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DESCENDO A LADEIRA

por Eliezer Cunha


Na semana passada, assisti o jogo entre Brasil x Paraguai válido por uma das vagas para a participação na Copa do Mundo de 2022. Jogo nitidamente protocolar, assim como toda esta competição. Em minhas memórias, nunca tinha assistido um torneio de tal importância apresentar um nível de qualidade competitiva tão baixa. As décadas passadas de 70, 80 e 90 foram contempladas com seleções e partidas de qualidade muito superior que ora apresentada. Jogos aparentemente fáceis com seleções modestas se transformavam em verdadeiras batalhas dentro das quatro linhas. Jogadores defendiam suas Seleções com mais afinco e honradez. Paraguai, Uruguai, Venezuela, Bolívia, etc. se transformavam em gigantes e se colocavam como pedra na chuteira de nossa seleção. A qualidade e competição era tão acirrada que em algumas situações a vaga só foi decidida no último jogo, perante um clima de verdadeira decisão. 

Hoje o que vemos; seleções apresentando um futebol de baixíssima qualidade, facilitando e muito nossa classificação para o maior torneio de futebol do mundo esportivo. Podemos salvaguardar hoje como concorrente, somente a seleção dos nossos Hermanos argentinos e mais nada. Temos uma equipe imatura, em constante período de tentativa e erro. Não temos uma equipe consolidada, como também, qualquer consistência no padrão de jogos. Essa competição de selecionamento das seleções em nosso continente é extremamente protocolar e não validam em nada o nível de qualidade das equipes. Apesar de um grupo de jornalista e seus colaboradores tentarem retirar leite de pedras, exaltando veementemente a importância e a qualidade da equipe, sob análises e tentativas de exposição otimistas, impondo um nível surreal de confiança nas transmissões dos jogos, sabemos que a equipe enfrentará o verdadeiro teste somente no desenrolar da competição na Copa do Mundo que se aproxima, e aí já é tarde. 

Que os Deuses do esporte nos protejam de mais uma melancólica participação na competição, e nos livre as impiedosas seleções Européias livrando-nos da inesquecível goleada ainda tão presente na memória de nós Brasileiros, vide 7×1.

MARINHO SETENTÃO

por Rubens Lemos


Nesta terça, dia 8, a maior glória esportiva do Rio Grande do Norte faria 70 anos. Da eternidade a fotografia de Marinho Chagas com a camisa do Cosmos de Nova York, o time mais badalado do mundo nos anos 1970, desde quando Pelé tirou as chuteiras detrás da porta para ensinar o Soccer aos norte-americanos e fazer sua merecida fortuna.

Marinho Chagas poucas vezes esteve tão pleno na junção espírito e estética. Sua risada é do moleque irreverente das Salgadeiras em Natal, indomável em pleno centro do planeta.

A imagem de Marinho Chagas no Cosmos é como uma resposta definitiva, sem direito a recurso, aos que ainda lhe torcem o nariz.

Marinho Chagas foi comprado ao Fluminense (RJ) e chegou chegando ao time-constelação. Convenceu Beckenbauer, a estrela principal, a lhe ceder a camisa 3 e a posição de meia-armador. Marinho Chagas encantou os States.

Foram 70 mil pessoas pagando ingresso para ver a magia subversiva do loiro irreverente e craque. Marinho Chagas estreou contra o Fort Lauderdale na vitória por 3×2 na primeira rodada da Liga dos EUA. Solto, passarinho voando pelos céus e chãos do meio-campo, levou incrédulos sardentos ao delírio. Marcou os três gols.

Marinho Chagas virava astro num time que, além do mitológico Beckenbauer da Alemanha, contava com o espetacular holandês Neeskens, o brasileiro Oscar, na defesa, o paraguaio Romerito, futuro campeão brasileiro pelo Fluminense e o italiano Chinaglia. A luz loira criava o refletor solar nas suas incursões missionárias ao ataque. A liberdade como filosofia de jogo e de vida.

Quando deixou o Fluminense (RJ) para seguir ao Cosmos, Marinho Chagas estava às turras com diretoria e torcida tricolores, inconformadas com seu desempenho bem abaixo do furor botafoguense que o fez melhor lateral-esquerdo do clube, com a Enciclopédia Nilton Santos deslocada para a quarta-zaga.

A ausência na Copa do Mundo da Argentina foi pior para o Brasil. Marinho Chagas, Paulo Cézar Caju e Paulo Roberto Falcão, os preteridos por Cláudio Coutinho, dividiriam por três a exuberância e a malandragem que faltaram a um time tosco e aquartelado em campo, sem inspiração, entregue à correria do bom e sem magia Dirceuzinho.

