Escolha uma Página

DO PRIMEIRO TIME A GENTE NUNCA ESQUECE

por Zé Roberto Padilha

Aos 12 anos, já torcia para o Fluminense. Aos 8 anos, fui conhecer o Maracanã ao lado da minha família. Toda ela americana. O América venceu e foi campeão carioca. Na volta para Três Rios, falei para o meu pai :

– Gostei daquela torcida. Aquela nuvem de pó de arroz, as cores tricolores…

E ele concordou.

Esse time foi minha referência. A camisa, linda e sem patrocínios, era cobiçada porque não vendia nas lojas. Eram confeccionadas e bordadas às mãos. Puma e Adidas, só décadas depois. Flu Boutique? Nem pensar.

Só a bola era pesada demais. Se chovesse, a água se introduzia no couro e passava a pesar 100kg. O bacana é que essa escalação perdurava por anos, dava para guardar de cabeça e colecionar o álbum de figurinhas da Panini.

Hoje, qualquer Endrick chega ao profissional sem pedir licença. Dar, como nós demos, um “Com licença, Seu Denilson?” .”Sim, pode chegar. Mas senta naquele banquinho e espera sua vez”.

Depois do Gilson Nunes, veio o Lula ocupar a ponta-esquerda. E depois, quando foi vendido ao Internacional, não é que chegara a minha vez?

Saudades. E orgulho de ser tricolor.

DE CARA COM O CARA

por Elso Venâncio

Na última semana, o baixinho Romário participou de dois podcasts. Em um deles foi o convidado, dando entrevista a Bruno Cantarelli e Beto Junior no ótimo Charla PodCast; e no outro, como apresentador, recebendo o craque Neymar na estreia da Romário TV – De Cara com o Cara. A política amadureceu o senador, que hoje vem evitando as polêmicas, sem os ataques e revides que não levam a lugar nenhum. Romário intermediou as pazes do cantor Belo com Denilson e não descarta voltar às boas com Edmundo:

— Jogávamos futevôlei na mesma rede na Barra. Hoje, não, mas já já tudo vai ser como antes — disse o Baixinho. Isso indica que, em breve, o Animal pode ser convidado para a Romário TV.

Parece que foi ontem, mas há 30 anos o Flamengo repatriava o maior jogador do mundo, na mais significativa contratação do futebol brasileiro de todos os tempos, após a conquista do tetracampeonato mundial pela Seleção Brasileira, nos Estados Unidos. Logo que voltou, Romário pediu ao então presidente rubro-negro, Kléber Leite, que contratasse Edmundo, na época o grande jogador do futebol brasileiro com a camisa do Palmeiras.

Formado por Edmundo, Romário e Sávio, o ataque dos sonhos do Flamengo foi implodido pela vaidade. O mesmo aconteceu quando Romário e Edmundo estavam juntos, no Vasco e no Fluminense. Jovens, os ídolos se afastaram, sem ter, na realidade, nenhum motivo sério que justificasse o rompimento. Romário, por exemplo, mora na casa que era de Edmundo, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Recomendo a entrevista de Romário no Charla PodCast. Ele ficou à vontade para contar suas historias, que não são poucas. O papo de Cantarelli, Beto Junior e Romário me fez lembrar do Mundial de 1994. Na véspera do embarque da equipe da Rádio Globo AM-RJ, recebi um inusitado telefonema da Mônica Santoro, esposa do Baixinho na época:

— Você poderia levar uma calça, um sapato e BIS (chocolate) para Romário?.

Nos Estados Unidos, o mais famoso atleta da Copa não falava com a imprensa e me cobrava a entrega da encomenda, que condicionei a uma entrevista exclusiva.

A Casa da Brahma, em Los Gatos, recebia alguns jogadores da Seleção que mantinha sob contrato, em dias de folga. Lá esperei Romário, que abriu o coração numa longa entrevista para o “Show da Madrugada”, apresentado ao vivo, direto da Califórnia, pelo inesquecível Washington Rodrigues. O astro falou de tudo, pautando os jornais do Brasil por alguns dias. Mas o que era para ser destaque passou desapercebido: “Ganho a Copa e volto para jogar no Flamengo”. Isso era simplesmente inacreditável!

Incrédulo, arrogante e com o nariz em pé, o vice-presidente de futebol do Barcelona, Juan Gaspar, avisou a Kléber Leite:

— Só se o senhor pagar 4 milhões e meio de dólares.

— Faço agora o depósito — foi a resposta.

Um pool de empresas garantiu a transação. Romário passou a ser a maior personalidade não só do futebol brasileiro, mas de todo o país.

IMORTAL ATÉ QUANDO NOSSO FUTEBOL MERECIA

por Zé Roberto Padilha

Não era apenas o futebol praticado no país que exalava arte. Sua magia se expandia para os jornais, com Nelson Rodrigues e Armando Nogueira escrevendo colunas que eram verdadeiras poesias. A arte também contagiava as transmissões esportivas, onde João Saldanha dava moldura ao que assistia e descrevia com maestria.

Léo Batista fazia no Globo Esporte o que Luis Mendes e os Apolinhos faziam no rádio: transformavam o esporte em um instrumento mágico de interação com os torcedores. Lá em casa, o almoço era servido antes ou depois do Léo Batista.

O futebol brasileiro era uma religião, e os estaduais eram mais importantes que qualquer competição nacional. A Taça Guanabara, por exemplo, sempre bateu recordes de público e renda.

