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OS HERÓIS QUE VOAVAM DE VERDADE

por Zé Roberto Padilha

Até 1970, quando alcançamos nosso tricampeonato, nossos goleiros, como Felix, eram como náufragos. Ficavam isolados naquela ilhota na pequena área e não havia quem os treinasse em separado.

Corriam com a gente, faziam os mesmos exercícios dos que atuavam na linha e, após os treinamentos, ficavam em uma caixa de areia saltando pra lá e pra cá. E os preparadores pediam para cruzarmos bolas sobre a area para saírem do gol.

E era só.

Já em 1974, Leão foi o primeiro goleiro da seleção a ser resgatado do isolamento. Raul Carlesso, da Comissão Técnica da Seleção Brasileira, inovou criando uma nova função, treinador de goleiros, que veio a dar orientações e treinamentos específicos para a posição.

Você só percebe essa evolução técnica assistindo “Gol, o grande momento do futebol “. A maneira como passaram a saltar e se posicionar mudou completamente. E para melhor.

No fim de semana, vendo o goleiro do Cruzeiro não se mexer diante da cobrança da penalidade máxima, cobrada por Gabigol, deu para perceber que seu treinador estudou com ele, Rafael, a melhor maneira de defender.

Como Gabigol precisa que o goleiro salte para um lado para jogar a bola do outro, ao permanecer parado tirou sua concentração e ele acertou a trave.

São mais que treinadores, são orientadores, psicólogos, amigos e psiquiatras. Do contrário, sem esse ombro, os reservas do Fábio já teriam se jogado da ponte.

Desse jeito, rendo minhas homenagens aos que não tiveram tal privilégio. E mesmo assim se superaram, treinavam por conta própria e saiam do gol por sua conta e risco.

E a eles, especialmente ao Gato Félix, tricampeão mundial, uma das pessoas mais educadas com que joguei, no Fluminense, rendo minhas homenagens.

Eles foram os nossos heróis que, ao contrário do National Kid, voavam de verdade.

O LEGADO DE TARCISO

por Claudio Lovato Filho

Volta e meia, quando penso em como devemos nos comportar nos momentos bons e nos momentos nem tão bons, penso em Tarciso.

De tempos em tempos – com frequência cada vez maior conforme a idade avança – reflito sobre o quanto é importante acreditar no dia seguinte, no fato que está por vir, e manter a confiança. Durante essas reflexões, é comum que me venham à mente lembranças de Tarciso.
Que legado de persistência, honradez e humildade.
A persistência, a honradez e a humildade que só os verdadeiros vencedores têm.

Não apenas isso, claro, porque também jamais faltaram a ele atributos como talento, coragem e senso de companheirismo. As qualidades não eram poucas.
Em 2018, alguns dias após a morte dele, fui chamado a falar sobre o Flecha Negra a um grupo de gremistas aqui de Brasília. Foi de surpresa, sem aviso prévio, durante um almoço. Quem me conhece sabe que prefiro escrever a falar, mas não pude recusar aquele pedido, não houve como. Não tanto pela insistência dos parceiros ou pela ênfase da convocação, mas simplesmente porque precisávamos falar de Tarciso, chorar sua partida, celebrar sua legenda e sua lenda. Então fui.

Recordei acontecimentos como os jogos de que participei na Escolinha do Grêmio, em 1978, aos meus 13 anos, sob a assistência de Ancheta, Tadeu Ricci, Iúra, André, Éder, Tarciso e os outros heróis que formaram um dos elencos tricolores mais inesquecíveis de toda a nossa longa história iniciada em 1903.

Naquele almoço com companheiros tricolores aqui do Distrito Federal, eu disse, lá pelas tantas, que Tarciso havia roído o osso, mas também havia comido o filé. Um chavão surrado, eu sei, mas que me ajudou a expressar o que penso e o que sinto quando falo em José Tarciso de Souza.

