NAQUELE TEMPO ERA ASSIM
por Victor Kingma
Anos 60, as matinês dominicais e o Canal 100
No início dos anos 60, ter um aparelho de TV em casa era um privilégio apenas para as famílias mais abastadas. Assistir a um bom filme no cinema, então, era um dos principais divertimentos para a criançada do bairro onde eu morava em Juiz de Fora, Minas Gerais.
O cinema vivia o seu auge e enormes filas se formavam nos dias de exibição dos grandes filmes. Seja pelos apreciadores de épicos, como “El Cid” ou “Os Dez Mandamentos”, de aventuras como “Tarzan, o Rei das Selvas”, um bom faroeste nos moldes de “Duelo de Titãs” ou “Sete Homens e Um Destino”, e até uma boa comédia nacional, com o inesquecível Mazzaropi.
As sessões de cinema apresentavam ainda uma atração a mais: a exibição, antes dos filmes, do cine-jornal Canal 100.
Fundado no final dos anos 50 por Carlos Niemeyer o documentário sempre apresentava um resumo dos acontecimentos importantes da época, que podia ser a inauguração de Brasília, a nova capital, em 1960, pelo presidente Juscelino Kubitscheck, a renúncia do presidente Jânio Quadros, em 1961, ou as conquistas do campeão Éder Jofre, o Galo de Ouro, no Boxe.
Entretanto, para os apaixonados por futebol como eu e tantos meninos do bairro, o auge do canal 100 acontecia no final, quando eram apresentados os lances do principal jogo da semana.
A molecada vibrava quando o slogan do futebol aparecia na tela, acompanhado da trilha sonora marcante que eternizou a música “Na Cadência do Samba”, do compositor Luiz bandeira e seus versos iniciais: “Que bonito é”…
Com sua voz grave, o locutor Cid Moreira, na época em início de carreira, era o narrador oficial.
Quando o Flamengo conquistava algum título a filmagem era ainda mais completa e vibrante, devido à grande paixão do produtor Carlos Niemeyer pelo rubro-negro.
Lembro-me bem de que muitas vezes íamos à matinê do cine São Mateus, não pelo filme que estava passando, mas pelo jogo que seria exibido pelo documentário.
Todos que frequentavam os cinemas daquela época, com certeza, guardam grandes lembranças dos saudosos tempos das matinês e do Canal 100.
BOLA DE OURO, QUEM MERECIA?
por Idel Halfen
Premiação da Bola de Ouro.
A imprensa, sabe-se lá por qual razão, aponta previamente que o brasileiro Vinicius Jr. é o favorito. Algumas horas antes sai a notícia de que o jogador e demais representantes do seu time, o Real Madrid, cancelaram a ida ao evento, o que passa a ser um prenúncio, ou uma quase certeza de que o ganhador seria outro.
De fato, o vencedor foi outro, o espanhol Rodri, fato que provocou uma verdadeira comoção entre os brasileiros.
Acusações de racismo e de injustiça rechearam as redes sociais.
Fica a dúvida: baseado em quais critérios, pode-se dizer que o Vinícius Jr. foi melhor que o Rodri. E quais os estabelecidos para apontá-lo como pior? Primeiramente é importante ter em mente de que escolhas subjetivas, tal como essa, dão margem a interpretações, as quais, jamais serão unânimes. Outro ponto: acho muito difícil que os “revoltados” tenham assistido a todas as partidas dos dois jogadores, muito menos que tenham o devido embasamento para estarem absolutamente certos.
Já a atitude do Real Madrid foi péssima para o esporte, pois passa um péssimo exemplo de que, não sendo da forma que se objetiva, não há interesse em fazer parte das atividades.
O juiz nos prejudicou! Quantas vezes ouvimos, e cá entre nós, falamos, após uma derrota do nosso time? Por outro lado, quantas vezes ouvimos ou falamos que vencemos graças à ajuda do árbitro. Certamente a primeira situação ocorre muito mais vezes do que a segunda, se é que essa acontece.
As urnas foram fraudadas! Alguém que tenha o candidato como vencedor de algum pleito político já proferiu essa frase após o sucesso? Já quando perde…
Não fiz um tempo melhor porque o dia estava muito quente! Quem nunca ouviu essa frase de algum amigo após uma competição de corrida ou triathlon, por exemplo?
