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CARTA ABERTA A WESLEY

por Zé Roberto Padilha

Bom dia. Nem sei se escrevo como ex-jogador, treinador, ou seria da parte de um torcedor brasileiro saudoso de ser representado em campo por jogadores de alto nível. Como o futebol que você tem praticado ultimamente.

O que sei é que falo como testemunha de uma safra de talentosos jogadores que se perderam na estrada que liga a fama ao abandono. A lista é extensa e tem, como pole position, Perivaldo. Que jogava na sua posição.

Muitos que estavam voando, como você, surgiram do sacrifício que uma promessa precisa cumprir para se destacar em alto rendimento. Dormem cedo, não bebem, trocam mensagens com a namorada e treinam bastante. Até atingir o nível técnico e físico como você atingiu com seu talento.

Em pouco tempo, com o aumento significativo de salários, trocam de carros, de cardápio, passam a conhecer a noite e, na balada, conhecem uma modelo.

Aquela que mal percebia sua presença quando disputou a Copinha e sonhava com a vaga do Rodnei. Diante da sua beleza, muitos esqueceram das namoradas que ralaram ao seu lado e os levaram até a rodoviária para seus primeiros testes.

E, entre um clássico e outro, foram para Campos de Jordão desfrutar das novas conquistas.

Aos poucos, seus antecessores que voavam, se apresentavam à frente em busca de uma linha de fundo no lugar dos pontas, que, hoje, voltam para marcar, começaram a tocar a bola.

O fôlego amador e juvenil foi dando lugar ao acomodamento natural diante da vida mais confortável que alcançou. E foi por esses caminhos novos, sedutores e ilusórios, que o futebol brasileiro perdeu o Daniel Alves. E cadê o Robinho, um dos Meninos da Vila, que hoje só consegue jogar bola durante o banho de sol?

Encerro essa missiva lembrando dos meninos que chegam às escolinhas com o sonho de serem como você. “Vocês viram? Até chutando bem de fora da área …”. Eles estão precisando, não só para o futebol, como para suas vidas, de bons exemplos. E, geralmente, eles se espelham em seus ídolos. Não os decepcione.

E parabéns pelo seu grande momento.

O QUE ESSE RAPAZ PRECISA MOSTRAR MAIS?

por Zé Roberto Padilha

Na posição mais frágil da história do nosso futebol, a lateral-direita, a ponto de Fagner, com todo o respeito, disputar duas Copas do Mundo, Perivaldo, uma, e Maicon, duas, não é possível que Marcos Rocha, por sua regularidade, titularidade há décadas em times poderosos, como Atletico-MG e Palmeiras, não mereça uma oportunidade.

Ninguém é mais previsível que o Danilo, titular e capitão da nossa modesta seleção. Não se apresenta no ataque e é um marcador comum. Poucos, no entanto, conseguiram um empresário e um relações públicas tão influentes como ele.

Marcos Rocha, como lateral-direito, foi quem mais deu assistência no Campeonato Brasileiro. Se há alguém que também merece, joga na mesma posição e anda voando, é o Wesley, lateral do Flamengo.

E se o futebol é momento, Dorival Jr. poderia nos explicar qual foi, ou é, ou será um dia o momento Danilo?

Escalações inexplicáveis como essa mostram porque estamos nos arrastando nas Eliminatórias.

O GIGANTE BAIANO

por Elso Venâncio

O zagueiro Júnior Baiano chegou ao Flamengo no final da década de 1980, sonhando em comprar para o pai, Raimundo Ferreira — o Seu Mundinho —, uma fazenda em Feira de Santana. Logo, com títulos e prestígio, a promessa feita ao sair de casa foi cumprida. Na final da Copa São Paulo de Futebol Júnior de 1990, marcou o gol da vitória por 1 a 0 sobre o Juventus/SP, garantindo um inédito título rubro-negro. Ele fazia parte do maior time já visto na Copinha e da última grande geração de jogadores formados na base do Fla, com Rogério, Piá, Fábio Augusto, Fabinho, Marquinhos, Marcelinho Carioca, Djalminha, Nélio…

Lançado no profissional pelo técnico Carlinhos, Júnior Baiano já foi campeão carioca em 1991 e, no ano seguinte, chegou ao título brasileiro. Na conquista nacional, o Flamengo venceu o Botafogo no primeiro jogo da final, por 3 a 0, e empatou por 2 a 2 na finalíssima.

