FORAM TANTAS AS EMOÇÕES
por Zé Roberto Padilha

Fiz as contas. A última vez que a vesti, tinha 19 anos. E lá se foram 54 anos e ela se encontra bem mais conservada que seu dono. Também, guardada a sete chaves, três ou quatro saídas para nossas palestras, duas temporadas nos cofres da Caixa Econômica Federal…
O ano em que conquistei sua posse e guarda, 1971, tinha 19 anos. E era ponta-esquerda do time Sub-20 do Fluminense, campeão carioca de 1970.
Após o sucesso alcançado mundialmente pela conquista do tricampeonato, a CBD recebeu um convite da FIFA para, pela primeira vez, participar de uma competição nas divisões de base.
O treinador convidado, Antôninho, pegou a nossa base. Nielsen Elias, Rubens Galaxe, Abel Braga, Marinho, Marco Aurélio e eu, acrescentou um zagueiro, Mário, do São Paulo, um meia-esquerda, Ângelo, do Atlético-MG, e fechou com Jorginho Carvoeiro, Vasco, Nilson Dias, Botafogo, e Clayton, Santos.
No segundo tempo, Enéias, da Portuguesa, entrava para dirimir qualquer dúvida.
Vai perder de quem? E ganhamos invictos o primeiro Torneio de Cannes, ao vencer, na final, a França, com Lacombe e Girése, por 2×0.
E a guarda dessa camisa foi redobrada quando uma Pesquisa da Revista Times, publicada em O Globo, a elegeu como a camisa mais bonita de todos os tempos. Foram usadas por Pelé e Cia. um ano antes e a CBD, então pobre toda vida, guardou um lote pra gente.
As razões alegadas: a primeira Copa do Mundo em cores e o verde amarelo das camisas, o azul dos shorts e o branco das meias se colou ao imaginário dos amantes do futebol em todo o mundo.
Confeccionadas pela Athleta, escudo costurado às mãos, daqui a pouco vai voltar para o esconderijo. Mas, apesar de entrar com dificuldades, pois naquela época não bebia um chope da Brahma, um vinho na faixa dos 55 reais, foi muito bom vesti-la.
Afinal, não é todo dia que você reencontra o manto sagrado que lhe tornou um campeão mundial.
ABC E O RISCO DA QUEDA
por Rubens Lemos

