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DUAS ESCOLAS, NENHUM COMANDO, POUCAS ESPERANÇAS

por Zé Roberto Padilha

Não sei por qual ótica analisaram Vasco X Fluminense, mas a que nos chamou a atenção foram suas posturas táticas distintas.

De um lado, um time experiente abusava da habilidade dos seus jogadores. Muitos já anexando os papéis para completar a justa aposentadoria, tocavam a bola com categoria no intuito de manter a sua posse.

Se a perdem, vão correr o que não podem para recuperá-la. A solução: esbravejar com o árbitro e dar um carrinho porque não deu para chegar antes para realizar a cobertura.

Ser ranzinza faz parte dessa transição.

Uma pena que Xerém não seja prioridade, seja exceção, na renovação tricolor. Logo são vendidos, poucos permanecem.

Do outro lado, um comandante experiente, francês, que cruzou o Atlântico para, igualmente, completar a aposentadoria, fazia a bola ganhar velocidade nos contra-ataques. Circulavam ao seu lado pernas e pulmões voluntários que não ganharam destaque na Copinha. Do contrário, tinham embarcado para a Europa, como o Coutinho.

Como mediador, um árbitro sem a experiência necessária para mediar o encontro dos que voltaram com aqueles que sobraram. Tinha que ser 0x0.

Tirando a Copa do Nordeste, a seriedade com que Bahia e Fortaleza estão tocando seus projetos, já passou da hora de repensar os rumos do futebol brasileiro. Lembra?

Estamos fora das Olimpíadas e ocupamos a sexta colocação nas eliminatórias da Copa. O que precisa acontecer mais para ser recompensado com gols os que, como eu, ficaram acordados até mais tarde?

UMA COISA JOGADA COM MÚSICA – CAPÍTULO 49

por Eduardo Lamas Neiva

Zé Ary aproveita a breve dispersão do público e uma pausa na resenha da mesa principal do bar Além da Imaginação após a execução de “Escola de Feola” para pôr no aparelho de som “Brasil campeão do mundo”, de Aldemar Paiva e Nelson Ferreira, interpretada por Claudionor Germano, acompanhado por orquestra e o Coro Mocambo.

https://discografiabrasileira.com.br/fonograma/167575/brasil-campeao-do-mundo

Com o fim da execução de mais uma homenagem à seleção brasileira de 1958, Vicente Feola voltou a ser o tema da mesa.

João Sem Medo: – Em clube, Feola só dirigiu o São Paulo e o Boca Juniors, da Argentina.

Idiota da Objetividade: – Tudo indicava que Feola fosse o técnico na Copa de 62.

Garçom: – Garrincha ganhou aquela Copa pra gente, não foi?

João Sem Medo: – Pra começo de conversa, gosto de afirmar que se Garrincha fosse espanhol, a Espanha teria ganho o negócio. Se fosse inglês, naquele dia dos 3 a 1, nós teríamos entrado pelo cano para os ingleses. Mesmo contra o impetuoso, mas modesto Chile, se o Mané não mete aqueles dois logo de cara, confesso que não arriscaria nada. Se estou dando berro a favor de Mané Garrincha é porque jamais se pode admitir que lhe roubassem outra vez um título que, de justiça, já deveria ter lhe pertencido desde 58, quando entrou num time que vinha jogando mais ou menos, igual aos outros, e que depois da entrada do cobra no jogo contra a Rússia passou a ser uma máquina infernal. Viva Garrincha! Daqui a 400 anos, toda vez que falarem de futebol terão de falar de Mané Garrincha.

Ovacionado mais uma vez pelo público presente ao bar, Mané Garrincha se levanta e agradece mais uma vez a todos, em especial a João Sem Medo. Zé Ary aproveita a deixa.

Garçom: – Vamos aproveitar para homenagear mais uma vez Mané Garrincha, então?

Músico: – Claro que sim, como se vê todos concordam. Vamos chamar ao palco o grande saxofonista Luiz Americano, um mestre do nosso choro.

Luiz Americano vai ao palco aplaudido por todos.

Luiz Americano: – Obrigado! Se é pra enaltecer este grande gênio do nosso futebol, a música chama-se simplesmente “Garrincha”.

Músico: – E isso resume tudo, vocês vão ver. Ou melhor, ouvir.

O público no bar caiu na gargalhada com a maestria de Luiz Americano ao representar as risadas do povo com os dribles do Mané no saxofone. João Sem Medo, Ceguinho Torcedor e Sobrenatural de Almeida se levantam para aplaudi-lo de pé, juntamente com todos que estavam no Além da Imaginação. Uma epopeia!