Natal, lembro bem pelos jornais, repercutiu a falta de Marinho Chagas na lista do capitão Cláudio Coutinho, que preferiu, primeiro, improvisar o beque Edinho na lateral-esquerda e, depois, entregar a camisa ao sóbrio Rodrigues Neto, envelhecido, mas de bom desempenho no mundial.

Marinho Chagas não agradava ao status quo, ao poder vigente, era acusado de indisciplinas, ele que traçava duas chacretes, bailarinas do Programa do Chacrinha, a cada três dias.

A contratação pelo Cosmos teve o devido aval de Pelé, que, em 1972, Marinho Chagas estreando pelo Botafogo contra o Santos, levou um lençol que gerou espanto e revolta diante da insolência do menino de 20 anos, abusado e confiante no seu brilho incandescente.


Marinho Chagas deixava o calor e a badalação do Rio de Janeiro, onde mandava do Baixo Gávea à barra-pesada da Lapa ou da Praça Mauá, pelos agitos de Manhattan, frequentando discotecas, dançando à John Travolta e colecionando beldades cintilantes que pareciam saídas da forma do paraíso.

Reparem bem no rosto de Marinho Chagas, maior expressão esportiva do Rio Grande do Norte em qualquer tempo. Há o olhar do menino de rua tramando presepadas, há a autoconfiança do gênio de personalidade firme. Há o solitário saindo do casulo no formigueiro do universo.

Sempre será dono do espaço que houve ou no mistério do pós-morte. Marinho Chagas é maior – bem superior – aos corvos que vibravam no seu final melancólico, driblado e dominado pelo álcool. Não é o meu caso.

A fotografia de Marinho Chagas no Cosmos, no Cosmos do planeta da bola, cobiçado por 11 entre 10 bons de molejo do tempo de beleza em quatro linhas, me joga na varanda do orgulho e na tristeza da saudade. Marinho Chagas, o do Cosmos, nunca vai combinar com morte. Anjo setentão.

Na seleção

A primeira partida oficial de Marinho Chagas na seleção brasileira aconteceu na derrota para a Suécia (0x1) durante excursão para a Europa em 1973.

Titular

Marinho Chagas ganhou em seguida a posição de Marco Antônio nos amistosos preparatórios para a Copa do Mundo de 1974, da qual foi o melhor lateral-esquerdo.

Números

Segundo o Almanaque da Seleção Brasileira, de Roberto Assaf e Antônio Carlos Napoleão, Marinho Chagas fez 36 jogos com a camisa do Brasil, ganhando 24, empatando nove, perdendo três e marcando quatro gols.

Títulos

Marinho Chagas ganhou dois títulos estaduais: pelo ABC em 1970 e pelo São Paulo em 1981. Na seleção brasileira, ganhou o Bicentenário dos Estados Unidos em 1976.

Melhor Botafogo

Na seleção do Botafogo(RJ) de todos os tempos, Marinho Chagas ocupa a lateral-esquerda com o deslocamento de Nilton Santos à quarta-zaga.

Time

É Manga ; Carlos Alberto Torres, Leônidas(ex-técnico do América de Natal), Nilton Santos e Marinho Chagas; Gerson e Didi; Garrincha, Jairzinho, Heleno de Freitas e Paulo Cézar Caju.

DISTÂNCIA DO ÍDOLO DIMINUI PAIXÃO DO TORCEDOR

por Elso Venâncio


A cada dia aumenta a dificuldade do torcedor em ter acesso a seus ídolos. Isso acontece também com a imprensa. Há um abismo entre os jornalistas e os craques.

Quando surgiu o Fla-Barra, nos anos 90, Vanderlei Luxemburgo levava o time para o clube na véspera dos jogos. Não queria perder a identidade. Hoje o pai não pode levar o filho para bater uma foto com o ídolo. Na maioria das vezes, o pai era quem tietava; o filho era o escudo.

As crianças sonhavam entrar em campo com o time no Maracanã. Quando isso acontecia, chegavam a perder o sono. Eram os mascotes, substituídos hoje por bonecos, caricaturas.

Aos poucos, a paixão do torcedor por seu clube do coração vai diminuindo. Fato que, há tempos, acontece com a Seleção Brasileira. Paixão tem que ser regada, precisa ser renovada.

