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AMÉRICA, JOÃO CABRAL E EU

por Leandro Paulo Bernardo


No encerramento de 2015, os olhos do mundo futebolístico ficaram abertos para a decisão do mundial interclubes entre Barcelona e River Plate. Lógico que também estava aguardando esse embate, a eterna luta quixotesca sul-americana contra os “moinhos de ventos” europeus. Todavia, o quê provocou as minhas legendas oculares foi uma simples notícia vinda do Recife.

O tradicional América apresentou o seu elenco de 2016 em sua tradicional sede na estrada do Arraial, local que por muito tempo está alugada a um colégio particular e que viveu momentos de angústia com o leilão da sua sede, à qual chegou a se adquirida por uma rede de lojas de eletrodomésticos e posteriormente embargada pela justiça. Torço incondicionalmente pelo Santa Cruz, mas qualquer notícia do mequinha e sua sede causa um imenso valor simbólico em mim. O maior torcedor do clube, o escritor João Cabral de Melo Neto, faleceu em 1999. Nesse ano estava prestando o meu primeiro vestibular e todos os professores “cravavam” que iria cair alguma questão sobre o autor no vestibular.

Eu tinha saído da zona da mata com quinze anos de idade para tentar “ser Doutor” na capital. Com um grande sacrifício dos meus pais, meus dois irmãos e eu morávamos em um pequeno apartamento alugado na rua do Príncipe. Graças às aulas de literatura no colegial, passei a associar minha “batalha” com as poesias dos gênios pernambucanos. Li o poema do primo de João Cabral, Manoel Bandeira e logo pensei; Esse cara teria inveja de mim, pois moro na rua do Príncipe, vizinho da rua do Lazer e do Sossego, paralelo com a rua do Sol e da Aurora. Apaixonei-me pela obra “canavieira” do meu conterrâneo Ascenso Ferreira e pirei ao conhecer a “morte e vida Severina”.

No colégio identificava-me com o pessoal da mata, do sertão e do Cariri cearense, que lutavam por suas vidas futuras e mesmo com a severidade do vestibular, possuíamos uma determinação do “Severino”. Eu tinha um amplo conhecimento desportivo, porém não me identificava com o curso de Jornalismo (achava que seria a personificação do “gauche” do Drummond), então optei pela vida profissional na área de saúde. Eis que o local da minha prova seria no colégio Dom Vital em Casa Amarela, à qual necessariamente teríamos que passar pela Estrada do Arraial. Dentro do ônibus coletivo senti um imenso simbolismo ao passar pela sede do América, parecia um adeus, uma transição do menino que respirava futebol para um homem que transformaria os sorrisos das pessoas.

Venci aquele vestibular (com uma questão de física baseada num lance do Rivaldo) e a luta acadêmica, tornei-me Odontólogo, mas o futebol ainda pulsa em minhas veias. Recentemente passei a escrever para alguns sites de futebol, tenho zilhões de histórias mesmo sem ser formado em jornalismo. Talvez a alma daquele menino que amava a Supercopa e as transmissões da Band, junto com aquele adolescente que descobriu a literatura e a outra versão do futebol com o Grandes Momentos do Esporte tentem balançar o pensamento desse dentista adulto.

Tenho roteiro para cinema, livro pronto, histórias para contar…tudo sobre futebol. Mas o mundo ainda precisa do meu labor, especialmente na bicentenária Brejo da Madre de Deus, da qual João Cabral descreveu em um belo poema sobre a trajetória do Rio Capibaribe, assim como o futebol ainda precisa do amor e da poesia erradiado por clubes como o América. João Cabral de Melo Neto sonhava em ver seu mequinha grande novamente, talvez ao recuperar sua sede, o clube possa novamente sonhar. Em junho de 2015, a sede do América foi classificada como um Imóvel Especial de Preservação (IEP). Com isso, o prédio do clube centenário de Casa Amarela não poderá ser demolido ou sofrer alterações que modifiquem sua estrutura original.

Dentro de campo o clube está na segunda divisão estadual. Em 1990 disputou pela última vez uma série B… só que era a nacional Ficou num grupo com meu Santinha, Central de Caruaru (cidade à qual resido atualmente), do maior clube da região quilombola; Capelense (próximo da linda Quebrangulo de Graciliano Ramos) e dos menestréis CRB e CSA. 

Boa sorte ao mequinha, que seus sonhos possam ir além das margens do Beberibe e do Capibaribe, consiga navegar por mares nunca antes navegados. Que os caminhos da estada do Arraial tenham ainda o seu verde irradiando os horizontes para Casa Amarela. Sua luta possa ser um novo “Dom Quixote” para um futebol atual sem poesia, sem cor, sem sonhos, sem lares afetuosos.