Os torcedores do ABC, mesmo os dissimulados, não conseguem esquecer o medo do rebaixamento da Série C para a Série D. O ABC tem um dos piores times de sua existência e o retrospecto de 2025 provoca arrepios numa mesa de mármore.
Desde as eleições, o ABC vive um cenário triste de derrotas, todas elas com o carimbo da gestão comandada por Eduardo (Dudu) Machado.
O ABC perdeu a Copa do Nordeste para o Maracanã Maracanaú, do segundo escalão do futebol cearense, a Copa do Brasil para o Olaria, que nem entre os pequenos do Rio de Janeiro pode ser incluído, é uma farandola. Depois, o campeonato estadual para o América aos 45 minutos do segundo tempo.
A atual chapa de comandantes do ABC demonizou a gestão do ex-presidente Bira Marques, fechou acordo com as torcidas organizadas e parece estar colhendo os frutos bem antes do que o previsto. Baixo astral total.
Os jogadores contratados têm muita bossa e pouca bola. O tal Anderson Rosa, trazido para solucionar todos os problemas criativos do time não passou até agora de um rebolado contumaz, dando toquinhos infrutíferos tentando um efeito que dele está bem distante.
Já vi crises terríveis no ABC. Em 1982, formaram um misto de ex-juvenis com o Negão Alberi aos 37 anos e o resultado foi o fiasco total, incluída no péssimo boletim uma derrota de 3×0 para o Clube Atlético Potiguar, tradicional saco de pancadas do Além Potengi. Naqueles dias, os titulares treinavam com surradas camisetas Hering e os reservas se preparavam com o peito nu.
O ABC também viveu tenebrosos dias em 1986 e 87, mesclando formações com veteraníssimos em fim de carreira como o ex-campeão mundial Jair, que jogou pelo internacional(RS) e o Peñarol(Uruguai) com jovens aspirantes a craque, como o meia Adalberto. Em 1986, o ABC não ficou sequer em segundo lugar e perdeu um seletivo para o América para participar da Série C do Brasileiro.
Em 1987 foi pior. O time trouxe Denô, ex-Sport que estreou numa derrota de 3×0 para o América e sem a menor condição física. Era comum ver abecedistas chorando na arquibancada do Castelão(Machadão). O América foi o campeão e o Baraúnas, o vice.
Em 1988, o ABC chegou à decisão com um time medíocre, cujo camisa 10 era o tosco Dica, ex-Riachuelo. Contraram dois times e, ao final, a prata da casa acabou titular e vice-campeão diante de 28 mil pessoas no Machadão avermelhado de festa.
O ABC erra desde o ano passado, é claro, mas a diretoria anterior sempre teve um foco: organizar as finanças, pagando dívidas consideradas gigantescas e evitando a perda judicial do Estádio Frasqueirão.
A campanha foi radical e Dudu Machado vendeu a ideia de modernidade visitando as instalações do Fortaleza e aproveitando um diretor de futebol ex-Corinthians. Um cartola que não acertou sequer uma das contratações. Mesmo assim, dispõe de todos os poderes para mandar e desmandar.
O rebaixamento é aquele fantasma que interrompe o sono e pode acontecer porque o clube perdeu a premiação da Copa do Nordeste e da Copa do Brasil, dinheiro que fatalmente resultaria em reforços de qualidade.
O melhor jogador do ABC atualmente é o meia Randerson, que veio sem maiores propagandas. Sem falar em Wallyson cuja simples presença física ainda preocupa os adversários. Wallyson fez muita falta na finalíssima do Estadual contra o América.
Correto seria desmontar em tempo recorde esse time sofrível, mandando embora pelo menos a metade dos atuais jogadores e trazendo quatro ou cinco nomes de reconhecida competência para tentar permanecer sempre entre os quatro primeiros da terceirona.
Dudu Machado parece acuado e sem grana para gastar em contratações. O torcedor, por sua vez, deve apostar nos tranquilizantes porque descer à Série D – onde já se encontra o América -, seria uma saída fúnebre para o time mais querido do Rio Grande do Norte.
SÓCRATES BRASILEIRO
por Elso Venâncio

Na década de 1980, com a liderança de Sócrates e outros jogadores politizados, como Casagrande, Wladimir e Zenon, surgiu a Democracia Corinthiana. Com o fim da era Vicente Matheus em 1982, Waldemar Pires assumiu a presidência do Corinthians e colocou o sociólogo Adilson Monteiro Alves como diretor de futebol. Adilson, com ideias avançadas, revolucionou a forma de administrar, viabilizando que os jogadores opinassem em todas as decisões: contratações, horário dos treinos, concentração, bicho, etc. Os atletas só não escalavam o time, tarefa essa do treinador.
O goleiro Leão, contratado no período da Democracia, reagiu: “Muita gente vota, mas só três decidem: Sócrates, Casagrande e Wladimir”.
Ao entrar em campo, o time levava uma faixa: “Ganhar ou Perder, mas sempre com democracia”. O Corinthians foi bicampeão paulista em 1981/1982, e o movimento ganhou corpo na luta contra a Ditadura Militar, influindo na volta da eleição direta para governador, em 1982. Nomes como Rita Lee, Washington Olivetto e Boni apoiavam publicamente as manifestações.
Um dos líderes da Democracia Corintiana, Sócrates nasceu em Belém/PA e cresceu em Ribeirão Preto/SP, onde estudou medicina e se tornou jogador profissional pelo Botafogo local. Após sua formatura, ele aceitou deixar cidade, sendo comprado pelo Corinthians por 350 mil dólares, numa das mais elevadas transações do futebol na época.
Durante a vitoriosa carreira, Sócrates jogou as Copas do Mundo de 1982 e 1986. Inclusive, foi capitão da famosa Seleção Brasileira de 1982, dirigida por Telê Santana. A equipe entrou para a história ao encantar o mundo na Copa da Espanha, mesmo derrotada nas quartas de final, por 3 a 2, pela Itália, no jogo conhecido como “A tragédia do Sarriá”. Nos clubes, além de Botafogo-SP e Corinthians, o Doutor vestiu também as camisas de Fiorentina, Flamengo e Santos. Ativista político, atuou com destaque nas Diretas Já, movimento para a retomada das eleições pelo voto popular para a presidência da República.
Sócrates sempre disse que queria morrer num domingo e com o Corinthians campeão, o que realmente aconteceu. No dia 4 de dezembro de 2011, o Timão venceu o Palmeiras por 1 a 0 e conquistou o Campeonato o Brasileiro. Na mesma data, o craque faleceu, com 57 anos, lutando contra o alcoolismo.
Após conquistar o Oscar com o filme “Ainda estou Aqui”, em março deste ano, o cineasta Walter Salles anunciou que vai dirigir o documentário “Sócrates Brasileiro”, em quatro episódios. Uma brilhante iniciativa para contar a trajetória do ídolo eterno do Corinthians e um dos maiores do futebol.
ELE VOLTOU!
por Zé Roberto Padilha

