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10 ANOS SEM O GODOFREDO CRUZ

por Wesley Machado

O antigo estádio Godofredo Cruz, do Americano Futebol Clube, fica localizado na Avenida 28 de Março, número 948, no Parque Tamandaré, em Campos dos Goytacazes-RJ.

O Estádio Godofredo Cruz foi inaugurado em 24 de janeiro de 1954 em uma rodada dupla entre Americano X Vasco e Goytacaz X Bangu.

Em 24 de agosto de 1975, no Godofredo Cruz, o Americano venceu o Santos por 2 a 1 na estreia do Campeonato Nacional em dia de grande festa no estádio e na cidade de Campos.

Menos de seis meses depois, no dia 17 de fevereiro de 1976, o Alvinegro Campista derrotou, em sua casa, o maior rival, o Goytacaz, por 1 a 0, gol de Paulo Roberto de pênalti, e conquistou o Eneacampeonato Campista.

Em 30 de março de 1983, o Godofredo Cruz recebe o que é considerado o maior público oficial da história do estádio, 22.853 pagantes na partida do Americano contra o Flamengo.

Em 28 de abril de 2002 o Americano ganhou, em seu estádio, o Vasco por 2 a 1 de virada e se sagrou campeão da Taça Guanabara, num dos maiores feitos do clube.

O último grande momento do Godofredo Cruz foi o amistoso de Túlio Maravilha com o Botafogo em 27 de dezembro de 2012. No ano seguinte, 2013, há exatos 10 anos, o estádio foi demolido.

UMA COISA JOGADA COM MÚSICA – CAPÍTULO 6

por Eduardo Lamas Neiva

Enquanto Gonzaguinha, Ruy e Magro se despedem da plateia agradecendo pelos aplausos, Zé Ary vai à vitrola e põe pra tocar a faixa “Futebol de Bar”, do disco “São Paulo-Brasil”, de Cesar Camargo Mariano, lançado em 1977.

Um músico: – Ótima escolha, Zé Ary! Cesar Camargo Mariano é muito fera.

Garçom: – E o nome da música tem tudo a ver com o que estamos presenciando: Futebol de Bar.

João Sem Medo: – Boa, Zé Ary. Muito boa!

Ao fim da música, a plateia volta todas as suas atenções aos quatro amigos, que aproveitam a deixa silenciosa para prosseguirem a conversa de onde haviam parado antes da interpretação de Gonzaguinha, Ruy e Magro de “Se o meu time não fosse o campeão” 

João Sem Medo: – Ainda nos anos 10 do século XX, as vitórias dos grandes clubes, principalmente nos clássicos, já estavam fazendo os torcedores vibrarem mais com a gozação após a vitória sobre um rival.

Ceguinho Torcedor: – É verdade, João. Certa vez, em 1915, encomendamos um jantar de vitória quando vencíamos o América por 3 a 0, mas quem apareceu no restaurante no Centro da cidade foram os americanos. Eles viraram pra 5 a 3.

Sobrenatural de Almeida: – A partir daí, os jantares só eram marcados quando o árbitro apitava o fim do jogo. hahahaha

Ceguinho Torcedor: – O problema era contratar a banda pra tocar. Os músicos ficavam escondidos. Se vencíamos, eles apareciam e tocavam a noite toda. Mas se perdêssemos, a banda ficava esperando a turma do time rival sair de frente do restaurante ou da sede pra ir embora de fininho.

Músico (do palco): – E os músicos não recebiam?

Ceguinho Torcedor: – Sim, recebiam. Eram pagos mesmo assim.

João Sem Medo: – Pros clubes grandes da zona sul do Rio, Fluminense, Botafogo e Flamengo, o pior era aguentar o gozo dos torcedores do América, que era até então, o único time grande da zona norte. E isso começou a criar rivalidades que iam pro campo, e a cordialidade já não era mais a mesma. Houve muita invasão de campo e pancadaria, inclusive no aristocrático estádio das Laranjeiras.

Ceguinho Torcedor: – Em 16, num Fla-Flu, Coelho Netto, que era deputado, foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras e pai de Preguinho, grande ídolo tricolor…

Idiota da Objetividade: – … autor do primeiro gol da seleção brasileira numa Copa do Mundo, em 1930, no Uruguai.

