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OUTROS TEMPOS

por Sérgio Luiz Monteiro

Sou do tempo em que jogar contra o clube de São Januário era um verdadeiro trabalho de Hércules. Talvez o 13º…

Por mais que dominássemos a contenda, bolas batiam teimosamente nas traves, perdíamos gols e muitas vezes a cabeça, que saía quase sempre inchada, do estádio.

O Vasco era um algoz implacável e a considerável diferença de vitórias é fruto dessa história que começou há 100 anos, em 1923 — só fomos vencer pela primeira vez em 28!

Mesmo com grandes times que tivemos nas décadas de 40, 50 e 60, sempre foi “osso” vencê-los.

Quando comecei a frequentar o ex-Maracanã, tive um amargo batismo: escrita de 76 a 81 sem vitórias contra o clube da Cruz de Malta. Estava lá em 81, num 3×1 que findou o martírio, e em que jogamos supersticiosamente todo de branco. Nada tão Botafogo.

Foi o ídolo Túlio, o “artilheiro marqueteiro” que começou, em meados dos anos 90, a mudar a marcha do histórico, que ainda hoje é bem desfavorável, mas que já pode ser considerado um “jogo normal” — e não o terrível estigma de outrora…

Eis então porque os jovens alvinegros de hoje, não temem o ex-expresso são vitória. Várias tundas alvinegras depois e — mesmo perdendo ineditamente duas decisões cariocas seguidas 2015/16 — Botafogo x Vasco é um clássico equilibrado.

Mas o de hoje colocou o líder — já sem o gajo e de técnico novo (e foi bola na Caçapa!) — contra um dos últimos colocados, e a essa altura, numa já sem graça luta contra o rebaixamento.

Na última semana, jogamos um futebol “estreito de Magallanes” num pífio empate e o clube da colina venceu o verdão do agronegócio, o Cuiabá.

O clube da capa-e-espada teve mais um belo capítulo de sua gloriosa história: manteve a liderança, com uma nova comissão técnica, enfrentando um tradicional, aplicado e desesperado rival.

Mais uma vitória e a estranha sensação de solidão (ou seria solitude) na liderança: nós, botafoguenses, não estamos conseguindo ver ninguém por perto…

P.S. Longo é o caminho, mas a sensação é que falta só um Tiquinho.

Saudações Alvinegras!

HOKA – UMA ESTRATÉGIA DE SUCESSO

por Idel Halfen

Alguém já ouviu falar na marca de calçados esportivos Hoka? Provavelmente poucos, mas vale conhecer a respeito, principalmente em função da estratégia mercadológica utilizada, a qual reputo como excelente.

Criada em 2009 por Jean-Luc Diard e Nicolas Mermoud, a Hoka surgiu em função do entendimento de que os aspectos tecnológicos não eram explorados em sua plenitude pelas marcas de calçados esportivos. 

A partir dessa identificação de oportunidade, os dois fundadores buscaram desenvolver um produto investindo fortemente em inovação e abrindo mão até da estética. 

Embora a trajetória da marca traga inúmeros fatos interessantes, vamos pular para 2012, quando a Deckers comprou a Hoka.

Os valores envolvidos na aquisição não foram divulgados, mas sabe-se que a Hoka tinha na época um faturamento anual de US$ 3 milhões.

Ao contrário do que costuma acontecer nas operações de M&A (fusões e aquisições) que envolvem marcas com elevado potencial de crescimento, a Deckers conseguiu resistir à tentação de promover um processo de expansão veloz, optando por um desenvolvimento planejado. 

A possibilidade de uma distribuição mais agressiva foi descartada, o que deixou o produto, evidentemente, fora dos grandes varejistas. 

Ilustra essa condição, o fato de a empresa antes da pandemia ter recusado a oportunidade de estar nas lojas da Foot Locker, uma referência no setor. Situação similar aconteceu na Dick’s Sporting Goods, onde, a Hoka, antes de estar presente em 100% das lojas da rede, executa testes em poucas lojas para entender o comportamento da demanda e, dessa forma, não “queimar” a marca.

Ao invés de estar acessível a todos, a marca optou por estar nos locais voltados ao que entendia ser seu público-alvo, processo no qual as vendas diretas tiveram substancial importância.