A verdade é que qualquer coisa que frustre nossas expectativas nos leva num primeiro momento a “terceirizar” a responsabilidade. Faz parte! O problema é ficar com essa percepção durante muito tempo achando que há uma conspiração contra suas predileções.
Voltando à premiação da Bola de Ouro e à especulação sobre racismo, vale lembrar que o Lamine Yamal do Barcelona foi eleito o melhor jogador revelação.
Essa ponderação em nada coloca em dúvida a existência de atos de racismos em inúmeras outras situações, os quais precisam ser punidos de forma dura e exemplar. O alerta que precisa ser feito, diz respeito a um possível exagero, onde suspeitas não confirmadas acabem minimizando a importância da causa.
Vale também a reflexão acerca do vazamento do resultado, fato que permite divagar se vale a pena ficar insatisfeito com “eleições” cuja proteção da informação é negligenciada.
OU ELE OU EU
por Elso Venâncio
Marcelo merece respeito e consideração como ídolo eterno do Fluminense, mas ninguém está acima da instituição. No futebol, os grandes astros, com raras exceções, são supervaidosos e gostam de mandar e desmandar. Nenhum jogador pode ficar chateado por ficar no banco ou entrar quase no fim do jogo.
— Não toque em mim. Para de fazer média com a torcida! — disse Marcelo ao técnico Mano Menezes, de forma intempestiva, na beira do campo. Foi a gota d’água numa relação há tempos desgastada. Mano sabia dos problemas enfrentados pelo seu antecessor, Fernando Diniz, o que o encorajou a bater de frente com o multicampeão.
O caso Marcelo lembra Gabigol, que, sem limites no Flamengo, extrapolou e criou atritos. Só agora, depois de um ano perdido, o atacante rubro-negro foi enquadrado e voltou a ser decisivo.
Craques costumam derrubar treinadores e até companheiros de time. Romário, após a derrota no famoso Fla-Flu de 1995, com gol de barriga do Renato Gaúcho, disse para a diretoria do Flamengo: “Ou ele (Vanderlei Luxemburgo) ou eu”. O artilheiro era o todo poderoso, num clube que tinha dificuldade para pagar salário e não estava estruturado para receber o então maior jogador do mundo. Rodrigo Fabri, contratado com status de craque junto ao Real Madrid, preferia chutar a gol do que dar assistências ao Baixinho. Nâo à toa, foi para o banco de reservas e acabou negociado.
Evaristo de Macedo foi o único que não perdeu o controle do grupo naquele conturbado Flamengo. “Aqui, quem mandou sou eu. Sou eu!”, gritou no vestiário, reprimindo Romário.
Também podemos lembrar de Djalminha, joia da base rubro-negra, que encarou e partiu para a briga com Renato Gaúcho num Fla-Flu, em 1993, no Caio Martins. Renato dava as cartas e avisou: “Ou ele ou eu”. Então com 31 anos, Renato ficou, enquanto Djalma, de 22, foi emprestado ao Guarani de Campinas, se tornando posteriormente um dos grandes do futebol no Brasil e no exterior.
A atual posição da diretoria do Fluminense seria diferente se Marcelo estivesse em forma e fazendo a diferença. Talento ele tem, mas, estando com a vida resolvida, demonstra não ter paciência para que volte a atuar em alto nível. Ainda se encontra acima do peso e tendo sucessivas contusões.
É fato que Marcelo se tornou uma lenda viva no Real Madrid, pelo qual jogou 16 temporadas, conquistando 25 títulos. Com 36 anos e agora fora do Fluminense, ele tende a voltar ao clube espanhol, mas como gestor ou embaixador. Até mesmo porque o seu filho Enzo, que nasceu em Madri, é uma das maiores revelações da base merengue, sendo constantemente convocado para a seleção sub-15 da Espanha.
Marcelo também está eternizado em Xerém. Bastar dizer que o Fluminense batizou com o seu nome o campo em que forma diversos craques.
a menina no alambrado
por Claudio Lovato Filho
Pois é, menina. O que eu posso te dizer?
Tem gente falando que você exagerou, que se arriscou sem necessidade.
Outros, que você só queria aparecer e que deu mau exemplo.
Será?
Eu não vi nada disso. Eu vi paixão.
Alguém poderia me perguntar: “E se fosse a sua filha, machucada daquele jeito por causa do arame farpado, correndo o risco de despencar do alambrado e se arrebentar?”
