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O ARTISTA QUE NOS UNIU

A história de um ídolo dentro e fora dos campos

 por Pedro Barcelos 


No dia 10 de julho de 1980, o Brasil perdia um de seus principais pintores, Francisco Rebolo. Porém, para além disto, o Corinthians perdia um de seus principais artistas. Nascido na Mooca, em 1902, Rebolo pode ser retratado de diversas formas, mas nós sempre iremos reverenciá-lo como o artista do escudo.

Ainda moleque, ouviu seus pais se queixarem da falta de grana em casa. A situação estava complicada. Pensando como poderia ajudá-los, não tardou a seguir uma carrocinha que passava pela rua enquanto jogava uma pelada. Foi com ela até seu destino final, crente que desta jornada conseguiria algum trampo que amenizasse a carência doméstica. Destinado, conseguiu assim seu primeiro trabalho: pintor de paredes.

Mesmo atarefado com os serviços recém-demandados, não deixou de jogar bola nas várzeas paulistanas. Na época, os clubes da Liga (de elite) e de várzea continham os mesmos jogadores. O homônimo corintiano, por exemplo, se chamava Botafogo, time formado por espanhóis da rua Santa Rosa (no Brás) que eram majoritariamente donos de armazéns de secos e molhados. O Paysandu jogava com o nome de Argentinos, na Rua do Glicério, que pela proximidade de casa, Rebolo acabou integrando. Após um tempo, Tobias, outro pintor de paredes, chamou Francisco para integrar o São Bento, que seria seu primeiro time da Liga. 

O ano de 1922 poderia ficar marcado para os artistas da época como o marco da arte modernista no Brasil, mas Rebolo nesta época era apenas um pintor de parede e seu foco artístico estava mais para o futebol. Seu ingresso no Corinthians, time que sempre torceu, aconteceu de forma curiosa. Contratado para pintar uma parede na sede do clube, Neco (jogador da seleção brasileira e um dos maiores ídolos da história do clube), reclamou: “Você vem aqui tirar o nosso dinheiro como pintor do salão e joga lá no São Bento?” A solução para o problema veio com o passe de Rebolo e o título do Campeonato Paulista daquele ano (Taça do Centenário da Independência), jogando de ponta-esquerda.


Sua passagem como atleta pelo seu time do coração não foi longa, durou apenas cinco temporadas. Após este período, ainda jogou no Ypiranga até se aposentar dos gramados. Porém, sua principal contribuição ao futebol ainda estava longe de acontecer.

Sua carreira de pintor de quadros decolava, sendo reconhecido cada dia mais como um dos principais artistas brasileiros. Junto com outras importantes figuras da época, criou o Grupo Santa Helena em seu ateliê na Praça da Sé. Era um grupo de artistas autodidatas notáveis. Prova disto, quando perguntado em uma exposição sobre se conhecia Cézanne, retrucou: “É corintiano? Mora em qual rua?”

Em 1936, finalizou aquela que seria uma das suas principais gravuras sobre futebol, estampando a capa do livro “O Negro no Futebol Brasileiro”, de Mario Filho. O autorretrato (ele vestindo branco e preto, óbvio) ganhou fama também por ilustrar um negro jogando futebol com as cores nacionais, algo ainda pouco recorrente na época. 


No entanto, foi em 1939 que seu nome ficaria para sempre marcado na história do Corinthians. Alguns dirigentes e amigos que ele mantinha no clube o procuraram para resolver uma questão: o clube agora também tinha equipe de regatas e o emblema do época não embarcava nesta novidade. Rebolo, então, pintou o escudo novo em toda a sede do Parque São Jorge.

O tempo passou e o clube deixou de ser apenas um coletivo de bairro para ter proporções mundiais. Após o pentacampeonato brasileiro, o escudo começou a ficar ofuscado pela quantidade de estrelas na camisa. Em 2011, o clube resolveu a questão com a seguinte nota: “Se título cada um tem o seu preferido, o emblema é único. É o belíssimo desenho de Rebolo que une todos os corintianos em torno de uma única paixão. É o escudo que nos protege dos adversários. É o distintivo que nos distingue dos outros. A camisa continuará com o escudo na altura do coração. Agora, até maior. E, do lado de dentro, no coração de cada um, continuará a brilhar a estrela preferida”.


