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QUANDO A SELEÇÃO BRASILEIRA JOGAVA AQUI

por Zé Roberto Padilha

Quando olhamos essa foto, notamos que, com a exceção do Aílton, todos defenderam a seleção brasileira. Não é pouca coisa.

Jogavam aqui, votavam aqui, falavam a língua daqui e viviam os mesmos problemas de todos nós, brasileiros.

E o mais importante: jogavam o futebol alegre e criativo que sempre foi nossa marca registrada.

Agora, são convocados aqueles que são vendidos cedo, são treinados pelos Guardiolas da vida que cerceia a criatividade, o drible, em prol do tic-tac coletivo. Tudo o que fizeram diferente na base foi concretado pela mesmice arduamente aplicada.

E assim vão perdendo o toque magico, o diferencial com que Zico, Ronaldinho Gaúcho, Rivelino, Gerson e Romário encantaram o mundo. Possibilitaram ao Brasil ter o pulo do gato e alcançar a hegemonia do futebol mundial.

Hoje, pode trocar de treinador, aquele que pega o time na véspera, que ele será incapaz de destravar a genialidade reprimida.

Como a FIFA fez com os nossos estádios, tirou o isopor das arquibancadas, a geral para quem recebe salário-mínimo, o futebol europeu fez igual com nossos jogadores. Todos jogam igual e a Copa do Mundo fica nas mãos daqueles que preservam um diferente.

E, hoje, de diferente, imunizado, ainda capaz de driblar e criar só tem o Messi. E quem é o campeão mundial?

DIA NACIONAL DO FUTEBOL

por Paulo-Roberto Andel

Ah, se não fosse o futebol… Como eu ia me entorpecer em sonhos diante do mundo injusto e cruel, cheio de mortes por covardia e gente dizendo adeus muito antes do razoável?

Como eu ia ter alguma alegria durante a semana ou na noite de domingo?

Escrevo sobre muitas coisas, mas futebol é essencial para mim. Ele é o álcool que pouco bebo, ele é o cigarro verde que não fumo, é o alívio para noites silenciosas e viradas por simples tensão. Há cinquenta anos o futebol me salva do suicídio, então não pode ser pouca coisa.

O jogo, o gol, o lance, a gente que faz da arquibancada aquarela, a gente que se abraça e ri ou chora, a gente que namora e deseja. Ah, o futebol, que já foi samba e rock e agora é cumbia, é ele que me tira da miséria e do desespero.

Quer uma noção da importância? Neste sábado mesmo no Nilton Santos. Em qualquer outro lugar, uma queda de luz diz pouca coisa. Agora, faltar luz durante um jogo de futebol é plantão jornalístico.

Meu futebol tem botão, dadinho, bolinha de isopor, areia da praia, figurinha, mesa de preguinho, boneco, camisa, flâmula e livros, muitos livros. Tem saudades da família, beijo da namorada, sacanagem nas cadeiras, abraço de irmãos, choro, riso, suspiro e tudo se resume num UUUUUUHHH quando a bola passa pertinho da trave ou o goleiro espalma para corner, no Maracanã abarrotado.

Meu futebol tem gente banguela, camisa rasgada, chinelo de dedo e geral abarrotada, todo mundo se apertando na chuva e torcendo para a Suderj abrir o portão que dá acesso ao alto da arquibancada, onde tem uma enorme cobertura de concreto que faz o som ecoar pela terra.

Ah, o futebol. Noites em claro, viradas impossíveis, sonhos e drama. Futebol de lembranças, que faz voltar no tempo e ver na tela momentos arrebatadores.

Talvez o meu futebol nem exista mais, mas ele é tão bom que a sua simples lembrança já alimenta muitas fantasias maravilhosas. Todas elas me fazem sentir vivo, sereno, com o coração cheio de esperança mesmo que as probabilidades sejam minúsculas.

Claro que há defeitos mis no futebol, mas o saldo positivo justifica a batalha.

@p.r.andel

“UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” – CAPÍTULO 71

por Eduardo Lamas Neiva

A música de Tavito e Aldir Blanc empolgou o público, muitos cantaram o refrão e alguns chegaram a dançar. Zagallo foi muito cumprimentado, por ter sido o coordenador-técnico da seleção de 1994, e o ex-goleiro Wendell também, já que foi o treinador de goleiros daquela equipe vitoriosa nos Estados Unidos. Angenor Rosa aproveitou a deixa pra fazer uma sugestão.