Ceguinho Torcedor: – Ídolo tricolor de todos os esportes, o Preguinho. Um super-campeão, um multi-homem! Mas eu falava de seu pai, deputado, escritor, um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras junto com Machado de Assis… pois bem, ele, naquele Fla-Flu de 1916, pulou o alambrado pra invadir o campo, inconformado com o árbitro, que tinha mandado repetir uma cobrança de pênalti pro Flamengo que Marcos Carneiro de Mendonça…

Idiota da Objetividade: – O primeiro goleiro da seleção brasileira!

Ceguinho Torcedor: – Exatamente, exatamente… Como eu falava antes de ser interrompido pelo Idiota, o árbitro mandou repetir uma cobrança de pênalti que Marcos Carneiro de Mendonça tinha defendido, e a elegância do Coelho Netto foi deixada nas sociais. Com sua bengala ameaçadora foi pra cima do juiz. Aquela ação do nobre deputado acabou incentivando a torcida tricolor a invadir o campo também. O jogo, que era vencido pelo Flamengo por 3 a 2, foi suspenso e disputado em outra data. O Fluminense acabou vencendo por 3 a 1.

Idiota da Objetividade: – Uma vergonha!

Sobrenatural de Almeida: – Naquele dia, eu já tinha feito o Fluminense perder um pênalti, cobrado pelo Riemer, pra fora.

João Sem Medo: – Naquele tempo, a regra determinava que se a confusão durasse pelo menos cinco minutos o jogo era suspenso.

Sobrenatural de Almeida: – O pessoal entrava na confusão de olho no relógio se o seu time estivesse perdendo.

Idiota da Objetividade: – Como sempre, o jeitinho brasileiro prejudicando o espetáculo.

João Sem Medo: – Mas nos primeiros anos do futebol tivemos também grandes exemplos de esportividade e honestidade. Mimi Sodré, um dos maiores nomes do escotismo brasileiro, é um deles. Mimi apontava ao árbitro quando cometia uma infração.

Garçom: – Isso existiu no Brasil? Ah, só antigamente mesmo.

João Sem Medo: – Mimi Sodré, campeão pelo Botafogo em 1910 e 1912, quando também foi artilheiro do campeonato, se a bola batesse na mão dele, não dava mais um passo sequer. Chegou a pedir ao árbitro pra anular um gol seu, num jogo da seleção brasileira militar.

Ceguinho Torcedor: Mario Filho contou também que Mimi Sodré tirou algumas vitórias do Botafogo com sua honestidade. Os outros jogadores do Botafogo tentaram mudá-lo, em vão.

Garçom: – Seu Mario Filho bem podia vir aqui pra contar essas e muitas outras histórias.

Ceguinho Torcedor: – Seria ótimo, mas infelizmente ele não poderá vir desta vez. De alguma forma, ele está presente, pois muito do que estamos contando ele revelou em seu clássico livro “O negro no futebol brasileiro” e em crônicas que assinou nos jornais em que trabalhou e comandou. Recomendo que leiam.

Sobrenatural de Almeida: – Mario Filho conta também que quando Mimi Sodré levantava o dedo, a arquibancada vinha abaixo, parecia gol, mas o “Menino de Ouro”, que depois virou “Velho Lobo” pros escoteiros, era muito querido da torcida por ser honesto demais. As moças davam gritinhos entusiasmados e todo mundo batia o pé na arquibancada. Assombroso o Mimi, assombroso!

Alguém na plateia: – Assombroso mesmo. Já pensou hoje um jogador pedindo ao árbitro pra anular um gol que marcou? É capaz de apanhar da própria torcida.

Sobrenatural de Almeida: – E ainda ser expulso de campo por desacato ao árbitro. (dá sua risada medonha) hahaha

João Sem Medo: – Aconteceu algo parecido, não tem muito tempo, num clássico em São Paulo…

Idiota da Objetividade: – … Isso mesmo, João. Foi no primeiro jogo da semifinal do Campeonato Paulista de 2017. O zagueiro Rodrigo Caio, do São Paulo…

João Sem Medo: – Hoje no Flamengo…

Idiota da Objetividade: – Isso mesmo. Ele, naquele clássico paulista,  disse ao árbitro que Jô, atacante do Corinthians, não havia atingido o goleiro tricolor Renan Ribeiro e sim ele próprio. Com isso, o cartão amarelo que havia sido dado pro Jô foi retirado pelo árbitro Luis Flávio de Oliveira.

João Sem Medo: – Alguns torcedores do São Paulo não gostaram. Parece que o técnico, o Rogério Ceni, e alguns jogadores do time tricolor também não.

