NOS PERDOE, JOÃO PEREIRA LOPES, ODAIR GAMA, REMO RIGHI
por Zé Roberto Padilha
Seria fácil jogar apenas na conta da atual gestão a culpa pela devastação total do gramado (foto) de um dos clubes de futebol mais importantes do estado: o Entrerriense FC.
Não foram apenas eles, os gestores da vez, que construíram piscinas em casa. E deixaram de frequentá-lo e ainda levaram familiares e amigos para um mergulho cada vez menos social.
Muito menos os que afastaram os sócios que deixaram de comparecer às serestas. E deixarem no caixa do bar a garantia do pagamento das suas heroínas Heloisa e Vitória. Fora o 13* do Zé sem a qual o mato o cobriria.
Muito menos, foram eles que deram Playstation para seus filhos e os deixaram no quarto exercendo sua iniciação ao sedentarismo no lugar de os matricularem nas escolinhas de futebol.
O Entrerriense FC desabou debaixo do nosso teto é não conseguimos mantê-lo opulento e forte, disputando campeonatos e dando oportunidades de tantos garotos alcançarem seus sonhos, como nos deram um dia para alcançar os nossos.
Todos falhamos. E quando mais um Parque de Diversões parte, ele não deixa apenas crateras em um gramado em que nossos heróis Quarentinhas, Marianos e Traíras desfilaram sua arte. Escreveram, com uma bola de futebol nos pés e uma paixão no coração nas arquibancadas, parte da nossa preciosa história esportiva.
Ele deixa crateras em nossa porção cidadã, trirriense, pessoas de boa índole, trabalhadoras, honestas e, infelizmente, incapazes de honrar o patrimônio e a memória daqueles que tanto lutaram para erguê-lo.
Nunca será tarde para reerguê-lo. Desde que aceitemos que todos nós poderíamos ter feito um pouco mais por ele.
A PARTIDA PERFEITA
por Zé Roberto Padilha
O Estádio Rei Pelé, em Maceió, é um daqueles templos sagrados do futebol brasileiro que foram inaugurados durante o “Milagre econômico ” da década de 70. Quando você está jogando por lá a laje fecha sobre você e te engole, como no Mineirão, canalizando o eco da torcida para perto de onde você vai bater o corner. Como no Serra Dourada, no antigo Olímpico e no Maracanã.
De lá, bem longe, entre Bahia e Pernambuco, numa quarta-feira à noite, durante o Campeonato Brasileiro de 1978, jogando pelo Santa Cruz, contra o CRB, guardo uma das mais marcantes lembranças e lições da minha carreira como atleta profissional de futebol.
Em 17 anos com carteira assinada, foi ali que exibi talvez a única atuação perfeita com a bola nos pés. Qual desportista, ator, médico ou engenheiro não se lembra do dia em que acertou tudo durante a prática do seu ofício?
Naquela noite iluminada, em que Júpiter deve ter se entendido com Netuno, as cartas e os Búzios conspiraram a meu favor, devo ter errado apenas dois das centenas de passes que realizamos em média durante as partidas. Jogadas de linha de fundo? Em três das seis tentativas deixei o lateral para trás e acertei o cruzamento na cabeça do Nunes. No outro, para um voleio do Betinho e, pra fechar o placar de 3×0, um cruzamento certeiro para um peixinho fatal de Luiz Fumanchú.
Durante essa abençoada partida não corria. Voava. E enquanto saboreava minha própria atuação, pensava: mas por que justo ali, longe da grande mídia, tendo como testemunha apenas a Rádio Clube de Pernambuco e da Gazeta de Alagoas? Por que não no Maracanã em um daqueles Fla x Flu que joguei?
Se tivesse iluminado daquele jeito defendendo camisas pesadas, de empregos anteriores, certamente seria convocado para a seleção. Como aprendi a não discutir com o destino, e ele quis que fosse ali meu dia de Rivelino, que tal tentar uma bomba de fora da área?
Juro, arrisquei e a bola passou raspando a trave.
É impressionante o que pode alcançar a mente, jogava e pensava, uma vez desobstruída das limitações cotidianas que nós mesmos nos impomos.
Terminada a partida, parti para o vestiário como um atleta olímpico que alcançara um recorde e se preparava para subir ao pódio. Passei pelo meu treinador, Evaristo Macedo, que disse:
– Valeu, garoto!
Mas como valeu se eu nunca havia atuado antes daquele jeito?