Rindo muito, Garrincha vai ao palco e dá um abraço apertado no saxofonista.

Luiz Americano (emocionado): – Muito obrigado! Muito obrigado! Muito obrigado por tudo, Mané.

Ambos saem do palco abraçados como se fossem amigos de longa data. E a resenha volta a esquentar.

Ceguinho Torcedor: – A partir da vitória de 62 sumiram todos os imbecis, não havia mais um idiota nesta Terra. Passamos a ser 75 milhões de reis, até mesmo o bêbado tombado na sarjeta, com a cara enfiada no ralo, também era rei. Ninguém tinha dúvidas da vitória. E sofríamos porque há também a angústia da certeza. Amigos, nunca foi tão fácil ser profeta. Nós sentíamos o Bi, nós o apalpávamos, nós o farejávamos.

Sobrenatural de Almeida: – Tirei o Pelé de campo e da Copa contra a Tchecoslováquia pra provar que o Brasil podia vencer sem seu rei.

Ceguinho Torcedor: – Feliz o povo que, na vaga de um gênio, põe outro gênio. Amarildo, o Possesso, surgiu contra a Espanha e foi o novo Pelé proclamado. E Garrincha? Foi o gênio duplo do escrete. Era genial por si e por Pelé.

Garçom: – E pra cantar os nossos gênios da bola, só mesmo mais um gênio da nossa música. Jackson do Pandeiro, por favor, venha ao palco.

Sob aplausos, Jackson do Pandeiro se encaminha para o palco e, sem perder tempo, vai direto ao assunto com a banda.

Todos aplaudem muito.

Jackson do Pandeiro: – Este foi o “Frevo do bi”, composto por Braz Marques e Diógenes Bezerra. Muito obrigado, minha gente! Em especial o meu agradecimento vai pro Zé Ary, que se mostrou um grande dançarino.

Todos riem. E aplaudem.

Jackson do Pandeiro: – Só um esclarecimento: esta música foi feita e gravada antes da Copa de 62.

Garçom: – Ah, por isso a letra fala tanto do Pelé, que acabou jogando só duas partidas.

Jackson do Pandeiro: – Isso mesmo. Obrigado.

Jackson do Pandeiro sai do palco aplaudido de pé e se direciona à sua mesa.

Quer acompanhar a série “Uma coisa jogada com música” desde o início? O link de cada episódio já publicado você encontra aqui (é só clicar).

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Um gol desse não se perde!

QUANTO VALE A MARCA DO SEU TIME

por Idel Halfen

Recentemente foi publicado um estudo acerca dos valores das marcas dos principais times brasileiros, o qual teve uma razoável repercussão nas redes sociais, onde o filtro quase inexiste, e na imprensa, onde deveria existir, mas…

Antes de passarmos ao conceito de valuation, vale comentar que, por ser um mercado ainda pouco maduro, os eventuais resultados que podem se obter através das variadas metodologias, servem como meros instrumentos ilustrativos, os quais, talvez, possam se incorporar ao rol de indicadores “legais” para discussão de torcedores, tais como tamanho de torcida e número de seguidores, entre outros, mas que não se convertem diretamente em conquistas esportivas, tampouco abordam corretamente o conceito de branding.

Afinal, a marca de um clube vai ser precificada, na verdade, em função de quanto os investidores estarão dispostos a pagar e o “vendedor” a receber.

Mas deixando esse pragmatismo de lado, é necessário mencionar que existem vários métodos para se chegar ao valor de uma empresa. Ok, podemos estender, guardadas as devidas ressalvas, para times, porém, sem a pretensão de se encontrar resultados idênticos com metodologias diferentes.

Aliás, diante dessa usual divergência de valores é que recomendamos a utilização de mais de uma metodologia, até porque, muitas das vezes, uma complementa a outra.

Advém daí a minha crítica à imprensa em divulgar os valores como uma verdade absoluta, sem sequer mencionar as eventuais incongruências que os estudos podem apresentar, afinal, se houvesse tanta assertividade assim, não haveria nenhuma discussão acerca dos valores nas operações de M&A, nem haveria tantos rankings diversos sobre valor de marcas.

A título meramente de ilustrar as devidas opções de modelagens, vamos listar a seguir alguns métodos, pedindo adiantadamente desculpas caso o artigo pareça enveredar para o lado do “economês”. Por outro lado, utilizamos das mesmas escusas por simplificar algo que requer bastante detalhamento.

