FEIJÃO COM ARROZ DOS TREINADORES ANTIGOS
por Zé Mário
Há poucos dias escutei alguém falar que os treinadores antigos só faziam o “Feijão com Arroz” nos treinamentos dos jogadores de futebol.
Quando ouvi isso a minha cabeça começou a girar para entender o significado de tal afirmação. Quem afirmou isso? Será que foi um pesquisador? Um cientista? Um ex-jogador de futebol? Um ex-jogador de futebol Campeão Mundial? Minha mente foi retrocedendo no tempo. Hoje, com 74 anos, tive que fazer um esforço muito grande para voltar aos 10 anos de idade.
Aos 10 anos eu comecei a jogar futebol de salão. Ou melhor, comecei a jogar o futebol da bola pesada. Atualmente FUTSAL. Meu primeiro clube foi o Magnatas Futebol de Salão, ali na Estação do Rocha. Não lembro os nomes dos treinadores desse tempo, mas me lembro que aprendi a me posicionar dentro da quadra. Cada um tem uma função e me foi mostrada e orientada a função que eu deveria exercer na minha posição.
Eu comecei de beque parado. Cobertura, passe bom, boa marcação, raça, vontade de vencer, cabeça fria, etc. Algumas coisas aprendi no paralelepípedo e no asfalto. Outras nas peladas no campo que era metade mato e metade areia. Ainda outras coisas aprendi com meu pai. Ser macho. Disputar a bola com vontade, mas com lucidez.
Ainda no Magnatas aprendi a competir. Disputei algumas competições oficiais. Mudei para o Vila Isabel Futebol de Salão, hoje extinto, e continuei a minha evolução, sempre orientado pelos Treinados Antigos. Incentivavam a técnica, a criatividade e, principalmente, que o momento do jogo era o jogador quem decidia. Ele não entrava em campo.
Assim, fui me informando com eles e “Aprendendo a Jogar” igual aquela música que a Elis tornou imortal uma letra do Guilherme Arantes. Tudo que falavam eu prestava atenção. Minha carreira de jogador de futebol de salão evoluía tranquilo. Campeão pelo Vila Isabel, Campeão Brasileiro pela seleção Carioca.
De repente surgiu uma oportunidade de treinar no infanto-juvenil, nome da época para a minha idade, no meu time de coração, o Fluminense. Sem muita convicção em me tornar um jogador profissional, comecei a treinar.
Conheci o Pinheiro, o ex-jogador e Treinador da minha categoria. Já o admirava como jogador do Fluminense. Fui muitas vezes ver os jogos no Maracanã e ele era um dos heróis. Tê-lo perto de mim e me ensinando e orientando a minha possível profissão futura foi uma honra.
Qual seria a minha posição no campo? Sei lá. Apesar de já ter jogado em campo grande, a minha formação foi no Futebol da Bola Pesada. O Pinheiro me colocou de Ponta Direita para me observar. Ponta Esquerda e Centroavante.
Em um treino eu entrei sozinho com a bola dominada e me deparei com um goleiro famoso. O treino era contra o profissional ou o reserva. Sei que parei a bola e fiquei sem ação. O goleiro na expectativa do que eu ia fazer e eu paralisado na frente dele. Para a minha sorte, veio o centroavante e eu passei a bola para ele fazer o gol.
Aí veio uma das melhores lições que aprendi na vida.
O Pinheiro apitou anulou o gol e deu falta contra o meu time. Perguntei o porquê e ele falou que eu tinha sido covarde em concluir o lance. Falou que eu tive medo do nome e da imagem do goleiro. Fiquei estático. Pedi desculpas dizendo que ele estava com a razão.
Levo para o resto da minha vida essa lição. Não tenham medo de nada que apareça na sua frente. Resolvam. Pode ser cauteloso, calmo, mas decida.
Além desse aprendizado, ele ensinava que nunca deveríamos receber a bola de costas para o gol adversário. Sempre, de frente e no mínimo de lado.