E fui encontrando pelo caminho repórter alagoano, narrador pernambucano, jogadores adversários e me trataram como quem tivesse jogado uma partida qualquer.
Mal sabiam que havia treinado muito, evitado noitadas, cigarros e bebidas alcoólicas para um dia atingir a perfeição. E quando chego próximo dela, ninguém foi capaz de reconhecer. E se o meu máximo não causou a mínima atenção, entrei no vestiário bem arrasado.
Não tinha medalha, pódio, hino nacional, um abraço apertado e, muito menos, um Motorádio me aguardando. E quando me dirigi a balança na qual seu Amauri, um simpático funcionário do Santa Cruz, nos pesava, antes e depois das partidas, após conferir o que tinha perdido, ele me confidenciou baixinho:
– Que atuação, hein, Zé Roberto. Hoje, você foi perfeito!
Que alívio senti naquele instante. Não fiquei prosa ou mascarado, apenas feliz. E aliviado. Afinal, de que valeria a busca pela perfeição, em qualquer profissão, se quando a alcançamos, nem que seja por apenas 90 minutos, ninguém for capaz de perceber seu esforço e obstinação?
Depois dessa partida, até 1985, quando encerrei minha carreira no Bonsucesso, continuei a ser o Zé Roberto de sempre. Aplicado e determinado, nunca mais o Zico, um Rivelino, um Gerson, mestres que me concederam aulas com chuteiras ao meu lado.
Mas foi com seu Amauri que aprendi uma nova lição. E adotei um novo hábito.
Sempre que assisto de perto uma performance acima da média, e que me encante, faço questão de esperar o final da partida, da peça de teatro, do show do rapaz que fez o papel de Michael Jackson no Vivo Rio para lhe dar um abraço.
Só eu sei o que foi preciso para conseguir ser um dia perfeito no que fazia. E jamais me esqueci como a indiferença e o descaso são capazes de nos abater minutos depois de tal conquista.
MEMÓRIAS DO TORNEIO DOS CAMPEÕES EM 1982
por Paulo-Roberto Andel
Olha, eu gosto muito de futebol, muito mesmo. Gosto de jogar e de ver. Ir ao Maracanã é uma coisa muito boa, e está mais fácil porque meus pais agora me deixam vir sozinho, inclusive à noite. Só o passeio já valeria a pena: eu pego o 434 na Figueiredo Magalhães e faço uma viagem pelo Rio. É um percurso muito bonito que serve de roteiro turístico pela zona sul do Rio, o Centro e, logo depois, Praça da Bandeira e São Cristóvão até chegar ao maior estádio do mundo.
Praticamente todo o meu dinheiro eu gasto com futebol. Também não tenho muito, é a mesada que meu pai me dá. E também vou ao cinema. Só que o futebol é sagrado. Para poder ir a mais jogos, eu vou de geral que é bem mais barato, quase o preço da passagem de ônibus. Se estiver com tempo de chuva, aí a geral é certa, porque você aguenta o primeiro tempo e, no intervalo, o pessoal da Suderj abre uma escada que vai até a arquibancada.
Eu sou Fluminense desde que nasci, gosto demais do Fluzão, mas venho ver jogos de outros times. Já assisti Vasco, Botafogo, Flamengo, America e Bangu.
Não sei por que, mas uma coisa que eu gosto muito é de chegar ao Maracanã ainda vazio, bem silencioso. Esse silêncio me faz muito bem, é como se acalmasse tudo. Gosto de ver o campo, bem verdinho, mesmo quando tem alguns defeitos. Ah, e eu gosto também de me deitar na geral vazia e ficar olhando o céu. A cobertura de concreto do Maracanã faz o desenho de um círculo, o céu parece um disco voador, é muito bonito. Claro que o estádio cheio é maravilhoso também, mas eu gosto dele deserto. É um jeito diferente de ver.
Outra coisa ótima da geral: a gente pode jogar bola antes do jogo. Outro dia teve Vasco e Botafogo, então viemos com uns amigos da escola. A gente marcou o golzinho e ficou três para cada lado. Tinha o Luiz Cláudio, que é Flamengo, o Bolaman também. O Chico, vascaíno. Não me lembro se tínhamos um botafoguense na trupe. Nossa bola oficial, a Dente de Leite. Acho que foi num sábado à tarde.
Foi uma ótima ideia fazerem o Torneio dos Campeões. Vários jogos excelentes, tem Maracanã quase todo dia. Logo mais eu vou de novo pra ver Vasco e São Paulo. Sempre alguém me pergunta por que eu vou numa partida que não tem o meu time. É que futebol é bom demais. Só de subir a rampa e passar pelo tunelzinho da arquibancada, já é uma emoção enorme.