Músico: – Zé Ary, acho que os craques da mesa chegaram à conclusão que vivemos ali naquela época a Era Romário, né?

Todos concordam.

Músico: – Então, ele merece uma homenagem musical.

Garçom: – Claro, claro que merece. Vou pôr aqui no nosso apareho de som uma belíssima composição do Carlinhos Vergueiro, chamada “Romário”.

Músico: – É do ótimo disco do Carlinhos Vergueiro chamado “Contra-ataque – samba e futebol”, lançado originalmente em 1999.

Garçom: – Vamos ouvir este belíssimo samba.

http://culturabrasil.cmais.com.br/romario-carlinhos-vergueiro

A música agrada em cheio, em especial o “seu” Edevair, pai do Baixinho, presente ao bar Além da Imaginação. O público em geral até cantou o refrão em coro: “Ô ô ô, Romário, romântico, boêmio, verdadeiro; um rei, um raio, um astro brasileiro…”. Ceguinho Torcedor aproveitou e seguiu no embalo da empolgação geral.

Ceguinho Torcedor: – Quando Roberto Baggio chutou a bola pras nuvens eu transcendi de tanta emoção.

Idiota da Objetividade: – E o Zagallo estava lá na comissão técnica, como coordenador. O “Velho Lobo” teve de ser engolido novamente. Com ele conquistamos quatro dos nossos cinco títulos mundiais. Em campo, fomos campeões em 58 e 62, e fora das quatro linhas ganhamos o tri em 70, com ele de técnico, e, como coordenador técnico, em 94.

Zagallo se levanta, agradece e é muito aplaudido. Mas Sobrenatural de Almeida resolveu dar um carrinho na euforia.

Sobrenatural de Almeida: – Assombroso! Assombroso mesmo o que o Velho Lobo fez pelo futebol brasileiro. Mas, porém, todavia, no entanto, nem sempre tudo correu bem com a seleção quando Zagallo esteve lá.

Idiota da Objetividade: – Sim, ele foi muito criticado em 74 pelo futebol defensivo da seleção.

Sobrenatural de Almeida: – E foi vice em 98 com aquela assombrosa história da convulsão do Ronaldo no dia da decisão com a França.

Ceguinho Torcedor: – Zagallo é o nosso maior vencedor, aquele que sempre vestiu a amarelinha com a alma arrepiada de emoção.

Sobrenatural de Almeida: – Sem dúvida, sem dúvda. Mas também teeve problemas com Romário desde 1992 e cortou o gênio da grande área, o craque da Copa de 94, às vésperas do Mundial da França, em 98.

Idiota da Objetividade: – Dois dias antes de o Brasil derrotar a Holanda na semifinal, nos pênaltis, Romário fazia o gol do Flamengo no empate em 1 a 1 com o Internacional, no Beira-Rio.

Garçom: – Bom, Romário em 98 não pôde disputar a Copa, mas aqui ele não vai ser cortado, nem barrado. Vamos ouvir outra música em homenagem ao artilheiro, que também tem seu nome como título, composta por Leonardo Teixeira, Ricardo Imperatore e Ronnie Marruda e gravada pela Banda Bel. Simbora! É pra todo mundo dançar muito.

O povo dança e se diverte. Houve uma dispersada geral, mas quando o povo se aprumou novamente, Zagallo pediu a palavra a Zé Ary, no que foi prontamente atendido.

Zagallo: – Em 93, antes da convocação pro jogo contra o Uruguai, pelas eliminatórias, o Parreira me ligou e disse que convocaria o Romário. Eu respondi: “Parreira, está certo”. Convoquei Romário várias vezes depois e, em 98, perto da Copa começar, Romário, que era meu titular com o Ronaldo no ataque, estava om um edema na batata da perna. Foi um caso especial, pela categoria do jogador e fomos até o limite que podíamos e fizemos o máximo para ele continuar na seleção, mas não foi possível. O doutor Lídio Toledo foi claro, depois de receber os exames, ao dizer que não podia garantir a volta do jogador nem no terceiro jogo da Copa. Então, decidimos cortá-lo. Sobre o Ronaldo, eu nunca fui médico, não posso falar do que aconteceu, o problema não era meu. E só fiquei sabendo do acontecido três horas mais tarde. Por que escalei o Ronaldo? Vocês sempre vão perguntar e eu sempre vou responder: porque ele foi liberado pelos médicos.

