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UMA COISA JOGADA COM MÚSICA – CAPÍTULO 45

por Eduardo Lamas Neiva

Após a “Homenagem a Pelé” que todos acompanharam com atenção e emoção, João Sem Medo retomou o papo falando dos dois maiores gênios da História do futebol brasileiro e mundial.

João Sem Medo: – Com Garrincha e Pelé em campo a seleção brasileira jamais perdeu um jogo sequer.

Idiota da Objetividade: – João, foram ao todo 40 partidas, com 35 vitórias do Brasil e cinco empates. Juntos em campo, ambos fizeram 54 gols: Pelé fez 44 e Garrincha, 10. Com a camisa da seleção, Garrincha só saiu de campo derrotado uma vez, no seu último jogo pelo Brasil, já na Copa de 66, nos 3 a 1 para a Hungria. Com Pelé, Mané atuou pela última vez pela seleção na estreia do Mundial da Inglaterra, na vitória de 2 a 0 sobre a Bulgária.

João Sem Medo: – Cada um fez um gol naquela partida, em 66. Mané jogou contra a Hungria, mas Pelé não. E contra Portugal, Pelé jogou…

Ceguinho Torcedor: – Foi caçado em campo.

João Sem Medo: – Foi mesmo. Mané não atuou na derrota de 3 a 1 para Portugal, jogo que eliminou a seleção na primeira fase da Copa de 66.

Garçom: – Pelé e Garrincha, será que teremos outra dupla igual a essa algum dia? Com a licença dos grandes amigos que estão aqui, vou pedir uma ajudinha a outro gigante da nossa Cultura pra falar, ou melhor, cantar um pouco mais sobre o nosso futebol e esta dupla genial. No telão e nas nossas caixas de som, Chico Buarque, em “O futebol”, de sua própria autoria.

Mesmo presente apenas em vídeo, Chico é aplaudido de pé pela plateia.

Garçom: – Em 58, Pelé e Garrincha arrebentaram. Tinha só sete anos de idade, mas me lembro bem da festança.

Idiota da Objetividade: – Os dois estrearam juntos em Copa do Mundo na vitória sobre a Rússia, de 2 a 0, que classificou o Brasil para as quartas de final. Enfrentamos a seleção do País de Gales.

João Sem Medo: – Foi um jogo muito duro.

Ceguinho Torcedor: – O povo queria que enfiássemos uns seis ou sete. Eis a nossa tragédia: – a pura e simples vitória não basta. Desejamos enfeitá-la, pôr-lhe fitinhas e guizos. E o triunfo sem show, sem apoteose, o triunfo enxuto deixa o brasileiro descontente e desconfiado. Mas eu vos digo: – foi a maior vitória brasileira. Imaginem se, por um absurdo, tivéssemos batido de 15. Íamos enfrentar a França como uns anjinhos, com a sensação mortal da invencibilidade.

Sobrenatural de Almeida: – Como aconteceu em 50…

Ceguinho Torcedor: – Em 50, perdemos a Copa porque goleamos a Espanha.

Garçom: – Foi contra o País de Gales que Pelé fez aquele golaço, dando um chapeuzinho no zagueiro?

Idiota da Objetividade: – Não foi um balão. O gol em que Pelé deu balãozinho ou chapéu, como queira, foi na final contra a Suécia. Contra Gales, ele estava de costas pro gol, matou a bola no peito, deu um toque pra tirar um zagueiro da jogada e foi mais rápido que outro que vinha na cobertura pra marcar o gol.

Garçom: – Vamos ver no telão, então. Com narração do grande Geraldo José de Almeida, que ali está, (imitando a voz do narrador) minha gente!

Geraldo José de Almeida: – Olha lá, olha lá, olha lá! No placarrrrrr… (rindo muito) Agradeço muito a todos pelos aplausos e a você Zé Ary pela brilhante imitação.

Todos vibram muito e aplaudem ainda mais Geraldo José de Almeida.

Ceguinho Torcedor: – Amigos, nada descreve o uivo, o urro que soltamos, aqui, quando o “speaker”…

Todos os outros: – “Speaker”, Ceguinho?

Ceguinho Torcedor: – O locutor de rádio, o narrador. Nada descreve o uivo, o urro que soltamos quando ele atirou o seu berro bestial “gol!”! Até aquele momento, o Brasil inteiro, de ponta a ponta, do presidente da República ao apanhador de guimba, o Brasil estava agonizando, morrendo ao pé do rádio. E veio Pelé, com seus 17 anos, e fez o milagre. Olhem Pelé, examinem suas fotografias da época e caiam das nuvens. Era, de fato um menino, um garoto. Se quisesse entrar num filme de Brigitte Bardot seria barrado, seria enxotado.