O Maracanã é grande, é gigante. Espero poder acompanhar o futebol pelo resto da vida. Toda vez que vou ao jogo, é como se eu continuasse um sonho que nunca termina. Há pouco, o Fluminense quase foi campeão brasileiro, mas deixamos escapar a vaga pro Grêmio de virada. Foi um jogão. Perdemos, paciência. A coisa não está fácil para o Flu, mas espero que em breve a gente tenha um time que possa ser campeão. Eu tenho fé que isso vai acontecer.
AS FINAIS DO CAMPEONATO BRASILEIRO DE 2000
por Luis Filipe Chateaubriand
No ano de 2000, o Campeonato Brasileiro foi substituído pela Copa João Havelange, devido a confusões que levaram o certame a ser jogado por centenas de clubes – eu chamava a competição de “Copa Centopeia – O Monstro de 116 Patas” – com esses clubes divididos em módulos.
Nas semifinais da competição, o Vasco da Gama suplantou o Cruzeiro e, com seu timaço espetacular, foi às finais.
Já o São Caetano, fenômeno da época, suplantou o Grêmio nas semifinais e, surpreendentemente, se classificou às finais.
Eis que Vasco da Gama X São Caetano foi uma final que não se esperava.
O primeiro jogo das finais foi realizado no Estádio Palestra Itália, em São Paulo, com mando de campo para o São Caetano.
O jogo terminou empatado em 1 x 1, com o primeiro gol para o São Caetano de César e o empate vascaíno com gol de Romário – ambos no primeiro tempo.
O segundo jogo das finais, no Estádio de São Januário, com mando de campo para o Vasco da Gama, não foi concluído, uma vez que o alambrado do local foi destruído, e várias pessoas foram arremessadas para o campo e se machucaram.
Assim, o segundo jogo das finais foi repetido, no Estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, com mando de campo para o Vasco da Gama.
O Vasco da Gama marcou com Juninho Pernambucano, Adãozinho empatou e Jorginho Paulista fez 2 x 1, ainda no primeiro tempo.
No segundo tempo, O insaciável Romário decretou o 3 x 1 final.
Pela quarta vez, o Vasco da Gama era campeão brasileiro!
“UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” – CAPÍTULO 58
por Eduardo Lamas Neiva
Após o encerramento da música de Douglas Germano houve um silêncio impactante. Porém, logo começaram a surgir aplausos e muitos elogios. Se houve também alguns descontentes, eles se calaram e se afastaram, ninguém viu, nem ouviu.
Houve depois uma certa dispersão, mas como a bola não pode parar na nossa resenha, Idiota da Objetividade logo se recordou de outra vitória brasileira sobre a Inglaterra.
Idiota da Objetividade: – Contra os ingleses, na casa deles, em Wembley, o Brasil só conseguiu ganhar pela primeira vez em 1981, por 1 a 0, com um gol de Zico.
Garçom: – Lembro bem. Foi o primeiro jogo da excursão à Europa, um ano antes da Copa da Espanha. Depois vencemos a França, por 3 a 1, com um show de bola no Parque dos Príncipes, em Paris, e a Alemanha Ocidental, de virada, por 2 a 1, com Valdir Perez pegando duas vezes pênalti cobrado pelo Breitner, e Cerezo e Júnior fazendo dois golaços.
Idiota da Objetividade: – Que boa memória, Zé Ary! Perfeita descrição dos fatos.
Garçom: – Vamos ver aquele gol?
Zé Ary põe o vídeo para rodar no telão o gol da primeira vitória brasileira sobre a Inglaterra, em Wembley.
Logo após a exibição do gol, muitos olham para Sócrates, que sorri com a lembrança daquela exibição contra a seleção inglesa.
Garçom: – Peço licença aos senhores, mas citar Zico sem ouvirmos uma homenagem musical ao Galinho seria um pecado, não acham?
Ceguinho Torcedor: – Um pecado capital!
Músico: – Aí vamos lembrar do grande vascaíno Paulinho da Viola.
Ceguinho Torcedor: – E por associação de ideias: Roberto Dinamite!
Músico: – Aliás, outro grande amigo de Zico, o Dinamite.
Garçom: – Em breve, o grande ídolo vascaíno estará aqui com a gente. Mas vamos ouvir no nosso sistema de som “Camisa 10 da Gávea”, do Jorge Ben, com a grande Maria Alcina.
