DEVO AO RÁDIO O AMOR PELO FUTEBOL
por André Felipe de Lima
O rádio me fez amar o futebol. Não tenho a menor dúvida disso. Sou um homem convicto, portanto, e de uma geração que assistia ao futebol na TV raríssimas vezes. Sou também de uma época (e ando repetindo muito isso em cada frase que digo…) onde não havia contrato milionário entre clubes e emissoras. Ao vivo, na velha Telefunken P&B , e para valer, só mesmo jogos de Copa do Mundo. Clássicos, como Vasco e Flamengo, por exemplo, eram raros ao vivo. Só rolavam na telinha quando estava em jogo um troféu da Taça Guanabara ou do campeonato carioca. Sem TV, eu vibrava com as transmissões radiofônicas dos jogos e sempre curtia, horas mais tarde, na TVE, o videoteipe completo do jogo que ouvi e, de quebra, os gols do Fantástico na indefectível voz do Leo Batista, com o notório patrocínio da cachaça Tatuzinho. Quem não se lembra do jingle? “Ai, Tatu, Tatuzinho, me (sic) abre a garrafa e me dá um pouquinho…”. Um verdadeiro “paraíso” do jogo de palavras que poucos anos depois, na faculdade de jornalismo, estudei nas divertidíssimas aulas de linguística do genial mestre André Valente. Aliás, quem nunca leu de autoria do Valente “A linguagem nossa de cada dia”, que leia. É uma viagem deliciosa pelo nosso idioma. Um encanto. Mas como estávamos falando, o meu amor pelo futebol nasceu com o rádio. Esse amor começou tímido, jogando bola com a minha surrada camisa do Vasco, da marca Hering, mas foi crescendo, crescendo, crescendo a cada jogo que ouvia pelo rádio. Acho que a maioria das partidas pode ter sido a maior pelada do mundo, mas eles, os locutores, faziam daqueles jogos “verdadeiros jogões”, como dia desses comentou o amigo Márcio Carneiro. Podia ser um Vasco e Mixto (é com xis mesmo… entenda-se isso), isso pouco importava. Empolgava-me mesmo manter o ouvido colado no rádio e depois tecer entusiásticos comentários com os colegas do colégio na manhã seguinte: “Meu irmão, que jogaço o de ontem do Vasco contra o Mixto…”. Éramos inocentes, ingênuos, mas saudavelmente românticos e com uma capacidade para sonhar que hoje sinto falta nas novas gerações que vivem o seu tempo, é verdade. Um tempo de velocidade, de apelo midiático sem precedentes, de novas e impressionantes tecnologias. Tempos de uma acessibilidade à informação que eu jamais tive quando jovem, mas também tempos de artificialidade. Por isso acredito que a minha geração, a do meu pai e a dos meus avós amavam mais o futebol, porque o rádio nos permitia sonhar mais com o clube, seus brasões e ídolos. Vejam vocês. Hoje em dia, um time é campeão e o torcedor não invade mais o gramado para comemorar com os jogadores. Estes, por sua vez, também são o reflexo dessa artificialidade de que falo. O juiz apita o final da peleja e a comemoração não é efusiva como aquelas que presenciamos nos anos de 1970 e de 80, e isso citando somente as que presenciei no Maracanã ou nas raríssimas transmissões ao vivo pela TV. A festa era impressionante. Revejam, por exemplo, o fim daquele jogo decisivo do Corinthians contra a Ponte Preta, em 1977, e comparem com as “comemorações” de finais dos anos de 2000 para cá. A constatação é óbvia. Amávamos mais o futebol. Vibrávamos mais. Cantávamos mais. Aquilo que o passado roubou de mim era o futebol que o rádio me ensinou a amar. Ah, Jorge Curi; ah, Waldir Amaral, que saudade de vocês…
Jorginho II
DE BEM COM A VIDA E COM O FUTEBOL
por Eduardo Lamas
Assim como a entrevista com Pintado, em novembro de 2019, a oportunidade de conversar com Jorginho aqui em Florianópolis não podia ser perdida. Afinal, como treinadores que nasceram e têm residência fixa em outro estado (no caso de ambos, em São Paulo), acabam sendo moradores apenas passageiros de muitas e muitas cidades. Valia o mesmo nos tempos de jogador. Neste retorno ao Museu da Pelada, em outubro passado, procurei logo agendar esta entrevista, pois sabia que muitas e muito boas histórias com o sempre bem-humorado Jorginho não faltariam. E a expectativa se confirmou, como vocês podem atestar no vídeo acima.