Entre as razões que levaram a essa estratégia, destacamos:

  • criar a sensação de ser um produto para poucos. Para isso se utilizou do conceito que chamamos de marketing de escassez, no qual, no caso da Hoka, mais do que provocar o senso de urgência e incentivar a compra imediata, fez com que a marca ficasse associada a algo com o cunho de “exclusivo”.
  • ter um melhor controle sobre os preços praticados, visto que a baixa disponibilidade/oferta propicia melhores condições para se estabelecer um posicionamento premium com reduzido risco de eventuais promoções por parte do varejo.
  • fortalecer a identidade da marca, proporcionando condições de se criar uma liderança de conceito na mente do seu público-alvo, liderança que, naturalmente, chegará a uma gama maior de pessoas, principalmente através do boca a boca. 

Evidentemente, como citamos no início, há uma preocupação grande com o desenvolvimento do produto e seus aspectos tecnológicos , afinal de contas, a busca por um crescimento sustentável carece de um bom marketing, o qual se beneficia quando lida com bons produtos/serviços. 

Desse modo, podemos concluir que a estratégia da Hoka nos fornece um excelente benchmark ao mostrar que a visão de longo prazo é fundamental para uma boa gestão.

Corrobora para essa conclusão a evolução das receitas da marca: em 2017, cinco anos após a aquisição pela Deckers o faturamento ultrapassou os US$ 100 milhões, já no último ano fiscal, finalizado em 31 de março de 2023, atingiu US$ 1,4 bilhão.

“UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” – CAPÍTULO 16

por Eduardo Lamas Neiva

O papo sobre a Copa de 50 com toda comoção é revivida por aqueles que puderam presenciar e participar dos dias de festa até o silêncio final. Jorge Goulart, então, volta ao palco e toma a palavra.

Jorge Goulart: – Aquela Copa de 50 foi realmente uma grande festa antes da final. O Lamartine, que ali está (todos aplaudem), fez outra marcha que poderia ter sido o hino do primeiro título mundial do Brasil, se não perdêssemos pro Uruguai. Vou cantar aqui a “Marcha do Scratch Brasileiro” que homenageia também o estádio Municipal, como era chamado a princípio o Maracanã.

Jorge Goulart é aplaudido, assim como Lamartine Babo, que numa das mesas próximas ao palco se levanta para cumprimentar o público.

Jorge Goulart: – Viva Lalá!

Todos: – Viva!

Jorge Goulart continua no palco, enquanto o público o aplaudia e também Lamartine Babo.

Jorge Goulart  – Agora vou chamar ao palco a Linda Batista pra cantar outra música feita pra Copa de 50.

Linda se encaminha pro palco aplaudidíssima.

Linda Batista (no palco) – Obrigada, gente. Uma pena não termos ganhado daquela vez, né? Mas tive a felicidade de gravar este samba do Ary Barroso, que ali está e também merece muito os nossos aplausos.

Todos aplaudem Ary Barroso.

Linda Batista: – Vamos lá!

Mais aplausos.

Sobrenatural de Almeida: – É, a festa foi boa, mas a euforia foi demais também. O clima de já-ganhou não me agradou.

Ceguinho Torcedor: – Então, foi você?

Sobrenatural de Almeida: – Não, foi o Obdulio Varela, o Gighia, o time uruguaio. Eu só dei um empurrãozinho, sem querer. Aquele discurso do general Angelo Mendes de Morais, pouco antes da bola rolar, me deixou revoltado.

Idiota da Objetividade: – O general Angelo Mendes de Morais era o prefeito do Distrito Federal, ou seja, o Rio de Janeiro, então capital do Brasil.

Ceguinho Torcedor: – Com uma euforia desmedida, o general disse pouco antes do jogo que os brasileiros eram os futuros campeões mundiais…

Zé Ary imediatamente põe nas caixas de som o trecho citado por Ceguinho Torcedor do discurso de Ângelo Mendes de Morais, da tribuna de honra do Maracanã.

Vaias e protestos da plateia são ouvidos.

Sobrenatural de Almeida: – Futuros mesmo, só oito anos depois…

João Sem Medo: – E também disse que tinha dado o estádio para a realização da Copa do Mundo, então que era a vez de os jogadores darem o título mundial para o Brasil. Com aquele discurso, o general pressionou ainda mais os jogadores brasileiros, ao mesmo tempo em que já cantava a vitória.

Ceguinho Torcedor: – Amigos, em 50, na véspera de Brasil x Uruguai, encontrei-me com o famoso “speaker” Gagliano Netto e perguntei: “Quem ganha?” Eis uma resposta triunfal: “Brasil 8 a 0” Vocês entendem? Ele não fazia por menos – tinha de ser 8 a 0. Pode parecer que era um caso de delirante otimismo individual. Absolutamente, milhões de pessoas achavam assim. E o Brasil perdeu! Dirá o Idiota da Objetividade que foi o Uruguai que nos venceu…

Idiota da Objetividade: – … E não foi?

