COMO ESSE RAPAZ INCOMODA
por Zé Roberto Padilha
Desde o tempo em que o Audax se tornou audacioso, passando pelos clubes onde a audácia o fez perder o emprego até o “vocês vão ter que me engolir”, onde foi disputar o título mundial com o mais respeitado treinador do mundo, Pep Guardiola, que esse rapaz incomoda o conservadorismo que assola nossa imprensa.
Fernando Diniz deveria ser coroado, pelo Ranking OGlobo/Extra, o melhor treinador do país em 2023. Sem enxergar esse ano, com todo o respeito, nenhum português à sua frente. Aí, na avaliação deles, Supercopa do Brasil, onde ninguém acompanha ou dá importância, tem um peso Libertadores.
Tem mais: nem levaram em conta que, hoje, ele dirige a seleção brasileira.
Uma pena que depois de anos de mesmice, Tite e Felipões, nossa imprensa não reconheça o valor da inovação. Da criatividade.
Mesmo perdendo por 4×0, o mundo assistiu alguns minutos de rara beleza e inovação. Uma saída de bola que nos faz ficar com o coração na mão, mas que só a arte do jogador brasileiro seria capaz de realizar.
Um dia eles vão ter que respeitar, não ter ciúmes, da capacidade inovadora de um treinador audacioso e competente.
VÍCIO DO VAR
por Elso Venâncio
O árbitro polonês Szymon Marciniak demonstrou, nos dois jogos do Fluminense pelo Mundial de Clubes, por que apitou a final da Copa do Mundo e da Champions League.
Na semifinal, contra o Al Ahly, do Egito, e também diante do Manchester City, sempre evitou o VAR. Até no polêmico lance do pênalti marcado de Percy Tau em Marcelo, fez valer sua interpretação. Deixou a bola correr, não usando a velha tática dos juízes de segurar o jogo.
Nos arbitrais da Fferj – a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro -, quando um clube necessitava do empate numa decisão, presenciei dirigentes indicando determinados árbitros que paravam a todo momento a partida. Com eles, os lances não tinham sequência.
Os campeonatos realizados no Brasil provam o quanto a arbitragem daqui é insegura. O VAR é consultado com tanta frequência que se tornou vício. Os jogadores, em faltas banais, sinalizam para os juízes, pedindo consulta ao equipamento eletrônico.
Acho patético ver o responsável pelo jogo parado em campo, conversando com a cabine do VAR e olhando para o telão do estádio sem saber o que fazer, enquanto atletas o cercam com a mão protegendo a boca, falando o que querem mas impedindo a leitura labial.
Dr. Rodrigo Santiago é um dos maiores ortopedistas do país. Seu pai, o médico Arnaldo Santiago, afirmava:
“Ele é melhor do que eu”.
Arnaldo combatia a Federação Carioca, instituição na qual os aliados Eduardo Viana e Eurico Miranda davam as cartas.
Recentemente, seu filho Rodrigo me disse que estava indo de carro com o pai para um Fluminense x Vasco quando Eurico ligou e, com voz mansa, avisou:
“Arnaldo, tudo bem? Hoje você perde feio! Quer apostar?”
Rodrigo complementa:
“O Fluminense foi goleado, com direito a arbitragem confusa e ‘infelicidades’ do nosso goleiro”.
Como presidente do Fluminense, Dr. Arnaldo Santiago Lopes viu, da Tribuna de Honra do Maracanã, o gol de barriga de Renato Gaúcho, na histórica vitória por 3 a 2 no Fla-Flu de 1995. De lá, chorou abraçado ao diretor financeiro Juber Pereira:
“Do coração eu não morou mais!”, brincou.
Tempos depois, foi traído por um infarto fulminante, aos 63 anos, quando jogava basquete no Caiçaras, clube social que fica às margens da Lagoa Rodrigo de Freitas.
Admito a culpa dos cartolas, da CBF e das federações estaduais na guerra contra tantos erros que acontecem em campo. Nomes vetados, ameaças e pressão da imprensa influenciam, sim, durante as frequentes dúvidas que afligem os inseguros árbitros que apitam o nosso futebol.
UMA COISA JOGADA COM MÚSICA – CAPÍTULO 41
por Eduardo Lamas Neiva
O heavy metal fez uma parte do público curtir e balançar cabeça no bar Além da Imaginação. Porém, outra parte se dispersou, foi ao banheiro, pegar um ar do lado de fora. Ceguinho Torcedor, então, deu como se fosse um passo, um passe pra trás, recuando um pouco pra fazer o jogo abrir novamente.
