A TORCEDORA-SÍMBOLO: DONA ELIANE
por Jonas Santana
Dona Eliene era a torcedora símbolo daquele time, capaz de deixar queimar a panela para discutir sobre quem era o melhor jogador. Pelo time, dizia ela, era capaz de qualquer coisa, até de viajar a cavalo sem saber montar.
Mãe de Nego Jordan (ela não gostava quando chamavam o filho dela de Ney Rio, em comparação a um determinado jogador, cuja amplitude aquática era bem maior), era uma mulher confiante no talento daquela equipe, que seria, segundo ela, a cópia do Vasco (seu time do coração) dos bons tempos, com Rondinelli, Orlando, Dinamite e tantos outros que vestiram a camisa cruzmaltina.
Era verdadeiramente uma torcedora fiel. Por várias vezes abriu sua casa para as comemorações do clube sempre aconteciam. Só tinha uma coisa: nada de bebida alcoólica, palavrões ou algo do tipo. Não importava quem era, se o melhor da equipe, o astro do jogo, o presidente ou até mesmo o seu marido, que também não bebia, ninguém entrava com nenhum tipo de bebida nem abria a boca para falar qualquer impropério. Contam a boca pequena que certa feita ela fez Dirran (atleta do clube conhecido por sua delicadeza de jumento enfurecido numa loja de louças) escovar a boca com detergente por conta de um palavrão que lhe escapara quando contava uma peripécia para o grupo de jogadores ali reunidos, a popular resenha.
E era na resenha que surgiam as estórias mais inusitadas, sempre sob o olhar e ouvidos atentos da torcedora número um daquele time.
E ela era uma mulher de fé. Dizia que não fazia promessa porque isso não era certo, pois se fizesse tinha que cumprir, mas não largava sua bíblia, nem deixava de ir ao culto por nada, mesmo que fosse final de campeonato e o time estivesse disputando. Era uma pessoa singular, com um enorme coração, aconselhadora, amiga, mas também, como diziam os “meninos”, quase uma “delegada” quando a situação assim se impunha. E gostava de cumprir o que dizia, como naquela vez que fez Nerroda tomar quase um frasco de óleo de rícino por este ter se queixado de uma prisão de ventre, ou mesmo quando botou Nego Jordan pra tomar durante duas semanas direto beterraba com ovo, leite e aveia, para criar “sustança”.
Era médica, fisioterapeuta, psicóloga, conselheira daqueles marmanjos, como dizia Dona Terezinha, “Dona Eliene é a mãe desses meninos e a saúde do time”.
E como não podia deixar de ter um acontecido, Dona Eliene se meteu a andar de cavalo, por sinal um cavalo que Lila tinha ganho como melhor atleta de um jogo em que ele conseguiu parar ninguém menos que Litinho, o jogador mais cobiçado daquelas plagas. Mas voltando ao caso do cavalo, ela, toda pimpona e com a ajuda do filho, montou no animal. A recomendação era de não bater nas “ancas” do cavalo, senão ele dispararia e aí quem não tivesse habilidade iria ao chão. E ela queria porque queria andar, mais para poder se distrair que por necessidade.
E ela vai, toda esbelta, afinal era uma mulher elegante, de calça comprida, botas, caracterizada a rigor para o momento. E eis que num momento de empolgação, o cavalo cavalgando pacificamente, alguém chama a atenção de Dona Eliene que, distraidamente, meteu os calcanhares das botas no cavalo. Foi a conta. O cavalo em disparada, ela gritando por socorro e os jogadores abandonando o jogo que corria ali perto para tentar segurar sua patrona. A disparada era tanta que quanto mais gritavam para puxar a as rédeas e não castigar a barriga do animal, mais ela atacava o bicho e mais ele corria. Finalmente, depois de uma desabalada carreira, Pedro Preto consegue alcançar as rédeas e pára o equino. Assim que o animal estava sob controle desce Dona Eliene, mais suada que pano de cuscuz e mais arranhada que sofá de casa onde tem gato, por conta das árvores encontradas à beira do caminho e que castigaram a torcedora símbolo daquela equipe. E haja água com açúcar para ela, que a esta altura estava totalmente sem fôlego e sem direção.
Tranquilamente os atletas voltaram ao jogo, não sem antes receberem cartões amarelos distribuídos à vontade pelo juiz, que tina interrompido a partida por conta do episódio.
