O CALVÁRIO SENTIMENTAL DE FERNANDO DINIZ E OS CORAÇÕES EM FUGA NO MORUMBI
por Marcelo Mendez
Foi um 5×1 inapelável!
Isso está posto, nada a contestar, sequer uma vírgula a ser revista, o São Paulo levou um impiedoso couro do Internacional ontem no Morumbi. Falar taticamente do que houve? Desnecessário a partir do momento em que o tricolor desmanchou em campo na segunda etapa e daí nada mais precisa ser explanado nessa seara. O que fica para ser comentado aqui, portanto?
O lado humano da coisa.
Amigo leitor do Museu da Pelada que aqui me acompanha, eu tenho dito sim há tempos que Fernando Diniz é uma das melhores coisas que aconteceu das quatro linhas pra fora do futebol Brasileiro. Trata-se de um homem completamente apaixonado pelo que faz, estudioso que dedica sua vida para o trabalho do futebol e que se preocupa sim, muito, com as novas questões táticas, com as novas ferramentas de trabalho do futebol, mas especialmente com o lado humano do jogo de bola. Daí eu lamentar profundamente o que aconteceu com o São Paulo e com ele, nosso professor em questão.
Fernando Diniz falhou no lado humano da coisa. Mas não falhou sozinho. Vejamos porque:
Todo mundo viu o episódio que teve entre Diniz e Tche Tche em Bragança Paulista. O técnico, sem o menor cuidado com fato de ter um microfone aberto a seu lado, estádio vazio e televisão ao vivo, desceu uns impropérios contra o jogador que visivelmente ficou abalado. Está claro que houve um excesso. Tanto que o próprio Diniz correu atrás de rever sua atitude. Daí vem o nosso lado aqui da imprensa.
É impressionante o quanto o boleirismo se fecha para entender as mudanças que acontecem no futebol. Óbvio que por um tempo, algumas coisas eram dos usos e costumes do ludopédio. Todavia, a sociedade evolui. Situações que eram aceitas, hoje não são cabíveis. Temos uma série de mudanças, a vida é outra e para que se entenda, os jogadores que hoje atuam em sua grande maioria, são nascidos na segunda metade dos anos 80, ou seja; Estamos lidando com outro tipo de ser humano, com outra geração de profissionais do esporte que entendem essa prática de uma outra maneira.
O jogador de 2021 sente a partida, diferente do que sentia um jogador dos anos 90, ou anos 70 e por aí vai. Essa conclusão é óbvia e me entristece profundamente que Fernando Diniz não tenha entendido isso. Não, não entendeu.
A partir do que aconteceu em Bragança, o Técnico, Psicólogo formado, perdeu o comando de sua equipe, porque ali ele promoveu uma quebra de confiança entre ele e seus comandados. Não resolveu no vestiário a questão como deveria e, daí então, o São Paulo descamba morro abaixo rotundamente. Temos várias rodadas pela frente, restam muitos jogos pra serem disputados e tudo pode acontecer, lógico que o São Paulo pode voltar pra ponta da tabela. Mas a casa precisa ser arrumada e quem tem que fazer isso é Fernando Diniz. Espero que faça corretamente.
Você sabe como, Diniz. Você sabe.
BALANÇO NEGATIVO EXPÕE DECADÊNCIA DO FUTEBOL DO RJ
por André Luiz Pereira Nunes
Podemos dizer, sem sombra de dúvida, que a fase atual tem sido extremamente ruim para o futebol fluminense. O Botafogo caminha a passos largos em direção ao rebaixamento e, provavelmente, terá o Vasco em sua companhia. O Flamengo, apesar do elenco caro e experiente, não conseguiu reeditar seus melhores dias sob o comando de Jorge Jesus. Após a saída do técnico lusitano, o time rubro-negro nunca mais se encontrou. Já o Fluminense resolveu apostar na estrela do veterano Fred, o qual visivelmente já não apresenta mais a mesma qualidade, assim como Paulo Henrique Ganso, a maior aposta que resultou em decepção dos últimos tempos do futebol brasileiro.
Se analisarmos as demais divisões, também constataremos que o futebol do Rio nada promoveu de relevante no ano passado. Na Série B não contamos atualmente com nenhum representante, fato este que deverá mudar, visto que Vasco e Botafogo devem tornar-se seus novos integrantes. Ainda é preciso ressaltar que nenhuma agremiação do estado ascendeu ao segundo escalão nacional. A única possibilidade seria com o Volta Redonda, solitário representante na Série C. Contudo, infelizmente em nenhum momento, o Voltaço esteve perto dessa façanha. Muito pelo contrário. Durante a disputa do campeonato chegou a flertar com o rebaixamento à Série D. A sua campanha irregular desanimou bastante seus torcedores.