Vamos relembrar as tardes de sábado na Gávea. Jogadores, dirigentes, sócios, torcedores e imprensa conviviam todos bem de pertinho. Aquela energia positiva passava para o time. Seu Edmundo, no portão de entrada com seu inseparável cachimbo, sorridente, chamava todos de ‘Doutor’ e barrava os penetras. Ele era a última barreira para quem tentava se aproximar do campo. O treino de apronto se tornava programa obrigatório na agenda dos torcedores, que vinham de toda parte do país para assistir ao jogo do dia seguinte.

Zico, o grande Ídolo, atendia, com toda paciência, um repórter de cada vez. Falava com as TVs, com as rádios e com os jornais. Não existia coletiva! Arquibancada cheia, a Gávea era uma verdadeira festa!

O Galo treinava faltas, normalmente no gol à esquerda dos vestiários, e quase sempre sozinho. Eu pensava com os meus botões: como pode o maior jogador do Brasil, um dos maiores do mundo em todos os tempos, armar sozinho as barreiras móveis. Ele pegava umas dez ou vinte bolas e dava um show nas batidas. Era um ‘avant-première’ do que aconteceria na tarde seguinte.

Os cartolas e jogadores não se escondiam atrás de assessores. Nomes consagrados, como Junior, Leandro, Bebeto e Renato Gaúcho, paravam para dar entrevistas e posar para fotos à beira do gramado. Jogadores chamavam os repórteres pelo nome. A imprensa fazia o elo entre quem era notícia e os torcedores. Hoje os craques não conhecem sequer os diretores, à exceção dos que trabalham diretamente no futebol e, claro, o presidente do clube.

O futebol brasileiro, o maior do planeta, começa a despencar no momento em que tenta imitar os europeus. Nosso país tem calor humano. Quem já morou fora sabe disso.

Vale lembrar aquela máxima do Tom Jobim:

“Viver no exterior é bom, mas é uma merda. Viver no Brasil é uma merda, mas é bom.”

Vamos direto para a despedida oficial de Zico – o último treinamento na Gávea antes da ida do Flamengo para Juiz de Fora. Ele fica no vestiário por bastante tempo. Faz sauna, corta a barba, é o último a sair. O ônibus já tinha seguido para Minas Gerais, onde a equipe disputaria um histórico Fla-Flu. Zico preferiu ir de carro com Sandra, sua esposa, domingo cedo. A tarde de repente virou noite e só eu o esperava. Fomos para o estacionamento dos jogadores e ele me atendeu com calma. Vesti toda a programação da Rádio Globo (noite, madrugada e manhã) com suas declarações. Não havia com ele um assessor, um puxa-saco, sequer um segurança. Estamos falando de Zico!

Na Copa do Brasil de 1990, o Flamengo foi campeão ao vencer por 1 a 0 o Goiás em Juiz de Fora (o Maracanã estava em uma de suas intermináveis reformas) e, depois, empatar sem gols no jogo decisivo, disputado no Serra Dourada. A festa uniu jogadores, dirigentes, imprensa e alguns torcedores. Uma grande mesa foi colocada na parte externa de uma churrascaria.

Não sou saudosista. Acho essa era atual das mídias sociais muito melhor do que antigamente. A modernidade chegou. É verdade, sim, que sinto falta do furo de reportagem. Da briga pela notícia exclusiva – ‘guerra’ definitivamente sepultada. Hoje tudo é falado ou exposto em tempo real e há as chatíssimas e pasteurizadas entrevistas coletivas.

O que não consigo entender é o isolamento do torcedor, que é a razão principal dessa paixão nacional chamada futebol. Para azar do futebol. E também da própria paixão nacional.

TEMPOS SOMBRIOS

:::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::


Ter 72 anos traz vantagens e desvantagens. Um dos pontos negativos é não conseguir mais jogar bola e um dos positivos é ter visto e participado do melhor futebol do mundo. Com essa vasta experiência posso fazer comparações de forma segura, mas muita gente fica chateada quando expresso minha opinião sobre o declínio do futebol.

Outro dia um apresentador comediante, desses bobos da corte que imitam melhor do que opinam, ironizava o ponto de vista da turma da velha guarda. Não tenho culpa se ele tem como herói o Neymar e nunca se deu ao trabalho de pesquisar sobre nossas verdadeiras lendas.

Falo isso, porque, infelizmente, assisti, Brasil x Argentina pela Copa América de futebol de salão. Não sei se essa é a pior geração da história, mas está entre elas. E o que mais me surpreendeu é saber que Ferrão, nosso pivô, já foi eleito o melhor do mundo. O Brasil perdeu nos pênaltis e o técnico da Argentina percebendo que nossa seleção não oferecia qualquer perigo colocou gol linha para tentar resolver no tempo normal. Pode parecer um detalhe, mas não é.

