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UMA VIAGEM NO TEMPO

por Wesley Machado

Um dos meus filmes preferidos é “De Volta para o Futuro”. E estou me referindo a toda “trilogia”. Até do terceiro filme – que alguns criticam – eu gosto. Recentemente descobri que – paradoxalmente – tem o filme 4 da “trilogia”. No segundo longa da série a história se passa em 2015. Uma produção lançada em 1989, ano do que é considerado pelos torcedores do Botafogo como do maior título até hoje do clube pelo simbolismo que tem.

Se em 1989, quando foi lançado “De Volta para o Futuro 2”, o Botafogo foi campeão carioca depois de quase 20 anos, em 2015, quando se passa “De Volta para o Futuro 2”, o Botafogo foi campeão brasileiro da Série B pela primeira vez – voltou a ganhá-la em 2021. O clube já havia sido rebaixado em 2002 e caiu de divisão de novo em 2014 e 2020. Meu pai diz que espera que não voltemos mais para a Série B.

No entanto, nós torcedores – sou jornalista, mas também sou torcedor – não devemos nos esquecer dos tempos de seca. Agora uma chuva de gols e vitórias – quem sabe títulos? – abençoa a estrela solitária e a faz voltar a brilhar. Como nesta quinta-feira, 10/10/2024, quando dois jogadores do Glorioso garantiram a vitória de 2 a 1 de virada da Seleção Brasileira diante do Chile no Estádio Nacional, em Santiago.

Esta época de glórias me faz voltar a um tempo que não vivi, os anos 1960, de ouro para o Botafogo e de agruras políticas. Década de luta pela liberdade em todo o mundo em meio a guerras sem sentido, como as contemporâneas. Período em que os jovens cantavam MPB nos festivais e muito mais. Que este momento de alegria, alegria, volte – por que não, por que não? – para o Brasil e o Botafogo, que tanto se entrelaçam, porém, entretanto, todavia com general apenas Severiano. Em um cinema novo com Canal 100. É o que sonha um brasileiro botafoguense, que prima pela esperança!

COMO AVALIAR UM LÍDER?

por Idel Halfen

Na semana passada, o Fluminense, atual campeão da Libertadores, teve uma vitória importantíssima contra o Cruzeiro pelo Campeonato Brasileiro de futebol.

Mas fiquem tranquilos, não quero aqui falar de futebol, tampouco ficar exaltando o triunfo, até porque, ganhar de um time que tem como técnico o Fernando Diniz e nas condições atuais, não é tão prazeroso como as demais vitórias sobre rivais e que nos colocam em lutas por títulos.

Prefiro falar sobre liderança, aproveitando as demonstrações de afeto e gratidão por parte dos ex-comandados e demais companheiros de Diniz na ocasião do citado jogo.

Nesse momento me veio à cabeça um vídeo que recebi recentemente mostrando a despedida de um executivo da empresa em que trabalhou durante anos, no qual foi mostrada a comoção e reconhecimento dos colaboradores. Infelizmente não lembro os nomes e detalhes que certamente deixariam o texto mais rico.

Diante dessas duas situações e outras que o espaço não comporta, não tenho dúvidas em afirmar que a melhor forma de se avaliar um profissional se dá através das demonstrações de respeito e admiração por parte de sua equipe.

Óbvio que os resultados obtidos são também fundamentais nesse processo de “julgamento”, porém, pelo fato de a performance sofrer forte influência das expectativas e de fatores exógenos de mercado, há margem para questionamentos.

Já a admiração dos colaboradores, não! Essa é, digamos, mais genuína, pois inclui momentos de cobrança, eventuais cortes, algumas broncas, discordâncias e até fatores externos, afinal todos passam por problemas particulares.

Sair de um lugar que convivemos com pessoas, seja por vontade própria ou não, tem como lado bom a oportunidade de se autoavaliar através da observação das demonstrações de seus colegas, principalmente pares e equipes.

Feliz daquele que tem a oportunidade de viver essa experiência.

Tenho certeza que o artigo ficaria mais elegante e positivo se fosse encerrado por aqui, mas, por outro lado, perderia a oportunidade de mostrar o antiexemplo, uma maneira de reforçar o correto.

Tentando resgatar a elegância perdida ao não ter encerrado o texto anteriormente, não citarei nomes, mas chamo a atenção para uma postagem feita no Instagram, após a vitória citada no primeiro parágrafo, na qual o autor, um tricolor, debochava do Fernando Diniz.

Gostar ou não de alguém, é direito de todos, debochar também, só que nesse caso denotou muito mais recalque do que algum tipo de humor sarcástico e inteligente.

Piora a situação saber que o autor da indelicadeza, além de levar a empresa que dirigiu à beira da falência, não desperta a menor admiração por parte do capital humano que lá deixou. 

Isso talvez explique seu rancor e seu recalque.

O SUBESTIMADO

por Elso Venâncio

Garrincha foi o maior driblador da história do futebol. O Charles Chaplin dos gramados, que encantou o mundo com sua ginga, sua habilidade, suas jogadas espetaculares, ultrapassando adversários em série. O Anjo das Pernas Tortas, como definiu o jornalista Nelson Rodrigues. O que o craque fez na Copa do Mundo de 1962 foi inacreditável!