Em se tratando de Série D, o último patamar do Campeonato Brasileiro, não há mesmo motivos para nos orgulharmos. A Cabofriense foi a única a se classificar para a segunda fase do certame e lá mesmo foi eliminada no mata-mata pelo São Luiz, de Ijuí. Os outros representantes, Portuguesa e Bangu, fizeram campanha verdadeiramente medíocre, o que é lamentável, sobretudo em se tratando do alvirrubro da zona oeste, vice-campeão em 1985. Chego a imaginar que disputaram a competição sem nenhum tipo de ambição, desejando a tal sonhada e precoce eliminação.
O panorama é deveras desalentador para um estado que sempre esteve na liderança e na vanguarda do futebol brasileiro. Não tem nem muito tempo, Macaé e Duque de Caxias tiveram passagens, ainda que curtas, pela Série B nacional. Hoje amargam uma espécie de limbo sem esperança de saída.
Os motivos para essa agonia são inúmeros, entre os quais, a falta de investimento nas categorias de base e a queda da receita do petróleo que alimentava as pequenas prefeituras que, por sua vez, bancavam os times de médio porte do interior. Já a falta de alternância no comando da Federação é algo que também precisa ser enumerado. É fato notório que o futebol fluminense precisa mudar, pois a estrutura reinante já não mais atende sequer às menores necessidades.
Dos quatro promovidos à Série C, dois são paulistas: Novorizontino e Mirassol. Representantes de um estado que decidirá o título da Copa Libertadores da América. Precisa dizer mais?
Se nada for feito em curto prazo, provavelmente esse cenário piorará bastante nos próximos anos. Principalmente, a partir do iminente descenso de Botafogo e Vasco, fato que não está nada longe de acontecer.
DEUS CASTIGA A QUEM O CRAQUE FUSTIGA
por Luis Filipe Chateaubriand
A grande máxima de Armando Nogueira, reproduzida no título deste texto, parecia fazer todo sentido naquela tarde de domingo do início de 1986.
Jogaram Flamengo e Fluminense, um Fla x Flu, pela primeira rodada do Campeonato Carioca.
O Flamengo formou com: Cantarele, Jorginho, Leandro, Mozer e Adalberto; Andrade, Sócrates e Zico; Bebeto, Chiquinho e Adílio.
O Fluminense formou com: Paulo Vítor; Alexandre Torres (Renato), Vica, Ricardo Gomes e Branco; Jandir, Leomir e Renê; Romerito, Gallo (Édson) e Tato.
O jogo marcava a estreia de Sócrates pelo rubro-negro. Mas o destaque da peleja seria outro…
Antes do início do jogo, a torcida do Fluminense pega no pé de Zico, voltando depois de meses de afastamento, devido a uma entrada criminosa no joelho que sofreu de um troglodita imbecil que jogava no Bangu.
A galera tricolor não perdoou e começou o coro: Bichado! Bichado! Bichado!
Como se diz no adágio popular, foram cutucar a onça com vara curta… Mordido pela “homenagem” do pó de arroz, Zico fez o maior jogo de sua vida!
Entre outras jogadas sensacionais que protagonizou no jogo, Zico criou as seguintes obras primas:
· Gol de cabeça, de peixinho, depois de cruzamento da esquerda – o primeiro.
· Gol de cobrança de falta perfeita, das melhores cobradas que vi na vida – o segundo.
· Gol de pênalti, cobrado com extrema categoria – o terceiro.
· Falta batida com absoluta perfeição, que explodiu no travessão de Paulo Vítor.
· Lançamento de bicicleta – isso mesmo, lançamento de bicicleta – para atacante companheiro.
· Toque de calcanhar dentro da área, para colocar Adalberto na cara do gol.
O Flamengo venceu o cotejo por 4 x 1. Apesar do placar ter sido elástico, foi jogo difícil, pois, embora o domínio do Flamengo tenha sido claro, a peleja permanecia empatada até quase 30 minutos do segundo tempo.
Ao fazer seu último gol no jogo, Zico se vira para a torcida tricolor e vaticina: “Bichado é a put… que pariu!”.
Como diz outro adágio popular, a vingança é um prato que se come frio.
Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!
GOLEADA PALMEIRENSE EM FAVOR DA CONVERSA DE BOTEQUIM
por Marcelo Mendez
Houve uma noite em 1986…
No Morumbi lotado, o Palmeiras martelava e amassava o Corinthians.
Carlos, o goleiro, pegava bolas e mais bolas em defesas espetaculares e as coisas não iam bem. Na antiga numerada inferior onde ficavam nos todos misturados, as esperanças iam ruindo até que chegamos ao ápice da coisa, aos 42 minutos do segundo tempo. Meu pai, puto com tudo, virou e me falou.
– Chega, vamos embora!
– O quê? Tá doido, Pai?? Ainda não acabou, não!!
– Vai acontecer o que vem acontecendo por esses 10 anos. Vamos…
Nesse momento, um corintiano ao lado que acompanhava a cena se meteu na história:
– Menino… Ouve seu Pai, vai ficar pra passar mais raiva? Vai assistir nossa festa?