No mesmo livro que Rebolo publicou sua gravura mais famosa sobre o esporte, Gilberto Freyre apresenta no prefácio uma famosa distinção entre o futebol-ciência (oriundo da Europa, com ênfase no jogo coletivo) e o futebol-arte (brasileiro, individualista, empírico). Esta diferença se acentuou com o tempo, ganhando relevância ainda mais notória após os três primeiros títulos mundiais brasileiros, porém, de todas as profecias possíveis para o futebol-arte, nenhuma consegue contemplar este personagem: pintor moderno, jogador ousado e desenhista do maior símbolo corintiano. Se falta arte para o nosso futebol contemporâneo, não falta história para as artes do passado.

Salve, Francisco Rebolo!

Salve o Corinthians!

QUEM É O CHEFE DO TITE?

por Elso Venancio


A Seleção não é do Tite. A Seleção é do torcedor brasileiro, que dia após dia demonstra cada vez menos interesse por ela.

Quem é o chefe do Tite? Será que na CBF alguém conversa com o técnico? Ou ele tem poderes absolutos para errar e seguir solenemente insistindo nos próprios erros?

Lembram a expectativa que era aguardar uma convocação? As ruas discutiam quem foi chamado e quem deixou de ir. Hoje o pessoal não está nem aí. Ver ou não a lista, parece que tanto faz.

Isso vale também para muitos clubes. O técnico se julga todo-poderoso, e não é. Tem que ser cobrado internamente. E olha que estamos passando por uma entressafra, melhor, estamos vivendo uma crise de treinadores. Renato Gaúcho e Cuca, que não saíram bem de seus últimos clubes, são hoje os destaques.

Agora, quanto à seleção… Daniel Alves, veja você, tem 38 anos. Thiago Silva, 36, assim como Miranda. Hulk está com 35. Parece até convocação da seleção de masters, aquela do “técnico” Luciano do Valle.

E os cadeiras cativas? Gabriel Jesus, Casemiro, Firmino e por aí vai. Gerson precisou ir para o exterior para ser chamado. Ainda bem. Mas, me explica… Bruno Henrique de fora???

Ricardo Teixeira pode ter os maiores defeitos do mundo, mas não se omitia. Lembro de viagens que fiz quando a amarelinha era comandada por Falcão e, depois, pelo Mano Menezes. Eles comentavam que era preciso renovar a Seleção. Ricardo era sempre o primeiro a ver a relação e, de certa forma, intimava – aliás, intimidava:

– Renova! Porque se chamar veteranos e perder dois jogos, eu demito. Se renovar, eu seguro.

TÍTULOS CARIOCAS ESQUECIDOS AGUARDAM RECONHECIMENTO POR PARTE DA FEDERAÇÃO

por André Luiz Pereira Nunes


.Engenho de Dentro mantém suas atividades no futsal carioca.

.Engenho de Dentro mantém suas atividades no futsal carioca.

A Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (FFERJ), na figura máxima de seu presidente, Dr. Rubens Lopes da Costa Filho, precisa ajustar as contas com a história do futebol carioca. Trata-se de uma questão urgente e necessária. Essa medida, por exemplo, já foi feita de maneira assertiva pela Federação Paulista de Futebol (FPF).

Em 1937, o São Cristóvão se sagrou campeão carioca pela Federação Metropolitana de Desportos (FMD). Esse título até hoje não foi reconhecido oficialmente por parte da Federação e, à pedido do Clube Cadete, elaboramos um dossiê, contendo documentos comprobatórios e provas irrefutáveis acerca dessa legitimidade. Para ajustar as contas com o passado, a entidade que rege o futebol fluminense precisa reconhecer e legitimar essa conquista.

Outro caso emblemático e, não menos importante, é o do Engenho de Dentro, campeão carioca, em 1925, pela Liga Metropolitana de Desportos Terrestres (LMDT). Apesar de não estar mais filiada, a agremiação suburbana do saudoso Mário Calderaro ainda mantém ativa a sua sede social, participando de torneios de futsal.


Prova da homologação do título carioca do São Cristóvão pela FMD

Prova da homologação do título carioca do São Cristóvão pela FMD

Graças a Marcelo e Ricardo Araújo, filhos do presidente Domingos, falecido em 2019, o Engenho de Dentro se encontra no rol dos clubes centenários. De acordo com eles, tudo seria mais fácil se o reconhecimento oficial da conquista do Campeonato Carioca, de 1925, e o da Subliga, de 1935, este último equivalente à segunda divisão, fossem, de fato, homologados.

— O Vasco é reconhecido por ter ganho o mesmo campeonato um ano antes. Há um campeão carioca em Engenho de Dentro que agoniza — lamentou Marcelo em entrevista recente ao jornal O Globo.

