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MORRE O JOGADOR NASCE A LENDA

por Marcos Vinicius Cabral


O mundo da bola ficou mais triste e enlutado com o desaparecimento físico de Carlos Alberto Torres, que foi traído pelo coração aos 72 anos de vida e morreu na manhã desta terça-feira (25), em sua casa no Rio de Janeiro. Este mesmo coração que aguentou muitas emoções no discorrer de uma carreira vitoriosa, tanto dentro das quatro linhas, como fora.

Considerado por muitos como o maior lateral direito da história do futebol brasileiro – ao lado de Leandro e Djalma Santos -, o ‘Capita’ deixa em nós brasileiros a imagem na Copa de 70, quando levantou a taça Jules Rimet mostrando ao mundo, além da eficiência de um futebol altamente competitivo e talentoso, a figura de liderança que acompanhava aquele fabuloso time.

Começou sua carreira  nas Laranjeiras e, aqui na cidade maravilhosa, só não vestiu a camisa do Vasco como jogador, assim como também não foi técnico do clube cruzmaltino.

Em seu currículo – que dispensa apresentações – tem o brasileiro de 83 pelo Flamengo que podemos considerar como o mais importante de sua trajetória como ‘professor’, quando comandou a equipe rubro-negra com jogadores da estirpe de Raul, Leandro, Júnior, Adílio, Zico e que já eram consagrados. 

Como jogador fica difícil dizer qual teria sido o momento mais evidente: no esquadrão histórico do Santos em que abocanhou nove títulos na década de 60? Na Copa do Mundo de 1970 quando foi dele o último gol num petardo indefensável para o goleiro italiano na final daquele Mundial? Ou ainda na Máquina Tricolor comandada por Francisco Horta e com tripulantes como Rivelino, Paulo Cézar Cajú, Doval, Edinho & Cia?

Mas dúvidas à parte, a certeza que fica que Carlos Alberto Torres foi grande. Foi um monstro de jogador e um líder que nenhuma equipe em sã consciência se daria o luxo de renegar.
O ‘Capita’ fez história. Escreveu seu nome nela. E se tornou história, dessas que são sempre bem contadas e que não suscita nenhuma dúvida de um final feliz. 

Enfim, nosso eterno camisa 4 deixa uma lacuna que dificilmente será preenchida por alguém.

Que Deus o receba de braços abertos e, que nesta partida em que a bola chora torrencialmente lágrimas de dor e que passeiam pela sua forma arredondada caindo no verde da grama, onde talvez possam brotar um novo Carlos Alberto Torres.

A vida segue…o futebol não!

A bola pune…quem a ela maltrata!

Para sempre em nossos corações!

Valeu, ‘Capita’!

O GOLEIRO DO CAPITA

por Mauro Ferreira


Em pé: Paulo Wrencher, Mauro Ferreira, Carlos Alberto Torres, Washington Rodrigues, Apolinho, Doval, Djalma Dias
Agachados: Newton Zarani, Emygdio Felizardo Filho, Tijolinho, Sérgio Du Bocage, ——–, José Medeiros.
 

“A bola quicou um pouco antes do chute. Foi o suficiente para ela encaixar direitinho no peito do pé. Se não tivesse quicado, não ia sair aquele balaço”. Era assim que o Capita contava o último gol da Copa do Mundo de 1970, no México. E assim, dessa forma simples ele levava a vida. Estar ou não sob holofotes, pouco importava, mesmo vivendo a vida toda sob eles. Como jogador, treinador, comentarista, vereador, marido de atriz global. Não escondia o que pensava, muito menos sua paixão pelo Fluminense – Marcio Guedes insiste que era botafoguense. Falava o que desse na telha, fosse numa entrevista séria ou na resenha da pelada.

Carlos Alberto Torres, o Capita, se foi de supetão. Como quando falava o que lhe vinha à cabeça. Não perdeu tempo nem deu tempo ao sofrimento, como quando disparou aquele petardo que encerrou a goleada brasileira sobre a Itália. Um chute. Um chute e rede. Nenhum toque a mais na bola. Nada. Um chute. Hoje, um infarto. Rápido, certeiro, poderoso. Como aquele gol. O gol que vai durar a eternidade do futebol.

