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HAILTON, O GOLEIRO QUE NÃO QUERIA “BARREIRA”

por Kadu Braga

Haiton Corrêa de Arruda poderia passar despercebido como mais um “CPF” entre milhões de brasileiros que amam futebol e jogam pelos campinhos de terra batida ou pelas ruas, bem à moda antiga.

E foi num destes, em Pernambuco, onde tudo começou. Em campos de futebol que eram cercados por mangueiras, o goleiro tomou gosto pelo jogo e predileção especial pela fruta. Ele levava caixas de Manga ao treino, oferecia aos amigos de time e recebeu em troca o carinhoso apelido. Nascia então, o imortal Manga, um dos grandes goleiros da história do futebol brasileiro.

O craque iniciou sua trajetória no Sport-RE e ganhou destaque no Botafogo-RJ, sendo parte de um time emblemático atuando ao lado de Garrincha, Nilton Santos, Didi e cia entre 1959 e 1968, conquistando quatro campeonatos estaduais e três torneios Rio-São Paulo.

No Brasil defendeu ainda Coritiba (PR), Operário (MS), Grêmio e Internacional, em Porto Alegre, sendo, pelo colorado, bicampeão brasileiro e defendeu a seleção na Copa de 1966 na Inglaterra. Se tornou ídolo também no Nacional, do Uruguai, onde conquistou a Libertadores da América e o Mundial de Clubes.

O defensor tinha uma característica bastante peculiar em campo. Não gostava de usar luvas, joelheiras e costumava dispensar “barreira” para ajudar a defender as cobranças de falta. Tudo para ser mais participativo em campo e mostrar sua enorme autoconfiança. Também não gostava de ficar de fora por lesão.

Manga, sim, era um jogador que dava gosto de se ter no time. Sua valentia tinha a alma do verdadeiro futebol brasileiro e como justa homenagem à sua brilhante carreira sua data de nascimento se tornou o “dia do goleiro”.

Salve 26 de Abril!

OS CARAS DO TETRA

por Elso Venâncio

Romário (5) e Bebeto (3) fizeram 8 dos 11 gols marcados pela seleção na Copa de 1994

Na Copa dos Estados Unidos, em 1994, Bebeto e Romário eram os maiores atacantes do mundo. Romário jogava no Barcelona. Bebeto, no La Coruña.

Romário, eleito o número 1 do planeta, ficou com a fama de ter sido o responsável pela conquista. Assunto que, com toda razão, irrita Bebeto. Não só Romário fez gols decisivos. Bebeto também, além de ter dado passes geniais, precisos, imprimindo mais velocidade aos contra-ataques, em uma seleção que se preocupava bastante em se defender, por apostar no poder de decisão de seus dois goleadores.

Bebeto chegou a Gávea aos 18 anos, em fevereiro de 1983, comprado junto ao Vitória, da Bahia, e já como destaque na seleção brasileira de juniores. Aymoré Moreira, treinador bicampeão no Chile, em 1962, estava no Galícia:

– O Flamengo levou o Dida do passado e o Zico do futuro.

Por sua vez, Romário surgiu como uma máquina de fazer gols. Nos juniores do Vasco, por três anos consecutivos – 1982, 1983 e 1984 – foi o artilheiro do Campeonato Carioca. Juntos, Bebeto e Romário conquistaram a Copa América de 1989, no Brasil, após um jejum de 40 anos. Na semifinal, 2×0 na Argentina, com o marcante gol de veleio de Bebeto e outro de Romário, após driblar o goleiro campeão do mundo Pumpido. Nesse jogo, Romário deu assistência, no gol do Bebeto, fez o dele e ainda descadeirou Maradona com uma caneta.

Bebeto era o maior jogador do país e Maradona, o maior do mundo. Romário, o ‘Rei da Pequena Área’, fez o gol do título, na vitória de 1 a 0 sobre o Uruguai, jogo de Maracanã lotado e forra no Maracanazzo de 1950.

No Mundial de 1990, na Itália, Sebastião Lazaroni reuniu o grupo e avisou que duplas disputariam a posição no ataque. Exemplo: Müller e Careca, que jogaram juntos a Copa do México, em 1986; e Bebeto e Romário, que mostraram incrível simbiose um ano antes.

O técnico disse que buscaria um parceiro para Renato Gaúcho, o outro atacante convocado. Bebeto, normalmente calado, ergueu o braço:

– Professor, não entendi. O meu companheiro está manco.

Os jogadores caíram na gargalhada. Romário tinha fraturado o perônio jogando pelo PSV Eindhoven. Dr Lídio Toledo chegou a vetá-lo, mas Lazaroni bancou sua permanência.