O Brasil não tinha nenhum coelho na cartola, nenhum jogador que pudesse resolver, improvisar, driblar, encantar o torcedor, como em outros tempos. Perder jogando é uma coisa, mas perder acuado é vergonhoso. O Brasil não vence mais nem no futebol de praia. Hoje baseamos nosso futebol em força e tática. Não criamos mais talentos, artistas. E se criamos não os encontramos em nossas seleções.

Também vi o português Abel Ferreira, do Palmeiras, dando entrevista, ensinando aos brasileiros como se deve jogar. Os portugueses viraram as grandes estrelas internacionais, mesmo nunca tendo vencido nada de relevante. Ganharam uma Eurocopa aos trancos e barrancos, estão na repescagem para a Copa do Mundo e dependem de CR7 pra tudo!

Pelo menos Senegal venceu o Egito e conquistou de forma inédita o título da Copa Africana. E dessa vez não era um técnico alemão, italiano, mas o senegalês Aliou Cissé. Torci demais! Um técnico negro no topo!

Também vi um belíssimo gol em um estádio suburbano, o do vascaíno Gabriel Pec contra o Madureira, uma matada no peito e o petardo no ângulo, um gol que parecia ter se libertado das amarras, um grito de socorro, um clamor, um pedido….não nos engessem, não enterrem nossa essência.

Preparados para a pérola da semana? Ouvi que “o time estava acoplado no sincronismo para ser mais propositivo, direcionando os atacantes agudos para chaparem a cara da bola”.

TRISTEZA, POR FAVOR, FIQUE DO LADO DE FORA

por Zé Roberto Padilha


Dizem que apenas Deus, e o resultado da Mega-Sena, um titulo alcançado aos 45 minutos do segundo tempo, podem decidir, quem nesta terra dos homens que amam o futebol, e perseguem a sorte, alcançará a felicidade.

Mas naquele domingo, 16 de julho de 1950, ele estaria nas mãos de um simpático e ardiloso mineiro. Seu Chico, radialista da Rádio Pequeri, era quem decidiria se sua gente explodiria de alegria, ou sucumbiria junto a todo país na mais completa dor do holocausto. Digo, perdão, Maracanaço.

No começo da década de 50, nem todos tinham rádio portátil em Pequeri, pequeno distrito de Bicas, zona da mata mineira, que só seria emancipado dois anos depois, localizado a 300 km de Belo Horizonte.

Os que tinham em suas casas, e ouviam a Voz do Brasil, Gerônimo, o Herói do Sertão, Emilinha e Marlene disputando o cetro de melhor voz pela Rádio Nacional, permaneceram desligados. Todos foram convocados para a praça principal para acompanhar pelas cornetas, fixadas aos postes, a final entre Brasil X Uruguai.

Era seu Chico quem comandava o microfone e ele estava inspirado. Era a bola sair pela lateral que ele fazia graça, baixava o volume que vinha da Radio Globo e anunciava um patrocinador.

Nem quando o Uruguai empatou a partida ele esmoreceu. E avisava, interrompendo seguidamente Waldir Amaral e Jorge Curi, onde a maioria das rádios pelo Brasil pegavam caronas: “O empate é nosso, minha gente. Brasil, zil,zil…”

E quando Gighia, aos 34 minutos do segundo tempo desempatou, Chico foi mais rápido do que o porta-voz do Apocalipse. E desligou o botão. E gritou, em nome dos ambulantes, que precisavam vender, da sua gente, tão esquecida, “Acabou! Somos campeões mundiais!”

Se o árbitro sempre dava minutos a mais, porque não posso antecipar alguns e evitar um trauma coletivo? No seu fundo musical certamente se ouvia: “Tristeza, por favor vá embora…”

Dizem, os mais antigos por lá, que a festa vazou a madrugada enquanto todos os 5 mil municípios pelo país ardiam em dor. E Pequeri, em Minas Gerais, foi, por 12 horas, a única cidade a comemorar o primeiro título mundial do futebol.

Quando acordaram e souberam do ocorrido, perdoaram o Chico. Que estava corrido. Para todos eles, foi um sonho vivido, uma festa não interrompida, um pesadelo superado, mesmo porque toda ressaca é ruim com qualquer resultado.

Nada que um Melhoral, quem se lembra, não resolvesse dia seguinte. Mesmo porque a tristeza, a verdade, a realidade nua e Gighia estava a caminho, pelas ondas médias da Rádio Globo, para recolocar a tristeza no seu devido placar.