Idiota da Objetividade: – O Corinthians, que já vencia por 1 a 0, depois fechou a vitória com mais um gol.

João Sem Medo: – No início da década de 10, o torcedor se manifestava poucas vezes, era mais contido durante os jogos. Até pelos próprios árbitros, como já dissemos. Às vezes parecia jogo de tênis. Mas com o passar do tempo, com o futebol ficando cada vez mais popular e os estádios ficando mais cheios, o barulho foi aumentando.

Ceguinho Torcedor: – Nos anos 20, o público cresceu ainda mais nos estádios de futebol, e as arquibancadas começaram a ficar sem os rostos conhecidos e passou aos poucos a receber a massa. O barulho aumentou muito e aí eu já não estava mais tão sozinho nos gritos. Mas era um solitário, pois a multidão é inumana, não tem cara.

Sobrenatural de Almeida: – Até música passou a ser cantada e tocada nas arquibancadas.

O papo estava tão animado que ninguém – ou quase ninguém – percebeu que Mussum tinha subido ao palco e aguardava a deixa pra poder se anunciar.

Mussum: – Cacildis! Vou aproveitar a brecha pra penetrar nessa área. Cês me permitem?

Os quatro amigos e o público concordam, com entusiasmo.

Mussum: – Obrigadis! Cês tão falando de torcedor e música, então vou cantar uma coisinha do Dicró, que está por aí, eu acho. Ele, depois de tomar umas e outras com a gente, vem aqui pra cantar umas boas também. “O torcedor”, vamo lá, rapaziadis!

Depois de se divertirem muito, todos aplaudem.

Mussum: – Obrigadis, minha gente! Olha, antes de me pirulitar, quero deixar um recado pros babacas racistas que sacanearam meu filho num estacionamento lá no Rio um tempo atrás. Eu pego vocês, me aguardem!

É mais aplaudido ainda. De pé.

O VASCO DA GAMA DE TODOS OS TEMPOS

por Luis Filipe Chateaubriand

No gol, a classe e elegância de Moacir Barbosa.

Na lateral direita, a seriedade de Augusto.

De zagueiro central, a liderança de Hideraldo Luiz Bellini.

De quarto zagueiro, a sensatez de Mauro Galvão.

Na lateral esquerda, a versatilidade de Mazinho.

Como primeiro volante, Fausto, a maravilha negra.

Como segundo volante, a sobriedade de Danilo Alvim.

Na ponta de lança, o descortino de Roberto Dinamite.

Atacante pelo lado direito, a impetuosidade de Edmundo.

Centroavante, o oportunismo de Ademir Marques de Menezes.

Atacante pelo lado esquerdo, a genialidade de Romário.

Barbosa; Augusto, Bellini, Mauro Galvão e Mazinho; Fausto, Danilo e Dinamite; Edmundo, Ademir e Romário.

E aí?

Vai encarar?

DEVE SER COMO ACELERAR UMA MERCEDES

por Zé Roberto Padilha

Terça, durante a transmissão de Flu X Strongest, lembraram da nossa Máquina Tricolor, versões 75 e 76. O bom momento da equipe de Fernando Diniz merece a comparação com aquele time que tinha quatro tricampeões mundiais (Félix, Marco Antonio, Paulo César e Rivelino) além de Toninho, Edinho, Gil, Mario Sergio e Pintinho que jogaram na seleção.

E que tive a honra de jogar ao lado do Zé Mario, Cleber, Erivelton e Manfrine. José Carlos Araújo, o Garotinho, nos chamava, pela correria danada que fazia, de “O acelerador da máquina”.

Talvez por ter machucado tanto, poucas vezes tive vontade de estar ali de novo, naquele tapete do Maracanã, pois as contusões e as conquistas se equivaleram. Até que deram um close na chuteira do Ganso.

Depois de muitos anos, me deu vontade de chorar. E de voltar a jogar.

Que coisa maravilhosa. Algo que deve acontecer com o Emerson Fittipaldi, bicampeão mundial, que construiu e dirigiu o Copersucar, ao ver a nova Mercedes entrar na pista.

A nossa chuteira (foto) era de couro duro e as seis trava (duas na frente e quatro atrás) eram atarrachadas com pinos que atravessavam um solado frágil e feria todo o pé. A batida na bola doía por todo o corpo.

Já a do Ganso, denominada Nitro Charge Adidas, tem o cabedal fabricado com Hybrid Touch-screen, que combina os benefícios do couro e do sintético em um único material para obter leveza e conforto.

