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O PASSARINHO CONTINUA VOANDO

por Mauro Ferreira

No meio de campo daquele fantástico Flamengo de 70/80 havia um passarinho. Não cantava, não piava. Encantava. Seu voo silencioso, rápido, rasteirinho, beirando a grama, encantava. E ai de quem tentasse prender o passarinho. Risco certo de um tombo daqueles vergonhosos, enquanto, sorriso aberto no bico, o passarinho voava…

Ah, o sorriso do passarinho… Era tímido uma hora; outras horas, quase sacana. Só não deixava de sorrir. Nunca. O passarinho estava sempre sorrindo. Vida leve a do passarinho, sempre voando, sempre voando. Escolheu gaiolas estranhas e grandes para exibir sua arte. E, mesmo engaiolado, exibia majestoso a penugem vermelha e preta, toda lustrosa, todo majestoso. Sabia estar livre, livre o passarinho. Ia para a gaiola para se divertir e divertir que estivesse de olhos grudados em seu voo…

Até que o passarinho resolveu sair de cena. Foi rápido, bem rápido. Num piscar de olhos, voou rasteirinho mais uma vez, só que para longe dos olhos de quem admirava suas peripécias. Desta vez, o drible foi em todos. Como nunca conseguiu ser preso, voou para bem longe, muito longe. Subiu para as nuvens atrás de outras gaiolas.

Adílio faleceu.

O passarinho continua voando.

O MAIOR CAMPEONATO DO MUNDO

por Zé Roberto Padilha

Nada se compara, em qualidade e equilíbrio, ao Campeonato Brasileiro. Que outro pelo mundo possui 20 clubes onde o último colocado, o Atlético-GO, joga na casa do adversário, campeão da Libertadores, vice mundial de clubes, o Fluminense, e joga melhor e lhe impõe uma derrota?

Tão equilibrado e com seus times investindo cada vez mais, repatriando suas crias, como Lucas, Coutinho, Thiago Silva, alguns se tornando SAF, que a cada rodada a tabela não se estende, no sentido de um clube se isolar na liderança ou rebaixamento, mas se comprime como numa sanfona quando ela se fecha.

Tão juntos que uma vitória ou derrota parecem valer 6 pontos pra cima ou para baixo tal a proximidade. Em outros campeonatos, ou dá Inter, Milan ou Juventus, Real ou Barcelona, PSV ou Ajax, Porto, Benfica ou Sporting e aqui nem tem como fazer previsões.

Aí vocês me perguntam: se é o melhor e mais difícil, por que o Brasil não ganha uma Copa há 22 anos?

A matéria prima Mãe in Brazil, cheia de dribles e improvisos, é vendida com 17 anos de produção. E passa a ser treinada pela geração Tic-Tac. Guardiola e seus seguidores não permitem mais de dois toques na bola. Aí são convocados para defender uma seleção brasileira jogando como europeus.

Pode trocar Diniz por Dorival, que enquanto ela for formada por quem joga na Europa jamais ela irá recuperar sua característica maior, seu diferencial, que nos levou a ser cinco vezes campeã mundial: a arte de criar algo novo. E jogar diferente.

Da última safra, um menino que desfilava seu variado repertório pelo Alianz Park, e encantava todo mundo, já caiu nas amarras dos Lancelottis. Ao estreiar contra o Barcelona, Endrick já ouviu: “Toca!!”.

E tudo que fez para encantar vai se desfazendo por obedecer, tocar e se adequar ao Padrão FIFA que alcançou os estádios por dentro e por fora.

GEOVANI E ADÍLIO

por Rubens Lemos

Quando o tema é meio-campo, nem pensar em meio-termo. Os retranqueiros do Brasil assassinaram o sarau literário de um time de futebol. A estrada por onde enchemos os olhos do mundo com luminosos craques e arquitetos, planejadores e cérebros de uma partida de futebol.

Me causa tanto desânimo o futebol patropi que voltei ao redemoinho dos anos 1980. Da minha década. Do meu tempo. Do brilho dos jogos a cada trama de categoria e talento criativo. Fixei minha saudade em dois exemplares preciosos do dom de fazer feliz um amante da arte sepultada: Geovani, camisa 8 do Vasco, Adílio, camisa 8 do Flamengo.

Geovani e Adílio nunca disputaram Copas do Mundo. São dois injustiçados incríveis. Geovani poderia ter ido em 1986 e em seu lugar jogou Alemão. Geovani seria o titular mais aclamado em 1990, na insossa equipe de Sebastião Lazaroni e não viajou para a Itália. Alemão novamente, com Tita aos pedaços na reserva, foram convocados.

Adílio surgiu com a morte de outro solista, Geraldo Assobiador, de choque anafilático em operação para retirada de amígdalas. Adílio, juvenil nascido na Cruzada São Sebastião, conjunto de apartamentos para pobres, criado por Dom Hélder Câmara em plena área nobre do Rio de Janeiro, foi o companheiro perfeito de Zico.

Adílio de Oliveira Gonçalves era o típico carioca de morro. Negro, pernas arqueadas, andar gingado, malabarista com a bola. Criava no meio-campo e, se o treinador quisesse, driblava até a sombra de Nelson Rodrigues, deslocado para a ponta-esquerda. Teria vaga em 1978, seguiram Chicão e Batista, em 1982, na vaga de Renato Pé-Murcho, do São Paulo. Adílio jogou uma só partida pela seleção brasileira, em março de 1982 e foi excepcional diante de 150.289 pagantes.