Ele mostrou suas credenciais aos torcedores gaúchos em novembro de 1972, quando, jogando por seu clube de então, o América do Rio, deu espetáculo numa partida contra o Internacional, no Beira-Rio. O jovem centroavante de 21anos fez gol em jogada que incluiu dribles em Figueroa e no goleiro Schneider. (Talvez disso tenha decorrido, pelo menos em parte, o gosto do zagueiro chileno em desferir cotoveladas no rosto do atacante, coisa vista muitas vezes nos anos seguintes, mas que jamais atingiu o intento de amedrontar o guerreiro nascido na pequena São Geraldo, em Minas Gerais.)

Tarciso chegou a Porto Alegre dois meses depois, em janeiro de 1973, vindo do América para assumir a camisa 9 tricolor, numa negociação que incluiu a ida de Ivo e Flecha para o clube carioca. Tarciso viu nosso arquirrival ser campeão estadual quatro vezes seguidas – sequência que envolveu questões nebulosas, como a absurda regra do “goal average”, que nos tirou o título de 1975, ano do Gre-Nal dos três gols do Zequinha, mas isso é outra história.

Em 1977, sob a batuta de Telê Santana – que o transformou definitivamente em ponta-direita, na sequência de movimentos feitos por Milton Kuelle e Ênio Andrade – e formando um ataque lendário com André Catimba e Éder Aleixo, Tarciso foi um dos maiores protagonistas da conquista do campeonato gaúcho daquele ano, título que, como tantas vezes enfatizou nosso eterno presidente Hélio Dourado, abiu as portas para as grandes conquistas dos anos seguintes: o Campeonato Brasileiro de 1981, a Libertadores e o Mundial Interclubes de 1983 e tudo o que veio depois.
Tarciso estava lá: no Morumbi, superando o São Paulo e levantando a taça do nosso primeiro Brasileirão; no amado e saudoso Olímpico, derrotando o Penãrol, num feito do tamanho da América; e no Estádio Olímpico de Tóquio, jogando na ponta-esquerda, na épica vitória contra o Hamburgo, confirmando que a Terra é azul. E nunca, nem a sério nem de brincadeira, se ouviu ou viu, partidos dele, um gesto ou uma palavra que indicassem perda da simplicidade e da modéstia.

Neste 2023, caro amigo (acho que posso te chamar assim, não é?), quando se completam 50 anos da tua estreia pelo Grêmio, eu e toda a torcida azul-preta-e-branca queremos, mais uma vez, e de forma especial, celebrar teu nome, tua história e tua herança, e reiterar o orgulho de ter a ti como o jogador que mais vezes vestiu a camisa do nosso clube amado, em 723 partidas, e como um dos nossos principais artilheiros, o segundo maior, atrás apenas de Alcindo, com os teus 228 gols.

Jamais serás esquecido, jamais. Especialmente (digo isto por mim, mas sei que não apenas por mim) quando pensarmos em qualidades como honradez, persistência, humildade, talento, coragem e generosidade – só para citar algumas das que possuías de sobra.

Aqui estamos, amigo. A tua torcida. Ela te saudará para sempre.

ATÉ QUANDO?

::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::

Depois do lamentável episódio de racismo na semana passada, a CBF se mobilizou para fazer campanhas de conscientização em todos os jogos da rodada. Não poderia deixar de parabenizar, mas confesso que ainda acho muito pouco. Vi que gravaram um vídeo com grandes atores, mas senti falta de muita gente que foi importante para o futebol brasileiro e mundial! Não só acho pouco, como vejo apenas uma ação pontual. Na minha visão, tem que ser algo permanente, visto que o preconceito tem sido cada vez mais comum nos estádios pelo mundo. Vamos ver como será daqui pra frente!

