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HAJA GOL

por Fabio Lacerda

Papa Títulos: Vialli notabilizou-se como grande artilheiro e deixou saudades por onde jogou com sua marca de campeão

Pelé abriu a porta do céu para quatro grandes artilheiros do futebol mundial em 2023. E por coincidências do destino ou caprichos dos Deuses do Futebol, o ano de 2023 foi uma sucessão de perda dos feitores daquele momento mais emocionante do futebol. À moda antiga, sob a tática VW, o time comandado pelo Rei do Futebol contaria com Just Fontaine, Bobby Charlton, Roberto e Gianlucca Vialli.

Cheiro de gol: Roberto é um dos três jogadores que conseguiu o feito de ser campeão brasileiro e artilheiro aos 20 anos da mesma edição

Hoje, o astro italiano completa um ano para toda a eternidade. Aquele atacante natural de Cremona que fez história em Genova e Turim, estaria completando 59 anos. Sem falar no contínuo exercício de levantar troféus em Londres.

Vialli foi um centroavante que levava incômodos aos zagueiros adversários. Arisco, rápido e bom finalizador, Vialli atracou em Genova para defender a Sampdoria, clube pelo qual marcou mais gols. O scudetto na temporada 1990/1991 aconteceu seis anos após sua chegada ao estádio Luigi Ferraris. Juntamente de craques estrangeiros, como Toninho Cerezo, que conquistava seu segundo título do Campeonato Italiano, Vialli criou uma sinergia com Roberto Mancini que os tornaram uma dupla dentro de campo, e depois, à beira dele no comando técnico da Itália.

Vialli não sagrou-se campeão da Liga dos Campeões pela Sampdoria, mas a conquista do Velho Continente veio em duas ocasiões. A primeira com a camisa da Vecchia Signora na temporada 1995-1996. Vialli também foi campeão da Eurocopa 2020 no comando técnico da Azzurra com seu fiel escudeiro após a seleção transalpina ficar fora da Copa do Mundo de 2018, situação que estendeu-se até edição seguinte em 2022, no Catar.

Vialli foi a Londres defender o Chelsea na temporada 1996-1997. E sua trajetória de títulos continuou firme e forte na Terra da Rainha. E foi além! Passou a ser jogador e treinador. Vialli jogou duas Copas do Mundo e uma Eurocopa pela seleção.

Dois dias depois de Gianlucca Vialli rumar ao céu, o Brasil despediu-se do maior artilheiro do Campeonato Carioca, Brasileiro e do estádio de São Januário que caminha para seu centenário em 2027. Roberto despediu-se no dia 8 de janeiro, marcado pela confusão ocorrida em Brasília com a invasão dos Poderes da República e aniversário de quem vos escreve. E mais uma vez Zico reverenciou seu eterno amigo com uma homanagem multimídia no Jogo das Estrelas.

No dia do aniversário do Rio de Janeiro, o luto no mundo do futebol foi para o maior artilheiro de uma única edição de Copa do Mundo. O homem que fazia gol “para lá de Marrakesh”, deu seu último pontapé na bola aos 89 anos. O futebol mundial se despedia do africano Just Fontaine que jogou pela França entre 1953 e 1960.

Implacável: Fontaine mantém o recorde há 66 anos de gols em apenas uma edição

Outra ligação totalmente aleatória com o Rio de Janeiro é o ano que ele estreia no futebol pelo Casablanca, Marrocos, que, coincidentemente, remete à Copa do Mundo de 1950 – Maracanã, na capital fluminense, foi construído para o evento mundial que iria para sua terceira edição após a suspensão de duas edições em virtude da II Guerra Mundial.

Após o destaque na África do Norte, o Nice, da cidade homônima que é a segunda mais visitada na França nos dias atuais, levou o craque que, antes de transferir-se ao Reims, foi campeão da Copa da França (1954). Se no Reims teve a infelicidade de perder duas finais de Liga dos Campeões para o Real Madrid, por outro lado, teve a alegria de voltar a jogar com dois companheiros de seleção que estiveram com Fontaine na Suécia: Roger Piantoni e Raymond Kopa, que havia conquistado o título merengue sobre o Reims antes de sair do Santiago Bernabéu.

Dentre as curiosidades deste feitor de gols é que não foi à Copa do Mundo de 1954, na Suíça, e só foi convocado para a Copa do Mundo da Suécia devido à contusão do atacante titular, Cisowski. Situações que acontecem no futebol e parecem ser um conto de fadas para alguns, e pesadelos para outros. Desde a Copa de 1958, a marca atingida por Just Fontaine, de fazer 13 gols numa única competição, na qual sua seleção não foi à final, é um feito que parece ser impossível ultrapassar.

