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ABC E SUAS INJUSTIÇAS

por Rubens Lemos

O ABC é um ente federativo dentro do Rio Grande do Norte. Com seus hinos, suas heráldicas, sua constituição própria nos velhos papéis do estatuto e um povo em eterno frenesi de paixão. O ABC, só vim a aprender na própria pele, também é um clube injusto.

Ainda tinha minhas duvidas até o dia em que seu mais franciscano e alucinado dirigente, José Prudêncio Sobrinho, foi sepultado e o clube apresentou – como se estivesse operando o milagre da gratidão, a nota fiscal do caixão e dos demais itens do funeral de Prudêncio. Nos retiramos na hora, envergonhados, eu e o ex-presidente Leonardo Arruda.

José Prudêncio Sobrinho(foto) dedicava ao ABC o bem de um pai pelo filho e o seu sangue jorrava em preto e branco. Foi um homem rico, com uma rede de lojas de bateria de carro que foi se exaurindo. O ABC precisava, ele vendia uma filial. O dinheiro, a fundo perdido, era usado nas renovações de contrato do ídolo Alberi, na chegada de craques, na loucura que ele exerceu sem remédios de tarja preta a contê-lo. Até empobrecer.

Comigo foi no futebol de salão, que comandei de 2005 a 2010, levando o clube a 19 títulos, 13 deles regionais ou nacionais. Me chutaram com três sapatadas. Duas estavam nos pés dos mandões de então, a terceira ficou no meu próprio traseiro.

O péssimo instante por que passa o clube, desmoralizado nacionalmente graças única e exclusivamente à famigerada união de um ex-técnico pedante com um ex-diretor de futebol arrogante, reacende a lamparina da estupidez, do desagrado gratuito, sobretudo com os mais humildes, sangue e costela do ABC. A confiança depositada na dupla que arruinou o futebol do clube foi tão cruel quanto toda atitude mesquinha de cada um dos dois.

Há outros exemplos. Danilo Menezes, o melhor meia-armador do século passado, saiu do ABC de tanto ser perseguido, com os braços cruzados da diretoria em 1980, pelo técnico Servílio de Jesus, ex-jogador do Palmeiras. Servílio veio duas vezes ao ABC e, nas duas, não conseguiu nem título protestado para o alvinegro. Danilo Menezes voltaria em 1994 para ser campeão como técnico.

Pouco depois do que fizeram com Danilo Menezes, fizeram pior com o treinador Erandy Montenegro, campeão invicto do primeiro turno em 1981 e despedido sem nenhuma razão, apenas o serpentear de conhecida traíra da (má) memória do ABC. Erandy deu o troco no mesmo ano. Terminou tricampeão pelo América enquanto os seus algozes não colocaram o time sequer na Taça de Prata, lugar dos vice-campeões.

Em 1983, Erandy Montenegro montaria o melhor time que meus olhos fascinados viram ser campeão no ainda Estádio Castelo Branco: Lulinha; Alexandre Cearense, Joel, Alexandre Mineiro e Dudé; Nicácio, Dedé de Dora e Marinho Apolônio; Curió, Silva e Djalma.

Os escorpiões das emboscadas fatais tiraram o técnico Ferdinando Teixeira, também campeão do primeiro turno em 1996. O ABC perdeu o título para o América que contratou Ferdinando Teixeira e, com ele no comando, subiu para a Série A do campeonato brasileiro. Caso houvesse vencido em 1996, o ABC encerraria a década octacampeão potiguar.

Então veio Fernando Marchiori. Para iludir com resultados de aparente competência que nunca esconderam sua predileção pela mediocridade retranqueira. Ninguém engana todo mundo, o tempo todo. Aclamado(o ABC é pródigo em bajular forasteiros), Marchiori usurpou suas funções, mandou, desmandou, casou, batizou, até ser sufocado por derrotas pífias e procedimentos bizarros.

Como pneu sendo trocado com o carro andando, o ABC vê isolado o presidente Bira Marques. Aqueles em que tanto confiou, foram embora. Bira Marques precisa de ajuda, também deve pedir esse apoio, reconhecer o momento tétrico e convocar homens experientes.

A massa não pode continuar sofrendo. O ABC olha para a frente e enxerga uma improvável reviravolta. Bira Marques, meu amigo, você não estranhe: injustiça faz pouso contínuo pelos alpendres da Rota do Sol.