Ceguinho Torcedor: – Aquele Santos era o maior do mundo, muito melhor que o escrete húngaro do Armando Nogueira!
João Sem Medo: – O escrete húngaro de 54 era espetacular, mas não era imbatível, Ceguinho. Tanto que perdeu, de virada, a final da Copa pra Alemanha Ocidental.
Idiota da Objetividade: – Os húngaros eram os campeões olímpicos e chegaram à final sem saber o que era derrota há mais de quatro anos, num total de 31 jogos invictos. Em novembro de 53, golearam por 6 a 3 os ingleses em Wembley, onde os donos da casa não eram derrotados por uma seleção não-britânica desde 1901. Este é chamado de O Jogo do Século, eleito pela Fifa como um dos mais sensacionais de todos os tempos. Na revanche pedida pelos ingleses, menos de um mês antes da Copa de 54, os húngaros fizeram ainda melhor, venceram por 7 a 1, em Budapeste. Esta é a pior derrota da história do futebol inglês até hoje.
Garçom: – Esse negócio de 7 a 1 eu não gosto muito, não.
Alguns riem, outros fazem cara feia.
Idiota da Objetividade: – Já no Mundial da Suíça, massacraram os alemães ocidentais na primeira fase, com uma vitória de 8 a 3.
Sobrenatural de Almeida: – Não estive na Suíça, mas foi assombroso. Deve ter sido algum parente distante meu que tirou aquele título da Hungria.
Ceguinho Torcedor: – Os húngaros eram favoritíssimos e abriram 2 a 0 no início da grande final.
Idiota da Objetividade: – Acabaram derrotados por 3 a 2. Mas teve um gol de Púskas invalidado no fim da partida que gerou muita discussão.
Sobrenatural de Almeida: – Foi um parente distante na Suíça, só pode.
Garçom: – O Brasil perdeu da Hungria naquela Copa, não foi?
Ceguinho Torcedor: – Perdemos. E por quê? Pela superioridade técnica dos adversários? Absolutamente. Para nós brasileiros, o futebol não se traduz em termos técnicos e táticos, mas puramente emocionais. Em técnica, brilho, agilidade mental, somos imbatíveis. Antes do jogo com os húngaros, estávamos derrotados emocionalmente. Fomos derrotados por uma dessas tremedeiras obtusas, irracionais e gratuitas. E não era uma pane individual: era um afogamento coletivo. Naufragaram, ali, os jogadores, os torcedores, o chefe da delegação, o técnico, o massagista. Mas quem perde e ganha as partidas é a alma. Foi nossa alma que ruiu face à Hungria, foi a nossa alma que ruiu face ao Uruguai, em 50. Um Freud seria muito mais eficaz na boca do túnel do que um Flávio Costa, um Zezé Moreira, um Martim Francisco. Só um Freud explicaria a derrota do Brasil frente à Hungria, do Brasil frente ao Uruguai e, em suma, qualquer derrota do homem brasileiro no futebol ou fora dele.
Sobrenatural de Almeida: – Os psicólogos e as psicólogas já estão no futebol tem tempo, Ceguinho.
João Sem Medo: – Agora não tem mais desculpa. Se bem que tem uma turma de palestrantes motivacionais…
Garçom: – Melhor deixar quieto, seu João.
João Sem Medo: – É. Não compro mais briga por tão pouco.
Idiota da Objetividade: – A Hungria, sem Púskas, porque estava machucado, mas com Hidegkuti, Kocsis e outros grandes craques, eliminou a seleção brasileira nas quartas-de-final, com uma vitória de 4 a 2. Foi uma partida muito tumultuada e teve confusão no fim.
João Sem Medo: – Tínhamos grandes jogadores também, como Djalma Santos, Nilton Santos, Didi, Pinga, Julinho Botelho, mas a seleção não estava bem preparada.
Músico: – Seu João, desculpe interromper, mas antes daquela Copa, os paulistas, especialmente os corintianos, levavam muita fé no Baltazar, o Cabecinha de Ouro…
Idiota da Objetividade: – Baltazar foi o autor do primeiro gol do Brasil naquele Mundial, na goleada de 5 a 0 sobre o México. Mas depois de enfrentar a Iugoslávia, ficou fora da partida contra a Hungria.
Músico: – Mas a esperança nos gols dele pela seleção eram tão grandes que o compositor Alfredo Borba, autor da música “Gol de Baltazar”, gravada por Elza Laranjeira em 1953, em homenagem ao artilheiro do Corinthians, com citação a vários de seus companheiros, fez uma adaptação da música para a Copa de 54 e pôs o título de “Gol do Brasil”.