A FFERJ, até hoje, só reconheceu os certames realizados pela Liga Metropolitana entre 1917 e 1924 como legítimos Campeonatos Cariocas. De acordo com esse critério, quando o Vasco, o último grande, foi aceito na Associação Metropolitana de Esportes Atléticos (AMEA), as competições da LMDT passaram a ser estaduais não reconhecidos. Essa mera conveniência claramente não atende às demandas históricas.

Existem, portanto, sete campeões cariocas “esquecidos” e não reconhecidos: o mencionado Engenho de Dentro A.C, em 1925, o Modesto F.C., de Quintino, em 1926 e 1927, o S.C. América, de Lins de Vasconcelos, em 1928 e 1929, o Sportivo Santa Cruz, em 1930, o Oriente A.C., em 1931, e o S.C. Boa Vista, da Tijuca, em 1932, todos pela LMDT, além do São Cristóvão, em 1937, pela FMD.


Plantel do São Cristóvão, campeão carioca em 1937 pela FMD.

Plantel do São Cristóvão, campeão carioca em 1937 pela FMD.

As nove edições do Campeonato Carioca, que são completamente ignoradas, foram disputadas entre 1925 e 1932, na época do amadorismo, e em 1937, no caso específico do São Cristóvão, já na era profissional.

Infelizmente, dada a impossibilidade desses clubes clamarem por algo, à exceção do Engenho de Dentro e do São Cristóvão, pois todos foram extintos ou estão inativos, resta aos pesquisadores, jornalistas, historiadores e amantes do futebol requererem que a Federação faça as pazes com o passado do futebol carioca. A homologação dos títulos esquecidos é uma necessidade de ajuste com a história e com os feitos desses times.

HAJA PACIÊNCIA

:::::::: por Paulo Cézar Caju :::::::::


Talvez a letra “Paciência”, de Lenine, seja a que mais retrate esse longo período de pandemia enfrentado por todos nós. Um dos trechos diz: “enquanto todo mundo espera a cura do mal e a loucura finge que isso tudo é normal eu finjo ter paciência”. E é exatamente isso. Nessa última semana tive que buscar forças, o equilíbrio mental, para suportar as notícias sobre as internações de três amigos, praticamente irmãos, Marco Antônio e Jairzinho, parceiros de Copa 70, e meu compadre Búfalo Gil, da Máquina Tricolor. Todos vacinados, “protegidos” pela segunda dose, mas ainda não é o suficiente porque surgiu a variante Delta e sabe-se lá quantas outras surgirão.

“Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma, até quando o corpo pede um pouco mais de alma, a vida não para”. Sigo com a máscara e rezando por dias melhores. O futebol sempre distrai e é o meu companheiro de todas as horas. Assisti poucas partidas nos últimos dias, mas fui premiado pela belíssima vitória de 5×0 do Manchester City sobre o Arsenal. Sou fã do Manchester e do Guardiola, já falei mil vezes. Soube que o meu Botafogo venceu o Coritiba e o Vasco a Ponte Preta. Será que sobem?

Como se não bastasse esse vírus maldito ainda ter que aturar esses analistas de computador comentando é osso duro de roer. Nesse fim de semana, ouvi que o jogador driblou por dentro e saiu na contramão! Inter e Atlético-GO protagonizaram um show de horror, com mais de oitenta passes errados. Que vergonha! Assisti também Bragantino x Galo e ouvi que o time de Bragança tem a virtude de alargar o campo! É cada uma! O Bragantino é um de meus candidatos azarões ao título, o outro é o Fortaleza.

Decidi que vou torcer para tudo que surpreenda e nos tire desse marasmo futebolístico. O locutor diz que Hulk está de volta à seleção. Verde não deu certo, será que amadureceu? Diego Costa foi resgatado pelo Atlético e já já vira Rei em nossas terras, afinal todos que não deram certo na Europa, ou já deram o que tinham que dar por lá, dão as cartas por aqui. A verdade é que o nosso futebol segue descendo ladeira abaixo e até mesmo a turma da praia parou no tempo. Quem diria, perdemos para Suíça e Senegal. No vôlei, nas Olimpíadas, já havia sido assim e vimos a banda passar.

Ah, PC, mas os outros países evoluíram! Tá bom, e nós vamos continuar chupando dedo. No sofá, sozinho e pensando em meus amigos internados, vejo Savarino driblar um monte de gente. Ele é abusado! Me lembrei de Osni, Katinha, Manoel Maria, Edu, Eduardo, Joãozinho, Rogério, Cafuringa e Nilton Batata, nossos pontinhas do passado. Só falta o estádio cheio para exaltá-los. Na verdade, falta muita coisa. “Será que é tempo que lhe falta pra perceber? Será que temos esse tempo pra perder? E quem quer saber? A vida é tão rara. Tão rara”. Salve, Lenine! Salve a arte!