APENAS PARA NÃO SEREM ESQUECIDOS

por Zé Roberto Padilha


Jogava na Seleção Carioca de Máster, em 1993. E o Brasil disputava as eliminatórias para a Copa do Mundo de 1994. Após a partida em Mariana-MG, onde o Marinho, ex-Bangú, arrebentou com o jogo, fomos jantar no hotel antes de voltar ao Rio. A televisão transmitia Brasil x Bolívia, jogado lá nas alturas, e à sua volta se aglomeravam torcedores, jogadores, funcionários e hospedes. Quando a Bolívia marcou o seu gol, dois gritos surgiram lá do fundo do salão. Seriam bolivianos?

Não, eram Marco Antônio e Brito, tricampeões mundiais, que torciam por eles. Ninguém entendeu nada, mas como todos eram gratos pelo que fizeram por trazer a posse definitiva da Taça Jules Rimet, ninguém se manifestou. Muito menos, aprovou.

Já dentro do ônibus, procurei sentar perto de uma dessas feras para descobrir a razão. E ambos foram sinceros e visionários: “Não torcemos contra o Brasil. Torcemos para não sermos esquecidos.”

De fato, em vinte e três anos de insucessos seguidos, em cinco edições de Copas do Mundo, eles eram sempre lembrados antes da bola rolar. Félix, Piazza, Carlos Alberto, Everaldo, por onde estivessem, o Globo Esporte dava um jeito de encontrá-los. E as novas gerações ouviam as histórias de um grupo que conquistou o que nenhum outro conseguira mais alcançar. E tinha cachê. E reconhecimento.

Um ano depois, veio o tetra. Pior ainda para eles, alcançamos o penta. E nunca mais o Tino Marcos foi saber onde estava o “furacão” daquela edição, o Jairzinho, único jogador que fez gol em todas as partidas de uma Copa do Mundo. Já não dava mais Ibope porque “a memória do torcedor, telespectador, é mais fraca apenas que a razão que sobrou do seu fanatismo. É fraca, mas como dói…!”.

Desta safra maravilhosa, símbolo absoluto do futebol-arte que encantou o mundo, ousada e revolucionária por colocar em campo um ataque formados pelos melhores camisas 10 do país (Jairzinho, Botafogo, Tostão, Cruzeiro, Pelé, Santos, e Rivelino, Corinthians) alguns já se despediram de nós. A defender sua efeméride apenas os proprios atores , Paulo César Cajú, com suas crônicas, o Gérson, ao microfone, e o Rivelino, quando de suas intervenções em mesas redondas.

Agora, em 2020, o tricampeonato brasileiro de futebol completa 50 anos. Que busquem o Marco Antônio, e o Tostão, por onde andará nosso doutor? E o Clodoaldo, aquele maravilhoso cabeça de área, virou treinador? Dá palestras?

São todos heróis nacionais. Imortais e insubstituíveis por qualquer outra conquista. Que se faça justiça e, novamente, os recoloquem no lugar mais alto da história e da memória do nosso futebol. Eles merecem.

#TBT DO MUSEU

por Wendell Pivetta

Ontem mesmo era Dia do Fotógrafo em nosso país, e hoje o dia do #tbt, símbolo digital de resgatar a memória com fotos nostálgicas.

Estou quase finalizando minha formação no curso de jornalismo pela UNICRUZ e atualmente aproveito a experiência de atuar na Secretaria de Esportes e Lazer de Cruz Alta estagiando e fotografando o esporte do município. O ano de 2019 foi de muitas descobertas no caminho da fotografia. Tive o privilégio de captar registros do futebol municipal dentro do campo e da quadra em edições do Citadino Municipal.

Prestigiar com a lente grandes jogos, momentos de comemoração, lágrimas de felicidade e o grito solto de “é campeão” estarão eternizados em minha memória e na foto cuja a qual posso compartilhar com os leitores do Museu da Pelada momentos históricos das competições promovidas no ano de 2019. Citadino de Futebol de campo, futsal masculino e feminino estão presentes nesta mostra fotográfica digital.

O maior desafio na minha experiencia fotográfica com certeza foi o de deixar de ser um espectador e despertar para fazer a captação da foto no momento em que a ação acontecia!

TONINHO CEREZO, O ARTISTA DA BOLA

por Luis Filipe Chateaubriand


Antônio Carlos Cerezo surgiu no Atlético Mineiro, em meados dos anos 1970. 

Depois de um empréstimo ao Nacional de Manaus, voltou ao Galo para ser um dos principais artífices dos grandes times do clube na segunda metade da década.

Jogou no clube mineiro até meados dos anos 1980, quando foi negociado com a italiana Roma. 

Jogou, ainda, pela Sampdoria, pelo São Paulo, pelo Cruzeiro, pelo Lousano Paulista, novamente pelo São Paulo e encerrou a carreira no Galo mineiro.

Era o jogador peladeiro, no bom sentido da palavra. 

Com técnica excelente e preparo físico fenomenal, movimentava-se por todos os lados do campo, sendo opção segura para receber a bola e, ao mesmo tempo, um ofertador de bola aos companheiros como poucos.

