A SELEÇÃO BRASILEIRA DE 82
por Luis Filipe Chateaubriand
Cantada em prosa e verso como uma das maiores seleções de futebol que o mundo já viu, a Seleção Brasileira de 1982 tinha imperfeições que muitas vezes não são notadas.
O técnico Telê Santana, notório adepto do futebol bem jogado, perdeu a oportunidade ímpar de fazer do Flamengo da época seu time base. Tivesse o feito, tendo o Flamengo como time base, teria ainda maiores chances de ganhar aquela Copa do Mundo do que de fato aconteceu.
Leão; Leandro, Oscar, Edinho e Júnior; Andrade, Falcão e Zico; Tita, Sócrates e Adílio. Seria um time titular com a base rubro-negra – ou seja, técnica, tática e conjunto – aliado à genialidade de Sócrates e Falcão, à experiência de Leão (o melhor goleiro do país de então), à segurança de Oscar e à agilidade de Edinho (que Luisinho não tinha, apesar da técnica).
O banco de reservas, à época composto por cinco jogadores, poderia ter Raul, Luisinho, o excelente Toninho Cerezo, o gênio Reinaldo (que não foi convocado pelo conservadorismo pessoal do técnico) e o versátil Lico (que não foi convocado sabe-se lá por que).
Vamos convir: se assim fosse, o escrete canarinho teria muito mais chances de êxito do que mesmo aquele timaço que foi montado à época teve.
Times como o Flamengo de 1981 e 1982 aparecem muito raramente em nosso futebol. Desperdiçar a chance de torná-lo base de nossa seleção foi enorme desperdício.
Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há 40 anos e é autor da obra “O Calendário dos 256 Principais Clubes do Futebol Brasileiro”. Email:luisfilipechateaubriand@gmail.com.
SAMPAOLI E A OXIGENADA MORAL NO FUTEBOL BRASILEIRO
por Luiz Ricas
Quando o técnico argentino assumiu o Santos FC no começo do ano, todos esperavam o que ele entregou e o que já vinha fazendo em seus últimos trabalhos, no Chile, na Argentina, no Sevilla ou no Universidad do Chile. Linhas avançadas, posse de bola, goleiro líbero, futebol ofensivo com muitos gols tomados e também sofridos. Um futebol intenso e jogado. O que ele fez no futebol brasileiro nesses quatro meses foi muito mais que tático.
A oxigenada do Sampaoli no futebol brasileiro não é tática, é moral. Taticamente em era de internet e TV a cabo, todos que acompanham futebol sabiam do conceito de jogo dele, inclusive com esse resultado de fazer um monte de gols e quando perde, também na mesma proporção. Mas a grande novidade é a voz dele: exigir o que deveria ser óbvio e usar do lastro dele para falar disso publicamente.
No futebol daqui a gente normatizou coisas completamente absurdas, como jogador voltar inteiramente fora de forma das férias, nenhum comprometimento (necessitando de motivação para fazer o que se dispôs a fazer, jogar bola), jogador ruim ganhando fortunas em times grandes, jogadores manhosos que tem que ser tratados como “pop star prima dona principezinho do mundo”, atraso de salário, dirigente não cumprir promessas, comissão técnica ou parte do elenco receber salário e outros departamentos e jogadores do clube não, etc. Só para ficar nos exemplos dos quais ele francamente falou em público. Instituições gigantes em mãos de gente incompetente ou de má índole.
No início de abril, o treinador que vai aos treinos de bicicleta na plana cidade santista viu um grupo de crianças assistindo ao treino em cima da árvore e prontamente convidou os garotos para entrar no CT, conhecer os jogadores e ver o treino do banco de reservas. Um simples gesto até destoa do modo intocável como são as relações entre torcida e atletas, um dia inesquecível para essas crianças e um breve gole na água da realidade que o elenco por ele treinado bebeu.
Sampaoli é gigante nesse gesto e em todos desde que começou no futebol e merece louvores por isso. O Santos que ele atualmente comanda e demais clubes do Brasil são gigantes em sua história e torcida, mas temos cada dirigente, cada jogador, cada cartola que é impressionante a força do futebol em se manter vivo por aqui com tanto sangue suga grudado nele!