Um alvoroço na porta faz o público todo do bar Além da Imaginação se levantar. Era Pelé chegando. Houve uma ovação sem igual.

Pelé: – Muito obrigado. Seu Ceguinho está certo, eu era muito jovem ainda em 1958 e foi uma emoção muito grande aquele gol e a conquista do título, entende?

João Sem Medo e Ceguinho Torcedor, com a ajuda de Sobrenatural de Almeida, conseguem se aproximar e dar um abraço em Pelé.

João Sem Medo: – Agora a festa está completa.

Quando Pelé finalmente consegue se sentar, bem à frente da mesa onde nossos quatro personagens principais estão, Zé Ary toma a palavra.

Garçom: – Nós todos é que só temos a agradecer ao Rei Pelé, não é? Então, vamos pôr mais música nas caixas de som, desta vez acompanhadas de imagens maravilhosas do Rei registradas pelo Canal 100 no nosso telão. Mas antes, aproveito pra pedir uma salva de palmas a Carlinhos Niemeyer, o criador do Canal 100, que está presente na casa.

Carlinhos Niemeyer se levanta e agradece os efusivos aplausos do pessoal presente ao Além da Imaginação. Zé Ary então anuncia a próxima atração.

Garçom: – Vamos ouvir “Obrigado, Pelé”, de Miguel Gustavo, com o MPB-4.

Todo mundo fica embevecido com a música e as imagens. Pelé agradece mais uma vez os aplausos e fica com a pelota.

Pelé: – Preciso agradecer muito ao Miguel Gustavo, que ali está, e também ao MPB-4…

Garçom: – Magro e Ruy Faria estão aqui, muitos aplausos pra eles, por favor.

Ambos agradecem. E Pelé conclui emocionado.

Pelé: – É muita homenagem bonita de vocês, entende. Muito obrigado.

É mais aplaudido ainda. Inclusive por Garrincha, que timidamente não deixa seu lugar, Didi, Carlos Alberto Torres, Félix e outros ex-companheiros de Santos e seleção brasileira. 

Fim do Capítulo 45

Quer acompanhar a série “Uma coisa jogada com música” desde o início? O link de cada episódio já publicado você encontra aqui (é só clicar).

Saiba mais sobre o projeto Jogada de Música clicando aqui.

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AS FINAIS DO CAMPEONATO BRASILEIRO DE 1990

por Luís Filipe Chateaubriand

No ano de 1990, os arquirrivais paulistas São Paulo e Corinthians decidiram o título do Campeonato Brasileiro.

O São Paulo conseguiu vaga na decisão ao eliminar o Grêmio nas semifinais.

O Corinthians conseguiu vaga na decisão ao eliminar o Bahia nas semifinais.

O primeiro jogo das finais, no Estádio do Morumbi, teve mando de campo do Corinthians.

O Corinthians venceu por 1x 0, gol de Wilson Mano logo no início do primeiro tempo.

O segundo jogo, também disputado no Estádio do Morumbi, teve mando de campo do São Paulo.

E, novamente, o Corinthians venceu por 1 x 0, gol de Tupãzinho no início do segundo tempo.

Pela primeira vez, o “Timão” era campeão brasileiro!

ETERNA HUMILDADE

por Rubens Lemos

O maior ídolo do meu clube, Carlos Roberto de Oliveira exibia um sorriso quixotesco, hoje arquivo de tradição: Roberto Dinamite viveu para morrer na humildade unida à timidez ostensiva. Foi o melhor centroavante brasileiro dos anos 1970.

Se alguém retrucar propondo um duelo técnico com Reinaldo, o mignon maravilhoso do Atlético Mineiro, a Copa do Mundo de 1978 desempata: Reinaldo sucumbiu às contusões e expectativas, Roberto fez o gol que manteve o escrete na disputa até ser terceiro colocado invicto, “Campeão Moral”, uma balela do falecido técnico Cláudio Coutinho em alusão às pernas abertas pelo Peru para a Argentina(0x6), que eliminaram o Brasil.

Quando as alegrias de infância eram parcas, havia Roberto Dinamite com sua cabeleira de roqueiro internacional e a interminável vocação para pulverizar defesas. Cresci vendo o supertime do Flamengo de Zico, Carpeggiani, Adílio, Júnior, Toninho Baiano depois Leandro, Raul e Cláudio Adão. O Vasco tinha Roberto e um amontoado comprado por avarentos portugueses.