Traz a tecnologia Energy Pulse, unidade elástica localizada na frente do pé que oferece um retorno da energia empregada na corrida.

Já falei que deu vontade de chorar e jogar?

Tudo bem. Ganso merece. Eu e o Emerson merecíamos também.

Foi bom, deu vontade de vestir outra vez a camisa 11 tricolor e entrar em campo porque o Eduardo, meu neto, ligou dizendo que estava no setor leste.

“Perto da geral?”. Perguntei.

À esta altura, já delirava na ligação.

MESTRE ZIZA

por Péris Ribeiro

Vibrante, Zizinho comemora a conquista da Taça Oswaldo Cruz contra o Paraguai, em 1956

Como Pelé, não havia zagueiro que o marcasse. Como Pelé, aprendeu a bater para preservar a integridade. Justo a integridade de quem sabia mais em um campo de bola. De quem podia, sempre, dar gols e talento refinado de presente para as arquibancadas em festa.

Ah, que pena, torcedor de hoje, você não ter visto as coisas que esse Thomaz Soares da Silva inventava, num repente, a cada palmo de grama. Coisas que lhe davam um ar de Mozart tecendo filigranas ao piano. Ou faziam com que a gente sentisse que, ali, estava um Leonardo da Vinci criando obras primas com os pés, na imensa tela do gramado do Maracanã.

Mesmo assim, torcedor de hoje, de uma coisa tenha você a certeza: aquele moço moreno, de mediana estatura brasileira, mereceu como poucos a cognominação universal de Mestre. E foi como Mestre que imperou absoluto pelos nossos campos, por volta das décadas de 40 e 50.

Ídolo e espelho no qual procurava se refletir o então menino Pelé, aquele gênio por excelência do futebol viveu momentos de idolatria junto ao povo. E tais momentos, por sinal, só seriam comparáveis aos dedicados a mitos como o presidente Getúlio Vargas, o “Gegê Pai dos Pobres”. Ou a Francisco Alves, o inigualável “Rei da Voz” dos auditórios da Rádio Nacional do Rio de Janeiro.

Dono de muitas glórias, o que o Mestre Ziza costumava comentar era que, de algumas delas, chegava a guardar lembranças forte, eternas – certamente, um contrabalanço para a dolorosa perda da Copa de 50, em pleno Maracanã, para os uruguaios.

  • No tricampeonato que ganhei com o Flamengo, onde já brilhavam o Domingos da Guia e o Perácio, dei logo o ar da minha graça, pois parti para a consagração bem no início da carreira, no começo dos anos 40. E na Seleção, também tive bons momentos. Ajudei o Brasil a ganhar a Copa Rocca da Argentina, em 1945. Ganhei a Taça Oswaldo Cruz dos paraguaios duas vezes. E fui campeão do Sul-americano de 1949, sendo considerado o maior jogador da competição – lembrava com carinho o velho Mestre.

Que gostava sempre, no entanto, de comemorar uma conquista toda especial:

  • É que em 1957, aos 38 anos, provei a mim mesmo – e a muita gente que já duvidava do meu futebol – que não estava acabado. Que podia comandar um time, ainda. Então, ser campeão naquele ano com o São Paulo, foi uma emoção que mexeu muito comigo. Ainda mais, porque ganhamos do Santos do Pelé de 6 a 2, em plena Vila Belmiro. E do Corinthians, do Luizinho “Pequeno Polegar”, de 3 a 1, na grande decisão. Não há como negar. Aquele meu São Paulo era mesmo espetacular!

Particularmente, porque tinha o Poy no gol; o Mauro e o De Sordi, lá no fundo-de-zaga; o Maurinho, o Gino e o Canhoteiro arrasando no ataque. E o Dino Sani ali comigo, dominando o meio-de-campo…

Gênio na acepção do termo, eis que o que chega, até mesmo, a soar como inverossímil, é que aquele venerável Mestre Ziza – ou simplesmente, Zizinho – nunca tenha deixado de mostrar um total espírito guerreiro em campo. Solidário como poucos, era visto a acudir, a qualquer tempo e momento, o companheiro em apuros. Fosse na disputa de uma jogada ou no ato de uma covarde agressão, praticada por um zagueiro adversário.

Só que o que devia mesmo, isso sim, era jogar sempre de fraque e cartola. Sapatos de cromo, ao invés de chuteiras. Como o irretocável deus dos estádios, que sempre foi…