Se em 70 o choro vinha para lavar a alma de felicidade, hoje a lágrima corre de profunda tristeza. Ele certamente mantém o sorriso franco, o mesmo que alegrava qualquer um em suas resenhas. O mesmo que exibia nas peladas que jogava com qualquer um, em qualquer tempo, a qualquer hora. O mesmo dessa foto aí, no time do Jornal dos Sports. Eu era o goleiro e ele jogava essa pelada com a gente toda segunda-feira no Montanha Clube, no Alto da Boavista. A zaga facilitava o meu trabalho! O capitão da melhor seleção de futebol de todos os tempos estava ali, ao meu lado! Não vai estar mais. Não vai ter mais resenha divertida. Mas sempre, sempre, aquela bola vai quicar e encaixar direitinho no peito do pé do Capita.

Triste…

SONHO REALIZADO

por Sergio Pugliese

O dia 25 de outubro vai ficar marcado pela morte de Carlos Alberto Torres, o maior capitão da seleção brasileira. Vale destacar, no entanto, que hoje também é comemorado o Dia do Dentista! Por isso, resgatamos uma crônica muito bacana da coluna “A Pelada Como Ela É”.

É inegável que o Dr. Luiz Antônio Coelho Martins, o Lulinha, realizou o sonho de qualquer peladeiro. Afinal, quem nunca se imaginou atuando no Politheama ao lado do mestre Chico Buarque e de inúmeros outros nomes da MPB, ou fazendo parte do time de Zico, o Galinho de Quintino, Adilio, Julio Cesar Uri Geller e vários outros craques que fizeram história no melhor time de todos os tempos do Flamengo? Essa honra não é para qualquer um. Conheçam mais um pouco do lado peladeiro do Lulinha nas fotos e no vídeo abaixo!


Zico, Gaúcho, Jaime, Lulinha, Andrade, Delacir, Gaúcho Lima e Zé Carlos. Convidado, Adílio, Renato Carioca, Pita, Heleninho Boca de Açúcar, Gilmar Popoca, o Cai Cai, e Julinho Uri Geller.  


O Politheama com Vinícius França, Rodolfo Fernandes, Carlinhos Filé, Chico Buarque, Rodrigo Paiva, Lulinha, Carlinhos Vergueiro e Bibi.


Adílio, Lulinha, Julio Cesar e Guillermo Planel.

OBRIGADO, CAPITA!!!

por Sergio Pugliese


O futebol perdeu hoje um dos jogadores mais respeitados da história! O respeito era tanto, que lhe deram a missão de ser o líder daquele timaço que conquistou a Copa de 70! E a função foi tão bem exercida que ganhou o apelido de “Capita”, o “Capitão do Tri”, que beijou com carinho a Taça Jules Rimet! Vítima de um infarto fulminante, Carlos Alberto Torres morreu hoje, aos 72 anos, no Rio de Janeiro.

Com uma classe incomum para jogadores defensivos, o lateral-direito surgiu como uma grande promessa do Fluminense no início da década de 60 e, posteriormente passou a jogar como zagueiro. Atuou também por Santos, Botafogo, Flamengo e New York Cosmos, sempre caindo no gosto das torcidas sem precisar de muito esforço. Atualmente, trabalhava como comentarista do Canal SporTV.

Em homenagem a um dos maiores jogadores do futebol mundial, recordamos uma entrevista e um texto da coluna “A Pelada Como Ela É”, publicado em 14 de abril de 2012, que conta um pouco sobre a vida de boleiro do “Capita”, desde a infância:

O MENINO DA PENHA

Após mais uma vitória sobre o rival Independente, a rapaziada do Ipiranga seguiu para o Armazém do Seu Carlos, tradicional ponto de encontro “pós-massacres”. Seu Carlos além de excelente anfitrião também funcionava como patrocinador do time porque bancava sanduíches, refrigerantes e, claro, o uniforme: camisa branca de gola vermelha, calção azul e meião branco. Nesse dia, o jogo foi duríssimo e o lateral Carlos Alberto, líder do grupo, deitou-se na calçada da Vila da Penha de braços abertos, extasiado e principalmente aliviado por libertar os pés em carne viva das chuteiras, dois números menor.