Por fim, Sir Bobby Charlton, que após 13 meses da partida da Rainha Elizabeth, em 2022, deixou os súditos ingleses sem pai nem mãe. A lenda do “Teatro dos Sonhos”, e do English Team dava adeus dez dias antes de completar 86 anos.

Imortal: Bobby Charlton, sobreviveu a queda do avião do United e fez parte de toda a revolução do clube

Uma carreira dedicada aos Red Devils. Sua ligação com o Manchester United começou em 1953 e vai durar por toda a vida. Encerrou sua trajetória no Old Trafford em 1974 como jogador. Foi convocado para quatro Copas do Mundo (1958, 1962, 1966 e 1970) marcando gols somente em 1962 contra a Argentina, e em 1966, quando a Inglaterra conquistou a Copa do Mundo num final para lá de polêmica contra a Alemanha. Bobby Charlton foi crucial na partida contra Portugal que havia eliminado o Brasil. O lendário jogador marcou os dois gols da vitória por 2 a 1 contra a seleção comandada por Eusébio, Coluna, Simões, Vicente & Cia.

E o futebol pregou peças ao artilheiro inglês assim como aconteceu com os demais personagens. Em 1970, a Inglaterra vencia a Alemanha Ocidental por 2 a 0. A decisão do técnico inglês, Alf Ramsey, de substituir o astro, culminou com a virada alemã que comeu o prato frio da vingança eliminando os “Algozes de Wembley”.

UMA COISA JOGADA COM MÚSICA – CAPÍTULO 43

por Eduardo Lamas Neiva

Após “Camisa Molhada” ser bastante apreciada pelo público, a camisa amarela, novo uniforme da seleção brasileira, voltou ser o assunto no bar “Além da Imaginação”. 

Idiota da Objetividade: – Em 1953 houve um concurso promovido pelo jornal carioca “Correio da Manhã” para se escolher o novo uniforme da seleção brasileira. O gaúcho Aldyr Garcia Schlee, então com 19 anos, derrotou mais de 200 candidatos, com sua criação: a camisa canarinho.

Garçom: – Com sorte ou não, foi com a camisa canarinho que conquistamos o penta.

Idiota da Objetividade: – Um ano antes do concurso, a seleção brasileira havia conquistado, já sob o comando do técnico Zezé Moreira, o seu primeiro título fora do nosso território: o Campeonato Pan-Americano de 1952, no Chile. O título foi conquistado de forma invicta, com vitórias sobre o México, por 2 a 0; Panamá, por 5 a 0; Uruguai, por 4 a 2, e Chile, por 3 a 0; e apenas um empate, sem gols, no segundo jogo, contra o Peru. Na vitória sobre o time da casa, Ademir Menezes fez dois gols, e Pinga, o outro.

Ceguinho Torcedor: – Mas o primeiro título mundial, que nos arrancou das entranhas o complexo de vira-latas, veio em 58, na Suécia.

Músico: – Seu Ceguinho e demais senhores desta mesa tão qualificada, aproveitando o tema iniciado, peço permissão para interrompê-los, por favor. Tem música muito mais famosa sobre aquela conquista de 58, mas gostaria de tocar aqui no piano pra vocês uma composição do grande Altamiro Carrilho, que foi gravada naquele mesmo ano pelo pianista José Luciano. Chama-se “Os canarinhos venceram”. Gostariam de ouvir?

Todos concordam, então…

https://discografiabrasileira.com.br/en/music-composition/133643/os-canarinhos-venceram

O povo todo aplaude após a apresentação e Idiota da Objetividade retoma a bola com rapidez.

 Idiota da Objetividade: – A classificação nas eliminatórias para a Copa de 58 veio com um empate em 1 a 1, em Lima, e uma vitória de 1 a 0 sobre os peruanos, no Maracanã.

Ceguinho Torcedor: – Com um maravilhoso gol de Didi, o Príncipe Etíope de Rancho, feito em folha-seca.

Idiota da Objetividade: – A seleção da Venezuela também participaria do grupo, mas desistiu.