Com o tempo, nossos craques partiram para a Europa e só retornavam um ano antes da aposentadoria. Assim, encheram nossos clubes de idade e levaram para Brasília e Cariacica o que antes era jogado no quintal da nossa casa.

Léo Batista, como qualquer amante do nosso futebol, estava cansado de noticiar a vinda de Coutinho e a partida de Luiz Henrique. Dos meninos de Xerém que nos deixam a cada dia enquanto o Fluminense insiste em trazer Renato Augusto e anuncia o retorno de René, dispensado pelo Flamengo.

Para quem se orgulhou de apresentar à nação os gols de Vavá, Ronaldo e Careca, ter que anunciar a escalação de Carlinhos no comando do ataque do Flamengo, ou Lelê no Fluminense, era um fardo difícil de carregar.

Portanto, não cobrem lucidez dos jornalistas que hoje inundam as mesas redondas. Não há fragrâncias exaladas dos campos que os inspirem como antes, quando tínhamos a presença e a voz de Léo Batista.

Ele foi imortal enquanto a hegemonia do futebol brasileiro merecia sua presença.

Descanse em paz.

LÉO BATISTA, INTERMINÁVEL

por Paulo-Roberto Andel

Várias vezes por semana, eu volto a onze, dez ou oito anos de idade por alguns segundos ou minutos, só para lembrar de histórias e histórias de garoto, possivelmente a melhor época da minha vida. E ser garoto para mim era ter esportes por perto, praticando ou acompanhando.

Quando estava em casa de folga, a TV era uma distração. Os esportes. Os meus contemporâneos, todos perto dos sessenta anos hoje, tinham como referências na TV o Esporte Espetacular e o Globo Esporte. Em ambos, a voz de Léo Batista era a referência para nós. E olhe que ele vinha de muito antes, dos anos 1940!

Narrou a triste final da Copa de 1950, sem conseguir transmitir – fato que o entristeceu para sempre. Foi o primeiro jornalista a noticiar a morte de Getúlio Vargas. E já experiente, colonizou o jornalismo esportivo na TV brasileira, sem deixar herdeiros mas com certeza influenciando centenas de profissionais.

Volto aos treze anos, lá está a voz de Léo Batista no Globo Esporte e nos gols do Fantástico – um jogo à parte, que passava de verdade todos os gols de todo o Brasil.

A voz interminável ecoou por anos, anos e décadas até que hoje encontrou o silêncio. Mas nenhuma história é representada por seu final, e com 70 anos de carreira as histórias de Léo Batista são muito grandes para caber num livro.

Neste caso a história é de uma voz familiar, que sempre esteve dentro das nossas casas. Uma voz inesquecível.

Agora, Léo Batista se junta a outros grandes nomes do jornalismo esportivo brasileiro, como Jorge Curi, Waldir Amaral, Fiori Gigliotti, Celestino Valenzuela e, tantos, tantos outros craques que, com suas narrações, fizeram a crônica do esporte brasileiro na alegria e na tristeza, mas dúvida na vocação para a eternidade. O que difere Seu Léo de todos os demais é que nenhum foi tão longevo quanto ele, trabalhando com alta qualidade praticamente até o fim.

O Seu Léo, que agora deixa tanta saudade num domingo cinza, é o mesmo que por muitos anos abraçava minha mãe e a chamava de Lurdinha me Copacabana. Mais do que uma voz, o abraço também é um desenho da saudade.

Agora eu vou para os 57 anos, e pela primeira vez em minha vida vou estranhar o silêncio de Léo Batista.

Felizmente, fica uma história gigante!

QUANDO ERA O CARIOCÃO

por Paulo-Roberto Andel

Para os mais jovens é coisa difícil de acreditar, mas houve um tempo dos anos 1970 e 1980 onde os garotos, loucos por futebol, não estavam nem aí para a Libertadores e o Brasileiro. Copa do Brasil e Sul-americana sequer existiam. O grande lance era o Campeonato Carioca, com os timaços na disputa e muitas surpresas dentre as equipes de menor investimento.

Primeiro, claro, o nível técnico era muito superior ao atual. Segundo, mesmo em má fase, os grandes times cariocas tinham brincando seis jogadores de ponta, o que acirrava a disputa. Terceiro: as equipes mais modernas tinham pelo menos três ótimos jogadores, o que garantia as brigas. Por fim, os jogos nos campos menores significavam batalhas duríssimas que dificultavam qualquer supremacia. Olaria na Bariri, Campo Grande no Ítalo del Cima, Madureira em Conselheiro Galvão, a Portuguesa na Ilha e até os times de outras cidades eram absolutamente temíveis, trazendo equilíbrio e emoção à competição.

Os tempos mudaram, novos campeonatos surgiram, o modismo internacional e as cotas de TV levaram as atenções para outros campos, mas o velho Campeonato Carioca, mesmo surrado e maltratado pelos próprios dirigentes, ainda atrai a atenção de muita gente que foi criada com a supremacia do Rio no país.

Algo para se pensar: desde que o futebol brasileiro passou a desprezar de vez as equipes de menor porte em suas competições, logo no começo deste século, o Brasil nunca mais conquistou a Copa do Mundo. Coincidência ou seca na torneira da produção de craques, que sempre foi alimentada pelas equipes de menor poder financeiro? Nunca é demais refletir.

@pauloandel