DOIS CRAQUES E UM REENCONTRO
por Marcos Vinicius Cabral
“Nosso time se tornou um grupo com uma união muito forte fora de campo. Às quartas-feiras no Cinco de Julho, jogávamos para ajustar os erros. Com isso, acabamos um bom tempo invictos e aproveitando para treinar para o campeonato, já que o mesmo era disputado por grandes equipes e bons jogadores. Ganhar do Pouca Rola foi uma das maiores vitórias desse time com uma espinha dorsal composta por Leleco, por mim, Irineu, Gonçalinho e Guina. Lembro do campo cheio naquele domingo e da confiança transmitida pela nossa torcida. O resultado em si foi para confirmar o talento de uma geração representada por grandes jogadores”. (Marcinho, ex-zagueiro do Grêmio, atualmente com 51 anos)
“Havíamos disputado campeonatos anteriores, éramos uma equipe de amigos e jogando juntos ficamos fortes. Recheado de craques, um garoto, craque de bola, chamado Marcos Vinicius, apelidado de Lito, cresceu vendo aquele time jogar e passou a fazer parte do elenco. Naquele fatídico jogo, o árbitro, de nome Nei, era tio de um jogador do Grêmio e nós já imaginávamos o que poderia acontecer. Atribuo a ele nossa derrota pois foi o único culpado por não termos chegado à final. Foi uma grande decepção, e uma covardia o que o organizador do campeonato fez, pois ele torcia para o time que era o nosso principal rival”. (Flávio, ex-meia do Pouca Rola, atualmente com 48 anos)
O domingo se aproximava e a ansiedade calçava chuteiras para entrar em campo.
De um lado, a boa equipe da “Esquina do Pecado” em Neves – point de encontro dos jogadores do Grêmio Futebol Clube – se reunia para ouvir atentamente o treinador Dico traçar sua estratégia.
Não muito longe dali, no “Bar de César” – que ficava em frente à Praça do Barreto – o Pouca Rola Futebol Clube se preparava para a partida mais difícil da temporada.
Vencer o nervosismo era sair na frente naqueles 90 minutos que definiriam quem chegaria à final do 5° Campeonato Comunitário do Ceclat, em 1990.
Dois jogadores se tornaram símbolos das cores que defendiam: o zagueiro Marcinho, camisa 5 do Grêmio, e Flávio, camisa 10 do Pouca Rola.
– Enfrentar Flávio era saber que o jogo ia ser duro, devido a sua qualidade técnica. Nós fomos criados ali no Barreto e todos se conheciam. Não podíamos relaxar pois de um grande jogador sempre se espera alguma coisa – elogia Marcinho.
– Não quero entrar no mérito do quanto fomos prejudicados pela arbitragem mas Marcinho e Leleco (goleiro), foram fundamentais para a vitória deles com uma grande atuação – devolve Flávio.
Polêmicas à parte, os olhos castanho-claros de Marcinho e os esverdeados de Flávio, olham na direção do passado para reviver esse confronto.
Confronto este que começou bem antes do apito inicial da partida com provocações de ambos os lados durante a semana e encerrada na manhã daquele domingo quando cada atleta colocou a planta de seus pés no solo sagrado do Clube Combinado Cinco de Julho.
Fundado em 1927, o ‘Gigante da Zona Norte‘ que vivera tantas decisões emocionantes, estava prestes a transformar Grêmio e Pouca Rola num confronto histórico assim como inesquecível.
Nas escalações dos times, nada de novo, apenas uma mexida no setor de meio-campo do Pouca Rola com a entrada de Isidoro no lugar de Lito.
– Até hoje não consegui entender minha sacada do time, pois vinha fazendo um grande campeonato e jogávamos com o regulamento debaixo do braço – diz o ex-camisa 8 Lito.
E completa:
– Comecei a jogar bola com 13 anos de idade e ter sido preterido numa semifinal contra o Grêmio, foi sem sombra de dúvidas, uma das maiores frustações no futebol – lamenta o habilidoso meia hoje com 45 anos.
Contudo, o lateral gremista Irineu vai além:
– Para ser sincero não lembro muito do jogo, afinal de contas, são 29 anos que ele aconteceu. Mas pra mim teve um gosto especial, já que joguei no Pouca Rola na sua primeira formação e sempre tive carinho pelo time. O barato disso tudo eram as provocações – relembra aos risos.
Mas naquela manhã de sol forte, foi preciso esquecer o sorriso e fechar a cara e os portões do clube, pois os craques daquela partida atraíram muitos torcedores.