Garçom: – Por isso, vamos chamar a cantora Elza Laranjeira ao palco pra cantar esta versão pra gente.
Elza Laranjeira se dirige ao palco e chama Baltazar pra ir com ela. Os dois são muito aplaudidos.
Elza Laranjeira: – Muito obrigado. Foi uma honra muito grande gravar as duas versões desta música em homenagem ao grande artilheiro Baltazar.
Baltazar: – Agradeço muito a Elza, ao Alfredo Borba e a todos vocês.
https://discografiabrasileira.com.br/en/music-composition/122426/gol-do-brasil
Todos aplaudem a apresentação de Elza e a bola volta ao João Sem Medo.
João Sem Medo: – A festa e a alegria aqui são muito bem-vindas, mas em 54, na Suíça, os dirigentes, o técnico Zezé Moreira e os jogadores não conheciam sequer o regulamento.
Idiota da Objetividade: – Depois de passar pela primeira vez por eliminatórias, com quatro vitórias em quatro partidas, contra Paraguai e Peru, a delegação brasileira também foi pela primeira vez de avião para uma Copa do Mundo. Na estreia, como já dissemos, a seleção venceu o México, por 5 a 0, na estreia na Copa de 54. Em seguida, enfrentou a Iugoslávia com ambas as equipes necessitando apenas de um empate para se classificarem.
João Sem Medo: – Um regulamento esdrúxulo, mas que os brasileiros tinham obrigação de conhecer.
Idiota da Objetividade: – Eram dois cabeças de chave por grupo e ambos não se enfrentavam; as outras duas seleções também não se confrontavam. No Grupo 1, o do Brasil, a França era a outra cabeça de chave. Como a seleção brasileira derrotou o México, e a Iugoslávia venceu a França, por 1 a 0, o empate classificava as duas equipes para as quartas-de-final.
João Sem Medo: – O regulamento ainda previa uma prorrogação, sabe-se lá por quê. O jogo estava 1 a 1, o time do Brasil se esforçando ao máximo pra tentar a vitória, enquanto os iugoslavos jogavam tranquilos, os brasileiros se desesperavam em campo achando que teriam de fazer um jogo extra três dias depois. Ninguém na delegação brasileira conhecia o regulamento da Copa. Enquanto ainda estávamos surpresos com a classificação, os iugoslavos bebemoraram e dançaram à vontade depois do jogo, no hotel em que estavam hospedados.
Idiota da Objetividade: – Os brasileiros só ficaram sabendo que a seleção estava classificada pelos repórteres que foram ao vestiário após o jogo. Ainda assim dirigentes foram atrás do árbitro da partida e o representante da Fifa para confirmarem a informação.
João Sem Medo: – Os dois ficaram horrorizados com o desconhecimento do regulamento por parte dos brasileiros. Isso mostra bem como estávamos na Suíça.
Sobrenatural de Almeida: – Assombroso!
Garçom: – O futebol brasileiro não foi bem na Suíça, mas não deixou de ter a alegria da tabelinha entre música e futebol naquele ano de 1954. Vamos ouvir, então, “O rei da bola”, de Luiz Antonio e Sebastião Nunes, na voz de Marly Sorel.
https://discografiabrasileira.com.br/fonograma/128530/o-rei-da-bola
Fim do capítulo 41
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Um gol desse não se perde!
A HORA DE RELEMBRAR QUEM É O BRASIL AO MUNDO
por Zé Roberto Padilha
Foram por detalhes, não por extrema qualidade, que nossos clubes perderam as últimas finais do mundial de clubes. O Grêmio, de Renato Gaúcho, perdeu de 1×0 para o “poderoso” Real Madrid, com Cristiano Ronaldo.
Depois foi o Flamengo que deixou escapar o título para o “asssombroso” Liverpool, também por 1×0. Gol do Firmino. E, finalmente, o Chelsea, então sensação inglesa, venceu o Palmeiras por 2×1 com um gol de pênalti no fim da partida.
O fato de terem recursos para comprar os melhores do mundo perde sua relevância quando os melhores do mundo não podem usar sua criatividade porque a escola europeia, Pep Guardiola à frente, impõe a prática dos dois toques.
Anteontem, preguiçosos e previsíveis, só um jogador do Manchester deu uma arrancada em direção ao gol. E era um brasileiro. Deve ter sido chamado num canto e levado uma bronca para se enquadrar.
Dois pra cá, dois pra lá, e assim vão cozinhando adversários, minando a audiência e tirando dos seus talentosos jogadores o direito ao drible. A permissão para criar algo que encante os amantes do futebol.