Terminada a partida, procuraram pela torcedora e ela estava tacitamente sentada, ainda se recuperando. Depois desse acontecido ela não quis mais saber de andar de cavalo, mas se tornou veterinária e criou uma escola de equitação.
MÁRIO? QUE MÁRIO?
por Luis Filipe Chateaubriand
Mário Português começou a se destacar no final dos anos 1970, no Fluminense.
Jogador de grande técnica e extrema criatividade, era o cérebro do time que foi campeão carioca no ano de 1980.
Pouco à frente, transferiu-se para o Bangu, onde fez uma “dupla do barulho” com Arturzinho.
Arturzinho e Mário “infernizavam” as defesas adversárias e faziam a alegria dos atacantes companheiros, como Marinho e Fernando Macaé.
Em seguida, no ano de 1984, Mário, junto com Arturzinho, se transferiu ao Vasco da Gama, onde se formou um trio ofensivo “da pesada”: Mário, Arturzinho, Roberto Dinamite.
O Vasco da Gama foi muito bem no Campeonato Brasileiro, tendo sido o vice-campeão do certame.
Em 1985, enquanto Arturzinho se transferia para o Corínthians, Mário voltava ao Bangu, para exibir o seu repertório de bom futebol.
Em seguida, Mário Português foi para Portugal, onde jogou no Sporting de Lisboa, com a mesma classe de sempre – jogar bola “vestindo terno”.
Mário Português deixou um legado que demonstra que a bola deve ser bem tratada.
O MAIOR DE TODOS
por Péris Ribeiro
Lima, Zito, Dalmo, Calvet, Gilmar e Mauro (em pé), Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe (agachados)
Em toda a história do futebol, nunca um time teve um reinado tão longo e glorioso como o Santos da Era Pelé. Foram 15 belos anos – ou seja, uma década e meia. De 1958 a 1973. Tempo suficiente para que o esquadrão da Vila Belmiro encantasse o mundo definitivamente, chegando ao inacreditável recorde de 49 títulos de campeão – 27 deles, pelo menos, em competições internacionais. E 29, em torneios oficiais.
Um detalhe marcante em toda essa apaixonante história é que, apesar de haver se consagrado como o primeiro Bicampeão Mundial de Clubes, nas temporadas de 1962/63, o ano dourado do Santos do Rei Pelé e Cia foi mesmo o de 1968.
Afinal, nele foram conquistados nada menos de oito títulos – outro recorde histórico. Figurando como maiores destaques, o Campeonato Brasileiro – na época, chamado de Torneio Roberto Gomes Pedrosa. Ou Robertão -, o Octogonal Internacional do Chile, o Pentagonal de Buenos Aires e as Recopas Sul-Americana e Mundial de Clubes.
Exibindo, onde quer que jogasse, o tão proclamado estilo refinado dos seus craques, o que aquele Santos sempre fazia questão de deixar evidenciada era uma espécie de comprometimento nobre. E esse comprometimento falava do dever – e da seriedade – de entrar em campo para ganhar os seus jogos. E, ganhando, isso significava ser campeão quase sempre. Daí as muitas conquistas, o rosário de títulos pelos cinco Continentes.
O que talvez pareça incrível é que, apesar das dores musculares e de algumas contusões que, volta e meia, acabavam por incomodá-lo – além dos tradicionais resmungos de contrariedade, pois o excesso de jogos era cada vez mais frequente -, nem o próprio Pelé, muito menos Coutinho, Gilmar, Dorval, Pepe, Zito ou Mauro Ramos de Oliveira, eram capazes de dizer “não” aos mais variados tipos de competições em que viviam se metendo.
É que tudo aquilo era de lei, não havia como fugir. E o que eles tinham então a fazer, felizes ou não, era vestir o uniforme imaculadamente branco santista e entrar em campo. Afinal, era isso o que os cruéis e rigorosos contratos exigiam. Menos mal, é que o time seguia ganhando quase sempre. Daí aqueles estranhos títulos que, de repente, o consagrado Esquadrão da VilaBelmiro passou a exibir. Era Santos, campeão do Octogonal de Santiago do Chile, pra lá; Santos, campeão do Hexagonal de Buenos Aires, pra cá; Santos, campeão do Pentagonal de Guadalajara, no México…
– Pois é, minha gente, eu sei bem como tudo isso é difícil. Mas, mesmo em meio a todas essas dificuldades que temos sempre de superar, nunca deixamos de amar o futebol como a melhor coisa do mundo. E é esse sentimento, que procuramos passar aos povos que conhecemos. Jogue a gente em que estádio jogar – disse Pelé, certa vez, mesmo extenuado após mais uma vitória do Santos, cumprindo outra alucinante maratona de jogos por vários países da Ásia.