Ceguinho Torcedor: – O escrete naquele jogo contra o Peru não exprimiu, nem de longe, nem por aproximação, o futebol brasileiro. O que houve foram alguns lampejos individuais fulgurantíssimos, como o gol do Didi, as arrancadas de Garrincha e a compacta bravura de Bellini. Mas o futebol não vive de iluminações pessoais e tivemos de melhorar muito até conquistar a taça na Suécia.

Garçom: – Didi deu a classificação para a Copa e foi importantíssimo em 58.

Didi: – Obrigado!

Ceguinho Torcedor: – Sim, mas há poucos meses do Mundial, Didi viveu um dilema: a Suécia ou Guiomar.

Garçom: – Sua esposa?

Didi: – Verdade. O Ceguinho pode contar a história.

Ceguinho Torcedor: – Obrigado. A CBD tomou uma providência patética: baixou uma ordem impedindo que qualquer jogador levasse a mulher à Suécia. Só um cego de nascença não via que se tratava de separar Didi de Guiomar.

Didi: – É, cheguei inclusive a enviar uma carta à CBD solicitando a dispensa da Copa, por causa da decisão da entidade.

João Sem Medo: – Didi fez questão de dizer o tempo todo que ele pagaria as despesas da mulher. E ela não ficaria na concentração, ora bolas!

Ceguinho Torcedor: – Ficaria fora da concentração, apenas como torcedora de Didi e do Brasil.

Idiota da Objetividade: – Acabou que a dona Guiomar não foi à Suécia.

Didi: – Uma pena, não é meu amor?

D. Guiomar concorda com a cabeça.

Didi: – Até hoje não entendi aquela perseguição a Guiomar?

Ceguinho Torcedor: – Existia contra ela um preconceito militante, agressivo e eu quase diria internacional. Ela sempre tratou a todos com uma cordialidade quase doce. Mas bastava que Didi fracassasse numa folha-seca, ou desperdiçasse um pênalti, ou desse um passe errado, para que a torcida a responsabilizasse.

Garçom: – Que isso!?

Ceguinho Torcedor: – Vejam vocês a ironia do futebol: ela devia ser a responsável, por igual, pelos defeitos e os méritos de Didi. Mas não. Se Didi falhava era Guiomar, se não falhava, era Didi. Ninguém admitia que ela pudesse representar, no futebol do craque, um poderoso estímulo, um incentivo total.

Guiomar: – Obrigada, seu Ceguinho.

João Sem Medo: – Ele tantas vezes declarou à imprensa o seu amor à mulher e sempre afirmou que era por ela que jogava. E o mais importante é que ele foi à Copa e ajudou muito o Brasil a conquistar o título.

Ceguinho Torcedor: – E como! O nosso Mister Football!

João Sem Medo: – Sim, foi como a imprensa internacional o apelidou na Copa da Suécia.

Ceguinho Torcedor: – Com Moacir por trás de cada um dos seus erros, como uma constante, ininterrupta ameaça, Didi, com seu nobre tipo racial, como um príncipe etíope de rancho, enxergava longe e percebeu que não podia se permitir o luxo de um cochilo.

Didi: – Não mesmo. Moacir foi um excelente jogador de meio de campo.

Idiota da Objetividade: – Moacir, meia do Flamengo, foi titular da seleção nos dois últimos amistosos realizados no Brasil antes da Copa de 58, nas vitórias de 4 a 0 e 3 a 1 sobre a Bulgária. No primeiro jogo, realizado no Maracanã, Moacir fez dois gols. Depois Didi ganhou a vaga de titular e foi eleito o melhor jogador do Mundial da Suécia, eleito pela Fifa.

Ceguinho Torcedor: – É, mas quase todo mundo gritou contra Didi. Nos treinos da seleção foi vaiado quantas vezes? Conclusão: amarrou a cara e seu comportamento, em todo o Mundial, foi esmagador. Não se podia desejar mais de um homem, ou por outra, de um brasileiro. Ninguém que jogasse com mais gana, mais garra e, sobretudo, mais seriedade. Nem sempre marcava gols, mas era ele quem amaciava o caminho, quem desmontava as defesas adversárias com seus lançamentos em profundidade. Com uma simples ginga de corpo, liquidava o marcador. E nas horas em que os companheiros pareciam aflitos, ele, com sua calma lúcida, prendia a bola e tratava de evitar o caos possível. Nenhum escrete levanta um Campeonato do Mundo sem extraordinárias qualidades morais. De nada adiantará o futebol se o homem não presta. O belo, o comovente, o sensacional no triunfo de 58 está no seguinte: foi, antes de tudo, o triunfo do homem.

