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ÍDOLO, ÍDOLO?

por Paulo-Roberto Andel

Antigamente era outra coisa. Você tinha o craque e o ídolo, às vezes os dois se encontravam numa pessoa só. Se não acontecesse, tudo bem.

O craque era o craque, mostrava sua habilidade, a capacidade de resolver jogos difíceis, de realizar lances inesquecíveis. Ganhar títulos também, mas não necessariamente. É fácil lembrar de dois tremendos craques que foram ídolos do Botafogo e não foram campeões: simplesmente Heleno de Freitas e Mendonça.

O ídolo era o ídolo. Podia ser craque ou até não ser, mas precisava de qualidades especiais: liderança, garra, atitude, carisma, espírito de equipe, comportamento distinto. Muitas vezes o ídolo passava sua carreira toda num só clube. Agora, sendo craque e ídolo, era um foguete para o céu. Todos os clubes tiveram os seus.

Hoje em dia no Brasil, os jogadores ficam pouco tempo no clube, e quando voltam é para encerrar a carreira. Muitos são conhecidos dos torcedores pela TV, muitas vezes pela maioria de crianças e jovens, porque muitos campeonatos internacionais são disputados no fuso horário da tarde por aqui. E aí vem a confusão: o sujeito vira ídolo não necessariamente pelo que fez no clube, mas também em outros lugares.

Claro, não existe uma regra para se determinar quem é ídolo ou não. Cada um tem o seu e pronto. Basta respeitar a opinião do outro.

Na pequenina parte que me cabe, meus ídolos foram personagens da minha infância. Ainda tive um já adulto: Ézio. O artilheiro que certamente foi um dos jogadores mais dedicados e fidalgos que o Fluminense já teve em sua gigantesca galeria de ídolos. Antes dele? Ricardo Gomes, Assis, Edinho, a Máquina Tricolor toda. E Denílson, Telê, Waldo, Castilho, muitos nomes. Depois vieram grandes admirações e algumas decepções. É do jogo.

Os garotos de 2024 nem sempre têm ídolos que honram suas camisas com atitudes dignas. Alguns têm futebol, outros fazem gols, outros são polêmicos, outros criam confusão. Os tempos mudam, as visões também. Os grandes ídolos nem sempre são grandes pessoas. Talento com a bola não eleva o caráter de ninguém. Às vezes o sujeito é só uma celebridade talentosa. Para não se decepcionar, o melhor de sempre é checar quem é quem, dentro do possível. Mas ninguém precisa ficar chateado: dá pra curtir o time e as conquistas sem necessidade de ter um ídolo. No fim, o escudo sempre prevalece.

@p.r.andel

SALÃO, CAMPO, SOÇAITE

por Raul Quadros*

Joaquim é considerado um dos maiores jogadores da história do futebol soçaite no Brasil.

Um domingo desses de março, folheando “O Globo”, vejo uma entrevista com Ze Brito, um dos jogadores do Milionários, famoso time de futebol soçaite do Clube Caiçaras, quase imbatível nas décadas de 70 e 80. Nela ele diz com todas as letras que o melhor atacante que viu nos campo de peladas foi Joaquim – que era, inclusive, o artilheiro do Milionários.

Dias depois, caminhando pelas alamedas do Piraquê, encontro com Dobbin, meu companheiro dos tempos de banco escolar do Colégio Militar, hoje, comodoro do clube. Tínhamos combinado há algumas semanas, que eu escreveria uma matéria sobre a sinuca e os frequentadores dela. Naquele momento mudou tudo.

– Deixa pra falar da sinuca depois. Faz uma matéria com o Joaquim. Que tal ?

Concordei na hora.

Joaquim é sócio do Piraquê há mais de 50 anos. E peladeiro há muitos anos, tam-bém. Jogou salão, campo e soçaite a vida toda. Soçaite joga até hoje: às quartas à noite, sábados e domingos, pela manhã. No Piraquê, claro.

Começou no futebol de salão em 1964, com 13 anos. No Carioca Esporte Clube, no Jardim Botânico. Dois anos depois foi para o Fluminense. Jogou nos juvenis e foi campeão carioca. Passou, também, pelo Grajaú TC, Grajaú CC, Social Ramos, Rocha Miranda e Sírio e Libanês.

Joaquim jogava de pivô e foi artilheiro de todos os clubes pelos quais jogou. Quando estava no futebol de salão do Fluminense, em 1966, foi convidado por Antoninho para fazer testes no campo. Antoninho era técnico dos juvenis do Fluminense e da seleção brasileira amadora.

Joaquim se apresentou ao técnico Pinheiro, dos infantis, e foi aprovado. Mas ficou pouco tempo no campo. Preferiu continuar apenas no salão.

E no soçaite, onde está até hoje.