O que não dá mais para esperar é a indefinição da CBF para anunciar o novo treinador! Já estamos na metade do ano e nenhum indício de como será a preparação para a próxima Copa do Mundo! Enquanto isso, Ramon Menezes segue tentando manter um equilíbrio e convocando de forma coerente.

Estive ontem no Nilton Santos com Carlos Roberto e, mais uma vez, gostei do que vi. Há muito tempo não vejo um Botafogo tão organizado e confiante. Volto a dizer que ainda é muito cedo e tem muito campeonato pela frente, mas dá para enxergar a construção das jogadas e um time bem treinado, muito seguro na defesa. Não lembrava a última vez que fiz isso, só que ontem vibrei como uma criança com o primeiro gol marcado pelo Botafogo. Se a vitória já não fosse o bastante, Atlético-MG e Palmeiras empataram e agora o alvinegro abriu cinco pontos de vantagem para o segundo colocado.

Por falar em Palmeiras, Abel Ferreira deu mais um vexame em relação a seu comportamento. Dessa vez, tomou, de forma grosseira, o celular de um jornalista que filmava a discussão do diretor do Palmeiras com o árbitro. Quero saber aonde isso vai parar!

Sobre os outros jogos da rodada, o Flamengo deu sorte de sair do Maracanã com um ponto contra o Cruzeiro, o Vasco perdeu para o Fortaleza e a situação é preocupante demais, assim como América-MG s Bahia. O Corinthians, de Luxemburgo, finalmente voltou a vencer. Acho que pouca gente acreditava na vitória contra o Fluminense, mas o futebol é apaixonante por isso. Com muito menos posse de bola, o Timão soube aproveitar os contra-ataques e conseguiu um bom triunfo conta os comandados de Fernando Diniz.

Pérolas da semana:

“Linha de três zagueiros, com alas pelas beiradas entrando na diagonal ou pela contramão para proporcionar uma ligação direta aguda e conseguir as segundas bolas”.

“Precisou trocar o pneu do carro andando para qualificar o alinhamento e tracionar o jogador agudo com GPS nos dados e leitura de jogo aguçada”.

SAUDOSO GAÚCHO

por Elso Venâncio, o repórter Elso

O centroavante Gaúcho não precisava do futebol para viver. Nasceu em Canoas, na Grande Porto Alegre, e investia seu dinheiro na criação de gado, nas fazendas da família localizadas em Campo Grande-MS e Goiás.

Nas divisões de base, na Gávea, tentou ser ponta-direita. O problema é que não se firmava. Passou por alguns clubes, mas teve razoável destaque apenas no Palmeiras, entre 1988 e 1989. Logo, voltou para o Flamengo. Para se consagrar e conquistar os principais títulos da sua carreira.

No Maracanã, em 1988, foi para o gol do Palmeiras, contra o Flamengo, no momento em que Zetti fraturou a tíbia ao se chocar com o atacante Bebeto. Sairia como herói ao defender dois pênaltis, um de Aldair, outro de Zinho. No regulamento daquele Brasileiro, se houvesse empate no tempo normal cada time somaria um ponto, mas quem ganhasse nos pênaltis levaria outro.

O centroavante chegou a defender o Boca Juniors, da Argentina, assim como o Atlético Mineiro, numa malfadada ‘Sele-Galo’, em 1994. Defendeu, ainda, o Lecce, da Itália, a Ponte Preta e até mesmo o Fluminense, mas ídolo mesmo só conseguiu ser no Flamengo.

Valente em campo, movimentava-se bem, mesmo com o porte físico avantajado. Consagrou-se como artilheiro do time nas conquistas do pentacampeonato brasileiro de 1992, na primeira Copa do Brasil que o clube levantou na História, em 1990, e nos Cariocas de 1991 e 1993.

Seus gols de cabeça eram marcantes. Lembrava Dionísio, o ‘Bode Atômico’. Testava como poucos. A cabeça grande e o enorme pescoço facilitavam-lhe o cabeceio.