Didi se levanta com Guiomar para abraçar Ceguinho Torcedor e João Sem Medo e todos são aplaudidos pela plateia. Zé Ary aproveita para tomar a palavra.

João Sem Medo: – Meu amigo Neném Prancha já dizia: “O Didi jogava bola com quem chupa laranja, com muito carinho”.

Todos concordam e Didi, já de volta à sua mesa, se levanta novamente para ser aplaudidíssimo por todo o público de pé. Parecia um estádio de futebol, tamanha a ovação.

Didi: – Agradeço muito, de coração, a todos. Em especial pela defesa do Ceguinho Torcedor e do João Sem Medo a mim e a minha amada Guiomar. Muito obrigado.

Garçom: – Nós que agradecemos, seu Didi! Nós que agradecemos. Vamos ouvir aqui a narração do gol de Didi contra a França na semifinal, quando o Brasil desempatou a partida quando estava 1 a 1, na narração de Geraldo José de Almeida, na época na Rádio Pan Americana, de São Paulo. E ver o golaço no telão!

A vibração é tão grande que parecia estar acontecendo naquele momento. Zé Ary pede a palavra novamente.

Garçom: – E pra completar vamos ouvir “O nosso dia chegou”, de Alfredo Borba e Osvaldo Rodrigues, que gravou a música. Quem quiser pode dançar à vontade. Vamos lá, seu Didi, e dona Guiomar!

https://discografiabrasileira.com.br/composicao/141714/o-nosso-dia-chegou

Fim do Capítulo 43

Quer acompanhar a série “Uma coisa jogada com música” desde o início? O link de cada episódio já publicado você encontra aqui (é só clicar).

Saiba mais sobre o projeto Jogada de Música clicando aqui.

AS FINAIS DO CAMPEONATO BRASILEIRO DE 1987

por Luis Filipe Chateaubriand

Em 1987, foi jogada a célebre Copa União, reunindo os 16 clubes considerados os melhores do país.

Depois de grandes jogos e um êxito comercial retumbante, Flamengo e Internacional de Porto Alegre chegaram às finais.

O Flamengo foi às finais depois de dois embates antológicos com o Atlético Mineiro, melhor clube da competição até então, nas semifinais.

O Internacional foi às finais ao superar o Cruzeiro, nas semifinais.

O primeiro jogo das finais aconteceu no Estádio Beira-Rio, em Porto Alegre, com mando de campo para o Internacional.

Bebeto abriu o placar para o Flamengo no primeiro tempo, 1 x 0.

Amarildo igualou o placar para o Internacional, ainda no primeiro tempo, 1 x 1.

E assim, acabou o primeiro jogo.

O segundo jogo das finais aconteceu no Maracanã, Rio de Janeiro, com mando de campo para o Flamengo.

Com gol de Bebeto no primeiro tempo, o Flamengo venceu por 1 x 0.

Pela quarta vez, o clube da Gávea era campeão brasileiro!

MUNDIAL NÃO É PARA FRACOS

por Marcos Vinicius Cabral

“Esperei o hiato entre o Natal e a chegada de 2024 para escrever sobre o tão aguardado confronto entre Manchester City (ING) e Fluminense (BRA), na decisão do Mundial de Clubes de 2023. Duas escolas que contam com ensinamentos dos professores Josep Guardiola e Fernando Diniz, técnicos que surfam na crista da onda ao conquistar bons resultados com os respectivos times. Além disto, relembro aqui que dos clubes brasileiros derrotados em finais para europeus na competição que colocam frente a frente o campeão da Libertadores contra o vencedor da Champions League, o Vasco de Antônio Lopes é, segundo reportagem do GloboEsporte.com, quem mais esteve perto da vitória. O 2 a 1 para o temido Real Madrid (ESP), em 1998 – ano em que o Cruz-Maltino comemorou um século de existência – não refletiu o que se viu no National Stadium, em Tóquio, naquela manhã de 1° de dezembro.

Entretanto, desde a derrota por 4 a 0 para o Manchester City, na final do Mundial de Clubes realizada no dia 22 de dezembro, que torcedores do Fluminense – não todos, mas boa parte deles – diziam que houve equilíbrio nas ações do time comandado por Fernando Diniz.