Ele incentivava o confronto de homem a homem. Ele exigia comprometimento. Ele exigia comportamento como jogador. Ele sempre falava que éramos espelhos dos mais jovens que a gente e precisávamos demonstrar isso para os mais jovens ainda.
Não existia peneira como é feita hoje. Quatro ou cinco meninos eram permitidos demostrarem o potencial deles no meio da equipe. Eles chegavam, trocavam de roupa junto com o grupo e iam para o treino. Num desses treinos um jogador chegou e dentro do vestiário o Pinheiro perguntou qual era a posição dele. Ele respondeu que era lateral direito. O Pinheiro o mandou ficar em pé, olhou bem para ele e mandou que ele andasse da porta do vestiário até a rouparia. O menino foi. Quando parou, o Pinheiro falou que pelo andar a posição melhor para ele seria volante. O menino treinou de volante e agradou.
Muito obrigado, PINHEIRO, pela minha iniciação no Futebol da Bola Mais Leve, mas com um Campo Imenso.
O Treino no Fluminense atrapalhava os meus estudos no São Bento e resolvi parar.
Voltei seis meses depois pelo Bonsucesso. Lá encontrei outro Treinador da Antiga, Alfredo Abraão, com muitos ensinamentos.
Cruzamentos, chutes frontais, marcação, coberturas, etc.
Me lembro bem que ele falava para os pontas que o pé na hora do cruzamento tinha que estar no formato de uma foice para a bola fazer a curva e ir de encontro à cabeça do centroavante e não o centroavante correr atrás da bola para cabecear. Nunca mais esqueci disso, apesar que eu não era ponta. Ainda assim anotei o ensinamento.
Trocou o Treinador. Saiu o Prof. Alfredo Abraão e entrou o Major Murilo de Carvalho. Mais ensinamentos e orientações proveitosas.
Num dos primeiros treinos coletivos, eu recebi três vezes a bola e dei três passes certos bem simples. Nos três passes certos, mas simples, ele apitou e deu falta contra o meu time. Na terceira vez perguntei onde errei. Ele parou o treino e falou que eu tinha feito o óbvio e fazendo aquilo eu morreria no Bonsucesso. Não teria progresso algum. Aí eu perguntei o que eu tinha que fazer. Prontamente me respondeu que quando a bola ainda estivesse com o meu companheiro e antes dele me dar a bola, eu já deveria ter olhado o campo todo e ver quem estava desmarcado. Então, eu olharia para um lado e daria a bola para o outro sem olhar. A jogada dessa forma seria melhor para o time.
Podemos dizer que era ter uma “Visão Periférica do Campo de Jogo” mesmo antes de ter recebido a bola.
Eu já fazia um pouco disso no Futebol da Bola Pesada sem ter muita noção da importância disso. Mais um que levo para a minha vida toda.
Depois peguei o Prof. Paulo Emílio. Ele me lançou nos profissionais do Bonsucesso, me levou para o Fluminense e depois para o Vasco. Mais uma série de aprendizados. Não dá para enumerar todos os aprendizados com todos os treinadores. Eu ficaria aqui escrevendo um livro e não um artigo.
Aprendi que cada treinador teria coisas boas e coisas não muito boas para aprender. Passei a catalogar o que fazer quando virasse Treinador e o que não fazer. Cada treinador anotava as boas e as que eu não gostava. Isso vai desde treinamento até as atitudes.
Se vocês prestarem atenção aos Treinadores que eu aprendi a praticar o futebol, sentirão a importância de atentar para o que essas pessoas fizeram pelo futebol.
Pinheiro, Alfredo Abrão, Paulo Emílio, Velha, Zizinho, Freitas Solich, Zagallo, Joubert, Jair da Rosa Pinto, Parreira, Didi, Orlando Fantoni, Otto Gloria, Diede Lameiro, Mário Travaglini, Mario Juliato. Olha quanto “FEIJÃO COM ARROZ” eu comi com o comando deles.