Renato Gaúcho foi o seu grande amigo no futebol. Após ser campeão mundial com o Grêmio, tornando-se para sempre o maior ídolo da história do tricolor gaúcho, acabou sendo contratado a peso de ouro pelo Flamengo em 1987, clube pelo qual conquistou a Copa União, no mesmo ano, sendo eleito, inclusive, o craque da competição. Vendido para a Roma no ano seguinte, retornou em 1989 declarando ter se arrependido de sair para a Europa. No Carioca de 1990, formou com Gaúcho a dupla de ataque do ‘Mais Querido’, o que o levou à Copa do Mundo da Itália.

Ambos infernizavam os zagueiros adversários e, sempre juntos, agitavam a noite carioca. Renato chamava a atenção por onde passava e se intitulava o ‘Rei do Rio’. Gaúcho se casou com Inês Galvão, que trocou a carreira de atriz para cuidar dele e da família.

Morava no condomínio ‘Selva de Pedra’, no Leblon. A pé, atravessava a Rua Gilberto Cardoso para treinar. Era dos primeiros a chegar. Sempre extrovertido, provocava os adversários, sobretudo os antigos fãs palmeirenses:

“Vou encher de gols esses italianos!”

Em 1991, Renato foi seduzido pela mala cheia e o iate do bicheiro Emil Pinheiro, em Angra dos Reis. Transferiu-se para o Botafogo, disputando dois Brasileiros com a camisa alvinegra. No primeiro jogo da final de 1992, o Flamengo fez 3 a 0 no rival, com o ‘Maestro’ Júnior brilhando, mesmo aos 38 anos de idade. No dia seguinte, uma crise explodiu em Marechal Hermes (a sede de General Severiano só foi devolvida ao alvinegro três anos mais tarde). Após um churrasco em sua casa, na Barra da Tijuca, o repórter Tino Marcos, da TV Globo, mostrou a principal estrela botafoguense brincando com Gaúcho, ao lhe servir churrasco na boca. Irada, a torcida alvinegra exigiu o afastamento de Renato, mesmo com o técnico Gil e os companheiros apoiando o camisa 7, até então carro-chefe da brilhante campanha que o clube fez ao longo de toda a competição.

Luís Carlos Toffolli, o Gaúcho, faleceu aos 52 anos, em 2016, na capital paulista, vítima de câncer de próstata. Viajou ao Paraguai para se tratar com um médico que prometia ‘curas milagrosas’. Renato Gaúcho foi contra, anteviu o charlatanismo. Chegou a se aborrecer com o amigo.

Após pendurar as chuteiras, Gaúcho resolveu morar em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul. Gostava de pescar e a vida pacata do Pantanal lhe fazia bem. Chegou a fundar o Cuiabá Esporte Clube e se orgulhava de seus quase 500 alunos na ‘Gaúcho – Escola de Futebol’, sediada na capital Cuiabá.

GAÚCHO, um goleador e ídolo que marcou intensamente durante sua breve mas vitoriosa passagem pelo Flamengo.

MAURO GALVÃO, CLASSE EM FORMA DE JOGADOR DE FUTEBOL

por Luis Filipe Chateuabriand

Mauro Galvão foi um zagueiro de extrema categoria que, no Brasil, defendeu Internacional de Porto Alegre, Grêmio, Bangu, Botafogo e Vasco da Gama.

Além destes, jogou no exterior, no futebol suíço.

Inteligente, sabia se posicionar na área de tal forma que os ataques adversários eram contidos com assiduidade.

Líder, também orientava o posicionamento dos demais defensores, contribuindo para que os times que defendia dificilmente fossem vazados.

Técnico, era capaz de fazer o desarme dos atacantes adversários com extrema facilidade, e ainda sair jogando.

Essas qualidades fizeram com que Mauro Galvão fosse o líbero da Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1990, na Itália.

Eis o caso de um zagueiro que jogava muita bola!