Ora, o que se viu no gramado do Estádio King Abdullah Sports City, em Jidá, na Arábia Saudita, foi a equipe inglesa com 55% de bola nos pés, que chutou em oito oportunidades para gol (quatro vezes mais que as duas do ataque tricolor), trocou 530 passes contra 444 do campeão da Libertadores e cobrou quatro escanteios contra dois do Fluminense. Há outras comparações que poderia utilizar, mas os já apresentados aqui dão a nítida noção do que foi o jogo.

Acostumados com o tiki-taka (tic-tac aportuguesado), também conhecido como Dinizismo, o estilo do Fluminense passa a ter mais rotatividade entre os jogadores, constantes trocas de posições e passes em todas as zonas do campo (principalmente na defesa para surpreender o adversário) no qual até o goleiro passa a ter a função de jogar com os pés. E com qualidade, é bom que se diga.

Funcionou bem em algumas competições em que conquistou títulos – por exemplo, no banho de bola que deu no Flamengo no Carioca e na inédita Libertadores, ambas em 2023 – mas na hora do vamos ver, acabou sendo engolido pelos ingleses. Isso sem contar que Haaland e De Bruyne, protagonistas dos Azuis Celestes, não jogaram por estarem lesionados.

Guardiola pensa diferente. Para o fã da Seleção Brasileira de 82, o estilo de jogo é “inútil”, “sem propósito” e “sem intenção clara”. Basta ler a biografia The Inside Story of Pep Guardiola’s First Season at Bayern Munich (Os bastidores da primeira temporada de Pep Guardiola no Bayern de Munique), escrita pelo jornalista espanhol esportivo Marti Perarnau.

No entanto, o tão aguardado embate Diniz versus Guardiola, acabou frustando os apaixonados pelas duas escolas de futebol. O City venceu sem esforço. O Tricolor errou o máximo em uma partida que deve-se errar o mínimo. Tornar-se presa fácil era questão de tempo, não de segundos como foi o gol de peito de Julián Álvarez.

Porém, quem deu trabalho aos europeus em uma decisão de Mundial de Clubes que, a propósito, voltando ao motivo da produção do texto, foram dois grandes times cariocas que encantaram os torcedores nos séculos XX e XXl: o Vasco de 1998 e o Flamengo de 2019, já citados acima.

Comandados por Antônio Lopes e Jorge Jesus, Vasco e Flamengo conquistaram a Libertadores, e chegaram com moral elevada à decisão do Mundial de Clubes contra espanhóis e ingleses.

O Vasco, que comemorava o centenário de existência, entrou às 9h (horário de Brasília) no National Stadium, em Tóquio, com Carlos Germano, Vágner, Odvan, Mauro Galvão e Felipe; Nasa, Luisinho, Juninho Pernambucano e Ramón; Donizete e Luizão. Do lado do time madrilenho, os brasileiros Roberto Carlos e Sávio, o argentino Redondo, o holandês Seedorf, o espanhol Raúl, além do montenegrino Mijatovic.

Mas foi o Real Madrid quem abriu o placar aos 25min do primeiro tempo, quando Roberto Carlos chutou com força de fora da área, a bola desviou na cabeça de Nasa e enganou Carlos Germano. No segundo tempo, Juninho Pernambucano, o Reizinho da Colina, aproveitou rebote do goleiro alemão Ilgner no chute de Luizão para finalizar no ângulo. Mas aos 38min, porém, veio o castigo. Raúl recebeu lançamento de Seedorf pelo lado esquerdo do ataque, deu dribles desconcertantes em Vitor e Odvan antes de tocar na saída de Carlos Germano. Fim do sonho para uma equipe que mereceu sorte melhor durante os 90min.

O Flamengo, por sua vez, chegava à segunda decisão de Libertadores da história. Com um futebol que assombrou o país, Diego Alves, Rafinha, Pablo Marí, Rodrigo Caio e Filipe Luís; Willian Arão, Gerson, Arrascaeta e Everton Ribeiro; Bruno Henrique e Gabigol, sob comando de Jorge Jesus, conquistaram a Taça Libertadores da América, o Campeonato Carioca, e, por fim, o Campeonato Brasileiro, em 2019.

A derrota por 1 a 0 para o Liverpool de Jurgen Klopp, no Estádio Khalifa International, em Doha (Catar), em um jogo disputado, pôs uma pá de cal e sepultou o sonho do bicampeonato Mundial para a Nação Rubro-Negra.