– Minha família não tinha dinheiro para comprar e usava as que me emprestavam – recordou-se Carlos Alberto Torres, o capitão do tri, rodeado pela orgulhosa comitiva do A Pelada Como Ela É formada pelo trio de atacantes Reyes de Sá Viana do Castelo, Daniel Planel e Fernanda Pizzotti. 

O problema dos pés esfacelados complicava no dia seguinte. Precisava cumprir as tarefas como mensageiro da corretora de imóveis, de Seu Geraldo Albernaes, e à noite marcar ponto no Educandário Santa Fátima. Mas se tivesse bola rolando esquecia tudo. Queria seguir os passos de Zé Luiz, o irmão mais velho que treinava no Fluminense e despontava como possível substituto do ídolo Pinheiro. Mas um acidente de carro jogou tudo ralo abaixo. Os pais Chico e Alaíde não davam a menor força para Carlos Alberto, mas um dia ele foi convidado para um treininho no Fluminense por Roberto Alvarenga, dono do Ipiranga e supervisor tricolor. Inventou para o patrão que precisava visitar uma tia doente, mas foi flagrado pelo Velho Chico nas Laranjeiras. 

– Ele me chamou de vagabundo para baixo, mas num jantar com a família pedi uma chance e ele deu. Era um paizão! – contou, ao lado do filho Alexandre Torres. 


E Carlos Alberto não desperdiçou a chance. Aos 16 anos, barbarizou nos treinos, entrou para o juvenil e três anos depois substituiu Jair Marinho, que fraturara a perna, no time principal. Comemorou sua estreia no Maracanã dançando até se acabar numa das festas organizadas por Seu Barbosa, figura folclórica do bairro. Perdeu de 3 x 0 para o América, mas vibrou com os Golden Boys tocando na carroceria de um caminhão, na Estrada do Quitungo. Ele e os parceiros do Ipiranga, Noca, o ponta-direita Othon, o lateral-esquerdo Chicão e o goleiro Rui. O pai coruja empolgado com a performance do garotão, liberou o Chevrolet 40 preto para ele ir ao treinos. Um arraso! 

– Em 1963 fui convocado para o Panamericano e em 1964, comprei meu próprio Fusca! – vibrou. 

Também em 1964 foi convocado para a seleção brasileira e ganhou a vaga de Djalma Santos. Na estreia, vitória sobre a Inglaterra, no Maracanã, ao lado de Gilmar, Gerson, Vavá e Pelé. No ano seguinte, outra grata surpresa: o convite para integrar o dream team do Santos, com Gilmar, Mauro, Orlando Peçanha, Geraldino, Zito, Mengalvo, Dorval, Coutinho, Pelé e Pepe. 

– Ganhamos tudo e ficamos mundialmente famosos – orgulhou-se. 

A carreira de Carlos Alberto foi fulminante. Se aos 15 anos resgatava as bolas da vala negra que rasgava o campinho de terra batida do bairro, apenas 10 anos depois, no dia 21 de junho, o maior lateral-direito de todos os tempos, entrava no Estádio Azteca, na Cidade do México, para ser assistido por centenas de milhões de pessoas, na decisão da Copa do Mundo de 1970, contra a Itália. E colocou-se naquela faixa de campo, no território onde pouquíssimos ousaram se engraçar. Um deles, Abel, ponta-esquerda do América, pai do jornalista Abel Neto. Esse, por muitas vezes, tirou o seu sono. Mas o tempo seguiu e faltava pouco para o mais jovem capitão da história das Copas do Mundo atingir o sonho maior: erguer a Jules Rimet. E Pelé resolveu ajudá-lo nessa missão rolando aquela bola macia que implorava “me chuta!”. Dessa vez a chuteira tinha o número certo e a pancada pegou na veia. O Brasil explodiu em emoção e no Armazém do Seu Carlos todos desabaram em lágrimas. O eterno patrocinador prometeu uma festa de arromba no Largo do Bicão para recepcionar o craque e, cinco dias depois, a promessa foi cumprida. Carlos Alberto Torres retornou ao armazém e os dois trocaram um longo e emocionado abraço. Depois foram para o jogo! O Ipiranga estava de volta! Após 90 minutos de racha sob sol escaldante, Torres, quebrado, descalço e rodeado de amigos, deitou-se na mesma calçada de sempre, abriu os braços e chorou olhando para o céu azul de Vila da Penha, onde tudo começou.

