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COMO CONSTRUÍ UM AMOR

por André Felipe de Lima

Eu tinha, sei lá, uns quase seis anos. Vivo confundindo minha idade. Ter nascido em um dia 31 de dezembro sempre deixou-me um pouco (às vezes até muito) confuso. E é assim até hoje. Só tenho certeza de que o ano era 1974 e o mês era julho. Ano e mês em que comecei a compreender que o futebol entrara em minha vida para não mais sair dela. Um dia em que, ao lado do meu pai, assisti, numa TV colorida (raridade na época), da tribuna dos profissionais do Hipódromo da Gávea, o jogo em que o Brasil perdera da Holanda, sim, a “Laranja mecânica”, de um tal “Cruyff”. Meu pai via o jogo e conversava comigo como se eu lá entendesse alguma coisa daquilo que se passava na TV. Solitários, eu e papai, em um jóquei clube completamente vazio, sem vivalma sequer, vimos o Brasil tomar um baile. Eu, e faço questão de frisar, não entendia nada do que acontecia em campo, mas achava do cacete aquele monte de maluco (sim, para mim todos uns doidos varridos) cabeludo (sim, cabeludos, porque era moda, na época, ostentar cabeleiras) chutando a bola um para o outro e os que vestiam camisa de cor azul tentando roubar a bola do pé dos camaradas que vestiam blusa laranja. Comecei a me dar conta de que aquilo ali, além de ser muito divertido, chamava-se futebol. Essa emoção aumentaria no mês seguinte. Eu explico o porquê. Meu pai tinha tudo para ser botafoguense. O pai dele, meu avô, o levava a jogos do Botafogo, isso lá nas décadas de 1940 e de 50. Mas havia um certo “Expresso da Vitória”, cuja camisa era ora branca, com faixa diagonal preta e uma cruz de malta no coração, ora o contrário, ou seja, preta com faixa branca, porém com a cruz sempre em vermelho. Havia também naquele “Expresso da Vitória” um cara chamado Ademir, com um queixo proeminente, mas com uma imagem quase bíblica nas fotos. Papai mostrou a foto dele para mim. Bom, por causa do tal Ademir o meu pai ignorou a “pressão” do vovô, deixando para lá o Botafogo. Voltando a minha particular história, eu, no mês seguinte aquele jogo dos caras de azul contra os caras de laranja, voltei a me empolgar com o futebol. Estavam em campo, aquele time da cruz de malta e outro com cabeludos de azul. Sabia que meu pai gostava do time que tinha a cruz de malta. Tentara me explicar isso algumas vezes, a história dele com o vovô. Mas não demoraria para que eu a compreendesse. Daquela vez não assistimos ao jogo pela TV. Não tínhamos TV em casa. Ouvimos, então, pelo rádio. E, naquele dia de agosto de 1974, passei a amar três coisas, e todas, harmoniosamente como uma trova, entrelaçadas: o time da cruz de malta, o futebol e as transmissões pelo rádio. O jogo terminara e recordo a alegria do meu pai, que gritava: “É campeão! É campeão! O Vasco é campeão!”. Eu não entendia rigorosamente nada, mas gritei com ele. “Campeão, papai! Campeão, papai! Vasco! Vasco! Vasco!”. No dia seguinte, logo cedo, pela manhã, peguei minha caixinha de lápis de cor e desenhei, tentando copiar o que via no jornal do meu pai, o escudo que se tornaria amor da minha vida, e encantei-me com a foto, em especial, de um cabeludo, de proeminentes dentes frontais e de sorriso farto, que no jornal se encontrava. As imagens daquele escudo e do cabeludo de sorriso farto jamais saíram da minha memória. E da minha caixinha de lápis de cor nasceu o que eu entendia como “O meu Vasco, o meu amor”. Obrigado, Ademir, pelo meu pai; obrigado Roberto Dinamite, por mim.

CADA DIA MAIS POBRES

:::::::: por Paulo Cézar Caju :::::::

Ainda nem me recuperei da partida do Pelé – se é que algum dia vou recuperar – e ontem recebi mais uma notícia que me deixou sem chão. Na verdade, tem sido tempos difíceis para os amantes do esporte, sobretudo pra mim.

Em meados de 2021, tive a perda repentina do meu irmão Fred Marinho. Quem o conheceu sabe a pessoa incrível que era e ainda sinto demais a sua partida. Penso nele todos os dias! Em novembro, a Isabel, lenda do vôlei, morreu de uma síndrome respiratória. No fim do ano, foi o nosso Rei e agora o Dinamite!