Tristezas à parte na vida dos vascaínos, rubro-negros e tricolores, derrota sempre machuca, fere o orgulho de todo e qualquer torcedor. Todavia, o mau resultado do Fluminense doeu mais do que os insucessos de Vasco e Flamengo. Ou alguém pensa diferente? Fica uma lição não apenas para o time das Laranjeiras, mas para os clubes do futebol brasileiro: é preciso rever conceitos de A a Z e em todo planejamento para voltar a competir de igual para igual em uma decisão de Mundial de Clubes.

Talvez esta (in)certeza soe – para quem é frio e não passional – como uma alerta de que jogar o Mundial de Clubes não é para fracos”.

OS MURROS DE WRIGHT

por Elso Venâncio

Vou à FFERJ, a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro, ao lado do narrador esportivo Carlos de Souza, o Biro-Biro, então na Rádio Globo e hoje produtor da TV Record. Após entrevistar o presidente Eduardo Viana, vi a porta de seu gabinete ser aberta bruscamente e fechada com força. Era o bicheiro Castor de Andrade seguido do advogado e dirigente do Fluminense José Carlos Vilela, velha raposa do futebol, conhecido como o ‘Rei do Tapetão’.

Sorridente, Vilela diz, quase sussurrando:

“Eduardo… pode qualquer um. Menos o Wright.”

Castor, que sabia exercer seu poder, adorava contestar pedidos e decisões. Afinal, mandava no Carnaval, no futebol (onde volta e meia tapava buracos financeiros da Federação e da própria CBF) e, claro, na cidade, apoiando ou frequentando o ambiente político.

“É esse que eu quero… o Wright! Ele é que vai apitar!” – reagiu o capô, aumentando o tom de voz para repetir, deixando bem claro à mesa:

“Ele vai apitar!”

Dois dias depois, o árbitro José Roberto Wright, todo de preto, no centro do gramado do Maracanã é cercado pelos capitães Vica, do Fluminense, e Marinho, do Bangu. Hora de bater cara ou coroa. Naquela noite, 18 de dezembro de 1985, o Tricolor, campeão brasileiro de 1984, precisava a todo custo vencer o adversário para conquistar o tri estadual. Com um punhado de craques, contava com uma das mais competitivas equipes da sua História:

Paulo Victor, Beto, Duílio, Ricardo Gomes e Renato; Jandir, Delei e Renê; Romerito, Washington e Tato (Paulinho). O técnico, Nelsinho Rosa.

Com sede de títulos, o time de Moça Bonita jogava pelo empate. O clube estava ferido, abatido com o vice-campeonato brasileiro obtido àquele mesmo ano, quando foi derrotado em pleno Maracanã pelo Curitiba do gaúcho Ênio Andrade, na disputa por pênaltis. Ainda assim, a equipe alvirrubra entrou no campo de peito aberto e cabeça erguida:

Gilmar, Perivaldo, Jair, Oliveira e Baby; Israel, Arturzinho e Mário; Marinho, Fernando Macaé (Cláudio Adão) e Ado. Seu treinador era o ‘xerife’ Moisés.

Após cruzamento de Perivaldo, o atacante Marinho, jogador de seleção brasileira, abriu o placar com uma cabeçada. Aos 18 do segundo tempo, o paraguaio Romerito empatou. E ao apagar das luzes daquela decisão tensa, jogo disputado com violência, partida dificílima de apitar, o reserva Paulinho cobrou com perfeição uma falta para virar a favor do time das três cores que traduzem tradição.

Wright errou feio ao não encerrar o jogo aos 45 ou 46 minutos da etapa final. Naquela época, tempo de acréscimo não era obrigatório ou protocolar como hoje. Nesse minuto a mais o estabanado Vica derrubou Cláudio Adão com uma ‘gravata’ dentro da área. Pênalti claro, a favor do Bangu!

O árbitro gesticula, mas não aponta para a marca da cal. Simplesmente, dizia que o jogo já havia sido terminado antes do lance capital. Brigas estouram na torcida, que por bom tempo vaia forte. O público anunciado foi de 89.162 pagantes, mas nesses anos, evasão de renda era um problema crônico do estádio mais famoso do mundo.

Castor manda seus capangas invadirem o gramado. Quer que surrem o juiz, que se via cercado por atletas banguenses. Seus asseclas só não esperavam o revide imediato de Wright. Faixa preta de judô e bom de briga, o árbitro derrubava um a um quem lhe surgisse à frente. O último a sofrer com seus punhos foi seu Walter, um veterano ex-lutador profissional de boxe.

O Bangu tentou anular o jogo na Justiça Desportiva alegando erro de direito, mas não obteve sucesso.