Ex-ponta-direita surgido na Portuguesa dos anos 80, quando o clube paulista ainda despontava em constante busca de um espaço entre os grandes do futebol brasileiro, Jorginho logo se destacou, fez parte de um ataque de sucesso com Lê e Toninho e conseguiu uma convocação para a seleção brasileira. A carreira vitoriosa que passou ainda por Atlético-MG, Palmeiras, Fluminense, Santos, Coritiba, Avaí, Santo André, entre outros, moldou o treinador, que assim como a Lusa até alguns anos atrás, tenta se inserir no hall dos grandes técnicos brasileiros.
Não é uma batalha fácil, ainda mais em tempos de tanta valorização de treinadores estrangeiros por aqui. Tanto, que quase um mês após esta nossa entrevista, ele deixou o Figueirense, logo após a conquista da Copa Santa Catarina. No entanto, ele certamente não perdeu a sua gana de viver e trabalhar que o ajudaram, por exemplo, a superar o momento mais difícil de sua vida: a morte de seu filho Leonardo, ainda muito jovem, num acidente de moto. Na vida e na bola, Jorginho é um grande exemplo, você há de concordar comigo.
O MONSTRO DO FUTEBOL DE SALÃO
texto: Mauro Ferreira
Ele ainda era só Serginho quando o locutor Januário de Oliveira soltou seu tradicional “eeeeeeee o golaço. Goooool do monstro. Serginho sabe que é disso, é disso que o povo gosta!!!! “. Ia além de saber que era disso que o povo gostava. Sérgio Sapo sentia o que o torcedor queria e entregava obras maravilhosas com a bola pesada grudada nos pés. Até hoje, senhor sabedor de seu dom, espalha histórias e uma certa marra típica dos craques sacanas. Pudera. Decidiu dois mundiais de futebol de salão com gols característicos: uma fuga despretensiosa para uma das laterais e um chute do nada no ângulo. O goleiro? Nem na foto saiu.
A pelada tradicional de domingo, no caldeirão do Albertãonão foi tão pelada dessa vez. A bola rolou, é verdade, mas os dribles foram substituídos por risadas, histórias, bolos e uma reunião de craques do futsal. Todos lá para comemorar o aniversário de Sérgio Sapo, o ala-pivô que infernizava os parados. Hoje, sessentão, espalha alegria e continua a ser reverenciado por seus companheiros de quadra e tantos outros súditos. De Paulo César Caju a Marinho; de Paulinho Shaolin a Joaquim, de Neimar a Joãozinho e tantos outros. Ainda joga, é verdade, sempre maroto, quietinho até, do nada, aparecer e… bem, a idade já não permite as mesmas estrepolias de antes.
No vídeo comemoração desta edição do Museu, o presente fica pro final. Não perca. Reveja, veja, olhe novamente, mais uma vez. É de tirar o fôlego. Justifica quando se ouve o aniversariante soltar o seu já tradicional “joguei pra car…”. É verdade. Jogou muito. Aliás, muito mais que o próprio palavrão-adjetivo. Serginho Sapo jogou… escolham o adjetivo que quiserem, será merecido.
Parabéns, Sérgio Sapo. O aniversário é seu, o presente é nosso. Sempre foi nosso.
COBRADORES DE FALTA E FALTA DE COBRADORES
por Elso Venâncio
Você se recorda dos gols de falta? Qual foi o seu gol inesquecível marcado de bola parada?