Aliás, dentre as muitas façanhas obtidas naqueles anos dourados, o Santos do Rei Pelé foi bicampeão do Torneio de Paris e tricampeão do Torneio Internacional de Santiago do Chile. E sagrou-se, ainda, campeão dos Torneios de Buenos Aires, Cidade do México, Nova York, Caracas e Kingston, na Jamaica.
Porém, em 1961, eis que, de uma hora para outra, surgiu enfim um desafio de peso pela frente. É que a Juventus, bicampeã italiana, dizia-se em melhor fase que o time brasileiro. E ainda tinha acabado de ver o seu camisa 10, Sívori, escolhido o “Bola de Ouro “ da Europa, na famosa enquete da revista “France Football”.
Mesmo assim, mesmo com toda aquela pompa, o fato real é que a Juva não foi páreo em momento algum para o Peixe. E, no jogo decisivo, uns sonoros 2 a 0 – gols de Pelé e Dorval – foram mais que suficientes para o Santos ser campeão do aguardado Torneio Itália/ 61.
É bem verdade que, pela imponência que emanava do estilo único daquele mágico Santos, aqueles eram os típicos torneios para serem disputados, sempre, em Paris – em pleno Parc des Princes. Quando muito, em Roma, Madrid, Cidade do México ou Lisboa. Mas, e os múltiplos – e quase sempre escusos – interesses dos cartolas e empresários? O que fazer, senão seguir na irracional roda-viva por países e estádios, enfrentando adversários cada vez mais inesperados?
Afinal, era dos cartolas e empresários, apenas deles e mais ninguém, a ideia de umnovo Pentagonal na longínqua Costa Rica. E ainda houve quem programasse uma surpreendente chegada à, então,desconhecida cidade de Kingston. Sendo que foi lá, sob um calor de mais de 40 graus, que o exaurido time brasileiroparticipou do modesto Torneio Triangular da Jamaica. Por estranha e infeliz ironia, a competição que iria proporcionar o último título internacional de campeão, ao inigualável Santos de Pelé e sua troupe de gênios.
Passados, hoje, nada menos de 50 anos daquele formidável legado de glórias, o que fica nos remoendo a imaginação é uma certa inquietude, uma incômoda impressão. Talvez, a dolorosa certeza de que aquele mágico Santos, o Santos do Rei Pelé e do capitão Carlos Alberto Torres, de Clodoaldo, Edu, Lima, Toninho Guerreiro, Ramos Delgado e tantos outros artistas da bola, poderia muito bem ter durado um tanto mais. O que matou-o, foi a ganância dos cartolas.
Como consolo, o que ficou para os que o viram jogar – como negar? – foi um verdadeiro presente dos deuses. Porém, para os que não o viram, não custa nada imaginar. E sonhar, sonhar …
CANADÁ RETORNA À COPA EM GRANDE ESTILO
por André Luiz Pereira Nunes
Canadá retorna em grande estilo ao Mundial (divulgação)
Finalmente o Canadá dará mais uma vez o ar da graça em um Mundial, feito que não ocorre desde a edição de 1986, no México, quando uma equipe cheia de limitações caiu ainda na primeira fase.
Durante a metade da década de 80, os canadenses vivenciaram a sua melhor fase no futebol. Além de vencerem a Copa da Concacaf, promoveram boa campanha nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984. Nas Eliminatórias para a Copa da Argentina já haviam chegado ao hexagonal decisivo. No ano seguinte, em 1979, disputaram o Mundial de Juniores, sediado no Japão. O time foi a sensação da primeira rodada, ao vencer Portugal por 3 a 1. Nas partidas seguintes, porém, capitulou diante da Coreia do Sul (1 a 0) e o Paraguai, de Romerito, por 3 a 0, sendo então eliminado na fase inicial de grupos.
Diante de um notável crescimento, a seleção principal quase se habilitaria para a Copa do Mundo da Espanha, em 1982. Entretanto, na fase final, disputada em Honduras, bastava apenas vencer Cuba e torcer para que os hondurenhos, líderes e já garantidos no Mundial, empatassem com o México. As coisas, contudo, não decorreram dessa maneira. Os canadenses ficaram no 2 a 2 com os donos da casa para desespero do técnico Barrie Clarke, que também comandara o escrete sub-20.