O Garoto Dinamite, que explodiu ao detonar um golaço contra o Internacional em 1971, aos 17 anos, enfrentava com dignidade serena o adversário mais poderoso tendo que se contentar com a companhia limitada de Renê, Gaúcho, Galdino, Zandonaide, Amauri, Ticão e Peribaldo, anomalias em chuteiras.

Com Roberto Dinamite, o maior clássico do Rio de Janeiro deixou de ser o Fla x Flu elitista dos tempos dos irmãos Rodrigues(Mário Filho e Nelson) para se deixar levar às multidões do Vasco x Flamengo.

Sempre com times abaixo da tradição, o Vasco encarava sem medo o rubro-negro, derrotado na Taça Guanabara de 1976 com pênalti perdido por Zico e no título de 1977, Roberto Dinamite mandando pênalti no canto direito de Cantarelli diante de 152 mil pessoas.

O estilo secos e molhados a granel dos Manoéis e Joaquins dos grandes frigoríficos do Rio de Janeiro, visava o dinheiro e Roberto Dinamite, para meu luto, aquele pedacinho de pano preto no bolso na camisa, partiu para uma temporada irregular no Barcelona. O Flamengo anunciou que iria trazê-lo para fazer dupla com Zico (juntos na seleção brasileira, nunca perderam).

Meu rádio de pilha à noite não saía da sintonia 1220 da Rádio Globo AM. O presidente do Flamengo, Márcio Braga, cantava vitória antes do tempo e mandou gravar uma tabelinha de Zico e Roberto Dinamite – ambos hipoteticamente vestindo vermelho e preto, destruindo a defesa do Vasco.

Sou um incoerente assumido. Sofrimentos me fizeram duvidar de Deus. Perseguições, amigos que acreditava me virando o rosto, cheguei a publicar que sou agnóstico. Mas, invariavelmente e desde garoto, rezo o Santo Anjo, o Padre Nosso e a Ave-Maria. Então, na prática, temo o Supremo e nele respeito sua força superior.

Uma das lições deste questionamento religioso, deu-se no drible de um jovem cartola chamado Eurico Miranda, único a desejar a volta de Roberto Dinamite, que terminou conseguindo ao dispensar a dívida do Barcelona pelo passe do ídolo. Roberto Dinamite retornou fazendo os cinco de Vasco 5×2 Corinthians. Roberto e Eurico eram siameses O poder afastou os dois. Eurico tem minha gratidão por trazer de volta o símbolo de um povo cheio de bravura e eternamente confiante.

Dia 8 de janeiro, fez um ano da morte física de Roberto Dinamite. A morte limitou-lhe a arte e a vida. A repercussão muito inferior à destinada a personagens sem seu carisma, sem sua disponibilidade incansável no atendimento ao torcedor.

Estive com ele em Natal em 1982 com a seleção de Telê Santana, o idolatrado que perdeu um Mundial por ignorar Roberto Dinamite e num jogo promocional no demolido Ginásio Machadinho. Suave timidez me fazendo feliz.

A era da internet é tímida quando se propõe a divulgar números de Roberto Dinamite, ser humano maior que a frieza estatística.

Pois Roberto Dinamite é o maior matador no Vasco(708 gols), goleador máximo do Campeonato Brasileiro(190 gols) e do Campeonato Carioca(284 gols) e quinto maior do mundo em campeonatos de primeira divisão(470 gols).

Chorar Roberto Dinamite é lembrar cada arrancada da intermediária até a trave contrária. É rever suas tabelas com Romário arquitetadas pelo gênio Geovani em seus lançamentos. Roberto Dinamite emociona a cada fotografia, economizando o sorriso, eternizando a humildade, nitidez dos verdadeiros ídolos.

BRASIL, IL, IL!!!

por Elso Venâncio

Zarife, com a filha Fiamma, ao lado de Zico e Júnior

O locutor da famosa vinheta ‘Brasil, il, il!’, que marca as transmissões esportivas do Sistema Globo de Rádio e da Rede Globo de Televisão, especialmente nos jogos da nossa seleção, nasceu em Nova Friburgo, a Suíça brasileira. Edmo Zarife, o inesquecível ‘Zazá’, para os amigos, começou a trabalhar aos 15 anos de idade, na Rádio Sociedade da sua terra natal. Ao se mudar pouco depois para Niterói, destacou-se como locutor comercial, sendo contratado pela Rádio Globo do Rio de Janeiro, onde se tornou a voz padrão do rádio nacional.

