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UM ADEUS SEM DESPEDIDA

por Marcos Vinicius Cabral

Leandro, nos juvenis do Flamengo, treina contra o ídolo Zico, na Gávea

No mundo real, algumas pessoas não gostam de despedida. Faz parte da personalidade delas. Mas em se tratando de um jogador de futebol, sair do tablado verde sem o gran finale e com a plateia sentada nas cadeiras de concreto das arquibancadas sem prestar o último aplauso, soa como desaforo.

Torcedores, até hoje, vivem se questionando o que leva craques de futebol a não se despedirem quando penduram as chuteiras.

Leandro, ex-lateral-direito do Flamengo e Seleção Brasileira, que neste domingo, 17 de março, celebra 65 anos, é um deles. O craque saiu de cena sem receber o merecido (e bota merecido nisto!) aplauso.

Seria o último. Mas o Peixe-Frito não nos deu esta chance. O camisa 2 rubro-negro que chegou ao Flamengo naquele 1976 como lateral-esquerdo, realizou quatros treinos e, aprovado por Valter Miraglia, se apresentou a Américo Faria com as armas que tinha (chuteira três números acima do que calçava, short apertadíssimo e meiões enlarguecidos) para vencer aquela batalha.

Américo sabia que estava diante de um grande soldado. Não teve jeito. Ele e o cabeça de área Vitor, campeão da Libertadores e do Mundial Interclubes pelo Flamengo, em 1981, foram aprovados e passaram a integrar os juvenis do clube. As guerras, dali por diante, seriam a profissionalização, os títulos, e o reconhecimento.

Receber a toalha de Bolinha, roupeiro à época, para se enxugar do banho após os treinos em que o menino de Cabo Frio fazia no clube de coração, era batalha vencida.

Mas Leandro fechou as cortinas do espetáculo que por muitas vezes foi protagonista. Ator principal. Enredo escrito por um destino que esqueceu de colocar no roteiro uma Copa do Mundo. Nem sempre a melhor história leva a estatueta do Oscar como melhor filme.

No mínimo, Leandro deveria ter feito um jogo de despedida para que a torcida, não apenas a rubro-negra, mas as que apreciam o futebol do craque que foi, pudessem prestar reverências e agradecimentos pelas jogadas espetaculares, dribles sensacionais, golaços inesquecíveis e glórias alcançadas ao longo da carreira.

Pelé teve não só uma, mas várias despedidas. A mais marcante no dia 1º de outubro de 1977, quando vestindo a camisa do NY Cosmos enfrentou justamente o Santos, clube que o projetou. Na plateia de mais de 75 mil espectadores, e nomes importantes como o então presidente americano Jimmy Carter e a lenda do boxe Muhammad Ali.

Cinco anos antes, Garrincha, o Anjo das Pernas Tortas, mesmo que tardiamente, se despediu também quando fez o último jogo como profissional. Foi em um amistoso realizado no dia 7 de setembro de 1972 entre Olaria e Caldense, em Poços de Caldas (MG).

A reboque vieram Zico, no inesquecível 6 de fevereiro de 1990, em pleno Maracanã. Roberto Dinamite, cujo nome virou sinônimo de saudade e nome do troféu para artilheiro do Brasileirão, também disse adeus ao futebol quando conseguiu a façanha de fazer Junior e Zico vestirem a camisa do Vasco, em 1993, contra o La Coruna de Bebeto.

Já Romário contra a Guatemala, em 2005, e Ronaldo Fenômeno contra a Romênia, em 2011, amarraram o cadarço das chuteiras pelo última vez e deixaram o legado de gols. Muitos gols. Diversos, inúmeros, incontáveis.

Mas Leandro foi na contramão deles todos. Deveria ser lei ou cláusula obrigatória no contrato que jogadores representativas e divididos entre o amor ao clube e a paixão irrestrita ao torcedor numa fumaça atmosférica de congraçamento, jogassem, pela última vez, uma partida festiva de futebol.