Idiota da Objetividade: – Que eram Lídio Toledo e Joaquim da Matta.

João Sem Medo: – Zagallo tem razão, quem libera um jogador nessas circunstâncias é o médico. Mas é ainda uma história muito mal contada até hoje e que teve a participação do Lídio Toledo.

Idiota da Objetividade: – Que já tinha tido problemas com Romário na Copa de 90, pois o jogador, que tinha fraturado a perna na Holanda, onde jogava no PSV Eidhoven poucos meses antes da Copa queria se tratar com seu fisioterapeuta particular, Nilton Petrone.

Garçom: – O doutor Lídio Toledo não pôde vir.

João Sem Medo: – Pois é, seria bom que viesse. Em 70, Pelé estava num dia com 38 graus de febre e no dia seguinte apareceu bom. O doutor Lídio deu a ele Penbritin, um antibiótico que os astronautas que foram à lua tomaram. E me disse: “Com aquela bomba, ele está zero quilômetro”. E me disse que Pelé tinha uma lesão de ligamentos no joelho direito, me disse sobre todos os venenos que ele tomou aqueles anos todos, me disse que ele não podia ou não devia jogar à noite por causa da vista. Minha obrigação era poupar Pelé pra que ele fosse tratado. Pedi ao médico um laudo por escrito, mas juro sob palavra de honra que não recebi. E na hora dos cortes do Toninho Guerreiro, por sinusite, e do Scala, por lesão, ele não apareceu, tive de dar as explicações sozinho, mesmo sendo leigo.

A fala de João Sem Medo provocou uma certa confusão no bar, com uns defendendo o vitorioso ex-médico da seleção e do Botafogo e outros apoiando João Sem Medo. Zé Ary deu um pique e pôs de primeira no telão Marco Pereira tocando “Tempo de Futebol”, composição do próprio violonista, pra acalmar os ânimos da plateia.

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Um gol desse não se perde!

TRINTA ANOS DEPOIS…

por Paulo-Roberto Andel

Eis o tempo, que escorre e vai oferecendo reflexões e reflexões, ainda mais no futebol por ter uma espécie de tempo próprio.

Imagine a ficção científica se você estivesse em 1994 e um cientista te oferecesse uma oportunidade como a do famoso filme “De volta para o futuro”. “Você vai para 2024 e espia como está a Seleção Brasileira, depois volta”. O susto seria grande. Estamos mal, bem mal e com evidente preocupação.

Há trinta anos, o Brasil vivia uma loucura. Depois de 24 anos, voltamos a ganhar uma Copa do Mundo em decisão dramática contra a velha Itália, sempre ela. Pela primeira vez, a Copa foi decidida nos pênaltis – e talvez esse drama ajude a explicar porque nós, brasileiros, passamos anos e anos sacaneando os tetra campeões.

Ah, o Zinho é enceradeira. Ah, o Brasil não joga bonito. Ah, o Brasil não goleia.

Não, a Seleção de 1994 não se compara às suas antecessoras vitoriosas em 1958, 1962 e principalmente 1970. Mas qual outra Seleção no mundo se compararia? Talvez justamente as que não venceram, talvez. Hungria 1954, Holanda 1974 e Brasil, ele mesmo, 1982.

A verdade é que, longe de paternalismos, não soubemos dar o devido valor aos tetra. Reconhecer que, desde a retumbante goleada sobre a Bolívia no Arruda, reagimos nas eliminatórias até a batalha final diante do Uruguai, quando Romário fez a maior exibição de sua carreira.

O Brasil não era uma tampinha chutada no chão. Na boca da Copa, perdeu Mozer e Ricardo Gomes, depois Ricardo Rocha – que outra Seleção aguentaria esse tranco? E o azar em ter um craque como Raí na pior fase de sua carreira? Tivemos e superamos.

Taffarel, goleiraço. Jorginho, monstruoso. Aldair e Márcio Santos, duas feras. Leonardo, ótimo. Quando Branco entrou, decidiu e mostrou a que veio.