Disputou vários Campeonatos do Aterro promovidos pelo Jornal dos Sports,vestindo as camisas do Clube Naval (Piraquê) ,Tio Patinhas – ou Tio Iberê, como também foi chamado e do Milionários. Eram equipes fantásticas e placares elásticos, goleadas, eram registradas em quase todos os jogos delas.

No final de cada ano, por causa da fama, principalmente do Milionários, era programado um jogo contra uma seleção de profissionais do futebol. Um deles foi em dezembro, num sábado à tarde, ano 1979. 

Equipe Milionários: Santoro; Ricardo, Quevedo e lório; Zé Brito e Ricardo Peixoto; Joaquim e Julio Chaves.

Desafiantes: Paulo Sérgio (Fluminense); Zé Maria (Internacional), Jorge e Junior (Flamengo); Carlos Alberto Pintinho (Fluminense) e Adílio (Flamengo); Gil (Fluminense) e Paulo César Lima.

Placar final: Milionários 12 x 4 Desafiantes

– Quantos gols você fez, Joaquim ?

– Não sei, não lembro…

– E na tua “carreira” toda ?

– Não contei…

Joaquim pode não ter contado, pode não lembrar mas, acho que há um pouco de modéstia nas respostas dele…

Afinal, o Zé Brito diz naquela entrevista para “O Globo” que o maior atacante socaite que ele viu jogar foi o Joaquim. E completa imaginando que “Joaquim deve ter feito mais de três mil gols em toda vida dele. Fui.

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*RAUL QUADROS, o autor dessa matéria, foi um destacado jornalista esportivo que dispensa maiores apresentações. Foi também sócio do Clube Naval por mais de vinte anos.

NAQUELE TEMPO ERA ASSIM

por Victor Kingma

Anos 60, as matinês dominicais e o Canal 100

No início dos anos 60, ter um aparelho de TV em casa era um privilégio apenas para as famílias mais abastadas. Assistir a um bom filme no cinema, então, era um dos principais divertimentos para a criançada do bairro onde eu morava em Juiz de Fora, Minas Gerais. 

O cinema vivia o seu auge e enormes filas se formavam nos dias de exibição dos grandes filmes. Seja pelos apreciadores de épicos, como “El Cid” ou “Os Dez Mandamentos”, de aventuras como “Tarzan, o Rei das Selvas”, um bom faroeste nos moldes de “Duelo de Titãs” ou “Sete Homens e Um Destino”, e até uma boa comédia nacional, com o inesquecível Mazzaropi.

As sessões de cinema apresentavam ainda uma atração a mais: a exibição, antes dos filmes, do cine-jornal Canal 100. 

Fundado no final dos anos 50 por Carlos Niemeyer o documentário sempre apresentava um resumo dos acontecimentos importantes da época, que podia ser a inauguração de Brasília, a nova capital, em 1960, pelo presidente Juscelino Kubitscheck, a renúncia do presidente Jânio Quadros, em 1961, ou as conquistas do campeão Éder Jofre, o Galo de Ouro, no Boxe. 

Entretanto, para os apaixonados por futebol como eu e tantos meninos do bairro, o auge do canal 100 acontecia no final, quando eram apresentados os lances do principal jogo da semana. 

A molecada vibrava quando o slogan do futebol aparecia na tela, acompanhado da trilha sonora marcante que eternizou a música “Na Cadência do Samba”, do compositor Luiz bandeira e seus versos iniciais: “Que bonito é”… 

Com sua voz grave, o locutor Cid Moreira, na época em início de carreira, era o narrador oficial.

Quando o Flamengo conquistava algum título a filmagem era ainda mais completa e vibrante, devido à grande paixão do produtor Carlos Niemeyer pelo rubro-negro. 

Lembro-me bem de que muitas vezes íamos à matinê do cine São Mateus, não pelo filme que estava passando, mas pelo jogo que seria exibido pelo documentário. 

Todos que frequentavam os cinemas daquela época, com certeza, guardam grandes lembranças dos saudosos tempos das matinês e do Canal 100.

BOLA DE OURO, QUEM MERECIA?

por Idel Halfen

Premiação da Bola de Ouro. 

A imprensa, sabe-se lá por qual razão, aponta previamente que o brasileiro Vinicius Jr. é o favorito. Algumas horas antes sai a notícia de que o jogador e demais representantes do seu time, o Real Madrid, cancelaram a ida ao evento, o que passa a ser um prenúncio, ou uma quase certeza de que o ganhador seria outro.

De fato, o vencedor foi outro, o espanhol Rodri, fato que provocou uma verdadeira comoção entre os brasileiros. 

Acusações de racismo e de injustiça rechearam as redes sociais.

Fica a dúvida: baseado em quais critérios, pode-se dizer que o Vinícius Jr. foi melhor que o Rodri. E quais os estabelecidos para apontá-lo como pior? Primeiramente é importante ter em mente de que escolhas subjetivas, tal como essa, dão margem a interpretações, as quais, jamais serão unânimes. Outro ponto: acho muito difícil que os “revoltados” tenham assistido a todas as partidas dos dois jogadores, muito menos que tenham o devido embasamento para estarem absolutamente certos.