Um adeus sem despedida, como Leandro fez, é uma bala perdida que atinge o coração do torcedor que muitas das vezes atrasou a prestação da geladeira para comprar ingresso e vê-lo brilhar com o Manto Sagrado nos ‘Maracanãs’ da vida.

Um adeus sem despedida é privar o torcedor de derramar lágrimas pelo desaparecimento físico do jogador que tanto ama.

Um adeus sem despedida é pior do que morder a maçã no Jardim do Éden e cometer o pecado adâmico que o primeiro homem que existiu na face da Terra de nome Adão fez.

Mas Leandro, que assinava contratos em brancos por amor ao Flamengo, que colocava bolsas e mais bolsas de gelo nos joelhos nos intervalos das partidas, que recusou e nem quis saber das propostas de clubes interessados em contratá-lo, surpreendentemente, disse um “adeus” sem despedida.

O Pelé da lateral-direita que vestiu apenas as camisas do Flamengo e Seleção Brasileira não teve tal jogo. Leandro, dono de uma técnica refinada, bailarino em solo verde mundo afora, marcou época defendendo o Flamengo, tornou um clássico como sendo dele – refiro-me ao Fla-Flu do Leandro, em 1985 – e aposentou as chuteiras. Fez isso na escuridão e sem a luz que resplandeceu o futebol lindo que jogou por 14 anos. Catorze este, que foi o número de gols que fez em toda carreira.

Mas o Peixe-Frito, chamado pelos amigos mais chegados, não nos deu a oportunidade em dizer: “Muito obrigado, Leandro!”. Não deu a chance de um jogo festivo pelos relevantes serviços prestados à causa do futebol. Sem um adeus, até a lembrança da última vez em que esteve em campo contra o Bangu, em Moça Bonita, pelo Carioca de 1990, foge da memória e vai se afugentar em meras estatísticas de recortes nos jornais da época e sites atuais.

Com a camisa do Flamengo, o senhor José Leandro De Souza Ferreira, nascido no dia 17 de março de 1959, na Casa de Saúde São José, no Humaitá, Zona Sul do Rio, realizou 414 partidas. Destas, venceu 239, empatou 98 e perdeu 77.

Desde a estreia contra o América, pelo Campeonato Carioca, em 22 de março de 1978, até o nefasto 7 de março de 1990, contra o Bangu, em Moça Bonita, Leandro, o Peixe-Frito, conquistou títulos, honrou o Manto Sagrado e adquiriu o respeito que só quem valoriza o Flamengo merece.

Mas se não quis dizer “adeus” em uma partida de exibição, coube a mim, Marcos Vinicius Cabral, convencê-lo a contar um pouco da história linda que construiu dentro de campo em um livro.

Em breve, eu e Sergio Pugliese estaremos lançando a obra literária que tem como título provisório ‘2 de Ouro da Nação’. O livro conta um pouco da infância do craque que nasceu no Rio e não em Cabo Frio como muitos pensam. Fala também da chegada ao Flamengo, momentos inesquecíveis como os títulos conquistados, a consagração de um dos maiores laterais de todos os tempos do futebol brasileiro, e o melancólico Bangu e Flamengo, em Moça Bonita, em 1990. Mas tem muito mais. Tem a injustiça (e única em toda carreira) expulsão contra o mesmo Bangu, em 1983. O árbitro? Arnaldo César Coelho, responsável pela proeza.

Mas Leandro mereceu joelhos melhores. Quis Deus que os problemas não fossem impeditivo para desfilar elegância e técnica refinada por mais tempo nos campos de futebol.

Uma pena, uma pena mesmo, que isto tudo foi em um adeus sem despedida.

UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” – CAPÍTULO 53

por Eduardo Lamas Neiva

Depois de dançarem e se divertirem com “O balanço do Garrincha”, cantado por Ary Lobo, o público se dispersou um pouco, mas logo voltou sua atenção à mesa de nossos personagens. Sobrenatural de Almeida retomou a pelota, levando adiante o papo sobre Garrincha e a Copa do Chile.

Sobrenatural de Almeida: – Eu mesmo tentei aprontar umas com o Garrincha em campo, mas fui driblado várias vezes.