– Marcelo… vamos!
– Espera, Pai…
– Cê vai ficar aí? Fica, eu tô indo!
Então vai, Pai! Vá pra porra! O senhor é palmeirense porra nenhuma! Vai embora, eu me viro!
Após a gente quebrar o pau, o Velho virou as costas e foi indo embora. Eu tinha 16 anos de idade em 1986. Na ocasião, num tinha uma moeda no bolso e quando meu pai começou a ir embora, eu nem pensei em nada. O corintiano do meu lado se meteu de novo:
– Garoto, melhor você ir embora, hein? Ah lá… faz como seu Pai que aqui o Coringão já levou…
Nesse momento, Jorginho se encaminhou para bater uma falta. Bola na área, Vagner Bacharel cabeceia, o goleiro Carlos espalma e a bola acha a barriga, as pernas e tudo de Mirandinha, que a empurra como dá para o fundo das redes.
GOOOOOOOOOOOLLLLLL!!!!!
Eu já gritei vários gols na vida. Mas eu duvido que algum deles tenha tido a força que teve aquele berro na cara do corintiano desenxabido ali na minha frente. Eu o peguei pela camisa e gritava… “Golllllllll”. Meu pai que estava indo embora voltou e quando vi estava meio que me abraçando, meio que me tirando em cima do corintiano, a quem eu agarrava pelo colarinho:
– Vai embora o caralho!!!
Passou todo esse tempo.
Eu devo admitir que não sou mais o mesmo torcedor que fui aos 16 anos. Tenho quase 50, sou Jornalista há 27 e cubro futebol há 22 anos. Evidentemente, muito daquela chama pelo time que se torce não arde mais com o mesmo fogo intenso da paixão. Mas eu sei o que é sentir isso.
Por conta de saber de como as coisas funcionam, hoje não vou vir aqui pra falar do esquema tático, de como jogou o Palmeiras, de como não jogou o Corinthians, isso não importa para o torcedor que venceu por 4×0, muito menos para o que perdeu por 4×0. Hoje é dia de deixar o torcedor tirar a sua onda e que cada um viva esse derbi como quiser. O futebol precisa disso:
Que o torcedor seja pleno na sua conversa de botequim.
A ARTE LEVOU VERMELHO
::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Existem algumas teclas do piano do futebol que já devem estar gastas de tanto que eu toco, mas repetirei quantas vezes forem necessárias porque não dá para ouvir certas coisas e ficar calado. Ontem, por exemplo, em mais uma atuação desastrosa do Botafogo, o “professor” Eduardo Barroca advertiu um jogador, não lembro qual, por ele ter dado um passe de efeito. Quem entende de futebol, na prática e não apenas na teoria, sabe que não foi uma firula, mas recurso.
Não sei, sinceramente, se Barroca já jogou na várzea, na praia, em quadras de cimento ou no paralelepípedo, mas sei que vários treinadores do futebol brasileiro nunca chutaram uma bola na vida. Ficam berrando à beira do campo: “ataca a bola!”, “ataca o espaço!”. E os comentaristas, que também nunca assinaram uma súmula, nos metralham com uma série de “quebra a bola”, “quebra a linha”, uma chatice. Os ex-jogadores que hoje analisam os jogos rezam a cartilha de algum cursinho e transformam as transmissões em um programa intragável.
Imaginem um técnico reclamando com Rivellino no momento em que ele aplicou o cinematográfico elástico em Alcir. A ousadia não pode ser censurada. Lembram do cruzamento de letra do Léo Lima? Se não fosse o improviso a bicicleta jamais teria sido inventada por Leônidas. E a folha seca de Didi? A arte e a rebeldia devem conviver em harmonia no futebol. Loco Abreu foi irresponsável quando arriscou cavadinhas em final de campeonato e até em Copa do Mundo? Para mim, foi um artista em dia de pura inspiração.
Já fiz embaixadinhas em frente ao Zé Dias, do Vasco, gol olímpico em Raul e deixei descadeirado muitos xerifões. E na final de uma Libertadores quando Joãozinho bateu uma falta furando a fila de Nelinho? E as “firulas” do genial Ronaldinho Gaúcho e a coleção de canetas de Fenômeno? Pedir para atacar a bola seria a mesma coisa que exigir de Zico um pancadão na cobrança de falta. Cesar Maluco certa vez, fez um gol, escalou o alambrado, pegou o copo de cerveja de um torcedor, bebeu e voltou ao campo. A galera endoidava!
Bira Burro fez um gol e foi abraçar Dadá Maravilha, seu adversário, tudo por conta de uma aposta. Hoje, o jogador corre para comemorar com a torcida e recebe cartão amarelo. Infelizmente, a arte, o improviso e a rebeldia levaram cartão vermelho e os treinadores viraram fiscais que ficam “na beirinha do campo” reprimindo os artistas e premiando os cavalos corredores e os cães de guarda.