Deu vontade de desligar a televisão e assistir o segundo tempo de uma pelada no Aterro do Flamengo.
Amanhã, Keno, Arias, Marcelo. André, John Kennedy, Ganso e companhia vão ter a oportunidade de devolver ao mundo o encanto que o futebol brasileiro provocou em 1958.
Se eles esqueceram o futebol-arte que Pelé, Didi, Garrincha apresentaram na Suécia, está na hora de lembrar a todos quem pratica o melhor futebol do mundo.
Se há muito não ganhamos uma Copa do Mundo, é bom lembrar que compraram nossos Gabriel Jesus, Coutinhos, Casemiros entre tantos, cheios de recursos e colocaram algemas que nem Tite ou Scolari conseguiram desatar.
Endrick, nossa última matéria-prima, será a próxima vítima.
Nosso país precisa, e muito, que o Fluminense não apenas nos traga o título de campeão mundial de clubes. Mas que dê uma exibição à altura da nossa história de maior vencedor de Copas do Mundo.
TEMPO É DINHEIRO
por Idel Halfen
Em sua coluna de 10 de dezembro no portal Inteligência Financeira, o economista Cesar Grafietti, que considero uma das maiores autoridades em finanças no futebol, nos brinda com um assunto de elevada importância: a tendência queda nas receitas advindas dos direitos de transmissão.
Em seu artigo, Grafietti cita o novo contrato da Premier League, cujo aumento para o período dos próximos cinco anos cresceu apenas 4%, percentual abaixo da inflação. Coloca também que, enquanto no passado as renovações costumavam ser por três anos, agora passaram a ser de cinco como ilustra também a Serie A da Itália e a La Liga da Espanha, o que parece denotar um entendimento de que não há um cenário promissor de aumento de valores. Enfim, o artigo traz várias informações interessantes que me fazem recomendar a leitura.
Diante das conclusões concernentes à perspectiva de crescimento dessa importante fonte de receita para o clubes, faz-se necessário jogar luzes sob o prisma de marketing para um melhor entendimento do que vem acontecendo e aqui não faço referência à capacidade de investimento e respectivas análises de retorno, pois isso é óbvio.
A intenção aqui é chamar a atenção para a ocorrência de um fenômeno que, aparentemente tem passado despercebido pelos gestores e, foi denominando por Herbert Simon – ganhador do prêmio Nobel de Economia em 1978 – de “economia de atenção”, onde preconiza que a riqueza de informação cria pobreza de atenção.
Se num passado recente, o advento da mobilidade e da internet nos proporcionou a impressão de que o tempo estava farto, afinal não havia mais limitação de “local” para acessar mensagens e demais formas de comunicação, hoje notamos que está faltando tempo.
Nesse contexto, é inegável o mérito dos geradores de conteúdo. Hábitos foram incorporados ao dia a dia, “dependências” foram criadas e novas formas de entretenimento passaram a fazer parte do cardápio de diversões. Tudo ótimo, só faltou antever que a crença de que basta produzir para vender é ilusória.
A propósito, essa característica nos remete ao que Kotler chama de Marketing 1.0 (são 5 as fases ou eras, segundo ele – por enquanto). Essa fase tinha como foco o produto e como objetivo principal o desenvolvimento dele, de forma a fazê-lo atrativo para vender, gerando assim uma cultura em que se consumia mais do que efetivamente se necessitava.
Qualquer semelhança com o momento atual da geração de conteúdos não é mera coincidência.
Ainda que caminhe para a fase 2.0, na qual o marketing se volta para o consumidor, buscando entender e satisfazer suas necessidades, pouco efeito surgirá se não pensarem na disponibilidade de tempo de cada consumidor, até porque, no caso do futebol e esporte de forma geral, os eventos são perecíveis, isto é, a atratividade de uma competição ao vivo é infinitamente superior às reprises.
Essa visão do mercado talvez explique os movimentos mais parcimoniosos nos investimentos dos players responsáveis pelas transmissões. Por outro lado, vemos a Netflix, por exemplo, incorporando às suas opções de entretenimento, eventos esportivos, tal qual o que ocorrerá em abril de 2024: uma partida exibição entre Rafael Nadal e Carlos Alcaraz.
Cabe aos clubes e às ligas entenderem que a briga por atenção está cada vez mais acirrada e que precisam buscar uma maior atratividade para seus produtos, afinal o conceito de concorrência não se esgota nas competições, fazendo parte, entre outros, verbas, audiência, satisfação e tempo.