João Sem Medo: – Foi mais um João!

Todos riem, inclusive Sobrenatural de Almeida, que soltou sua risada medonha.

Idiota da Objetividade: – Na vitória de 3 a 1 sobre a Inglaterra, pelas quartas-de-final da Copa de 62, Garrincha fez dois gols. O outro foi de Vavá. Garry Hitchens chegou a empatar para os ingleses na primeira etapa, sete minutos depois de Garrincha abrir o marcador. Mas Vavá fez o segundo, aos 7 da etapa final, e Garrincha marcou o terceiro, aos 14.

Ceguinho Torcedor: – Contra a Inglaterra, o Brasil arrancou todas as máscaras. Embora com dez elementos, pois o Possesso levou um tostão, o futebol brasileiro apareceu em todo o seu frenético esplendor. O gênio de Garrincha desarmava tudo, desde simples antipatias até os ódios shakespereanos. Seu futebol era de um humor ininterrupto e colossal. Ele nos ensinou a beber na fonte das alegrias simples.

João Sem Medo: – Sabíamos que não bastaria aos ingleses um jogador para a marcação de Garrincha. Eles começaram num 4-2-4, mas ainda não descobrimos em que sistema acabaram jogando. Na primeira bola recebida pelo Mané foi um deus nos acuda na defensiva britânica. O lateral Wilson foi o “John” daquele dia (muitos risos na plateia) e tratou logo de pedir socorro para acertar o seu lado.  Mané estava uma fera. Depois da contusão de Amarildo, que fez Garrincha ir pro miolo, a esquadra de Nelson naufragou de vez. Os ingleses tremiam como aspirantes escalados no time de cima. Numa dessas, Zagallo bateu um corner e um grandalhão que mais parecia uma vela de promessa perdeu na cabeça pro Mané. Cesta do Brasil. Depois apareceu uma falta fora da área, Didi ajeitou, mediu, mas o Mané não deu vez. Correu, deu um chega pra lá no crioulo e mandou brasa. A bola estourou no peito do goleiro e Vavá conferiu. E ainda houve o terceiro, mas nesse eu não vou falar porque precisaria ter estudado mais uns dez anos. Só vou dizer que foi uma folha-seca que me fez ficar até arrepiado.

Ceguinho Torcedor: – No lance desesperador do segundo gol, Didi ia bater de fora da área. E súbito, baixa no Mané uma luz de vidência. Amigos, o sujeito que não profetiza é um pobre de pai e mãe. Naquele momento, Mané viu, farejou, apalpou o gol quase que fisicamente. Empurrou Didi, meteu-se na frente e despejou a bomba.

Sobrenatural de Almeida: – Ajudei um pouquinho o Garrincha a fazer as coisas que normalmente não fazia naquele dia. Essa vidência que você falou fui eu que soprei no ouvido do Mané. O goleiro inglês foi traído por um desviozinho que dei na bola chutada pelo Mané e Vavá pôde cabecear pras redes depois.

Ceguinho Torcedor: – Dizer que Garrincha, sozinho, ganhou o “match”…

Os outros três: – “Match”!?

Ceguinho Torcedor: – A partida, a partida… Pois bem, dizer que Garrincha, sozinho, ganhou a partida, pode parecer injusto ou cruel. Muitas vezes, porém, tivemos a sensação de uma batalha desigual, uma monstruosa batalha, entre o solitário Garrincha contra todo o Império Britânico. O Mané fez dois gols e deu mais um.

Garçom: – Dá pra dizer quem foi melhor, Pelé ou Garrincha?

Sobrenatural de Almeida: – Os dois eram assombrosos. Penei com eles, porque não conseguia aprontar muitas. Acabei ajudando algumas vezes. Se não pude com eles, juntei-me a eles.hahahaha

Todos (rindo): – Assombroso!

Idiota da Objetividade: – Pelé foi mais completo. Garrincha, mais surpreendente.