Na véspera de um Natal, prestes a entrar de férias, grava o programa que apresentava: ‘Rio Total Show das 5’. Fita rodando, programa no ar, entrou esbaforido no estúdio, diante do olhar surpreso do operador de som Jorge ‘Brinquinho’:

“Vou fazer ao vivo. Não gostei da parte final”.

Profissional ao extremo, perfeccionista, chegava a ficar horas no estúdio gravando um texto. Emotivo, chorava ao saber que um colega seria dispensado, em alguma reformulação da empresa. Subia e descia nervoso as escadas até o quarto andar, na Rua do Russel, 434, no bairro da Glória – sede da Rádio Globo – repetindo para quem lhe surgisse pela frente:

“Sacanagem. Isso é sacanagem” – sua voz potente ecoava pelos corredores.

Rubro-negro fanático, recebeu a visita inesperada do Zico em sua sala. Abraçou o ídolo e não conteve as lágrimas:

“Zico, Zicão, Zicaço” – falava, imitando o locutor esportivo Jorge Curi.

O cantor paraguaio Fabio Rolon, amigo de Tim Maia, gravava as vinhetas ‘Rádio Globooo’, ‘Flamengooo’, ‘Vascooo’, ‘Fluminenseee’ e ‘Botafogooo’, que logo caíram no gosto popular. Mário Luiz, diretor de programação, conversa com sua equipe e sugere a criação de um bordão, frase ou sinal eletrônico, para enriquecer as transmissões de futebol, líder de audiência em todo o país.

O sonoplasta José Cláudio Barbedo garante que a vinheta “Brasil, il, il’ foi criação dele, que dirigiu Zarife na locução. Formiga, como é conhecido, brigou na justiça com a Rádio Globo após descobrir que a emissora registrou a vinheta em nome dela. Zarife alegava ter ficado mais de duas horas trancado no estúdio, em um domingo à tarde, gravando com Formiga.

Zarife era encontrado com frequência, nas folgas de fins de semana, andando pela Rua do Russel. Estacionava seu fusca branco e dava comida aos gatos, que eram levados por ele até a entrada da Rádio Globo.

Ele faleceu no dia 27 de dezembro de 1999, aos 59 anos, devido a problemas cardíacos, na clínica Pro-Cordes, no bairro Santa Rosa, em Niterói. Durante o seu sepultamento, em Friburgo, familiares e amigos destacaram a paixão que ele tinha pela profissão. O inseparável radinho de pilha do Zarife foi colocado sobre o caixão.

Edmo Zarife é um dos ídolos eternos da História do Rádio Brasileiro.

O CANHOTINHA DE OURO

por Zé Roberto Padilha

Em 1974, com a venda do Lula para o Internacional, finalmente chegara a minha vez de vestir a camisa 11 tricolor. O treinador era Carlos Alberto Parreira e Gerson, nosso Canhotinha de Ouro, iria disputar sua última temporada.

Segundo José Carlos Araújo, o Garotinho, fui denominado o “Pulmão do Gerson”. Ele devolvia, quando lhe entregava a bola, a gentileza nos concedendo passes e lançamentos geniais.

Na concentração, todos ficavam zoando seu jeito de falar pelos cotovelos. E não era poupado. “Papagaio! Papagaio!: Ele ficava muito bravo.

Dois anos depois virou comentarista. E eu, Roberto e Toninho fomos para o Flamengo, trocados por Renato, Doval e Rodrigues Neto. E entramos no mesmo ônibus que levaria a delegação do Flamengo, e de carona a equipe da Rádio Globo, para o Estádio Brinco de Outo da Princesa.

Já estávamos fazendo nosso sambinha no fundo do ônibus quando ele entrou. E se acomodou nas primeiras poltronas. E começamos a chamar o que menos ele gostaria de ouvir: “Papagaio! Curupaco! Papagaio!”.

Ele nem deixou quicar. Levantou da poltrona e soltou as últimas palavras que ouvimos do nosso ídolo tagarela: “Roberto, Toninho e Zé Roberto, não pertenço mais a laia de vocês!. Quero respeito!”.

Enfiamos a viola no saco, as cabeças debaixo das poltronas e nos silenciamos até o estádio debaixo da maior gozação.

Chegando ao Flamengo e indo enfrentar o Guarani, irritar quem tinha o microfone e a audiência da Rádio Globo era tudo que não precisaríamos. Chegando em casa, tirando o Roberto, que ficara no banco, ouvimos que ele elogiou bastante as nossas atuações.

Realmente ele provou que já não pertencia a mesma laia!”