Olha quantos “Campeonatos Mundiais” o Brasil ganhou comendo “FEIJÃO COM ARROZ”.
Se eu pudesse voltar a ter 15 anos de novo, eu passaria o dia todo rezando para tê-los me ensinando “FEIJÃO COM ARROZ”. Com o Flamengo, consegui dez Títulos, com o Fluminense, três, com o Vasco da Gama, oito e Portuguesa de Desportos um.
Como Treinador obtive quatorze Títulos ensinando o que aprendi. Ensinei o “FEIJÃO COM ARROZ” com a medida proporcional que cada grupo precisava.
Feijão com Arroz bem simples.
Feijão com Arroz com Amor
Feijão com Arroz mais evoluído.
Feijoada Completa para grandes jogadores.
Nada mais, nada menos.
Agora não me venham com Feijoada Portuguesa que não dá para engolir.
Quantos anos não ganhamos um Campeonato Mundial?
Será que estamos dando muito “CAVIÁ” para os jogadores e esquecemos que é o “FEIJÃO COM ARROZ” que eles precisam???????????????????????????????????????????????????????????
HOMEM DE VERDADE
por Rubens Lemos
Tornei-me adulto de verdade aos 23 anos e 29 dias. Graças a Romário, mago e malandro, pude ver, de verdade, sem ninguém para me contar, a maior exibição de um jogador pela seleção brasileira desde que assistira o primeiro jogo, em 1977.
Romário sambou no Maracanã com 101.533 pagantes e liquidou o Uruguai por 2×0, marcando os dois gols e, acima de qualquer ato plenamente humano, fez o que quis com a bola e os adversários.
Foi o maior perigo que o Brasil passou de ficar fora de uma Copa do Mundo. Picuinha do técnico Carlos Alberto Parreira e – sem fugir do script orgânico – do coordenador Zagallo, que jamais aceitariam o estrelato inigualável do Baixinho, herói dos cinquentões de hoje.
No dia 19 de novembro de 1993, o país amanheceu tenso. Romário era chamado como um atirador de elite para salvar o time. A seleção brasileira jogava pelo empate, se perdesse, dependeria de uma vitória do Equador sobre a Bolívia (terminaria empate por 1×1).
Melhor atacante do mundo, Romário já era fazia uns três anos. Chato, também nunca deixou de ser. Barrado num amistoso contra a Alemanha em Porto Alegre(Brasil 3×1) por Bebeto e Careca, só não abandonou a delegação porque foi contido literalmente no braço pelo seu companheiro de quarto – Renato Gaúcho.
Arrogantes, Parreira, menos, bem menos do que Zagallo, deram por encerrado o ciclo de Romário com a amarelinha. Estavam certos de que o trio Careca, Bebeto e Muller garantiria o lugar nos Estados Unidos em 1994. Careca, vaiado na Venezuela e sem o gás nem a categoria de sempre, pediu para ir embora. Restaram Bebeto, Muller e duas opções de meia-tigela: Evair e Valdeir.
O Uruguai era cascudo. Pelo menos três cracaços vestiam a camisa Celeste – Francescoli, Rubén Sosa e Fonseca e pairava sobre o Maracanã o caduco fantasma da derrota no mundial de 1950, exorcizada pelo maior fracasso da história do Brasil nos 7×1 levados da Alemanha, 21 anos depois.
Parreira e Zagallo juravam, para não convencer uma freirinha, que Romário seria convocado para decidir e tudo estava nos planos. Mentira.
Inventaram uma contusão em Muller para trazer o gênio. Soluções tidas como mortais, falharam, a maior delas, o apático Raí. E Zinho, que de habilidoso ponta-esquerda, foi mutilado, passando a mero perseguidor de laterais.
Romário chegou como se descesse na Vila da Penha, só de sunga. Garantiu que classificaria o Brasil e, ao primeiro toque, derreteu a maldade da dupla de comandantes. Driblou curto, deu balão, enfiou caneta, lançou longo, descadeirou zagueiros, humilhou os adversários – os oficiais e os traíras do banco de reservas.