João Sem Medo: – Pelé e Garrincha são extra-série. Só vi, como Pelé e Garrincha, talvez o Di Stéfano, um monstro sagrado. E depois, mais próximos, Puskas, Zizinho, Cruiff. Mas Pelé, Garrincha e Di Stéfano são os três extras-série. Vi Di Stéfano pela primeira vez em 50, 51; vi jogando dez, doze anos. Vi Pelé jogando dez, doze anos. Vi Garrincha uns quinze anos. Tenho opinião formada e confirmada sobre eles: são monstros sagrados do futebol internacional. Formam na linha dos fora de série. Depois você vem aí com trezentos.

Ceguinho Torcedor: – Pelé era já em 58 um gênio indubitável. Digo e repito: gênio. Já aos 17 anos, Pelé podia se virar para Michelangelo, Homero ou Dante e cumprimentá-los, com íntima efusão: “Como vai, colega?”. De fato, assim como Michelangelo é o Pelé da pintura, da escultura, Pelé é o Michelangelo da bola. Um e outro podem achar graça de nós, medíocres, que não somos gênios de coisa nenhuma, nem de cuspe à distância. Apesar de toda a nossa ingratidão, Pelé é imortal, porque ninguém pode enxotá-lo da nossa memória.

Garçom: – Mas, seu Ceguinho, como o senhor sabe disso se o senhor não enxerga?

João Sem Medo: – Esse aí enxerga longe. É como o craque, ele antevê.

Sobrenatural de Almeida: – O Ceguinho é assombroso. Fala dos gênios como se ele não fosse. Somos quase todos aqui criação dele. Ou saímos das costelas dele.

Todos riem.

Ceguinho Torcedor: – Em Garrincha, tudo comovia. Em primeiro lugar, foi e é da cabeça aos sapatos um herói nacional. O brasileiro é feio e Garrincha também era. Aqui, até os Apolos são mal-acabados. E as pernas tortas do herói ainda o aproximavam mais do nosso coração. Reparem no olho do Mané em qualquer vídeo desses que tem por aí. Era um olho doce, cândido, bom e também meio torto, com um leve, um pungente, um lancinante estrabismo. Tolstoi se o conhecesse, dar-lhe-ia..

Os outros três: – Dar-lhe-ia, Ceguinho!?

João Sem Medo: – Com essa mesóclise vão acabar comparando você àquele outro que andou presidente.

Ceguinho Torcedor: – Ah, não, aí já é ofensa, João.

João Sem Medo: – Eu sei, eu sei, desculpe. Mas dar-lhe-ia o quê?

Garçom: – Dá-lhe, o quê?

Ceguinho Torcedor: – Perdão, senhores, mas eu sou um admirador das mesóclises, ainda mais nessas ocasiões. Tolstoi daria em Garrincha um beijo na testa, se o conhecesse. Mas como eu ia dizendo: o povo não gosta de herói bonito. E o Mané chegou mais depressa aos corações porque era, fisicamente, mal-acabado como o próprio povo.

Mané Garrincha (rindo, levanta-se e fala de sua mesa): – Que isso, seu Ceguinho. Papai aqui sempre foi bonitão!

Risada geral no bar Além da Imaginação.

Ceguinho Torcedor: – Tá certo, Mané. Mas você cheirava a povo, se vestia mal e calçava mal. Era o povo e só povo, por dentro e por fora do terno, nos sapatos e na alma. Repito: tão povo e tão Brasil.

Mané Garrincha: – Tão povo e tão Brasil sim. Isso eu sempre fui.

Garçom: – Tão povo, tão Brasil, tão genial. E pra novamente homenageá-lo, nada melhor que Elza Soares!

João Sem Medo: – Elza também, tão povo, tão Brasil, tão genial.

Elza vai ao palco levando Mané de mãos dadas. Ambos sobem ao palco aplaudidos de pé por todo mundo.

Elza Soares: – Muito obrigada, meu povo. Muito obrigada, João. Vamos começar cantar a “Alegria do Povo” que sempre foi e sempre será Mané.

Ele sorri pra ela, ela pra ele e Elza começa a cantar a música “Garrincha, a alegria do povo”, de Paulo Debétio e Paulinho Rezende, com acompanhamento da banda Além da Imaginação.