Assim como fazia com os marcadores nos gramados, o artilheiro lutou até o fim contra um tumor no intestino, um adversário implacável. Nossos ídolos, nossas referências, estão indo embora e sabe qual é o pior? Os clubes não estão extraindo a sabedoria, o conhecimento, a experiência desses que fizeram chover dentro de campo e colocaram seus nomes na história do futebol.

Respondam com sinceridade! Faz algum sentido os dirigentes optarem pelos professores de educação física ao invés de colocarem os craques do passado – aqueles que vivenciaram o futebol de verdade – comandando alguma categoria das divisões de base? A resposta é óbvia! Como vão ensinar pra garotada como se bate na bola se nunca chutarem uma? Como dizer o comportamento dentro de campo, se nunca assinaram uma súmula? Os clubes precisam mudar essa postura antes que seja tarde, e o tempo é curto!

Lembro direitinho quando Roberto Dinamite surgiu nos profissionais, em 1971, no Maracanã, e já carimbou o apelido que acompanhou durante toda a carreira. Aos 17 anos, o garoto marcou um gol contra o Internacional, no Maracanã, e no dia seguinte a capa do Jornal dos Sports estampava: “Garoto-dinamite explodiu”. É, e dificilmente será superado, o maior artilheiro da história do Vasco da Gama com 708 gols marcados e também o que mais balançou a rede na história do Campeonato Brasileiro, com 190 tentos. Precisa dizer algo mais?

Se já não fosse o bastante, era uma pessoa incrível fora de campo e quem conheceu sabe o privilégio que era estar com Bob. Brincalhão, humilde e sempre de bem com a vida, jamais se comportou como a estrela que era e fazia questão de atender todos os fãs, seja lá onde estivesse.

Em um dos últimos encontros que tivemos, num almoço na casa do Sergio Pugliese, para o Museu da Pelada, simulamos uma cobrança de falta com a barreira e o goleiro improvisados com copos e talheres, relembrando o estilo de bater na bola de cada um. Nos divertimos bastante! Eu fui um dos primeiros a bater falta no canto do goleiro, desde os tempos de futebol de praia, no Columbia. Enquanto Bob tinha aquela pancada, eu dava um toque sutil na bola. Mas a verdade é que o goleiro não pegava nenhuma das duas! Kkkk!

Antes de terminar a coluna, gostaria de lembrar de um chocolate que demos no River Plate, time base da seleção argentina que tinha conquistado a Copa de 78, quando atuávamos pelo Vasco da Gama no Troféu Joan Gamper! Lembro de ter feito dois gols no Fillol, que saiu com a cabeça quente! Kkkk! Descanse em paz, meu amigo! Você fará muita falta!

Pérolas da semana:

“Sempre brigando pela segunda bola, o time busca a saída pela beirada através do corredor lateral, que proporciona uma leitura de jogo com apetite reativo e filosófico para pular do trem em aceleração”.

“Para subir as linhas ou mantê-las baixa, o treinador liga a torneira geométrica que visa um amasso espinhoso associando o encaixe com assistência para o último homem do ataque chapar a bola com precisão”.

GOL DO ROBERTO

por Wesley Machado

Corriam 11 minutos e 30 segundos do primeiro tempo no Maracanã. O Corinthians já vencia o Vasco por 1 a 0, gol do volante Caçapava. O comentarista Orlando Fantoni havia dito que não se devia esperar muito de Roberto Dinamite, que voltava do Barcelona após três meses na Espanha e três gols pelo Barça, que trocou o treinador que levou Roberto; e Dinamite, após conversar com Márcio Braga do Flamengo, acabou convencido por Eurico Miranda e, ouvindo o coração, retornou ao Cruzmaltino.

Era a reestreia do “Garoto-Dinamite”, apelido cunhado pelo jornalista do Jornal dos Sports, Eliomário Valente e utilizado pelo editor do Cor de Rosa, Aparício Pires, com uma nota em 20 de novembro de 1971: “Vasco escala o garoto-dinamite”. O jogo seria contra o Galo. Na semana seguinte, Roberto faz um golaço diante do Inter em sua estreia pelo Vasco e no Maracanã e o JS estampa na manchete: “GAROTO-DINAMITE EXPLODIU”! O mesmo jornal já havia utilizado o termo “dinamite” para identificar o forte chutador Quarentinha do Botafogo em 1960.