O DIA EM QUE DEIXEI DE SER TRICOLOR

por Zé Roberto Padilha


O telefone tocou das Laranjeiras. Quando isso acontece lá em casa, e não foram poucas às vezes, quem atende é o coração. De minha parte. E ele engole a razão, que vem da patroa, dos filhos e de quem mais tenha juízo.

Daqueles que sabem que não pagamos nossas contas com sonhos e idealismo. Mas com dinheiro.

Do outro lado da linha, Edinho, que assumia os profissionais do Fluminense, convidou-me para reassumir o juniores e ser seu auxiliar técnico nas finais contra o Vasco, pelo título do estadual carioca de 1993.

Após trabalhar em Xerém, nas divisões de base entre 1987 e 1991, voltara a Três Rios para ajudar na formação profissional das nossas equipes amadoras: o América FC e o Entrerriense FC.

Com a ajuda do supervisor tricolor, Paulo Alvarenga, estrutruramos os dois clubes, o Fluminense nos emprestou oito jogadores e ambos disputaram a primeira divisão em 1992. Algo inimaginável nos dias de hoje.

Mesmo assim, após uma derrota, fui demitido quando treinava o América. Depois disso, trabalhei na Distribuidora Brahma, com carteira assinada e sem depender de resultados para ter direito à estabilidade. E quando as contas se equilibraram, minha paixão falou mais alto e fui para uma nova aventura no futebol.

Parti debaixo de ressalvas coletivas. Nossos parentes sabem mais desse mundo sórdido do que nós, jogadores, treinadores, que somos reféns dessa cachaça. E das ressacas que nos provocam.

Ao mesmo tempo que disputava os dois jogos decisivos contra o Vasco, Edinho anunciava a imprensa que recebera uma proposta irrecusável do Marítimo, de Portugal, e que indicara meu nome para substituí-lo.

Todos os jornais estamparam minha foto como seu sucessor e o presidente do clube, Arnaldo Santiago, nem se manisfetara a respeito.

Tinha um Fiat Uno, mas na semana decisiva, conhecendo de onde buscam “valores” para ocupar o cargo, pedi emprestado o Santana zerado da minha irmã, que era o top de linha. Chegando com ele, não fiz feio diante do carro importado do Super Ézio.

O Vasco foi campeão e Edinho se despediu do clube e bateu nas minhas costas no vestiário:

– Agora é com você, amigo!

Sem ser anunciado oficialmente, perguntei ao supervisor dos profissionais, Roberto Alvarenga:

– O que faço?

Roberto disse: vem cedo dar o treino normalmente. Alguém precisa estar aqui. Fui pro hotel e nem dormi pensando na minha possível estreia no domingo, contra o Palmeiras, pelo Torneio Rio São Paulo.

Todos que nos antecederam no cargo, como Gilson Gênio, Rubens Galaxe, Sebastião Rocha, Gama, tiveram essa interinidade. Ocuparam a cadeira enquanto um Dorival Junior, Cuca, Celso Roth… vocês sabem!.


Cheguei cedinho ao clube e uma leva de jornalistas passou por mim. “Oi, Zé!” Tinha algo errado. Não era eu, caso contrário me cercariam. Ximbica, o roupeiro amigo, oito anos de clube como a gente, me chamou no canto do vestiário para nos consolar.

– O Nelsinho Rosa é muito amigo do Presidente! – disse.

– Mas por que não o anunciou? Deixou no ar meu nome, meus sonhos…

Enfim, fiz a viagem de volta mais triste da minha vid, mas ela era só aperitivo. Quando cheguei, Paulo Alvarenga ligou do Flu.

– Já soube, não é?

Eu respondi:

– Sim, mas ainda temos chances, afinal sou o treinador do juniores!

Ele retrucou:

– Não é mais. Nelsinho indicou o filho para treinar o junior. Você foi demitido!

Sabe aquele dia que você olha do alto da ponte e agradece o privilégio de ter tido os pais, tios, professores e avós que tive, nos ensinando o valor da vida?

Do Paulo Matheus, nosso psicólogo, que diz que precisamos ser os protagonistas da nossa própria história?

Pois é. A vida continuou. Foi apenas um dia em que deixei de ser tricolor por causa de uma gestão covarde, incapaz de assumir suas preferências à luz do dia. E que não estava à altura de dirigir nosso clube como eu estava preparado, naquela ocasião, para dirigir o Fluminense.

Era apenas uma gestão. O clube, e eu, somos maiores do que ela. E sobrevivemos.