Deu o passe medido para Júnior fazer o gol da vitória de 1×0 sobre a Alemanha Ocidental. É ela sim, a Alemanha que hoje põe na roda os pernas-de-pau de camisa amarela. Recebeu nota 10 da imprensa e Telê Santana o preteriu. Adílio também tinha vaga em 1986, Copa do Mundo em que foram passear Valdo e o falecido Edivaldo.

Geovani ganhou o Mundial de Juniores de 1983 pela seleção brasileira sub-20. Foi artilheiro e melhor jogador. Nasceu no tempo errado. Deveria ter surgido antes. A síndrome dos brucutus se alastrava e o seu estilo elegante, cadenciado, imperial na armação de jogadas era considerado lento e em desuso.

Geovani foi o jogador que conquistou o maior número de títulos cariocas pelo Vasco juntamente com Roberto Dinamite: Foram cinco, todos vencendo ao Flamengo. Geovani foi o melhor jogador das Olimpíadas de Seul em 1988. Tomou um cartão amarelo na semifinal contra a Alemanha (coincidência lamentável) e o Brasil perdeu a final contra a URSS. Neto ocupou o seu lugar e nada fez.

O capixaba Geovani foi o melhor jogador da América do Sul em 1988 e em 1989, venceu a Copa América pela seleção de Lazaroni, já na reserva, vítima do esquema de cinco zagueiros e menos um inteligente no meio e sobrou da lista porque Lazaroni tinha um compromisso de camaradagem com o seu “compadre” Tita.

Nos jogos entre Vasco e Flamengo na década de 1980, Geovani e Adílio coadjuvavam, ainda que tão brilhantes quanto às estrelas. A Geovani, Romário deve muitos dos seus gols, recebendo livre na área lançamentos de 40 metros, fita métrica na chuteira do Pequeno Príncipe, assim batizado o regente cruzmaltino.

Adílio destruía adversários quando Zico era anulado por três marcadores. Até dois ele resolvia fácil, fácil. Adílio, tendo mais atrás Andrade, ritmava o sensacional Flamengo campeão da Libertadores e do Mundial Interclubes de 1981.

Geovani e Adílio se respeitavam. Geovani, embora mais novo, aparentava a maturidade de um Gerson, mais toque e passes longos do que rapidez. Raciocínio genial na antevisão dos lances. Adílio, manhoso, balançava o corpo e se sobrepunha a qualquer marcador, desnorteado com tanta beleza afro-carioca.

Geovani e Adílio, observando emocionado o velho jogo – tenho muitos no acervo para me encantar mais adiante , pouco se encontravam, nunca trombavam um no outro. Eram clássicos, sutis, desconcertantes. Eles pensavam, traziam do ventre de suas mães, a intelectualidade boleira que desapareceu para sempre.

Geovani e Adílio jogavam num tempo de sábios: Havia Sócrates, Pita, Zenon, Delei, Silas, Mário Sérgio em fase vinho puro, Raí começando. Sobravam virtudes.

Lamentáveis do baixo nível atual, naquele tempo, com muito esforço, disputariam a quarta divisão de Ariquemes em Rondônia. Meninos de hoje, se vocês tivessem visto Geovani e Adílio, falar em Renato Augusto, Lucas Lima, seria blasfêmia. Penso em Geovani e Adílio. Com saudade e revanche.

PARADA DOS JOGOS DOS GRANDES CLUBES NAS DATAS FIFA

por Luis Filipe Chateaubriand

As Datas FIFA foram criadas para que as Seleções de Futebol possam jogar ao longo da temporada.

Em cada temporada, tem-se três Datas FIFA em Setembro, tem-se três Datas FIFA em Outubro, tem-se três Datas FIFA em Novembro, tem-se três Datas FIFA em Março e tem-se três Datas FIFA em Junho.

Se essas datas são reservadas para os jogos de seleções, parece claro que, nelas, não deve haver jogos de clubes.

Só que não…

Pelo menos, no Brasil.

Sucede que, aqui, ao contrário do resto do planeta, os clubes principais jogam muitas vezes em Datas FIFA.

Assim, cria-se uma desnecessária competição entre futebol de clubes e futebol de seleções, o que é péssimo para o negócio.

E os grandes clubes, que pagam altíssimos salários aos seus melhores jogadores, se veem desprovidos deles, quando jogam em Datas FIFA.

A situação é absurda!

Se queremos ter, no Brasil, um calendário de futebol minimamente aceitável, é necessário parar com essa prática.

O futebol brasileiro agradece!

CARLINHOS E VALFRIDO

por Zé Roberto Padilha

Quem se lembra dele? Valfrido era chamado de “O Espanador da Lua” e, neste fim de semana, vendo o Carlinhos jogar, lembrei dele. Vocês, os mais antigos, sabem o porquê.

O que nem os mais novos e antigos entendem é porque o Tite não faz o simples. Escala o Gabigol no ataque ao lado do Bruno Henrique. E deixa o Carlos Valfrido no banco.

Dar ao Gabigol a responsabilidade de criação, de achar soluções inteligentes para furar um bloqueio e ele mesmo aparecer como jogador surpresa, aí já é demais.

Se Carlinhos e Valfrido, pelo seu tamanho, espanam a lua, Tite anda vivendo por lá.

Desse jeito, fica difícil ver o Flamengo jogar.