Três anos depois, o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, diante do clamor popular, mandou Parreira convocar Romário. Müller, contundido, tinha sido cortado. O jogo com o Uruguai, válido pelas Eliminatórias, seria tenso, com o fantasma de 1950 novamente pairando pelo ar. Mesmo adversário, mesmo estádio e mesma vantagem, a do empate. Mas uma derrota tiraria o Brasil pela primeira vez de um Mundial.

Romário chegou de Barcelona na semana do jogo, foi direto para a Granja Comary, em Teresópolis, onde foi confirmado como titular ao lado de Bebeto.

Nessa partida, o Maracanã presenciou a maior atuação da carreira do Baixinho. Foi, sem sombra de dúvidas, uma das maiores exibições de um jogador com a camisa amarela. Romário fez os dois gols na vitória por 2×0, diante de mais de 148 mil pagantes, fora os tradicionais penetras.

Na Copa dos Estados Unidos, após 24 anos de jejum, vencemos novamente um Mundial, foi a conquista do tetracampeonato. O time: Taffarel, Jorginho, Aldair, Márcio Santos e Branco; Dunga, Mauro Silva, Mazinho e Zinho; Bebeto e Romário.

Trinta anos do Tetra? Nossa, como o tempo passou rápido…

HONRA AO CAPITÃO

por Rubens Lemos

Ninguém foi mais capitão do que Bellini, primeiro brasileiro a erguer uma taça do mundo. Nossa. Só nossa. Homem de porte, nobre de futebol valente. Um zagueiro, galã do seu tempo, antagonista estético do padrão boleiro. Estampa de elegância.

O gesto das duas mãos expondo o troféu e elevando à grandeza a pátria de chuteiras enfeitiçadas de talento, é a posteridade do futebol original, artístico e inimitável. Bellini suava o suor da glória e eternizou o gesto improvisado de segurar a Jules Rimet com as duas mãos e o sentimento guerreiro emocionado do infinito.

Sem o estilo monarca de um Didi, a malícia deliciosamente garrinchiana e a desnecessária adjetivação do garoto Pelé, dava o ar diplomata, quase de premier, à função tradicional das botinadas e trancos noss atacantes atrevidos. Ao espanador de virtudes.

Bellini, bem mais que o primeiro líder nacional a simbolizar o pontapé de um povo no complexo de vira-latas, de lambaio moral, foi o zagueiro do Vasco da Gama de verdade. Seu xerife, sua garantia, seu castelo inviolável.

Bellini traz a figura do meu vascaíno mais querido,. Seu fã aguerrido, disposto a brigar com quem duvidasse da garra e da liderança do seu ídolo. O meu pai escalava o time de 1956,que bateu o grandioso Real Madrid de Puskas, na euforia interiorana de criança ao pé do rádio, ruídos atrapalhando as transmissões na voz impactante do locutor Waldir Amaral:

– Carlos Alberto; Paulinho e Bellini; Laerte, Orlando e Coronel; Sabará, Livinho, Vavá Peito-de-Aço, Válter Marciano e Pinga.

O craque do meu pai era Válter Marciano, driblador que botou a constalação do Real Madrid no bolso na vitória por 4×3 que valeu o Torneio Internacional de Paris de 1957. Bellini, após expulsar Puskas e Di Stéfano da área, sublimou a consagração que viria no ano seguinte.

Foram 11 anos suando e sangrando por um clube que já nem existe mais na vida real. É somente fotografia amarelada de suas glórias e refugiado pela nostalgia. Bellini representava a coragem do almirantado da Cruz de Malta, hoje náufrago bombardeado pelos homens sem coração para cantar os versos do seu hino.

Há 30 anos, recolhido à aposentadoria e ao exílio crepuscular em São Paulo, desabafou indignado, por ter sido preterido de uma seleção dos melhores do Vasco de todos os tempos, feita pela Revista Placar. Começavam as injustiças de internet. Bellini perdeu para Ricardo Rocha, tricampeão carioca pelo Vasco e tetracampeão mundial pelo Brasil. Bellini protestou:

– O que fiz para merecer tanta desfeita? Eu fui tantas vezes campeão, ergui a Jules Rimet, o Vasco sempre foi a minha razão de viver e é assim que sou premiado na velhice?

Seria segunda decepção pública de Bellini. Em 1962, Mauro fez pressão sobre o técnico Aymoré Moreira, exigiu ser titular e capitão e o treinador cedeu.Aos jornalistas, lágrimas escorrendo de surpresa devastadora, pediu em prantos:

– Por favor, não me chamem mais de capitão!