– Múltiplo EBITDA – aqui se calcula o valor em relação ao Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização), visando encontrar um multiplicador aceitável para as partes. Como grande parte dos clubes, especialmente no Brasil, não têm esse índice positivo, o método também sofre restrições, de forma que muitas das vezes, inclusive no caso de empresas, passa-se a utilizar o múltiplo sobre as receitas.

– Múltiplos de mercado P/L – mantendo o conceito de múltiplos, nesse método o cálculo se dá ao dividir o preço da ação pelo lucro por ação nos últimos doze meses. 

– Fluxo de Caixa Descontado – nessa metodologia se traz a valor presente os fluxos de caixa futuros, descontando uma taxa que reflita as perspectivas de mercado. O desafio do método é ter que assumir taxas de crescimento e de desconto.

– Transação Comparável – através dessa análise, se realiza um comparativo com outras empresas/clubes que foram recentemente vendidos.

– Valor Patrimonial – que calcula o valor da empresa/clube tomando como base os ativos líquidos. Aqui a imprecisão ganha maior proporção no caso de corporações com consideráveis valores de ativos intangíveis. Lembrando que, contabilmente, o jogador é classificado dessa forma.

– Método de Valor Residual, geralmente se usa essa metodologia como complemento à do fluxo de caixa descontado e consiste em se estabelecer um período e um valor residual ao final desse.

Por limitação de espaço e para não fugir muito ao objetivo do blog, não nos deteremos nos demais métodos, dentre os quais, citamos o de Lucros Excedentes e o de Opções Reais. A ideia aqui, é esclarecer que não há metodologias perfeitas, pois, dependerá da maturidade, da disponibilidade dos dados propiciados pela organização e pelo setor e, sobretudo, de quanto as partes estarão dispostas a pagar e receber.

A COLETIVA DE TITE

por Elso Venâncio

A confusa coletiva

Péris Ribeiro, o ‘biógrafo do Didi’, me pergunta se eu vi a coletiva do técnico Tite depois do jogo do Flamengo contra o Volta Redonda. Respondi que não, porque as entrevistas de hoje são cansativas, arrastadas e sem perguntas que esclareçam as dúvidas do torcedor.

Contudo, decidi olhar no YouTube.

“Preciso de tempo para ajustar a flutuação” – foi a primeira frase que ouvi. Imaginei que alguém perguntaria o que isso significa.

“Tite, aqui, aqui, nesse lado… estou aqui, sou desse veículo…”

De repente, identificaram o profissional. E ele disse:

“Parabéns pela vitória…”

???

Esperava um questionamento, até porque um elenco milionário não vem convencendo e sequer definiu seu time titular. Mas não, a indagação é sobre o melhor aproveitamento de jogadas no terço final de campo.

Tite, com ar professoral, olha para o filho que está ao lado e diz que esse assunto tático quem domina é ele. Portanto, gostaria de falar sobre o gramado:

“É inadmissível esse campo de jogo. Está uma vergonha o gramado do Maracanã”.

O filho interage:

“Lembra que estava ‘off’, não fala sobre jogadas no terço final do campo e que observou o mercado”.

Tite intercede:

“Off”. E desempregado.

Fiquei meio confuso, já que no Jornalismo “off” representa narrar um texto com a locução coberta por imagens, ou divulgar informação preservando as fontes.

Em suma, o tom professoral de Tite foi o ponto central da coletiva. A imprensa, ouvindo e nas perguntas, julgou importante não contestar o mestre que tem no currículo – apenas ele e Telê Santana, o maior técnico brasileiro – a graça de perder uma Copa e dirigir a seleção na seguinte.

Lembrei do João Saldanha, que escrevia nos jornais da forma que falava, com um linguajar popular que todos entendiam.

Alguém perguntou se Juan vai para a CBF e ele apontou para outrem:

“Você!”

Rapidamente, chegou o dirigente Bruno Spindel:

“Juan não me disse nada”.

Surge, então, Marcos Brás:

“Não sei de nada e farei de tudo para mantê-lo”.

Nosso futebol mudou mesmo. A entrevista com o técnico acontecia dez minutos após os jogos, com os repórteres se revezando ao lado de Zagallo, Telê, Felipão, Dunga, Wanderlei Luxemburgo, Evaristo de Macedo e tantos outros, dentro dos vestuários e com perguntas olho no olho. Radialistas e jornalistas cercavam os treinadores, que, às vezes, ficavam no chuveiro esfriando a cabeça e pensando no que falar ao dar as caras. Não havia assessores de imprensa, muito menos seguranças com olhares protetores ou ameaçadores. Não havia zona mista: o contato era direto com os ídolos, que em última análise falavam e davam explicações para os torcedores de seus clubes.