UMA BREVE HISTÓRIA SOBRE FUTEBOL

por Paulo-Roberto Andel

Foto: Alex Ribeiro

Há quem diga que o futebol é bobagem. Santa insensibilidade: se não fosse o futebol, o mundo seria muito pior porque, para centenas de milhões de pessoas, ele é a única chance de alegria em meio a um monte de ódio, opressão e covardia.

Hoje à tarde, conversando com Raul, lembramos que o velho Maracanã era o único espaço de real convivência democrática da cidade entre ricos e pobres, abraçados nos gols e chorosos nas derrotas. Em muito menor escala, eu só consegui viver o mesmo no grupo de escoteiros: todos acampávamos com ou sem dinheiro, fazíamos vaquinha, apertávamos a comida, o ônibus mais barato. No grupo éramos uns setenta; no Maracanã, cem mil.

Quantas vezes o futebol me salvou? Não sei dizer. Quando meu pai chegava derrotado e violento por causa da bebida, eu corria para o 434, ia para a geral e chorava vendo um jogo. Noutras vezes, eu ficava no corredor da arquibancada olhando a UERJ e sonhando em estudar lá. Noutras vezes eu ia porque era o único lugar em que, tão solitário, eu não me sentia sozinho. Foi assim muitas vezes. Sem o futebol, a depressão teria me vencido, eu teria executado o suicídio que iniciei e teria sido um desperdício, porque escrevi muitas coisas legais a seguir, o que eu não faria morto por motivos óbvios.

O futebol me deu a ilusão de um monte de amigos juntos, caso da arquibancada; me deu sonhos em jogos e lances inesquecíveis; preparou meu espírito para saber encarar as derrotas. O futebol me deu muitos colegas, com quem interagi e trabalhei muitas vezes. Por exemplo, nesse domingo há 28 anos o meu time ganhou um dos maiores jogos de todos os tempos, com um gol de barriga. Naquele ano quase tudo deu errado pra mim, mas o campeonato valeu muito a pena.

Muitos anos depois, foi o futebol que permitiu minha estreia em livro e, por gratidão, escrevi um monte de livros sobre o tema, vários ainda inéditos. Por causa do futebol vivi admirações, paixões e conheci minha esposa. Também conheci pessoas do Brasil inteiro, com quem converso sempre que posso – algumas colaboram com o meu site.

O futebol só não me ofereceu mais abraços do que minha mãe. Você conhece ou segue um artista, acaba gostando mais dele quando é um entusiasta do futebol. Ele me faz esquecer as dores no corpo, a minha tragédia pessoal, a melancolia cotidiana. Por uma hora e meia, mesmo que o jogo não seja bom eu tenho meu pequenino momento de felicidade. Tanto faz se é uma partida importante ou esdrúxula – o jogo começa, eu volto a ter dez anos de idade e meu olhar persegue a bolinha na tela da televisão.

Ah, se não fosse o futebol, como eu teria conversado com a Bibi Ferreira, o Gilberto Gil e a Letícia Spiller? E a Maria Bethânia? E o Italo Rossi? E como eu ia suportar o mundo agora, que me humilha todo dia enquanto sinto dores pelo corpo e choro por tanta gente humilhada feito eu?

É domingo à noite, tudo parece perdido, tenho vontade de desistir mas penso na terça-feira, tudo pode ser diferente e surgir pelo menos uma luzinha no fim do túnel. Pode ser que eu não tenha um único amigo, pode ser que eu não consiga vender e está tudo perdido, mas a terça-feira me serve de esperança. Vou pensar no jogo, vou conversar com colegas para chegar logo o horário da partida. Agora é uma noite melancólica como todas de domingo, onde esperamos ótimas semanas que nunca, mas nunca chegam – ao menos para mim -, só que eu carrego comigo o futebol, a minha esmolinha, os meus botões que minha mãe comprou com tanto sacrifício, as histórias que vi e escrevi, as histórias que ainda preciso contar quando era garoto e, na Copacabana de orla escura, chutava a bola na areia com os colegas mesmo sem vê-la direito, nem o goleiro e o gol – assim como só nos resta viver, nos campos da praia só nos restava jogar, pouco importando se a bola iria para a direção correta, ou se um gomo da bola estivesse soltando.

Aqui falo de quarenta ou quarenta e cinco anos atrás, que foram há um susto porque tudo é brevidade, mas a bola na praia, na vila, no playground do Gordinho e mesmo no Maracanã – meu pai me levou para ver não apenas o Fluminense, mas o America, o Bangu e até o Campo Grande, todos contra o Flamengo – eram tudo uma coisa só: um pequeno suspiro de felicidade.