Ceguinho Torcedor: – Não. O que nos venceu foi o favoritismo total. Contra a Espanha, temíamos. E porque havia medo, um mínimo de medo, goleamos. Seis a um, foi o resultado final. Veio de Brasil x Uruguai o meu horror ao favoritismo.

Sobrenatural de Almeida: – Foi muita falta de respeito com os uruguaios. Aí, quando o Gighia penetrou pela direita e chutou, acabei fazendo a bola ir um pouco mais rápido e quicar na frente do Barbosa.

João Sem Medo: – Quando os políticos se metem no futebol acontece isso…

Garçom: – E o Sobrenatural…

Sobrenatural de Almeida: – … de Almeida. Hahaha

Ceguinho Torcedor: – Você bem sabe o quanto a política prejudica o futebol, né, João? Não escalou o Dario, como queria o Médici…

João Sem Medo: – Dario era um bom jogador, mas eu tinha Tostão, Jairzinho, Roberto Miranda, Coutinho, Toninho Guerreiro. Se eu quisesse trombador, aí eu poderia buscar o Dario, ou o Flávio, do Corinthians, o Alcindo, do Grêmio. O presidente escalava o Ministério dele e eu escalava o meu time.

Ceguinho Torcedor: – Esta frase te derrubou, João.

João Sem Medo: – É, estavam transmitindo pro Brasil todo a entrevista… Mas voltando a 50, o que fizeram com o Barbosa foi uma grande injustiça. Teve racismo ali.

Ceguinho Torcedor: – Foi um dia muito triste pro futebol brasileiro. Muito triste.

Idiota da Objetividade: – Foi uma tragédia aquela derrota de 2 a 1 para o Uruguai. Os uruguaios chamam aquela vitória em 1950 de Maracanazzo até hoje.

João Sem Medo: – E a imprensa daqui exagera. Chamaram a derrota de 3 a 2 para a Itália em 82 de tragédia do Sarriá.

Garçom: – Mal sabíamos o que estava por vir…

Sobrenatural de Almeida: – O Mineiraço, em 2014.

João Sem Medo: – Isso sim foi uma tragédia. Levar de 7 a 1 em casa, numa semifinal de Copa do Mundo, é o fim do mundo. Mas parece que tudo foi só um apagão.

Quase em coro, muitos presentes pensaram alto: “Pois é…” 

Quer acompanhar todos os capítulos da série “Uma coisa jogada de música”? Clique aqui e saiba como:

Blog Eduardo Lamas Neiva – 15 anos: A SÉRIE “UMA COISA JOGADA COM MÚSICA” NO MUSEU DA PELADA

ABC E SUAS INJUSTIÇAS

por Rubens Lemos

O ABC é um ente federativo dentro do Rio Grande do Norte. Com seus hinos, suas heráldicas, sua constituição própria nos velhos papéis do estatuto e um povo em eterno frenesi de paixão. O ABC, só vim a aprender na própria pele, também é um clube injusto.

Ainda tinha minhas duvidas até o dia em que seu mais franciscano e alucinado dirigente, José Prudêncio Sobrinho, foi sepultado e o clube apresentou – como se estivesse operando o milagre da gratidão, a nota fiscal do caixão e dos demais itens do funeral de Prudêncio. Nos retiramos na hora, envergonhados, eu e o ex-presidente Leonardo Arruda.

José Prudêncio Sobrinho(foto) dedicava ao ABC o bem de um pai pelo filho e o seu sangue jorrava em preto e branco. Foi um homem rico, com uma rede de lojas de bateria de carro que foi se exaurindo. O ABC precisava, ele vendia uma filial. O dinheiro, a fundo perdido, era usado nas renovações de contrato do ídolo Alberi, na chegada de craques, na loucura que ele exerceu sem remédios de tarja preta a contê-lo. Até empobrecer.

Comigo foi no futebol de salão, que comandei de 2005 a 2010, levando o clube a 19 títulos, 13 deles regionais ou nacionais. Me chutaram com três sapatadas. Duas estavam nos pés dos mandões de então, a terceira ficou no meu próprio traseiro.

O péssimo instante por que passa o clube, desmoralizado nacionalmente graças única e exclusivamente à famigerada união de um ex-técnico pedante com um ex-diretor de futebol arrogante, reacende a lamparina da estupidez, do desagrado gratuito, sobretudo com os mais humildes, sangue e costela do ABC. A confiança depositada na dupla que arruinou o futebol do clube foi tão cruel quanto toda atitude mesquinha de cada um dos dois.