Alguns lances violentos fizeram com que a fama de mau acompanhasse Júnior Baiano durante a sua carreira. Negociado com o São Paulo, aprimorou seu futebol com o mestre Telê Santana, deixando de ser o zagueiro desengonçado e às vezes furioso em campo. Num episódio marcante, se envolveu em polêmica com o árbitro Oscar Roberto Godoy, a quem acusou de estar bêbado num clássico entre São Paulo e Corinthians, no Morumbi.

Ao retornar ao Flamengo em 1996, depois de uma passagem pelo alemão Werder Bremen, Júnior Baiano viveu um um grande momento. Tanto é que chegou à Seleção Brasileira, fazendo parte da conquista da Copa das Confederações no ano seguinte. Só não foi campeão do mundo em 1998 em razão da convulsão sofrida por Ronaldo, no almoço que antecedeu a final contra a França. Na véspera, no campo anexo ao Chateau de Grande Romaine, em Lésigny, local de concentração a 20 minutos de Paris, um descontraído Ronaldo participava do racha — o tradicional “dois toques”. O clima era tão descontraído que mereceu um comentário do jornalista Mário Magalhães, autor do excelente “Marighella, o guerrilheiro que incendiou o mundo”:

— O poderoso Américo Faria virou churrasqueiro. 

O supervisor da Seleção Brasileira assava carnes para a comissão técnica na beira do campo. 

Ao fazer exames num hospital na capital francesa, a poucas horas do jogo, e chegar ao vestiário com o time aquecendo e Edmundo escalado, Ronaldo causou preocupação a todos. O time se desestabilizou, perdendo para a França por 3 a 0.

Na era Romário como melhor do mundo no Flamengo, era comum o Baixinho criticar os companheiros no vestiário: “Vocês não jogam p.… nenhuma. O Maracanã está cheio por minha causa”. Discussões e agressões aconteciam no intervalo e ao final de algumas partidas, sem que a imprensa tivesse conhecimento. Mas Romário respeitava três companheiros que não levavam desaforo para casa. Júnior Baiano era um deles, além de Clemer e Beto.

Após a Copa na França, Júnior Baiano se tornou ídolo no Palmeiras, chegando ao título da Copa Mercosul de 1998. Na vitoriosa campanha da Libertadores da América, com Felipão, em 1999, foi o artilheiro palmeirense na competição, com cinco gols. Nem assim deixou de ser identificado com o Flamengo, clube pelo qual, entre idas e vindas, disputou mais de 200 jogos. Passou também por Vasco e Internacional, bem como pelo Shangai Shenhua, America, Brasiliense, Macapá, Volta Redonda e Miami FC. Em suma, Júnior Baiano foi um gigante que marcou época nos clubes que defendeu, inclusive no exterior.

JAIR PICERNI, O PRECURSOR

por Reinaldo Sá

Na época, a seleção brasileira já era tricampeã mundial. Todavia, até 1979, a CBD (Confederação Brasileira de Desportos) nunca deu a devida importância ao futebol nas Olimpíadas. Os dirigentes priorizavam exclusivamente a Copa do Mundo. Porém, com a criação da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e a gestão de Giulite Coutinho, o projeto olímpico começou a receber atenção, ainda que sem o apoio dos dirigentes dos clubes.

Após o Brasil se classificar no Pré-Olímpico, a alta cúpula da CBF convidou o jovem treinador Jair Picerni para comandar a seleção brasileira nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984. Assim, há quatro décadas, começava um projeto desacreditado por muitos.

A convocação de Jair Picerni teve como base o Internacional de Porto Alegre, com jogadores como Gilmar, Luís Carlos Winck, Aloísio, Mauro Galvão, André Luís, Ademir, Dunga e Gilmar Popoca – este último, um meia de destaque nas categorias de base do Flamengo e campeão mundial de juniores em 1983. Completaram o elenco Paulo Santos, Kita e Silvinho.

Gilmar Popoca, com sua habilidade e passes precisos, era inspirado no ídolo Zico, do Flamengo, especialmente nas cobranças de falta. Sob o comando de Picerni, a campanha foi coroada com a conquista da medalha de prata, a primeira do futebol brasileiro em Olimpíadas. Na final, enfrentando a França, o Brasil foi derrotado por 2 a 0. Ainda assim, o trabalho de Picerni impulsionou sua carreira, marcada por projetos de reestruturação e pela revelação de talentos no cenário nacional.