O campo lotado como poucas vezes se viu enquanto os jogadores transpiravam demasiadamente um bom espetáculo.
Leleco, Mauricio, Marcinho, Mongol e Irineu; Zé Baleba, Gonçalinho e Testão; Guina e Eraldinho, pisaram no palco sagrado de terra batida, com seu tradicional uniforme: camisa branca e azul listrada na vertical, short branco e meiôes azuis.
Já na outra metade dos 60m x 40m de sua extensão completa, Cidinho, César, Milton e Jay; Isidoro, Neizinho e Flávio; Boulevard e Willian, aqueciam sob olhares confiantes numa vitória.
– Nosso time era favorito com méritos próprios e todos queriam ganhar da gente – recorda César, camisa 2 do Pouca Rola.
Bola rolando e o Pouca Rola vai para cima sendo soberano nos 45 minutos iniciais, com Leleco operando milagres no gol gremista.
A vontade de vencer empurra o time que joga todo de vermelho e comandado por Zeir (Roberto era o treinador mas por questões pessoais não pôde comandar a equipe), sai em busca do gol.
Numa bola despretensiosa, o zagueiro Milton (até então impecável na partida) sendo último homem, domina mal uma bola rechaçada no meio-campo e o arisco Guina numa arrancada dá um tapa na frente e toca na saída de Cidinho.
Um a zero.
Segundo tempo começa e o Grêmio usa o célebre adágio de “o melhor ataque é a defesa” e a zaga segura o ímpeto do adversário.
Depois disso, inúmeras chances desperdiçadas, gol de cabeça de Flávio mal anulado, empurrão em Boulevard dentro dentro da área não assinalado, uma mão na bola em cima da linha do gol que evitou o empate que o juiz não marcou e invasões em campo, manchariam o jogo que marcaria Flávio e Marcinho.
Fim de jogo: 1 a 0 para o Grêmio e comemoração discreta de um time que acabaria vencendo o Avenida e sagrando-se campeão.
Coisas da bola que excede todo entendimento.
Enquanto Flávio sempre honrou a camisa 10 por onde jogou, Marcinho como zagueiro sempre foi um admirável líder.
Ambos, inegavelmente foram craques.
Enquanto um defendia com propriedade sua área o outro era elegante até com os meioēs arriados para atacá-la.
Se um foi duro, porém leal o outro foi clássico como a Sinfonia n.o 5, dita Sinfonia do Destino, de Ludwig Van Beethoven.
Um foi apaixonado pela bola e o outro apenas amante.
Passados quase 30 anos, a sensação que se tem é que aqueles 90 minutos ainda não terminaram e só terminaram numa conversa a sós na Praça Monsenhor Albuquerque na Mangueira em São Gonçalo, onde se reencontraram a pedido do Museu da Pelada para falarem do jogo que mudou suas vidas.
E porque não dizer, o jogo que transformou uma rivalidade numa grande amizade entre eles.
ESTÃO BRINCANDO CONOSCO
É sabido que a imprensa em geral foca seus principais holofotes em Flamengo, Corinthians e, agora, Palmeiras. E, claro, em Tite. A imprensa tem os seus queridinhos e não disfarça isso. Felipão continua sendo tratado como fenômeno e Fábio Carille é o mais novo amor dos jornalistas esportivos.
Ele era o treinador de zaga de Tite, portanto é mais um professor retranqueiro que surge com a função de engessar a nossa arte. A imprensa prefere destacar a contratação do Pato pelo São Paulo do que discutir profundamente o que estão fazendo com o nosso futebol.
Querem um exemplo? Pouquíssimo se falou sobre a derrota da seleção de Sub-17 de 3×0 para uma fraquíssima Argentina. O Brasil podia perder até de dois gols e se classificaria. Vale lembrar que em fevereiro a seleção Sub-20 também havia sido eliminada do Sul-Americano e não garantiu a vaga para o Mundial.
Na época, perguntei quem era o técnico Carlos Amadeu, comandante da garotada. Na mesa redonda, uma “comentarista” disse quer era uma das maiores referências mundiais dessa categoria, Kkkkkk, peraí, estão brincando conosco!
Agora foi a vez da Sub-17. Em um grupo com cinco seleções, ficou em quarto e só os três primeiros se classificavam. O Brasil amargou sua pior campanha na história da competição. Nunca ficou fora da fase final. Sua pior posição foi a quarta colocação, em 1993. A “sorte” é como a sede do Mundial Sub-17 será no Brasil o time está garantido no torneio.