Zico, Didi, Rivellino, Jair da Rosa Pinto, Roberto Dinamite, Nelinho, Juninho Pernambucano, Ronaldinho Gaúcho, Marcelinho Carioca, Zenon, Rogério Ceni, Éder, Dicá, Jorge Mendonça – e por aí vai… Incontáveis são os grandes cobradores que o futebol brasileiro gerou. Sem câmeras de TV – muito menos VAR –, os zagueiros batiam sem pena, mas evitavam cometer faltas próximas à área. Era muito arriscado.
O futebol sempre teve choques fortes a todo momento. Contusões graves aconteciam em profusão. Pelé, marcado com violência, passou a ser ainda mais respeitado quando começou a revidar.
Fora do Rio, eu passava sempre o dia nos hotéis onde o Flamengo se concentrava. Apurava as notícias, conferia o time que estava escalado, fazia algumas entrevistas e ia para o estádio. No Pacaembu, mantinha uma rotina. Como chegava três horas antes de a bola rolar, ficava de papo com o popular Luizão, o mais antigo funcionário do histórico complexo esportivo. Ficamos amigos:
– Meu filho, nesse gramado – apontava com o dedo – vi Pelé fazer genialidades, mas também o vi quebrar muitas pernas.”
Vamos voltar às faltas, que, por sinal, o Rei cobrava como poucos. Para começar, Zico. Em plena final da Taça Libertadores de 1981, contra o Cobreloa, no Estádio Centenário, em Montevidéu. O inesquecível Jorge Curi, na Rádio Globo, de repente chama o repórter de campo Kleber Leite:
– Daí para o Zico é pênalti, Cury.
E era mesmo. Mas o Galo treinava à exaustão. Mais de 100 faltas por dia. Só diminuía a intensidade na véspera dos jogos.
Há poucos dias, jantei em São Paulo com três amigos. Entre eles estava José Carlos Brunoro. Perguntei a ele o porquê de não termos mais gols de falta:
– Os fisiologistas não permitem que os jogadores treinem. Podem estourar um músculo.
A meu ver, atleta profissional tem que ter personalidade. E não ficar acatando ordens absurdas.
Não satisfeito, recorro a Paulo Cezar Lima, o Caju:
– E a decisiva bola parada? – questionei.
– Falta treino! A preguiça é geral.
Paulo Cezar, o lúcido e corajoso colunista da Revista Placar e do Museu da Pelada, foi o único que alertou sobre os pênaltis perdidos na final da Supercopa do Brasil. Foram nove cobranças desperdiçadas. O gol é enorme, fica escancarado! Os profissionais têm altos salários… Como se explica isso? Que diferença para a final da Liga Inglesa, por exemplo, no último título do Liverpool.
Caju, um dos monstros sagrados do nosso futebol – e que tem total autoridade para falar o que quiser –, faz nova observação:
– E os coletivos?
Na sexta-feira tinha o apronto. Noventa minutos de bola rolando; profissionais contra juniores. Didi treinava a Máquina Tricolor nas Laranjeiras. O Mestre, em campo, de chuteiras, participava:
– Volta. Toca em mim. Posse de bola é nossa… O controle do jogo é com a gente.
Naquele timaço, os garotos que eram promessas, como Edinho e Pintinho, se concentravam com os profissionais. Nada mais justo. É assim que os meninos crescem. Vendo de perto suas referências.
Acompanhei Telê Santana em 1986, na Toca da Raposa e depois no Flamengo, entre 1988 e 1989. Nos coletivos, ele ia para o campo de calção, chuteiras e apito. No final, cobranças de falta e pênaltis.
Hoje, os treinos são táticos. Os professores fazem a preparação na metade do campo e tome retranca, com raras exceções, nas partidas. A substituição é sempre a mesma. Se faz um gol, tira um atacante e coloca um homem no meio. Se leva, o contrário.