A conquista abriu caminhos para outros treinadores, que encontraram uma estrutura mais sólida. Em 1988, Carlos Alberto Silva conquistou a medalha de prata nas Olimpíadas de Seul, perdendo a final para a extinta União Soviética. Já em 1996, Zagallo, tetracampeão mundial, viu o sonho do ouro se desfazer com a derrota para a Nigéria, ficando com o bronze em Atlanta.

Duas décadas depois, o Brasil se tornou bicampeão olímpico. Em 2016, nos Jogos do Rio de Janeiro, sob o comando do então desconhecido Rogério Micale, e, em 2021, nos Jogos de Tóquio, liderados por André Jardine, o país conquistou o ouro. Esta última edição foi realizada em meio às restrições da pandemia de COVID-19.

Hoje, Jair Picerni vive sua aposentadoria longe dos holofotes, mas segue sendo lembrado com carinho pelos amantes do futebol como o precursor do sucesso olímpico brasileiro no esporte.

RECRUTAMENTO E SELEÇÃO – CASE LIVERPOOL

por Idel Halfen

Quando olhamos a indústria do esporte e a parametrizamos com outras já mais consolidadas na economia, nos deparamos com um longo caminho a ser percorrido em termos de gestão, embora já seja perceptível um considerável progresso. Se fizermos um corte em termos de departamento, notaremos também um certo desequilíbrio, ou seja, alguns deles estão mais avançados do que outros.

Aliás, uma das áreas que vejo com bastante potencial de crescimento é a de Recursos Humanos, fato que, evidentemente, traz reflexos nas demais, afinal, selecionar, recrutar, treinar, avaliar, definir política de cargos e salários, entre outras, afeta toda a organização.

Discutir as razões que levam a esse cenário demandaria tempo e um espaço maior, razão pela qual pularemos essa parte e passaremos para a descrição de um case, que deveria servir como benchmarking para muitas organizações, inclusive as que atuam fora do ambiente esportivo. Refiro-me à contratação do técnico que veio substituir o campeoníssimo Jurgen Klopp no Liverpool.

Ao contrário do que o mercado especulava, o time inglês optou por um técnico, digamos, sem muita “grife”: o holandês Arne Slot, que dirigia então o Feyenoord e nunca tinha trabalhado fora do seu país natal, portanto, sem grande popularidade fora de lá.

Trazendo para o universo corporativo, imaginem a Vale trazendo para ser seu CEO, um executivo que nunca tenha liderado nenhuma grande corporação. 

O processo no Liverpool é exemplar porque teve como ponto inicial a definição dos objetivos e do que se queria de um treinador, no caso, manter uma filosofia de jogo similar á de Klopp. A partir daí, baseou-se em dados e métricas que permitissem a identificação dos melhores nomes, até chegarem a Slot.

Quantas empresas têm claramente delineados o que pretende de um executivo quando inicia um processo de contratação?

A análise em termos de números trouxe, entre outras informações, os seguintes dados: o Liverpool costuma ter 94 posses de bola por partida, o Feyenoord tinha 96, quando comandado por Slot. Os adversários do clube inglês completam 77% de seus passes, enquanto os do Feyenoord completavam 74%. O passe médio do Liverpool percorre 17,1 metros, enquanto o do Feyenoord percorre 17,2 metros. O Liverpool leva a bola ao ataque a uma velocidade acima da média de 1,26 metros por segundo, enquanto o Feyenoord vai ainda mais rápido, a 1,33 metros por segundo.

Evidentemente, olhar apenas para os números não é o suficiente, sendo necessário também considerar estilo de liderança, capacidade de resistir à pressão, habilidade no relacionamento, atenção ao desenvolvimento dos mais jovens, visão de logo prazo, além de inúmeras outras variáveis. 

Vale também atentar que, no caso de performance esportiva, a coleta de dados fica mais fácil e disponível. O que quero dizer é que os indicadores corporativos sofrem influência de diversos fatores do mercado, seja a capacidade gerencial da própria empresa, sejam fatores macroeconômicos, além das ações da concorrência, o que torna difícil o exercício de expurgá-los, todavia, o exemplo que o Liverpool nos brinda, serve para mostrar a importância do planejamento e da utilização de métricas para qualquer tipo de decisão.