Tem horas, na vida de um jogador, diante de uma pesada carga de jogos, viagens e hotéis, que é preciso ter, como treinador, um das últimas espécimes do futebol arte.
E no lugar daquele enfadonho treino tático, interromper a rotina dos gladiadores que exigem o máximo desempenho, e ordenar: hoje vai ser uma pelada. E entregar dois jogos de coletes nas mãos dos jogadores.
E Renato Portaluppi, o mais carioca dos gaúchos, que jogou com Zico, Paulo César e Mário Sérgio, e foi campeão mundial, nacional e local, tem moral para pedir para trazer a arte de volta porque fez da bola seu pincel de Renoir.
Quem não jogou, nem imagina de onde o atleta tira tanta garra para lutar para vencer uma pelada. E olha que apostaram uma caixa num mundo em que ganham tanto quanto quem preside a Ambev.
E na segunda-feira, discípulo de Espinosa que foi, vai organizar um churrasco para unir o elenco. Poder levar a família, os filhos, e por aí iniciar a construção de uma nova família.
O vestiário, no futebol, acreditem, é construído na brasa, não com tijolinhos.
Enfim, nada como recuperar o prestígio, o carisma e o charme do futebol carioca trazendo de volta uma cria de Joel Santana. E que os portugueses, que pela segunda vez nos colonizaram, me perdoem.
Mas nessa praia, Maracanã, com o doce balanço a caminho do mar, o deboche, a ironia, as provocações, no Rio, da sutileza do amanhecer, quem melhor nos representa é Renato Gaúcho.
E a LDU que nos aguarde.
TRAGAM O SANTA CRUZ FC DE VOLTA
por Zé Roberto Padilha

Quando Elias Zacour, o empresário maior do futebol brasileiro, vendeu um pacote com 14 jogos na França. Grécia e Emirados Árabes, em 1979, para o Santa Cruz FC, nós tínhamos feito um grande campeonato brasileiro.
Chegamos às semifinais, mas ele nos negociou como campeões brasileiros. Como não tinha Internet, as informações, quando chegassem tão longe, já estaríamos de volta.
Joel Mendes, Carlos Alberto Barbosa, Lula Pereira (Alfredo Santos), Levir Culpi (Paranhos) e Pedrinho. Givanildo, Wilson Carrasco, Betinho, (Jadir) e Joãozinho. Luiz Fumanchu e Nunes (Volnei). Tecnico: Evaristo Macedo. Eu, contundido, viajei como intérprete.
Bicampeão pernambucano, um time inesquecível, alcançou, àquela época, ao fechar a excursão com um 2×2 diante do Paris St Germain, o recorde de invencibilidade alcançado por um time brasileiro, a Portuguesa de Desportos. Invicta por 11 jogos.
Nós ganhamos dez e empatamos quatro.
Já se vão 46 anos dessa histórica conquista. Está na hora do Mundão do Arruda voltar a se encher de gente e de orgulho por ter o seu time representado, com arte e dignidade, o país e conquistado a admiração por aqueles que amam o futebol pelo mundo.
Tragam o Santa Cruz FC de volta. Ele foi, e sempre será, um dos maiores clubes do futebol brasileiro.