Revi esse jogo não menos que duas dezenas de ocasiões. O jogo, não, Romário, cabeceando por baixo das pernas do goleiro Siboldi e arrancando para desmontá-lo em ginga de corpo típica de roda de gafieira. Ali não foi o último jogo das Eliminatórias de 1993, mas o primeiro da Copa de 1994, que Romário ganharia com o pé nas costas, como fizeram, também a léguas de distância dos companheiros, Garrincha em 1962, Maradona em 1986 e Messi em 2022.
Terça-feira o Brasil pega o Uruguai e o pau deverá cantar como se fizesse parte de um cerimonial eletrizante do confronto histórico. Nunca será igual a 1993. Nem hesitarei em trocar a transmissão ao vivo pelo repeteco, na íntegra, da tarde em que me tornei cidadão, não tosco adolescente com alguns anos atestados na carteira de identidade. Devo a Romário.
DAS EMOÇÕES QUE VIVI QUANDO LEILA PEREIRA NÃO ESTAVA LÁ
por Marcelo Mendez
Quando eu chorei na arquibancada do Parque Antartica em 1985 depois do Palmeiras perder para o XV de Jaú, Leila Pereira não estava lá. Na noite que saí despedaçado do Morumbi depois daquele 2×1 pra Inter de Limeira em 1986, Leila Pereira não estava lá. No silêncio da volta de Bragança em 1989, Leila Pereira não estava lá. Quando eu ouvi o barulho daquela bola na trave do Aguirreregaray contra a Ferroviária em 1990, Leila Pereira não estava lá. Quando o Evair meteu aquela bola pra dentro dia 12 de junho de 1993 foi meu Pai a quem eu abracei no Morumbi e não a Leila Pereira.
Sou Palmeirense de um tempo que não havia Leila Pereira na vida do Palmeiras, mas hoje eu a reconheço.
Senhora Leila eu tenho profundo respeito pelo que a Senhora fez e pelo que senhora sente pelo Palmeiras. Mas lamento profundamente que isso não seja recíproco.
Lamento que a Senhora não tenha respeito pelo que eu e tantos Palmeirenses viveram antes da Senhora chegar e que seguirão vivendo depois da Senhora partir. A minha História com o Palmeiras faz parte da minha trajetória e jamais ela será maior que a Sociedade Esportiva Palmeiras, assim como a Senhora não é, nem ninguém será. A Senhora é uma empresária muito bem sucedida, sabemos disso. Mas entenda, Senhora Leila Pereira, que a Senhora pode comprar aviões, palácios, camarotes e o que mais lhe convir, mas jamais vai conseguir comprar o que eu chorei, o que eu vivi.
Lágrima não tem preço, paixão não tem cotação na bolsa. Amor é o que a gente não mensura, tampouco explica. E quem torce pelo Palmeiras construiu isso tudo.
Queira seu contracheque ou não.
zico e a copa do mundo de 1982
por Luis Filipe Chateaubriand
É tema bastante polêmico a qualidade da participação de Zico na Copa do Mundo de 1982, na Espanha.
Para muitos, atuações brilhantes, dignas do craque que era.
Para uns poucos, o “Galinho de Quintino” teria ficado devendo, jogado aquém de sua fama.
A verdade é que Zico fez uma grande Copa.
Mas uma grande Copa, mesmo!
Contra a Escócia, fez um gol de falta magistral.
Contra a Nova Zelândia, um belíssimo gol de meia bicicleta.
Contra a Argentina, um gol de puro oportunismo.
Ainda contra a Argentina, um lançamento esplêndido para gol de Júnior.
Contra a Itália, um passe genial para gol de Sócrates.
Houve um fato, contudo, que atrapalhou a performance do craque, exatamente no momento decisivo!
No jogo contra a Argentina, Zico tomou uma pancada criminosa de Daniel Passarella.