Em 1985, após conquistar a Copa da Concacaf, o país finalmente alcançou a inédita participação na Copa do Mundo. Todavia, o sorteio das chaves não o favoreceu. Além da França, de Michel Platini, campeã européia e semifinalista da Copa anterior, o Canadá ainda pegaria a Hungria, de Lajos Detari, uma das promissoras sensações do Mundial, que houvera eliminado Áustria e Holanda nas Eliminatórias. Para completar o quadro, o terceiro rival na fase de grupos seria a temível União Soviética, de Igor Belanov, cuja base era composta pelo campeão da Recopa, o fortíssimo Dínamo de Kiev.
Vale, porém, ressaltar que na estréia os franceses não encontraram moleza, só vencendo por 1 a 0, graças a um gol salvador de Jean-Pierre Papin, aos 34 minutos do segundo tempo.
Contra os húngaros, o Canadá realmente pegou uma pedreira, pois seu adversário havia tomado uma inevitável goleada de 6 a 0 para os soviéticos na rodada inaugural. Consequentemente, a sorte mais uma vez não contaria a favor dos canadenses, que caíram por 3 a 0.
Finalmente, no último cotejo, a equipe defrontou os já classificados soviéticos que, mesmo escalando os reservas, não tiveram a menor dificuldade para vencer por 2 a 0. Estava decretada assim a inédita e discreta campanha canadense na Copa do Mundo.
De lá para cá, o Canadá esteve perto de retornar a um Mundial apenas em 1994. Nas Eliminatórias contava com vários remanescentes da epopéia de 1986, como Randy Samuel, Mike Sweeney, David Norman, Carl Valentine e Dale Mitchell. A equipe chegou à última rodada do quadrangular final da Concacaf precisando somente vencer o México, em Toronto. Chegou até a abrir o placar logo no início, mas tomaria a virada nos minutos finais. Despachada para a repescagem, foi batida lamentavelmente pela Austrália. Mesmo tendo vencido em casa por 2 a 1, acabaria perdendo fora pelo mesmo placar, culminando na desclassificação através das cobranças por pênaltis.
Um momento de brilho ainda aconteceria, em 2000, quando o Canadá arrematou a Copa Ouro. Agora, classificados com honra para seu segundo Mundial, buscam conquistar uma campanha ainda melhor. A tarefa, no entanto, não será nada fácil. Seus contendores na primeira fase serão Bélgica, Croácia e Marrocos. Será uma parada bastante difícil.
UM GANSO FORA D’ÁGUA
por Zé Roberto Padilha
Será que não lhe alertaram que o futebol arte acabou?
Que precisa parar de insistir com que a classe, a habilidade, o domínio e a assistência persistam em meio ao futebol moderno?
Quando os garotos chegam às divisões de base, os gritos dos treinadores trogloditas, que tomaram o lugar dos ex-atetas nos clubes, começam a soar: toca, pega, marca, dá um chutão nessa porra!!!
Eles estão salvando seus empregos. E castrando gerações.
Não se formam mais craques, potencializam seu dom ou dão asas às suas infinitas inovações. Cerceiam na fonte ao priorizar a correria. A marcação forte, se possível, um carrinho voador.
Ganhar, por uma bola, como missão também nos infantis, são barricadas que se estendem para evitar a ousadia.
E o garoto vai chegando à graduação com medo de dar um drible. Uma caneta? Vai levar uma porrada porque, tão rara, vai parecer um acinte. Um deboche.
Luiz Gustavo, Fernandinho, Casemiro, Fred, Arthur, Fabinho, todos chegaram craques em seus clubes. Mas só foram convocados porque foram catequizados para deixar, gradativamente, sua classe pelo caminho.
Sabe quando o Ganso vai ser convocado depois que a Era Dunga veio forte e consagrou Felipão?
Quando entrar no Du Lorean do Dr. Brow e desembarcar na década de 1970. Com Ademir da Guia, Gerson, Geraldo, Cléber, Clodoaldo e Carlos Alberto Pintinho, iria entrar para a história do nosso futebol.
Como nasceu ontem e joga hoje, sem Telê Santana no comando da seleção, vai ser sempre um Ganso fora d’água.
Pobre água.