Novamente fui pesquisar para saber quem era o nosso técnico. Guilherme Dalla Déa está no comando desde janeiro de 2018. Você conhece? O que já fez para estar lá? Comandou escolinhas no interior de São Paulo? Chupou laranja com quem, Guilherme Dalla Déa???
Repito, estão brincando conosco. A CBF está distribuindo sua legião de amigos em áreas estratégicas porque é na base que está a galinha dos ovos de ouro. Essas subs todas são como festivais de moda e de automóveis. A intenção é exibir os produtos.
Dizem que o destaque da Sub-17 foi Reinier, do Flamengo, que tem interesse de Real Madrid, Manchester, Milan, Juventus, e Arsenal. Essa notícia, sim, interessa aos jornalistas esportivos. Ou seja, o futebol agora merece a cobertura da Caras. Mas aviso que Neymar namorando Anitta não me interessa.
Por que a imprensa não faz um raio-x das bases dos clubes? Vai descobrir que os empresários comandam a festa. E desde a molecada de nove anos, até menos. Os treinadores que não escalarem um garoto encomendado perde o emprego. Mas a imprensa, como diz a garotada, segue o baile!
Só sei que ontem zapeando ouvi um comentarista experiente dizer “que guardadas as devidas proporções o Clayson, do Corinthians, lembra o Cristiano Ronaldo em seu início de carreira”. Kkkkkkkk!!!!! Acham que continuei no canal ou fui assistir Pica-Pau?
PATROCÍNIO NÃO É SALVAÇÃO
por Idel Halfen
Os torcedores e a imprensa de forma geral costumam dedicar grande parte de suas expectativas na obtenção de patrocinadores máster para os clubes de futebol, isso costuma ocorrer principalmente nos momentos em que os times vão mal e há uma latente demanda por reforços.
É natural que assim se pense, afinal de contas estão vivos em suas mentes os times europeus que, além de terem no plantel inúmeros jogadores famosos e bons, ostentam nas camisas logos de marcas famosas.
Contudo, seria preciso entender que essa modalidade de patrocínio ainda não está madura o suficiente no Brasil, de forma que poucas empresas têm a real dimensão dos benefícios desta propriedade, ou quem sabe tenham e justamente por isso não invistam.
O que quero dizer com isso é o que sempre repito aqui: a simples exposição da marca é muito pouco para uma empresa que tenha objetivos bem traçados de marketing, mas isso é conversa para outro artigo.
Voltando aos valores envolvidos, com raríssimas exceções, esses não chegam a pagar nem três meses de folha salarial. Claro que já é melhor do que nada, ainda mais em um mercado sem grandes perspectivas de algo mais robusto, mas criar a expectativa de que a obtenção de um patrocinador fará do time uma potência e de que craques serão contratados é mais uma daquelas lendas urbanas que nos deparamos ao longo da vida. Há a hipótese também de as críticas serem parte de uma estratégia de discurso para se falar mal da gestão. Nem sei qual das opções é a mais obtusa…
O mais alarmante desse quadro é a falta de perspectivas de mudança no curto prazo, a não ser o surgimento de empresários que, por razões diversas, resolvam extrapolar a normalidade do mercado. Nesse caso, a torcida é para que esses empresários tenham uma permanência longa e que as áreas de planejamento dos clubes – se é que passarão a existir – elaborem planos contingenciais contemplando um eventual fim do patrocínio.
Acreditar na perenidade pode ser mais letal do que acreditar que patrocínios são as soluções para as gestões.
É importante também que se registre que, por mais que os defensores destes patrocínios que fogem à normalidade discorram sobre os retornos das iniciativas, as decisões na maioria das vezes não têm o amparo de um bom plano de marketing, o que também não significa dizer que não sejam viáveis.
De qualquer forma, dando retorno ou não, os investimentos feitos de forma pouco analítica não trazem a devida contribuição para a consolidação de uma cultura que entenda o patrocínio como um componente valioso de alguma estratégia de marketing.
Enquanto assim for, é melhor que os torcedores não criem grandes expectativas de bons resultados graças a algum patrocínio, e que a imprensa – ou parte dela -, ao invés de semear “falsas ilusões”, faça a sua parte não boicotando aparições e ativações de marcas.