Mas voltemos ao início do texto e avancemos no tempo. O Vasco perdia de 1 a 0 para o Corinthians no Brasileiro de 1980. Foi quando Roberto decidiu começar o seu show de bola e gols! Primeiro ao receber uma bola recuperada, fazer o pivô, driblar e chutar forte para o fundo das redes. Depois, arriscando de fora da área e contando com a ajuda do montinho artilheiro. Em seguida, ao correr e receber na entrada da área e chutar mais uma vez forte. “Gol do artilheiro nato, do goleador nato, gol de Roberto”, narrou Luciano do Valle.

Sócrates diminuiria de pênalti. Mas no segundo tempo, o time da virada, com a camisa número 1 preta, ampliou o placar. De novo, ele, Roberto. Cinco vezes. Dinamite 5 x 2 Corinthians. Luciano do Valle narrou assim: “Lá vai Roberto. Bateu pro gol! Golaço sensacional de Roberto! Mas que gol! Uma finta de corpo desconcertante sobre o zagueiro central Mauro, que também ficou olhando não sei o quê. Veja bem. E uma bomba no ângulo esquerdo do goleiro Jairo”. O repórter Raul Quadros pergunta: “Fantoni, explica estes cinco gols do Roberto”. E ele, que havia sido treinador do Vasco, se rende: “Uma coisa inédita. Cada um mais bonito do que o outro. Nossa Senhora”!

Em 2020, passadas quatro décadas, o ídolo concedeu uma entrevista para o site oficial do clube e lembrou com carinho a partida histórica. “Foi o jogo da minha vida (…) Isso pra mim realmente teve um significado muito especial (…) Ficou marcado e guardado pro resto da minha vida (…) Foi um dia que deu tudo certo (…) Eram mais de 100 mil pessoas. A preliminar foi Flamengo e Bangu e a torcida do Flamengo ficou junto com a do Corinthians. Fla-Fiel. Mas não teve jeito. Cinco oportunidades, cinco gols e saímos pro abraço”.

PELÉ E ROBERTO DINAMITE, GIGANTES DO FUTEBOL

por Luis Filipe Chateaubriand

Um, era chamado de Pelé!

Usava a perna direita magistralmente.

Usava a perna esquerda magistralmente.

Cabeceava com precisão.

“Matava” a bola no peito com esmero.

Era especialista em chutar de longe, de média distância e de perto.

Também era especialista em “rabo da vaca”.

Marcou mais de mil gols e ganhou cinco mundiais, três pela Seleção Brasileira e dois pelo Santos.

É o maior jogador de futebol de todos os tempos!

O outro, atendia pelo apelido de Roberto Dinamite.

Tinha um “canhão” nos pés.

É o maior artilheiro da história do Campeonato Brasileiro, com 190 gols.

É o maior artilheiro da história nos clássicos Vasco da Gama x Flamengo, Vasco da Gama x Fluminense e Vasco da Gama x Botafogo.

Fez gol antológico, “chapelando” zagueiro de alta estirpe.

Marcou mais de 700 gols na carreira.

Participou de duas Copas do Mundo de seleções.

Roberto Dinamite era muito bom, Pelé é lenda!

Perdemos Pelé e perdemos Roberto Dinamite, ambos foram derrotados na luta contra o câncer. Bom, a pelada no céu vai ser animada!

GRANDES AMIGOS

por Marcos Eduardo Neves

Neste dramático 8 de janeiro, quando o Brasil chora a perda de Roberto Dinamite, um dos maiores jogadores da História do futebol nacional, revelo em primeira mão um trecho que sairá no meu livro “O EFEITO ZICO”, que lanço ainda este ano.

Afinal, Zico e Roberto sempre foram grandes amigos. E continuarão sendo, porque amizade verdadeira é como o sentimento de um cruz-maltino: não morre jamais.

Eis o trecho:

“Essa coisa de rivalidade, sempre achei que deveria ficar apenas nas torcidas. Por exemplo, sempre me dei bem com o Roberto Dinamite. Não havia intriga, a gente só ‘rivalizava’ para promover nossos jogos. Deve ser por isso que sou respeitado até mesmo pela torcida do Vasco. Nunca zombei dela, sempre corri em direção à minha torcida para comemorar meus gols ou nossos triunfos.

Não à toa, quando o Roberto se despediu do futebol, diante do La Coruña do Bebeto, em 23 de março de 1993, vesti sem problemas a camisa cruz-maltina no Maracanã. Ainda distribuí centenas de autógrafos quando treinamos um dia antes, em São Januário. Foi estranho? Sim, foi. Mas fiz pelo Roberto, de quem sempre fui amigo. Antes e depois de pararmos de jogar.”

É isso. Descanse agora, Roberto. Um dia vocês vão se rever. Qualquer dia nos revemos também.

Força, Vasco!