Já a atitude do Real Madrid foi péssima para o esporte, pois passa um péssimo exemplo de que, não sendo da forma que se objetiva, não há interesse em fazer parte das atividades. 

O juiz nos prejudicou! Quantas vezes ouvimos, e cá entre nós, falamos, após uma derrota do nosso time? Por outro lado, quantas vezes ouvimos ou falamos que vencemos graças à ajuda do árbitro. Certamente a primeira situação ocorre muito mais vezes do que a segunda, se é que essa acontece.

As urnas foram fraudadas! Alguém que tenha o candidato como vencedor de algum pleito político já proferiu essa frase após o sucesso? Já quando perde…

Não fiz um tempo melhor porque o dia estava muito quente! Quem nunca ouviu essa frase de algum amigo após uma competição de corrida ou triathlon, por exemplo?

A verdade é que qualquer coisa que frustre nossas expectativas nos leva num primeiro momento a “terceirizar” a responsabilidade. Faz parte! O problema é ficar com essa percepção durante muito tempo achando que há uma conspiração contra suas predileções.

Voltando à premiação da Bola de Ouro e à especulação sobre racismo, vale lembrar que o Lamine Yamal do Barcelona foi eleito o melhor jogador revelação.

Essa ponderação em nada coloca em dúvida a existência de atos de racismos em inúmeras outras situações, os quais precisam ser punidos de forma dura e exemplar. O alerta que precisa ser feito, diz respeito a um possível exagero, onde suspeitas não confirmadas acabem minimizando a importância da causa. 

Vale também a reflexão acerca do vazamento do resultado, fato que permite divagar se vale a pena ficar insatisfeito com “eleições” cuja proteção da informação é negligenciada.

OU ELE OU EU

por Elso Venâncio

Marcelo merece respeito e consideração como ídolo eterno do Fluminense, mas ninguém está acima da instituição. No futebol, os grandes astros, com raras exceções, são supervaidosos e gostam de mandar e desmandar. Nenhum jogador pode ficar chateado por ficar no banco ou entrar quase no fim do jogo.

— Não toque em mim. Para de fazer média com a torcida! — disse Marcelo ao técnico Mano Menezes, de forma intempestiva, na beira do campo. Foi a gota d’água numa relação há tempos desgastada. Mano sabia dos problemas enfrentados pelo seu antecessor, Fernando Diniz, o que o encorajou a bater de frente com o multicampeão.

O caso Marcelo lembra Gabigol, que, sem limites no Flamengo, extrapolou e criou atritos. Só agora, depois de um ano perdido, o atacante rubro-negro foi enquadrado e voltou a ser decisivo.

Craques costumam derrubar treinadores e até companheiros de time. Romário, após a derrota no famoso Fla-Flu de 1995, com gol de barriga do Renato Gaúcho, disse para a diretoria do Flamengo: “Ou ele (Vanderlei Luxemburgo) ou eu”. O artilheiro era o todo poderoso, num clube que tinha dificuldade para pagar salário e não estava estruturado para receber o então maior jogador do mundo. Rodrigo Fabri, contratado com status de craque junto ao Real Madrid, preferia chutar a gol do que dar assistências ao Baixinho. Nâo à toa, foi para o banco de reservas e acabou negociado. 

Evaristo de Macedo foi o único que não perdeu o controle do grupo naquele conturbado Flamengo. “Aqui, quem mandou sou eu. Sou eu!”, gritou no vestiário, reprimindo Romário. 

Também podemos lembrar de Djalminha, joia da base rubro-negra, que encarou e partiu para a briga com Renato Gaúcho num Fla-Flu, em 1993, no Caio Martins. Renato dava as cartas e avisou: “Ou ele ou eu”. Então com 31 anos, Renato ficou, enquanto Djalma, de 22, foi emprestado ao Guarani de Campinas, se tornando posteriormente um dos grandes do futebol no Brasil e no exterior.

A atual posição da diretoria do Fluminense seria diferente se Marcelo estivesse em forma e fazendo a diferença. Talento ele tem, mas, estando com a vida resolvida, demonstra não ter paciência para que volte a atuar em alto nível. Ainda se encontra acima do peso e tendo sucessivas contusões.

É fato que Marcelo se tornou uma lenda viva no Real Madrid, pelo qual jogou 16 temporadas, conquistando 25 títulos. Com 36 anos e agora fora do Fluminense, ele tende a voltar ao clube espanhol, mas como gestor ou embaixador. Até mesmo porque o seu filho Enzo, que nasceu em Madri, é uma das maiores revelações da base merengue, sendo constantemente convocado para a seleção sub-15 da Espanha. 

Marcelo também está eternizado em Xerém. Bastar dizer que o Fluminense batizou com o seu nome o campo em que forma diversos craques.