Em todos os títulos do pentacampeonato mundial do Brasil houve protagonistas marcantes. Merecem destaque Didi, na Suécia, em 1958; Pelé, no México, em 1970; Romário, nos Estados Unidos, em 1994; e Ronaldo Fenômeno, no Japão e na Coreia do Sul, em 2002. Nenhum deles, porém, se iguala ao desempenho de Garrincha no Chile. 

Após um título mundial, tradicionalmente surgem comentários de que fulano “ganhou a Copa”. Só dois personagens merecem essa honraria. Em primeiro lugar, o próprio Garrincha, pelo que fez em 1962. Depois, Maradona, que conduziu a Argentina ao título em 1986, no México. Pelé foi genial em 1970, mas os ingleses elegeram Tostão como o maior jogador da Copa. Sem contar que havia Clodoaldo, Gérson, Jairzinho, Rivellino, Carlos Alberto Torres, Paulo Cézar Caju… Eram muitos craques!

Gérson foi um dos jogadores com a oportunidade de atuar ao lado de Garrincha e contra ele. Para o Canhotinha de Ouro, “Pelé não jogou mais que Garrincha. Mas não jogou mesmo!”.

Por suas peripécias na Seleção Brasileira e também com a camisa do Botafogo, Garrincha se tornou uma das principais atrações do Rio de Janeiro. O botafoguense Luiz Mendes, “o comentarista da palavra fácil”, dizia que “todos queriam ver Garrincha no Maracanã, especialmente os turistas”. Não à toa surgiu o apelido Alegria do Povo, que é um negócio sério, pois representa o que Garrincha foi para o futebol. Didi, o inventor da Folha Seca, repetia: “Jogo difícil? Eu meto a bola nele!”.

A lenda nasceu em Pau Grande, pequeno distrito de Magé/RJ, onde reuniu os amigos do peito para comemorar a conquista do bicampeonato mundial. Nilton Santos chegou e viu Garrincha jogando pelada, descalço, num campo esburacado e de terra batida. Boquiaberto, exclamou:

— Compadre, pelo amor de Deus, não faz isso. Você é o maior jogador do mundo!

Simples, divertido, desapegado dos bens materiais. Assim era Garrincha, definido pelo jornalista Paulo César Vasconcellos, do Grupo Globo, como “um subestimado no mundo da bola”. É inaceitável que até a FIFA não o reverencie como um dos imortais do futebol. Em qualquer seleção de todos os tempos, Garrincha é presença obrigatória.

Manoel Francisco dos Santos faleceu com 49 anos, no dia 20 de janeiro de 1983, atormentado pela doença do alcoolismo. Foi o único adversário que não conseguiu driblar.

LUISITO FALOU

por Claudio Lovato Filho

Luis Suárez não é ídolo por acaso. Não é ídolo apenas porque joga muito ou porque é totalmente comprometido com os objetivos da equipe da qual faz parte ou porque não economiza esforços durante cada minuto em que está em campo. Uma parte muito importante da condição de ídolo que Luis Suárez sustenta é a sua liderança.

Luisito é um daqueles caras que se sentem bem, sem sente em seu elemento  fazendo parte de um grupo de atletas profissionais, cidadãos, pessoas que representam uma coletividade, seja ela um clube ou um país. Luisito tem uma causa: o futebol, a seleção uruguaia, o Uruguai. E quando escrevo “futebol” me refiro ao amor pelo jogo em si e incluo nisso a completa entrega aos clubes pelos quais passou (entre eles, para meu grande orgulho, o Grêmio).

Por uma “questão de convivência” (em suas próprias palavras), Luisito foi a público dizer o que tinha a dizer só depois de se aposentar da seleção uruguaia. Em entrevista à DSports Uruguay deu detalhes sobre o ambiente atual na Celeste, cujo técnico é Marcelo Bielsa. Luisito disse que o treinador sequer cumprimenta os jogadores e que há casos de desrespeito, com os ocorridos com o centroavante Canobbio, tratado como “sparring” nos treinos da Celeste. Em outro episódio, o técnico argentino, de acordo com o relatado, pediu que os jogadores não cumprimentassem os torcedores uruguaios na entrada do hotel de uma das cidades-sede da Copa América, nos Estados Unidos. Além disso, de acordo com Luisito, Bielsa não permite que os funcionários tenham contato mais próximo com os jogadores, nem mesmo que os cumprimentem ou tampouco façam refeições com eles no Complexo Celeste, como é (ou era) hábito na seleção uruguaia.  