Não podemos fugir das nossas características, da nossa escola. Temos, sim, que treinar os fundamentos e não contratar por contratar portugueses sem expressão ou títulos, que invadem a três por dois o país do futebol.
DE ARTHUR PARA ARTHUR
por Marcos Vinicius Cabral
Naquele 18 de abril de 2007, Arthur era uma criança de dois anos e meio quando Messi enfrentou o Getafe no jogo de ida das semifinais da Copa do Rei, e em uma arrancada à la Maradona contra a Inglaterra na Copa do Mundo de 1986, no México, fez um dos gols mais bonitos da carreira. Doze anos depois, em eleição promovida entre torcedores do Barcelona, a obra prima foi eleita com mais de 500 mil votos o gol mais bonito da história do clube.
Na ocasião, era o terceiro ano do argentino como profissional que vestia ainda a camisa 19 e tinha o 9 Eto’o, 10 Ronaldinho Gaúcho e 20 Deco, companheiros que eram constantemente aplaudidos pelos Culés.
Desde então o tempo passou, Messi jogou outras 777 partidas pelo clube, marcou 672 gols, conquistou 35 títulos e ganhou fãs mundo afora. Um deles é Arthur Silva de Almeida Castro, de 17 anos, morador de São Gonçalo, e que por ironia do destino teve o nome registrado em homenagem a um outro gênio da bola que vestiu com maestria a camisa 10 e que nesta quinta-feira (03), completa 69 anos: Zico!
“Quando soube que seria pai de um menino, não pensei duas vezes. A escolha do nome Arthur para o meu filho, foi uma maneira que encontrei para retribuir e dizer ao Zico, o meu muito obrigado por ter dado a nós, rubro-negros, sete vezes o Estadual, quatro vezes o Brasileiro, uma Libertadores e um Mundial”, contou Milton Castro, de 48 anos, que também é pai do ex-jogador do Botafogo Rhuan, atualmente sem clube após rescindir com o Radomiak Radom da Polônia.
Mas o argentino Messi, atualmente camisa 30 do Paris Saint-Germain, é o ídolo de Arthur. E não há quem mude isso. “Eu gosto dos dribles curtos que ele dá e tento fazer isso nos jogos em que atuo. Ele simplifica as coisas e isso é o diferencial de todo craque”, revelou o garoto que busca o sonho de ser jogador de futebol.
Sobre Zico, afirma: “Sei que foi um grande jogador. Não tive a oportunidade de vê-lo jogar, privilégio que meu pai e meu tio tiveram, pois eles vivem falando muito das inúmeras qualidades dele. Meu tio, por exemplo, às vezes, para mexer comigo por causa do Messi, diz que o Zico foi mais jogador e me mostra vídeos com jogadas e gols dele”, revelou.
E acrescenta sobre quem é melhor: o Messi dele ou o Zico do pai e do tio. “Vi alguns lances pelo You Tube e confesso que balancei quanto ao fato de quem jogou mais. Analisando bem, lógico, cada um em sua época, o estilo do Zico é muito parecido com o do Messi. Raciocínio rápido, passes que deixam os companheiros na cara do gol, batida perfeita na bola e, apesar de meias, uma facilidade enorme em fazer gols. E gols bonitos, como esse que o Messi fez contra o Getafe e o que Zico fez de falta contra o Santa Cruz no Maracanã e o gol escorpião marcado no Japão”, pontuou.
Sobre Messi e Zico, dois gênios da bola, o garoto só queria ter a oportunidade de um encontro com ambos. “Ah, sei que é impossível de acontecer, mas queria dar um abraço nele e dizer para o meu ídolo o quanto me inspira. Já Zico, maior ídolo rubro-negro, queria dizer meu muito obrigado por alegrar a vida do meu pai e a do meu tio com tantas conquistas históricas”, contou o garoto pegando as chuteiras para jogar mais uma pelada inspirado pelo que já viu Messi e Zico fazerem dentro de campo.