MESTRE DIDI

por Elso Venâncio, o repórter Elso

Didi, Di Stéfano e Puskás. Um trio dos sonhos. Tudo para dar certo no Real Madrid dos anos 50 e 60. Porém, com ciúmes, o argentino Di Stéfano boicotou o astro brasileiro. Como o húngaro Ferenc Puskas fez questão de deixar claro em seu livro:

“O maior inimigo de Didi no Real Madrid foi a sua fama.”

Apenas em 1959 o Real Madrid passou a ter um negro no time. Simplesmente, o melhor jogador de futebol do mundo. A FIFA inovou ao eleger, ao fim da Copa de 1958, na Suécia, o craque da competição. Apesar de contar com o garoto Pelé e o genial Garrincha, Didi foi o escolhido. Recebeu, do jornalista Gabriel Hanot, o apelido de ‘Mister Football’. Francês considerado o papa da crônica esportiva europeia, Hanot criou a Champions League. Tinha moral entre os seus.

Os espanhóis pagaram uma fortuna por Didi: 100 mil dólares e mais dois amistosos em Madrid, com renda dividida. Hoje o clube admite investir 250 milhões de euros pelo francês Mbappé, superando os 222 milhões que o Paris Saint-Germain desembolsou para ter o brasileiro Neymar em gramados franceses. Outros tempos…

Por que Didi não deu certo na Europa? Por que retornou ao Brasil meses depois? Segundo o jornalista Peris Ribeiro, biógrafo do ‘Gênio das Folhas Secas’, é preciso um certo cuidado, afinal, não se comentava sobre racismo na época. Houve, ao certo, ciúmes do argentino, que era o dono da equipe e sequer foi escutado em relação à nova contratação da equipe.

Se Puskás declarou em seu livro que o maior inimigo de Didi foi sua fama, vale dizer que o presidente do clube madrilhenho, Santiago Bernabeu, almoçava semanalmente com o brasileiro. Mas não com Di Stéfano, nem com Puskás.

Na estreia do meia campeão mundial em 1958, jogo válido pelo Torneio Ramón de Carranza, vitória de 6 a 3 sobre o Milan, com direito a um golaço de ‘Folha Seca’… Depois, 4 a 3 no arquirrival Barcelona, na grande final. Didi foi eleito o craque da competição. Aos 34 anos e em fim de carreira, Di Stéfano ficou mal-humorado e passou a boicotar o brasileiro. Didi tinha 30 anos. Puskas, dois a mais que ele.

Freitas Solich afagou Didi e Di Stéfano não gostou nem um pouco. Grupo dividido, derrotas, e mesmo evitando atritos Didi percebeu-se sem clima no clube madrilhenho. O técnico paraguaio acabou sendo demitido. E Peris Ribeiro explica o que aconteceu a partir de então:

“Didi escreveu para João Havelange e João Saldanha dizendo que queria voltar para o Brasil. Os dois foram juntos à Espanha e Saldanha conseguiu a liberação do craque, abrindo mão dos amistosos que o famoso Botafogo faria em Madrid.”

Em 1958, os jornalistas acompanharam, curiosos e à distância, Didi e Paulo Machado de Carvalho caminharem ao lado, nos jardins da bela concentração localizada em Hindas:

“Doutor… Pelé e Garrincha têm que jogar”, arguiu Didi.

“Mas o Garrincha não é louco?” – retrucou o dirigente.

“Não! Ele enlouquece, sim, seus marcadores. Com os dois na equipe, pode anotar, seremos campeões.”

João Havelange nutria enorme carinho por Didi, mas lembrou Di Stéfano ao passar a ter ciúmes de Paulo Machado, ‘O Marechal da Vitória’, ao longo de dois Campeonatos Mundiais vitoriosos. Tanto que o afastou da Copa da Inglaterra, em 1966, competição em que a falta de comando foi determinante para o fracasso da seleção.

Nos estúdios da Rádio Globo-Rio, antes do ‘Enquanto a Bola Não Rola’, programa de debates que apresentei aos domingos, observei o seguinte diálogo. Armando Nogueira, o ‘Machado de Assis da crônica esportiva’, comentou com Didi:

“Lembro da primeira vez que te vi…”

“Quando foi?”, perguntou o autor do primeiro gol da História do Maracanã.

“No Estádio Aniceto Moscoso. Você começou no banco, mas assim que entrou, contra o Madureira, olhei para o Luiz Carlos Barreto e disse:

“Aquele ali vai dar jogador. E dos grandes!”