Quase todo mundo dança e aplaude ao fim. João Sem Medo retoma a pelota.
João Sem Medo: – Merecidíssima homenagem ao Zico, mas queria voltar ao ano de 59, se me permitem. Além do show do Julinho Botelho, houve o Sul-Americano na Argentina também e a seleção brasileira disputou a competição como campeã do mundo. Mas o título ficou com os argentinos…
Sobrenatural de Almeida (rindo): – O árbitro apitou o fim do jogo quando o Garrincha faria o gol da vitória e do título para o Brasil.
De sua mesa, Mané se manifesta com um gesto indicando que a seleção foi roubada naquela final. E ganha o apoio de quase todo mundo presente.
Ceguinho Torcedor: – Nas três primeiras partidas, a atuação do Brasil foi uma espécie de naufrágio. E contra o Uruguai, antes da final, vencemos no pau e na bola.
Garçom: – Opa!
Todos riem
João Sem Medo: – Na porrada e na bola. Derrotamos os uruguaios por 3 a 1. Eles baixaram o sarrafo e os brasileiros não correram da briga.
Ceguinho Torcedor: – O salto de Didi foi prodigioso. Foi realmente um voo para castigar os uruguaios, que tinham baixado o pau. Batida no futebol, a ex-Celeste, que vive de passado como uma planta de Sol, partiu para a luta corporal. Amigos, foi um sururu de antologia. O brasileiro meteu o braço. E não só o braço: enfiou o pé, deu chute, rasteira, rabo de arraia. Paulinho atravessou o campo para caçar, do outro lado, três adversários que batiam covardemente em Chinesinho. O inimigo pôs sebo nas canelas e deu no pé. Porém, o momento mais artístico da pancadaria foi a monumental intervenção de Didi. Outro qualquer teria usado meios normais, tais como o tapa, o soco, o pescoção, ou a boa e salubre cabeçada brasileira. Didi foi além. Tomou distância e correu. Havia um bolo de uruguaios. E todo o estádio parou no espanto do salto, tão plástico, elástico, acrobático. Essa espantosa agilidade carioca deslumbrou o povo. Com os dois pés, fendeu e debandou o grupo inimigo. A plateia argentina quase pediu bis.
Risadas em todo bar Além da Imaginação. Sem avisar, Zé Ary põe no telão as imagens com os melhores lances e a pancadaria entre brasileiros e uruguaios, em 1959. Quando todos percebem ficam estáticos, atentos a cada detalhe.
Houve um burburinho, todos se voltaram para Didi que se manteve sério, apesar dos gracejos à sua volta. João Sem Medo pegou a bola e partiu em frente.
João Sem Medo: – Na final, contra a Argentina, o árbitro Carlos Robles nos roubou um gol do Garrincha no finzinho do jogo. Ou melhor, antes do fim.
Ceguinho Torcedor: – Ele só admitia contra os argentinos faltas não decisivas. E, no último minuto, excedeu-se a si mesmo. Vale a pena reconstituir o lance: – Garrincha apanha a bola e dispara. Os 120 mil argentinos gelaram. E Robles, o nosso Robles, caiu num pânico convulsivo. Ele percebeu que Garrincha faria o gol ou, pelo menos, reconheceu esse perigo evidentíssimo. Imaginem um gol brasileiro em cima da hora e Robles tendo de reconhecê-lo! Lá no campo do River Plate, que não tinha, para proteção dos visitantes, nem essa tela de arame que o mais franciscano galinheiro exige. Ele, que naturalmente, tem família, surrupiou uns bons três minutos e apitou, apitou histericamente. Ao mesmo tempo a bola estufava o barbante argentino. Amigos, o Robles assassinou o gol brasileiro!
O público do bar se alvoroçou e vaiou o árbitro como se lá estivesse. Zé Ary aproveitou a deixa e dominou o lance com categoria.
Garçom: – Que coisa, seu Ceguinho! Mas Juiz Ladrão também tem música, então vamos colocar aqui no nosso aparelho de som, “Juiz Ladrão”, de Maracai e Muniz Teixeira, na voz da grande dupla sertaneja Lourenço e Lourival. Vamos lá, turma. Quem quiser pode dançar.
Muita gente, incluindo Garrincha e Didi, continuou a comentar sem elogios a atuação do árbitro chileno, mas logo caiu na festa promovida pela música.
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Um gol desse não se perde!