Todos aplaudem muito.

Elza Soares: – Obrigada. Obrigada. Agora, vou cantar aqui uma que foi composta pelo Mané. Aliás, vou cantar as duas que ele fez e eu gravei nos anos 60: “Receita de balanço” e, pra fechar, “Pé redondo”. Vamos lá!

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Um gol desse não se perde!

CANHOTINHA DE OURO

por Elso Venâncio

Gerson, um dos monstros sagrados do futebol brasileiro, comenta futebol hoje na Rádio Tupi, do Rio de Janeiro. Antes, passou pela Rádio Globo, depois que Washington Rodrigues aceitou o convite de Kleber Leite para ser o técnico do Flamengo em 1995, em pleno centenário do clube. Apolinho partiu depois para a Tupi, onde segue até hoje fazendo sucesso. A direção da Rádio Globo quis ter Zagallo, mas o ‘Garotinho’ José Carlos Araújo bateu o pé e o ‘Canhota’ acabou sendo contratado.

Passei a ancorar os jogos principais da cabine, ao lado do ‘Garotinho’, assim que deixei a reportagem esportiva. Comandava os debates antes da bola rolar, nos intervalos e ao fim dos jogos. Pude conviver de perto com dois grandes profissionais e, sobretudo, duas figuras humanas espetaculares: Gerson e Luiz Mendes, os comentaristas titulares. A audiência nas transmissões pelo rádio sempre sobe quando há polêmicas. Mendes, o ‘Comentarista da Palavra Fácil’, um gaúcho apaixonado pelo Grêmio e pelo Botafogo, de memória privilegiadíssima, era um verdadeiro ‘Google’ da época. E divergia, a meu pedido, das opiniões do Canhotinha:

“Gerson, eu discordo sempre de você, a pedido do Elso. Falei a verdade, tchê! Pronto!”

A gargalhada foi geral…

Durante os programas e jornadas eu vi Gerson se emocionar algumas vezes. No Dia das Mães era certo, com a família em foco. Ao ouvir a reprodução de seu gol contra a Itália, o segundo do Brasil na final da Copa de 1970, no México, na voz do locutor Waldir Amaral, o ‘indivíduo competente’ que o apelidou de ‘Canhotinha de Ouro do Futebol Brasileiro’, o ídolo chorava.

Numa tarde, em General Severiano, Didi, que chegou a jogar com Gerson no Botafogo após o bicampeonato no Chile, o aconselhou:

“Você tem que treinar lançamentos”.

Gerson se tornou o principal e talvez maior lançador da história do futebol. Numa excursão ao exterior, Didi, no campo, chamou Gerson:

“Canhotinha, está vendo aquele branquelo ali, o número 8 deles? Não deixa ele jogar. Cola nele!”

Bola rolando e Gerson reclama, aos gritos:

“Não dá… esse cara corre muito! Inverte comigo.”

“Eu, não. Você é garoto!”, retrucou Didi, o inventor da ‘Folha Seca’ e autor do primeiro gol do Maracanã. Os dois ícones da bola contavam histórias e passavam ensinamentos no ‘Enquanto a Bola Não Rola’, programa de debates aos domingos na Rádio Globo. Gerson ficava de pé quando cumprimentava o seu mestre, mas o provocava:

“Esse aqui deu trabalho… gostava da noite, de uma esbórnia.”

Didi ria de forma contida e mudava logo de assunto.

Certa vez, com Ronaldo Fenômeno no estúdio, Didi o aconselhou:

“Faz um dois… assim, você foge das pancadas.”

Há poucos dias eu presenciei o diálogo de dois tricampeões. Estava com Paulo Cézar Caju e o telefone dele tocou. Era Rivellino, alegre e descontraído:

“PC, liguei para o ‘Papagaio’ (outro apelido de Gerson) e falei que ele está ridículo dançando nas redes sociais.”

“Orelha, vai tomar no …” – a resposta chegou fulminante.