Dunga e Mauro Silva formavam uma tremenda dupla de volantes. Mazinho era um jogadoraço, capaz de fazer várias funções. E Zinho ia muito, mas muito além da enceradeira, como provou no decorrer de sua carreira.

Bebeto e Romário. Desnecessário comentar.

Membro da comissão técnica de 1970, Parreira já nasceu com o DNA da vitória. Um dos treinadores que mais classificou equipes para os mundiais, fez trabalhos espetaculares no Brasil, sendo o Fluminense de 1984 o melhor deles. Com Parreira, o Brasil foi frio, equilibrado, pragmático mas também talentoso. Ao lado de Parreira, o implacável e glorioso Zagallo.

Não brilhamos intensamente em todos os jogos, mas o fato é que o Brasil se impôs a todos os rivais na Copa dos EUA. Sua única grande dificuldade além da final foi a semifinal diante da poderosa Holanda, num jogaço por sinal. Em todas as partidas o futebol brasileiro foi superior, traduzindo sua força em grandes jogadas.

A beleza dos gols de Romário e Bebeto, a eficiência dos passes de Dunga, os bons cruzamentos de Jorginho, a elegância do miolo com Aldair e Márcio Santos, tudo isso está registrado.

Ok, não fomos brilhantes o tempo todo e nem precisávamos. Agimos quando foi preciso. Rever os jogos contra a Holanda e a Suécia a seguir, pela semifinal, ajudaria muitos a perceber que a nossa Seleção estava longe da mediocridade.

Há trinta anos o Brasil parou e enlouqueceu. As pessoas foram ao delírio. Nós não tínhamos mais Pelé e Garrincha, Didi ou Tostão, é fato, mas ainda tínhamos uma cortina do passado: Bebeto e Romário foram assombrosos, Taffarel e Jorginho foram devastadores, Branco foi demolidor, Dunga foi o símbolo da garra. O Brasil ganhou o tetra porque mereceu.

Quem não queria ter a chance de rever Pelé no campo? Ou Rivellino? Ou Didi? Claro que sim, mas na inevitável ausência destes craques porque o tempo não para, não há como não reconhecer que o Brasil de 1994 teve o seu valor. Que o digam os tempos modernos em que estamos, ao menos por ora.

@pauloandel

SÉRGIO CABRAL

por Paulo-Roberto Andel

Morreu num domingo frio de julho, aos 87 anos, um dos maiores brasileiros que já tivemos.

É difícil definir a trajetória de Sérgio Cabral em poucas palavras. Impossível, aliás. Por mais de meio século ele foi um dos faróis do Rio, disseminando informação, arte e cultura.

Jornalista por ofício, escritor, biógrafo, pesquisador, colecionador e muito mais, Sérgio foi um dos aríetes da Cultura popular carioca. Ao lado de outros grandes nomes, tais como Albino Pinheiro e Hermínio Bello de Carvalho, ele ajudou muito no conhecimento e popularização de expressões artísticas como o samba e, particularmente, as marchinhas de Carnaval.

Como não existe cultura popular do Brasil que não esteja próxima do futebol, Sérgio Cabral marcou presença firme como jornalista, cronista e comentarista de futebol. Torcedor apaixonado do Vasco da Gama, era uma espécie de memorabilia ambulante do futebol carioca.

Quando a barra pesou, Sérgio estava no Pasquim, tablóide de intenso combate à ditadura militar. Viveu o jornal do começo até seu final. O Pasquim não era só de acertos, diga-se de passagem, mas teve um papel importantíssimo na vida brasileira dos anos 1960 até parte dos 1980.

Jornalismo, futebol, samba, marchinhas, carnaval. O Rio das ruas, das vielas e conversa fiada. O Rio dos acepipes e chopes dourados da felicidade. O Rio que passou em nossas vidas e teve momentos brilhantes. Tudo isso foi registrado pelo texto sagaz e pela fala apurada de Sérgio Cabral, a quem o Rio de Janeiro muito deve em termos de divulgação, valorização e protagonismo na vida nacional. O jornalista merece todas as loas por sua dedicação pelo Rio, a quem dedicou toda sua vida profissional até que as limitações de saúde se tornaram implacáveis.

Deveria ser dia de homenagens a Sérgio Cabral no Teatro Municipal, no Teatro João Caetano e no Maracanã. Sergio merece: sua longa trajetória não foi em vão.

@pauloandel