Disciplinado como os militares de hierarquia e combate real, saiu bicampeão com uma medalha no peito e uma mágoa incurável. Hideraldo Luiz Bellini, paulista de Itapira, era maior que os escaninhos do futebol. Sujeira, bastidores nefastos.

Em 7 de junho de 1960, esteve em Natal, chamando a atençãoao pela simpatia natural, atendendo a todos os fãs e posando com mulheres hipnotizadas por sua beleza. Em campo, o Vasco arrasou o ABC por 6×2 no velho estádio Juvenal Lamartine e Bellini ficou impressionado ao levar um drible desconcertante do ídolo Jorginho Professor. Mas não apelou às pancadas.

Para a eternidade, ser capitão de campo tornou-se majestade instituída por Bellini, estátua em vida no Ex-Maracanã. O futebol brasileiro – desde 2014 com sua morte, está desfalcado em seu time titular da segurança e do seu caráter. Bellini significou vergonha na cara. Deveria ser em maiúsculo.

QUE FALTA LUCIANO DO VALLE NOS FAZ

por Zé Rober

to Padilha

Além de brilhante locutor, Luciano do Valle criou algo inédito no futebol brasileiro: a Seleção de Futebol Master. Jogadores que recebiam alta da profissão, como Diego, Fred e Filipe Luis, eram convocados para disputar amistosos pelo país onde sua arte, e idolatria, não saíam subitamente de cena.

Todo mundo saía ganhando. O torcedor, que tinha um bis dos seus ídolos, e estes, por sua vez, iam se acostumando, com mais técnica do que correria, com a chegada da barriga e da aposentadoria.

Se ele estivesse vivo, a convocação seria mais ou menos assim:

Goleiros: Fábio, Gatito, Cássio e Felipe (Amazonas);

Laterais: Mariano, Filipe Luis, Cortez, Edilson;

Zagueiros: David Braz, Felipe Melo e David Luiz;

Meio-campo: Ganso, Diego, Renato Augusto, Thiago Neves;

Atacantes: Coutinho, Diego Souza, Lucas Moura e Douglas Costa, Wellington Paulista, Rafael Sóbis e Walter (sem clube);

Técnico: Felipão;

Supervisor: Isaías Tinoco.;

Chefe da delegação: João Havelange (in memoriam);

Patrocinadores: Banco Nacional, Mesbla, Grapete, Cashmere Bouquet e Drible.

“UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” – CAPÍTULO 63

por Eduardo Lamas Neiva

O povo dança a valer e aplaude muito ao fim da apresentação de “Reis da bola”, de Moraes Moreira, Galvão e Pepeu Gomes. Moraes Moreira sai do palco agradecendo e cumprimentando todos que passavam por ele. Quando houve uma breve acalmada, Idiota da Objetividade retomou a pelota.

Idiota da Objetividade: – No mesmo dia em que o Brasil derrotou o Paraguai, em 1969, no outro grupo, o Peru comandado pelo nosso Didi se classificou para a Copa do México, eliminando a Argentina, no estádio La Bombonera, em Buenos Aires, com um empate em 2 a 2.

Sobrenatural de Almeida: – Mandei um representante meu ao estádio do Boca Juniors naquele dia. (dá sua risada medonha)

Todos riem. Mas o Sobrenatural de Almeida fica repentinamente sério e mais uma vez vai cutucar João Sem Medo.

Sobrenatural de Almeida: – Depois de vitórias brilhantes, a seleção e você, João, começaram a ter muitos problemas, né? Também, um comunista que nunca levou desaforo pra casa como você, no comando da seleção em plena ditadura militar de direita… Imagine se é você o técnico campeão no México? Como os militares, tendo como presidente Emilio Garrastazu Médici, iriam recebê-lo em Brasília?

João Sem Medo: – Eu nem iria, Almeida. Médici matou – ou deixou matar – vários amigos meus. Pra mim, era uma barbada. Mas imagine se comigo a seleção não ganhasse. Eu nem poderia voltar pro Brasil. Os militares tentaram me impedir de ir ao México comentar os jogos. Mas não conseguiram. Quando eu ia sair do Brasil pro México, fui posto pra fora do avião, no Galeão, embora tivesse passagem comprada, passaporte, tudo certinho. Eles me puseram nuzinho no aeroporto.

Garçom: – Que desrespeito!

João Sem Medo: – Eu disse pra um dos caras: “Olha, desaparece, porque, se eu estiver vivo e você também, um dos dois vai morrer”. Nunca mais vi esse filho da mãe. Ele me deu dois tapas.

Garçom: – Que isso, “seu” João?

