nasci na Rua São Luiz Gonzaga, número 209, no bairro de São Cristóvão, o bairro imperial carioca.