UM ESTRANHO NO NINHO

por Zé Roberto Padilha

Todo o universo da bola se preparou com esmero e carinho para fazer da abertura do Maracanã, o duelo entre Flamengo x Corinthians, um espetáculo grandioso. Reverenciar o futebol em um domingo de tarde, em seu templo sagrado, faz parte da nossa cultura, e é bonito, é bonito e é bonito. Da padaria aqui da nossa rua saiu um ônibus lotado e, ao comprar o pão, senti partir tal energia em ebulição apesar de ser tricolor. Mesmo porque, se havia algum frete para Curitiba, onde jogaríamos mais tarde, este seria de avião. O principado faz diferente, mas a nação consegue um jeito de empolgar diferente.


Quando defendi aquele manto depois de sete anos nas Laranjeiras, era um dos personagens em campo que definiriam se de lá voltariam alegres pela BR 040, ou trariam a tristeza como testemunha daqueles quilômetros que dobrariam até chegar Três Rios. E chegar cedo para quê? Ser sacaneado pelos vascaínos? Aturar o Álvaro nos portões de acesso ao Colégio Ruy Barbosa?

Quando a bola rolou e a televisão nos concedeu a linda imagem de um painel rubro-negro a emoldurar aquele “Ninho do Urubu”, fiquei a imaginar quantos atores, torcedores, imprensa, seguranças e arbitragem se prepararam naquele teatro para nos oferecer o melhor dos espetáculos. Mas na primeira paralisação, Balbuena, zagueiro corinthiano, foi chamado pelo seu treinador na beira do campo. Foi quando percebi um ruído. Oswaldo de Oliveira falava e o zagueiro não escutava. Seus olhos, em uma leitura oftálmica, revelavam: será que este cara conhece o nosso time a ponto de nos passar instruções? Mudar de tática?


Não conhecia. Oswaldo era um estranho no ninho ante tantos sabidos. Chegara há pouco, dirigira apenas três partidas e precisou da ajuda do auxiliar para escalar e realizar substituições. Quem levou aquele elenco para o túnel do vento da pré-temporada, após perder vários titulares para China, foi o Tite. Depois dos testes nas pistas de Jerez de la Frontera, onde carro e pilotos são apresentados, quem estava no comando era o Tite. Mas as câmeras o encontraram na arquibancada já como treinador da seleção.

No lugar de fixar o seu auxiliar, que conhecia o elenco, sua forma de jogar e suas armas de substituição, trataram de experimentar vários pilotos que não conheciam o carro. E o ultimo, Oswaldo, errou nas curvas quando escalou Marlone sem velocidade. E deixou de ganhar o jogo porque demorou a lançar o Luka diante de uma zaga confusa e que resolveu se lançar sem proteção ao ataque.


Do outro lado, Zé Ricardo, o treinador rubro-negro, acompanhou a montagem daquele time desde o começo. Como técnico dos juniores conheceu Felipe Vizeu antes de todos. Nos coletivos contra os profissionais percebeu a virtude dos titulares, e quando assumiu tinha o elenco nas mãos. Se errou e empatou em casa, não foi por falta de conhecimento do grupo, foi por desconhecimento de causa. Então, nossos cartolas, no lugar de se preocupar em aprovar recursos tecnológicos para validar ou anular gols, que tal parar de entregar seu time montado no meio da competição nas mãos de quem o desconhece? Certo fez o Flamengo, com Zé Ricardo,  o Botafogo com Jair Ventura, testemunhas oculares de sua recente história. Errado fez o Corinthians, o São Paulo e quem mais contrata o Argel, que trouxeram para seu ninho um estranho a pilotar seus descaminhos.