João Sem Medo: – Me deixaram nu, desfizeram mala, fizeram o diabo. E me soltaram, lá do Galeão mesmo, em duas, três horas. Um cara com vozeirão disse pra eu não aparecer mais no aeroporto. Aí falei com os chefões da Globo. Me deram mil dólares e me mandaram pegar um avião Rio-Belém. Fiquei lá um dia, parti pra Panamaribo, no caminho dos contrabandistas, o mesmo que o Ronald Biggs, aquele ladrão inglês de trem, fez. Sem precisar de passaporte, nem nada, peguei avião de vagabundo pra Port of Spain, depois pra Guatemala e, só então, fui pro México. Cheguei três dias após ter saído do Brasil. Foi duro sair do Brasil. Mas fui trabalhar, comentar os jogos pra TV Globo e torcer pelo time formado por mim.

Ceguinho Torcedor: – E fez outro trabalho brilhante.

Garçom: – Fez mesmo! Eu ouvi tudo, vi todos os jogos pela televisão na casa de um vizinho, o único da minha rua que tinha TV naquela época. E já que o assunto é o tri, vamos aproveitar pra trazer outro frevo que homenageia aquela seleção fundamental. Venha ao palco novamente, por favor, Jackson do Pandeiro!

Jackson do Pandeiro é muito aplaudido e volta ao palco com a alegria de sempre.

Jackson do Pandeiro: – Obrigado, obrigado. Depois de ter vindo aqui cantar o “Frevo do Bi”, agora vamos com o “Frevo do Tri”, de Braz Marques e Álvaro Castilho.

O povo se esbalda com o “Frevo do Tri” e aplaude muito Jackson do Pandeiro. Após breve intervalo, Sobrenatural de Almeida foi rápido pela direita e levantou mais uma polêmica, alfinetando João Sem Medo.

Sobrenatural de Almeida: – É João, me desculpe, mas você se meteu em muita confusão antes de ser demitido da seleção. Teve a história com o Yustrich.

Ceguinho Torcedor: – O Yustrich provocou muito.

Idiota da Objetividade: – Depois de vencer a seleção, num jogo-treino no Mineirão, por 2 a 1, em setembro de 69, Yustrich, então técnico do Atlético Mineiro…

Sobrenatural de Almeida: – Time do Dario, que aliás fez um dos gols.

Garçom: – Vamos ver os gols nas imagens do Canal 100 e narração de Vilibaldo Alves, da Rádio Itatiaia, no nosso telão.

Idiota da Objetividade: – Na narração, Vilibaldo Alves chama o Atlético Mineiro de Galo Vermelho, porque o time jogou com o uniforme da seleção mineira. Depois da partida, o Homão, como Yustrich era chamado, mandou seu time dar uma volta olímpica…

Garçom: – Mas que coisa ridícula! Yustrich não veio, mas um dia virá aqui explicar essa e outras muitas histórias que contam sobre ele.

Sobrenatural de Almeida: – Não sei se é boa ideia, Zé Ary.

Garçom: – É, talvez tenha razão, Seu Almeida.

Ceguinho Torcedor: – Yustrich sempre que podia criticava, debochava e chegou a chamar o João de covarde.

Idiota da Objetividade: – E quando já estava dirigindo o Flamengo ofendeu o João numa entrevista pra uma rádio.

João Sem Medo: – Aí fui lá na concentração do Flamengo fazer uma visita de cortesia…

Sobrenatural de Almeida: – Visita de cortesia com arma na mão, João?! (ri medonhamente)

O público ri.

João Sem Medo: – Eu entrei por uma porta, ele estava saindo por outra. Era muito meu amigo…

Garçom (imitando um personagem antigo de Jô Soares): – Muy amigo, muy amigo… (todos riem, inclusive João Sem Medo)

João Sem Medo: – Até você, Zé Ary? Bom, fizeram uma intriga enorme, e ele caiu naquilo. Aí não tinha arrego, não tinha mais papo, e então fui lá. Esvaziei a concentração do Flamengo, mas lá só tinha um come-e-dorme, porque eles se mandaram. Um caiu dentro de um rio em frente e ficou com água por aqui: “João, não sei nadar!”. Eu digo: “Fica aí, seu canalha”. E fui embora. Não houve nada.

Garçom: – Tá certo. Mas como o papo aqui é sobre futebol e aquele da melhor qualidade, vamos chamar um craque da Música brasileira pra cantar “Futebol” aqui pra gente. Venha, por favor, ao palco, Naná Vasconcelos!

Naná se levanta  e vai sorrindo pro palco, muito aplaudido.

Naná: – Muito obrigado a todos. É um prazer estar aqui com todos vocês. Vamos de “Futebol”, que ele não pode perder a dança.

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Um gol desse não se perde!