Luisito não se calou enquanto estava lá dentro. “Como capitão, em agradecimento ao povo, paramos todos”, respondeu ao treinador diante do pedido para que os jogadores ignorassem os torcedores agrupados na portaria do hotel. Em outra ocasião, atendendo a um pedido dos jogadores, Luisito foi falar com Bielsa. Queria transmitir o pedido dos colegas para que Bielsa ao menos os cumprimentasse com um básico “bom dia”. Sentou-se à frente do técnico e, por cinco minutos, disse-lhe, entre outras coisas, que estavam todos no mesmo barco. Bielsa, conforme contou Luisito, se limitou a dizer: “Muito obrigado, Luis”. Então o maior artilheiro da seleção do Uruguai, autor de 69 gols em 143 partidas, se levantou e foi embora.    

Luisito Suárez pediu ao torcedor uruguaio: apoiem os jogadores. Ele saiu da seleção, mas a seleção não saiu dele. Seus companheiros continuam sendo seus companheiros. Ele não se esqueceria deles, porque é um líder. E um líder de verdade, como Luisito Suárez, não aceita passivamente que seus companheiros sejam maltratados.      

Fosse um outro, poderia dizer para si mesmo: “Isso não é mais problema meu”. Mas não. Ele falou. Há quem concorde com maneira como ele agiu, há quem discorde. O meia Valverde disse: “É tudo verdade. Não mentiu nem exagerou em nenhum momento”. O goleiro Rochet também confirmou tudo, mas fez a ressalva de que, em sua opinião, o assunto deveria ser resolvido internamente, “a portas fechadas”. Valverde concorda com Rochet. Fica, então, a pergunta: e o torcedor uruguaio, ele não tem o direito de saber o que acontece nos bastidores da sua seleção?     

Foi um desabafo, uma crítica e uma denúncia. Talvez Bielsa venha a público para se defender. Talvez não faça isso. Tem direito de falar ou se calar. O fato é que Suárez expôs uma situação potencialmente perniciosa e provavelmente a estancou. À sua maneira – uma maneira pouco usual no futebol de hoje, em que, cada vez mais, cada um pensa em si –, Luisito pode ter conseguido o que todos os jogadores queriam: uma mudança para melhor no relacionamento com o treinador.

Luisito falou pelos seus companheiros, todos mais jovens – e este é um ponto muito importante nessa história. Falou também pela seleção do seu país, e quem acompanha a carreira dele sabe o quanto tudo isso é importante para ele: os companheiros, a seleção, o Uruguai.

DENÍLSON, REI ZULU, CACIQUE DE RAMOS

por Paulo-Roberto Andel

Foto: Marcelo Tabach

Garoto ainda, Denílson já tinha atitude. Aos dezoito anos, em 1961, jogava no Madureira. Cansado dos salários com meses de 150 dias, deu no pé.

Tomou coragem e foi no Fluminense. Cortou um dobrado na portaria, mas conseguiu entrar e, no estádio lendário, conseguiu chegar perto do Mestre Zezé Moreira. Deixou o medo pra trás e simplesmente pediu uma chance para treinar. Só saiu do clube treze anos depois. E cinco anos passados do pedido para treinar, estava na Copa do Mundo defendendo o Brasil.

Nelson Rodrigues, eterno, o apelidou de Rei Zulu com a estupenda precisão de sempre. Waldyr Amaral, a voz do rádio carioca, o chamou de Cacique de Ramos. Preciso também.

A Era Denilson começou de vez com o título carioca de 1964. Depois demorou um tempinho, mas o fim da década seria esplêndido: o Fluminense foi campeão carioca nas decisões apoteóticas de 1969 e 1971. Entre ambas, campeão brasileiro de 1970. Uma potência. Depois voltou a ganhar o Carioca em 1973. No meio do caminho, faturou três Taças Guanabara – uma façanha para qualquer jogador da história tricolor.

O Mestre Nelson era encantado com as passadas largas e elegantes de Denílson. A torcida tricolor inteira era. O futebol foi sendo lapidado por Tim e Telê Santana. Precisa mais? Sim. O querido e amado Helio Andel dizia “Ele era implacável”, e creio que Mendel Chapiro diria o mesmo.

Quando deixou o Fluminense para jogar no Rio Negro do Amazonas, Denílson já estava consagrado como um símbolo do clube. A revista Placar em outubro de 1970 cravava: “Não tente passar por Denílson. Ninguém passa”. Era quase uma premonição do título nacional que estava a caminho. Ninguém passava por Denílson naquele que, para muitos especialistas, foi o Campeonato Brasileiro mais difícil de todos os tempos, com todos os craques tricampeões no México presentes, além de outros 30 que não foram à Copa. O Rei Zulu encarou todos, viu e venceu. Foi campeão com a mesma coragem que um dia empenhou para jogar no Fluminense.

Nos últimos 50 anos, ele foi um discreto ícone do clube, unanimidade entre todos que o viram jogar. A elegância carregava um tonel de garra que poucas vezes se viu no Maracanã com a mesma intensidade, nos anos em que o Brasil realmente tinha o melhor futebol do mundo.

O Fluminense e sua torcida precisam enaltecer o Rei Zulu. Ele pode ter ido embora fisicamente, mas sua presença na eternidade tricolor é certa. São muitas e muitas histórias. Ninguém aprende com Zezé Moreira, Tim e Telê à toa.

@pauloandel