Pois é, menina. Como eu responderia a isso?
Não sei.
“Eu não posso por ser mulher?”, você perguntou quando foram lhe entrevistar depois do jogo.
Certeza que se em seu lugar fosse um menino a repercussão seria outra. Todo mundo sabe. O mundo é assim.
Você disse que queria voar, e, como não podia, subiu no alambrado.
Você tinha que extravasar de algum jeito, não é? Aquilo tudo no seu coração tinha que sair de algum jeito.
A verdade é que, naquele momento, o coração do El Cilindro era você.
O coração do futebol era você.
O futebol era você.
Marianela, Mari, o que você foi fazer, hein?
E o Yuri estava lá, no lugar certo, na hora certa, como costuma acontecer com todos os fotógrafos bons de bola.
Naquele momento, você era a mensagem; e ele, o meio.
Se você fosse minha filha eu talvez estivesse escrevendo tudo isto numa cama de hospital, caso tivesse sobrevivido ao infarto.
Mas cá estamos todos nós, todos firmes e fortes, você, o Yuri Laurindo, eu e todos nós que sabemos que a verdadeira essência do futebol está toda lá, simbolizada na foto.
A sua imagem no alambrado do El Cilindro.
Seu joelho cortado, seu braço “desansando” sobre o arame, suas lágrimas, seu amor por um clube, por um escudo. Tudo lá, naquela imagem.
O que mais eu posso dizer?
O CRAQUE DA MODA
por Elso Venâncio
Luiz Henrique, 23 anos, é o craque da moda do futebol brasileiro. Atacante canhoto, ele possui dribles e velocidade impressionantes para quem tem 1,82m de altura. Além de ser goleador, também dá assistências, deixando os companheiros na cara do gol.
Entre o final da década de 1960 e o início dos anos 1970, Paulo Cézar Caju, do Botafogo, recebeu do locutor esportivo Waldir Amaral, da Rádio Globo AM-RJ, o apelido de Craque da Moda. Campeão do mundo pela Seleção Brasileira em 1970, Caju era um meia adaptado à ponta-esquerda que desequilibrava em campo. O botafoguense João Saladanha ficava ao lado do Waldir Amaral nas Jornadas Esportivas. Era “o comentarista que o Brasil consagrou” e tinha opiniões marcantes.
— Esse PC é um garoto grande jogando bola no meio de crianças — dizia Saldanha.
Em ótima fase atualmente, Luiz Henrique tem momentos em que lembra Paulo Cézar Caju, só que jogando pela direita e usando a perna esquerda. O camisa 7 é o astro nas vitoriosas campanhas do Botafogo, líder do Campeonato Brasileiro e virtual finalista na Libertadores. Além disso, empurrou a capenga Seleção Brasileira rumo às recentes vitórias nas Eliminatórias. Saiu do banco nas duas últimas partidas, sempre para decidir. Primeiro marcou o gol da virada contra o Chile, nos 2 a 1, em Santiago. No jogo seguinte, contra o Peru, entrou já com 2 a 0 no placar para o Brasil, mas ainda deu passe para o gol de voleio do Andreas Pereira e fechou a goleada com um chute de fora da área.
Revelado em Xerém pelo Fluminense, em que chegou aos nove anos, Luiz Henrique foi negociado com o Real Betis, da Espanha, por 8 milhões de euros, em julho, de 2022. Para repatriá-lo, John Textor desembolsou 20 milhões de euros, sendo o maior e melhor investimento feito pelo Botafogo.
Pelé eternizou a camisa 10, que se tornou referência, sendo usada pelos craques dos times de futebol. O Botafogo é excessão à regra, pois tem a camisa 7 como mística. Foi esse o número usado por Jairzinho, Maurício e Túlio Maravilha, além do inesquecível Garrincha, a Alegria do Povo. Agora, Luiz Henrique é quem honra esse legado.
A próxima missão alvinegra na Libertadores é um jogo de risco, por ser no Uruguai, contra o Peñarol. Nas derrotas, os uruguaios costumam partir para a briga. Mas o célebre Papai Joel lembra que, “quando o Botafogo ganha, aparecem torcedores de tudo quanto é lado”. Confiantes, estão nas ruas, em sua maioria vestindo a gloriosa camisa de número 7.