E, com isso, foi para o jogo decisivo, contra a Itália, “baleado”.
No primeiro tempo contra a “Azurra”, não sentiu a contusão, e jogou muito – até ter a camisa puxada, e rasgada, por Gentile, teve.
Mas, no segundo tempo, era visível que as dores se fizeram presentes.
E, machucado, no segundo tempo Zico não pode apresentar o grande futebol que ostentava na Copa até então – o que pode ter sido um dos motivos de nossa eliminação.
Então, aos “sabichões” que insistem em dizer que Zico não fez uma boa Copa, afirma-se que não é verdade.
O cara não tinha como render, no segundo tempo contra a Itália, se foi alvo de um brucutu argentino, no jogo anterior.
E estamos conversados!
UMA COISA JOGADA COM MÚSICA – CAPÍTULO 31
por Eduardo Lamas Neiva
A música de Taiguara é aplaudidíssima e ele sai ovacionado do palco.
Taiguara: – Muito obrigado!
Depois de agradecer ao público e aos músicos, ele dá um abraço em Zé Ary, João Sem Medo, Idiota da Objetividade e, quando chega a vez de Sobrenatural de Almeida, há um rápido papo.
Sobrenatural de Almeida: – Taí um dos maiores compositores da nossa música! Dá um abraço aqui. Você é Botafogo, né? (solta uma gargalhada)
Taiguara (rindo): – É lógico que não. Você sabe que minha torcida é aquela coisa linda, aquela torcida que mesmo nas fases terríveis que o Flamengo já passou, quando a torcida não tinha mais por que acreditar, compareceu até num festival da canção, em 1968, só pra torcer por um cantor, como foi meu caso, só porque ele falava no Flamengo. Uma coisa extraordinária!
Sobrenatural de Almeida (rindo): – Você sabe que eu gosto de provocar.
Taiguara dá mais um abraço em Almeida, sai dando risadas e vai à sua mesa.
Garçom: – Nós que agradecemos a você, Taiguara. Bom, nós falávamos daquele Campeonato Brasileiro de 79…
Idiota da Objetividade: – O Inter foi campeão invicto, o único até hoje.
João Sem Medo: – Numa final em dois jogos com o Vasco. O Internacional venceu as duas partidas e se fartou de merecer o título. No último jogo, talvez 3 a 0 fosse mais justo do que os 2 a 1.
Ceguinho Torcedor: – Aquele time do Inter era espetacular!
Idiota da Objetividade: – Benítez, João Carlos, Mauro Pastor, Mauro Galvão e Claudio Mineiro; Batista, Jair e Falcão; Valdomiro ou Chico Spina, que fez os dois gols da vitória no primeiro jogo, no Maracanã, Bira e Mário Sérgio. O técnico era Ênio Andrade.
João Sem Medo: – Um time harmonioso, bem estruturado e com um extraordinário meio-campo. O Batista mais plantado, o excepcional Jair não somente lançando, mas aparecendo para finalizar, e o Falcão jogando como sabia, isto é, uma espécie de guerrilheiro se metendo por onde lhe parecia melhor, como um homem livre, fazendo seu melhor jogo. Além desses três, Mario Sérgio e Bira foram os bonzões.
Garçom: – Como estamos falando daquele Inter de 79 e Falcão já tinha brilhado nos dois títulos anteriores, de 75 e 76, vou pôr na caixa de som uma dupla de craques gaúchos pra cantarem aquela música que tem saudade do Falcão e da galera no Beira-Rio.
A turma se alegra com a música, alguns cantam junto e dá uma descontraída, dando uma voltinha pra esticar as pernas. Porém, logo ao fim de “Deu pra ti”, de Kleiton e Kledir, a mesa principal está refeita e disposta a levar a resenha adiante. Afinal, o papo é o melhor do futebol, como João Sem Medo já havia falado lá no início desta conversa.