Seus passes eram “açucarados”, muitas vezes magistrais. 

Tanto era capaz de fazer passes curtos para o ponto futuro, deixando companheiros em situações vantajosas para arremate ou criação de jogadas perigosas, como fazia passes longos, às vezes de mais de 40 metros, que deixavam colegas na cara do gol.

Ao longo dos anos 1970 e 1980, tornou-se cérebro de grandes times atleticanos, que contavam com nomes de destaque como Marcelo, Luisinho, Éder e Reinaldo. 

Era ele que fazia uma engrenagem quase perfeita ser colocada em ação.

Já veterano, no São Paulo dos anos 1990, continuava a ser um dínamo, um cara que fazia a diferença diversas vezes. 

Como na final do Mundial de Clubes de 1993, em que só faltou fazer chover.

Na Seleção Brasileira, teve uma carreira notável, com 73 atuações com a “amarelinha”. 

Junto com Falcão, Sócrates e Zico, compôs um dos maiores meios de campo da história de nossa Seleção.

Filho de um palhaço de circo, tinha um futebol refinado, vistoso e elegante e, assim, não deixava de ser um artista, como o pai. 

Artista da bola, produziu lembranças sobre o seu futebol exuberante que ficaram eternizadas não só para atleticanos e são paulinos, mas para os amantes do bom futebol em geral.

Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há mais 40 anos e é estudioso do calendário do futebol brasileiro e do futebol europeu. Email: luisfilipechateaubriand@gmail.com.

LEMBRANÇAS DO MARACA SETENTÃO

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Na semana passada, lembrei que em 2020 comemora-se os 50 anos da conquista do Tri, uma data especialíssima. Assim que a coluna foi publicada várias pessoas me enviaram zaps alertando sobre o aniversário de 70 anos do Maracanã.

Mas, peraí, como me esqueceria disso se eu e o ex maior estádio do mundo temos algo em comum? Eu e o Maraca nascemos no mesmo dia, 16 de junho!!! Por isso, amo tanto esse lugar e me revoltei com a plástica de quinta categoria que o submeteram. Virou uma arena como outra qualquer, bonitinha mas ordinária.

Os estádios precisam ter alma, devem nos arrepiar da cabeça aos pés e despertar a emoção dos cronistas. A magia deve prevalecer. A arquibancada pode ser de cimento desde que seu coração esteja confortável. Quando eu corria pela ponta-esquerda (beirinha é o…..) e o geraldino me xingava a resposta vinha com um drible desconcertante, um balão, uma caneta. A ira transformava-se em idolatria e eu virava rei. Radinhos de pilha eram arremessados no campo, mas no fim do jogo eu ganhava um motorádio e tirava onda. Ganhei mais de 20!

Na minha estreia, no Maracanã, pelo meu Botafogo, guardei três contra o América e saí campeão! Perdi as contas de quantos gols fiz no Andrada e de quantos pisões levei do Moisés. Quando Francisco Horta me trouxe de volta ao Brasil e troquei o Olympique de Marselha pela Máquina Tricolor, a diretoria do clube preparou uma grande festa no Maraca e vencemos o poderoso Bayern de Munique, 1×0.

Esse estádio meu deu muitas alegrias, mas também sofri. E não foi pouco. Estava naquele desastroso 6×0 do Flamengo contra o Botafogo e na dura derrota do Botafogo contra o Fluminense na final do Carioca de 71. Nesta última, fomos prejudicados pela arbitragem e fiquei dez minutos chorando no campo sem conseguir levantar, após o apito final. Waldir Amaral narrava um tempo e Jorge Curi o outro. Mário Vianna comentava e Armando Marques distribuía cartões. Quanta saudade, meu Deus!

O Maracanã, patrimônio do futebol, jamais poderia ter sido modificado. Era um templo, virou boutique. Pelo Flamengo, ganhei um Torneio de Verão contra o Santos, de Pelé, e o Benfica, de Eusébio. Ouviram bem isso? Pelé e Eusébio! Também no Maraca, participei de um treino aberto da seleção brasileira, preparatório para 70. No intervalo, Zagallo me chamou e disse que colocaria Arílson no meu lugar. Na frente de Arílson, avisei ao Velho Lobo que não sairia, que ele escolhesse outro, Kkkk!!! Me dava muito bem com Zagallo e para evitar confusões ele pediu para Arilson dar mais um tempinho no banco.

No Vasco, formei meio-campo com Guina e Pintinho, tá ruim? As charangas nos injetavam emoção, bandeiras gigantes coloriam o velho Maraca e os camisas 7, 8, 10 e 11 davam seus shows particulares. Os cinegrafistas do Canal 100 à beira do campo flagrando as pernas bailando, o povão extasiado, Brito dando uma espanada na área, Eduzinho furando as defesas e Fio Maravilha inspirando Jorge Ben…”Fio Maravilha faz mais um pra gente ver…”.

Ele fazia e o Maraca tremia como tremiam nossos corações.