O futebol brasileiro não só perdeu os grandes talentos em campo, mas também os que havia fora deles. Incluindo dirigentes e treinadores.

Exemplo disso é a seleção pré-olímpica do Ramon Menezes, com o vexame histórico de ficar fora das Olimpíadas em Paris mesmo tendo talentos como Endrick e John Kennedy no time.

AGARRA, WENDELL!

por Paulo-Roberto Andel

Félix foi meu primeiro goleiro. Ouvi seu nome junto com Fluminense e decorei para sempre. Em geral, os garotos passam a torcer por seus times por causa da camisa, das bandeiras e do escudo. Eu, não: torci por causa do nome, da palavra, sem sequer ter visto escudo e bandeira. Fluminense é uma palavra amável. Só depois eu descobri o maravilhoso escudo, mais os lindos botões do Cracks da Pelotas, transparentes. Por fim, o lindo time de panelinhas brancas, apaixonante.

Vi Félix em campo algumas vezes. Toda hora me abraçavam e me levantavam. Eu nem gostava, mas o que um garoto de seis ou sete anos pode fazer diante do mundo? Aceitar. O motivo era nobre: o Fluminense fazia gols, gols e gols. Tinha um dos maiores times de todos os tempos, seu camisa 10 era Rivellino. Eu gostava mesmo era de comer cachorro quente no Maracanã, gostava das cores e da linda nuvem mágica de pó de arroz – estávamos todos no céu cantando as vitórias tricolores.

Depois Félix saiu e entrou Renato, também campeão, mas aí o novo goleiro teve um problema de coluna e o Fluminense contratou Wendell. Em 1977, o Flu já não tinha mais o melhor time do mundo, mas ainda contava com jogadores de alto nível. Ganhou a respeitada taca Teresa Herrera no exterior, mas não teve êxito local e nacional. Bom, os torcedores não ficavam desesperados porque tínhamos sido campeões em 1969, 1970, 1971, 1973, 1975 e 1976. Nada mal. Wendell, Edinho, Marinho Chagas, Pintinho, Cléber, Rivellino, Doval, Rubens Galaxe, era uma tremenda base. No banco, os efêmeros César “Maluco” e Dirceu Lopes (monstruoso, mas praticamente não jogou).

Jorge Curi berrava a plenos pulmões na Rádio Globo “AGAAARRAAAA, WENDELL!”. Waldyr Amaral, mais contido, tecia loas ao goleiro durante a narração. Eu, garoto, ouvia e via. Admirava. Wendell era grande, de gestos elegantes, nada espalhafatoso. Parecia sempre tranquilo. Era um goleiro, uma garantia, do mesmo jeito que o veterano Lessa era para Gilberto Gil quando compôs “Tradição”. Eu ouvia e via. Isso durou uns dois, quase três anos. Aos poucos aprendi que os jogadores iam embora, eu fui na despedida de Luiz Fumanchu, e aí chegou a vez de Wendell. Ele e Renato saíram, chegou a vez do jovem Paulo Goulart, que a torcida chamava carinhosamente de Paulinho.

Depois que Wendell foi para o Santa Cruz e mais tarde para o Guarani, é que entendi seu tamanho ainda muito maior do que eu pensava. Que teve tudo para ser titular na Copa do Mundo. Que fez jogos monstruosos pelo Botafogo. No meu olhar de criança, ele era só o grande goleiro do Fluminense, que merecia atenção e admiração a cada lance, jogando de verde ou cinza, trazendo segurança ao gol do Flu. Paulinho virou titular, pegou pênaltis espetaculares e ajudou o Fluminense a ganhar o grande título de 1980. Nós o adorávamos, mas eu nunca me esqueci de Wendell, por motivo justo: ė que os craques exercem fascínio permanente sobre as crianças torcedoras, mesmo quando não ganham um título considerado muito importante.

Em pleno meio de Carnaval, entre a folia, o descanso e certa melancolia, à espera do clássico com o Vasco, eu lembrei de Wendell. Lembrei de suas camisas, de sua elegância, de sua calma, de defesas espetaculares que pareciam simples, e aí me dei conta que só o futebol te transporta dos 55 anos para os 10 de vida num rompante, com justiça e verdade. Por isso, entendo perfeitamente as crianças enlouquecidas por Fábio: eu também fui assim, quando meu tempo era apenas um enorme futuro pela frente.

Agarra, Wendell! Ainda me lembro.

@pauloandel