Idiota da Objetividade: – Um ano antes, na temporada anterior a este título do Inter, dois times paulistas haviam disputado a final, com o surpreendente Guarani, de Zenon e o jovem Careca, de apenas 18 anos, sendo campeão em cima do Palmeiras.
Sobrenatural de Almeida: – Outra zebra formidável que eu aprontei! (solta sua risada medonha)
João Sem Medo: – O caráter daquela conquista do Guarani deveria marcar o futebol brasileiro por muito tempo. Um time do interior do Estado de São Paulo, apenas o Santos tinha conquistado títulos nacionais. Mas o Santos constituiu uma exceção nacional e internacional. O êxito do Guarani foi diferente. Santos era ainda o grande porto, o maior porto do Brasil. Campinas fica lá dentro, naquela época ainda mais no interior mesmo, e seus clubes levavam todas as desvantagens que os das chamadas segundas cidades dos Estados sempre levaram.
Ceguinho Torcedor: – Amigos, como a finalíssima entre Palmeiras e Guarani esteve acima dos jogos da Copa da Argentina, naquele mesmo ano. Houve a maior rapidez, sem prejuízo da beleza, do virtuosismo. Eu afirmava naquela época que os cretinos fundamentais diziam de olho rútilo: “O Brasil não tem mais craques!”. Pois tinha – e ainda tem – muito mais do que se pensa. O Guarani levava a falsa vantagem do empate, mas venceu a partir do momento em que só se interessou pela vitória. Perseguiu o gol. E quando este aconteceu, eis o Guarani perseguindo outro gol. Pra todos nós o Guarani foi uma surpresa. Ouvi e vi o jogo com colegas e a toda hora alguém dizia: “Que cracaço de bola”.
João Sem Medo: – E olha que o Zenon não jogou o último jogo.
Idiota da Objetividade: – Foi substituído por Manguinha. Zenon estava suspenso por ter recebido o terceiro cartão amarelo no primeiro jogo, que ele mesmo decidiu, no Morumbi, em cobrança de pênalti.
Sobrenatural de Almeida: – O goleiro na hora do pênalti foi o centroavante Escurinho. Ele foi pro gol depois da expulsão do Leão. Sinistro!
Idiota da Objetividade: – O Palmeiras já tinha feito as duas substituições, como mandava a regra na época.
Ceguinho Torcedor: – Na verdade, a nossa surpresa não tinha nenhuma razão. Se o Brasil quisesse, faria cinco escretes de igual valor. Por exemplo: um homem como Zenon. Em São Paulo, meus amigos só falavam de Zenon com elogios frenéticos. Zenon era realmente craque, comprovou isso no Corinthians e vestindo a camisa da seleção posteriormente. Mas o Guarani não era de um craque só, era um formidável time, no mundo não tinha outro maior.
João Sem Medo: – Eu vi o Zenon jogando a primeira vez em 72 ou 73 lá na terra dele, em Itajaí…
Idiota da Objetividade: – Ele na verdade nasceu em Tubarão, João. Terra do Renato Sá também.
João Sem Medo: – Ah sim, isso mesmo, obrigado. Então foi em Tubarão… Ou em Itajaí mesmo, o jogo. Roubaram um time argentino, o Argentinos Juniors. Roubaram os gringos de uma maneira! O Zenon jogou esse jogo, era um monstro.
Idiota da Objetividade: – Ele depois jogou de 1972 a 75 no Avaí, onde foi campeão catarinense em 73 e 75, antes de se transferir pro Guarani.
João Sem Medo: – Eu nunca vi esse cara errar passe. Uma vez estava falando isso na televisão e ele errou um pênalti, já na época em que estava no Atlético Mineiro. Paciência. Mas era um monstro.
Garçom: – Então, em homenagem àquele grande time do Guarani, vou pôr aqui no telão uma versão instrumental linda do hino do Bugre, tocado na viola caipira pelo cantor, compositor e multi-instrumentista Victor Hugo.
Todos aplaudem e elogiam muito.
Fim do capítulo 31
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