Dito e feito.

Didi volta e meia era cotado, mas não pôde realizar o sonho de ser técnico do Brasil em uma Copa do Mundo. O ‘Velho Marinheiro’ Gentil Cardoso afirmava:

“A cor impediu que eu e Didi comandássemos a seleção brasileira.”

Ou seja, hoje falamos muito de racismo. Mas esse problema data de muito, mas muito tempo mesmo. Não é algo recente. E nem tão cedo passará.

BAIRRISMO SEM FIM

:::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::

Se antes era rotina, tenho escutado cada vez menos as piadinhas de cavalo paraguaio quando falam do Botafogo. Continuo achando que ainda é cedo, que jogadores importantes podem se lesionar ou serem negociados, mas dá para garantir que o time erra pouco e está cada vez mais confiante no Brasileirão.

Li que o Palmeiras vinha de 31 jogos sem perder no Allianz Parque e o Botafogo acabou com a invencibilidade com um belo gol de Tiquinho Soares. Agora, são sete pontos de vantagem para o segundo colocado e mesmo assim tive que ver muita bobagem da imprensa na televisão, sobretudo a paulista.

Tenho propriedade no assunto, pois sempre sofri muito com esse bairrismo quando jogava em São Paulo. Acho uma chatice tremenda e sabia que todos iam desvalorizar a vitória do Botafogo. Dito isso, vi alguns reclamando do impedimento no gol anulado, outros dizendo que não foi merecido e por aí vai. Na minha opinião, o Botafogo poderia ter vencido até de mais gols, mas pecou nas finalizações, como de costume. Acho, inclusive, que os jogadores que estão treinando pouco esse fundamento e isso pode prejudicar o Alvinegro no decorrer da competição, visto que é um time que tem a defesa segura e tenta aproveitar as poucas chances que tem na partida.

Quem não tem uma defesa segura é o Flamengo, que depois de tomar quatro do Bragantino, tomou dois do Santos, mas conseguiu uma vitória importante na Vila Belmiro. A nota triste é que o jogo foi de portões fechados depois da selvageria que rolou no clássico contra o Corinthians.

O mesmo pode se falar da torcida do Vasco, que depredou o maior patrimônio do clube, São Januário, após a derrota para o Goiás. Enquanto os clubes não forem punidos com rebaixamentos ou algo do tipo, essas cenas serão cada vez mais comuns, infelizmente! Além disso, lamento muito também o fato dos jogadores não se manifestarem, não protestarem contra esses atos de vandalismo. O mínimo que deveriam fazer era uma grave nacional, parando todos os campeonatos! São os jogadores que fazem o espetáculo!

Por fim, o Fluminense ganhou do Bahia de virada, com um a menos, mas acho que foi mais falha do lateral do Bahia do que méritos do tricolor carioca. O campeonato é longo e ainda não chegamos nem na metade, vamos aguardar!

Já que o escritor Helcio Herbert Neto dedicou sua coluna a mim, alegando que “iniciei a cruzada contra a imbecilidade há mais tempo e que percebi rapidinho que esse linguajar era um jeito de camuflar ignorância”, seguem as pérolas da semana:

“Com um triângulo equilátero, forma-se um sistema propositivo para atacar a linha de quatro no último terço do campo e amassar o adversário encaixotando com alas pelos lados”.

“Através de uma leitura de jogo posicional, o jogador agudo desenvolve o corredor central para zerar a segunda bola e proporcionar uma identidade à equipe que pega o elevador”.

O BOTAFOGO DE TODOS OS TEMPOS

por Luis Filipe Chateaubriand

No gol, Manga, um colosso!

Na lateral direita, Carlos Alberto Torres, técnica e vigor conjugados.

Na zaga central, Mauro Galvão, classe à toda prova.

Na quarta zaga, Nílton Santos, nada menos do que a enciclopédia do futebol.

Na lateral esquerda, Marinho Chagas, um talento assombroso.

De primeiro volante, Gérson, o “Canhotinha de Ouro”.

De segundo volante, Didi, o “Mister Football”.

De meia atacante, Jairzinho, um furacão.

Na ponta direita, Garrincha, um fenômeno monumental!

De centroavante, Heleno de Freitas, categoria notável.

Na ponta esquerda, Paulo Cezar Caju, irreverente e irrequieto.

Manga; Carlos Alberto, Mauro Galvão, Nílton Santos e Marinho; Gérson, Didi e Jairzinho; Garrincha, Heleno e Paulo Cezar.

E aí?

Vai encarar?