Gênios do futebol e bons amigos, com muitas histórias e títulos em Copas do Mundo, no tempo em que o futebol brasileiro era protagonista, respeitado e temido.

Teremos amistosos esse mês, contra a Inglaterra, em Wembley, e a Espanha, no Santiago Bernabeu. Na onda das Bets, você apostaria em vitórias dos comandados do técnico Dorival Júnior?

CONTRA FOTOS NÃO HÁ ARGUMENTOS

por Zé Roberto Padilha

Qual jogador de futebol conseguiria, hoje, saltar mais de um metro e ter o tempo da bola para alcançá-la no terceiro andar?

Pelé foi um atleta quando todos eram jogadores de futebol. Tinha uma musculatura forte, natural, que lhe concedia força e velocidade, e que só artificialmente ficou à disposição dos nossos jogadores a partir de 1974.

A Alemanha, campeã mundial, introduziu o futebol força e seu feito saiu distribuindo máquinas Apolo e Gladiador por todo o mundo. Quando elas chegaram, Pelé se despediu.

Quando respondo para meus filhos e netos quem foi Pelé, porque ele foi considerado o Rei do Futebol, sempre cito como exemplo um adulto jogando bola entre as crianças.

Os zagueiros batiam nele e caíam. A velocidade era de um Mitsubshi fazendo 100 metros em 0,5 segundos contra 50 segundos, de uma Kombi, dos que ousavam tentar acompanhá-lo. Seus chutes, com os dois pés, furavam as redes. Tiveram que reforçá-las.

Suas fibras fortes, herança dos seus ancestrais, não foram alcançadas no sedentarismo da Casa Grande, mas na capoeira, nas estratégias de fugas contra a opressão dos que viviam nas Senzalas.

Um gênio que surgiu fora do seu tempo. Depois dele, alguns súditos fizeram bonito. Dentro do seu próprio tempo. Nada que se aproximasse de sua genialidade.

Por isso, Pelé será eterno.

NADA IRÁ SUBSTITUIR JOEL SANTANA

por Zé Roberto Padilha

“O médico que trabalha com IA tem inúmeras vantagens. Ele é um médico melhor. A IA pode ler os exames trazidos pelo paciente e entregar ao médico uma leitura imediata sobre os dados que quer saber.”

Quem disse isso é o presidente do Hospital Albert Einstein, Sidney Klajner, em O Globo.

“Imagine um sistema que pensa mais rápido e com mais dados do que o cérebro humano consegue fazer. Mesmo que o médico passe no quarto a cada duas horas, nada poderá lhe abastecer mais do que milhares de dados dos que passaram por todos os quartos”.

Confesso que estou com medo do futebol levar a campo um treinador IA. Simplesmente, ela vai mostrar ao estudioso e inovador um algoritmo baseado em centenas de situações parecidas. O que não falta serão opções das mexidas feitas, em situações parecidas, pelo Muricy, Zagallo, Vanderlei e Mano Menezes.

Só que o futebol, ao contrário da medicina, não tem lógica. Aqueles comentaristas que vivem a criticar o centroavante tricolor por não pegar na bola, entram pelo Cano quando ele aparece e decide.

Nem a IA conseguirá explicar o Cano.

Enfim, saudades do Joel Santana. Tinha uma prancheta, e na sua cabeça, algo peculiar, Carioca pra levar, Brasileiro pra dar um jeitinho. E no improviso, dava um jeito do Renato Gaúcho, no fim de uma decisão, completamente extenuado, ficar em campo até o fim em um Fla x Flu decisivo.

Sem Joel Santana e sua intuição de ex-jogador criado ao lado do Dé e Alcir, presença debochada no Bloco das Piranhas levados pelo Moisés, nenhum treinador IA ganharia um título em cima do Flamengo em 1995.

Que jogava pelo empate, com Romário voando um ano apos ser o cara do tetra, aos 43 minutos do segundo do tempo. E justo no ano do seu centenário.

A IA, pelo menos no futebol, jamais irá alcançar a Inteligência de JS. Porque jamais existirá algoritmo algum que consiga captar a magia de um felling.