Há outros exemplos. Danilo Menezes, o melhor meia-armador do século passado, saiu do ABC de tanto ser perseguido, com os braços cruzados da diretoria em 1980, pelo técnico Servílio de Jesus, ex-jogador do Palmeiras. Servílio veio duas vezes ao ABC e, nas duas, não conseguiu nem título protestado para o alvinegro. Danilo Menezes voltaria em 1994 para ser campeão como técnico.

Pouco depois do que fizeram com Danilo Menezes, fizeram pior com o treinador Erandy Montenegro, campeão invicto do primeiro turno em 1981 e despedido sem nenhuma razão, apenas o serpentear de conhecida traíra da (má) memória do ABC. Erandy deu o troco no mesmo ano. Terminou tricampeão pelo América enquanto os seus algozes não colocaram o time sequer na Taça de Prata, lugar dos vice-campeões.

Em 1983, Erandy Montenegro montaria o melhor time que meus olhos fascinados viram ser campeão no ainda Estádio Castelo Branco: Lulinha; Alexandre Cearense, Joel, Alexandre Mineiro e Dudé; Nicácio, Dedé de Dora e Marinho Apolônio; Curió, Silva e Djalma.

Os escorpiões das emboscadas fatais tiraram o técnico Ferdinando Teixeira, também campeão do primeiro turno em 1996. O ABC perdeu o título para o América que contratou Ferdinando Teixeira e, com ele no comando, subiu para a Série A do campeonato brasileiro. Caso houvesse vencido em 1996, o ABC encerraria a década octacampeão potiguar.

Então veio Fernando Marchiori. Para iludir com resultados de aparente competência que nunca esconderam sua predileção pela mediocridade retranqueira. Ninguém engana todo mundo, o tempo todo. Aclamado(o ABC é pródigo em bajular forasteiros), Marchiori usurpou suas funções, mandou, desmandou, casou, batizou, até ser sufocado por derrotas pífias e procedimentos bizarros.

Como pneu sendo trocado com o carro andando, o ABC vê isolado o presidente Bira Marques. Aqueles em que tanto confiou, foram embora. Bira Marques precisa de ajuda, também deve pedir esse apoio, reconhecer o momento tétrico e convocar homens experientes.

A massa não pode continuar sofrendo. O ABC olha para a frente e enxerga uma improvável reviravolta. Bira Marques, meu amigo, você não estranhe: injustiça faz pouso contínuo pelos alpendres da Rota do Sol.

UMA BREVE HISTÓRIA SOBRE FUTEBOL

por Paulo-Roberto Andel

Foto: Alex Ribeiro

Há quem diga que o futebol é bobagem. Santa insensibilidade: se não fosse o futebol, o mundo seria muito pior porque, para centenas de milhões de pessoas, ele é a única chance de alegria em meio a um monte de ódio, opressão e covardia.

Hoje à tarde, conversando com Raul, lembramos que o velho Maracanã era o único espaço de real convivência democrática da cidade entre ricos e pobres, abraçados nos gols e chorosos nas derrotas. Em muito menor escala, eu só consegui viver o mesmo no grupo de escoteiros: todos acampávamos com ou sem dinheiro, fazíamos vaquinha, apertávamos a comida, o ônibus mais barato. No grupo éramos uns setenta; no Maracanã, cem mil.

Quantas vezes o futebol me salvou? Não sei dizer. Quando meu pai chegava derrotado e violento por causa da bebida, eu corria para o 434, ia para a geral e chorava vendo um jogo. Noutras vezes, eu ficava no corredor da arquibancada olhando a UERJ e sonhando em estudar lá. Noutras vezes eu ia porque era o único lugar em que, tão solitário, eu não me sentia sozinho. Foi assim muitas vezes. Sem o futebol, a depressão teria me vencido, eu teria executado o suicídio que iniciei e teria sido um desperdício, porque escrevi muitas coisas legais a seguir, o que eu não faria morto por motivos óbvios.

O futebol me deu a ilusão de um monte de amigos juntos, caso da arquibancada; me deu sonhos em jogos e lances inesquecíveis; preparou meu espírito para saber encarar as derrotas. O futebol me deu muitos colegas, com quem interagi e trabalhei muitas vezes. Por exemplo, nesse domingo há 28 anos o meu time ganhou um dos maiores jogos de todos os tempos, com um gol de barriga. Naquele ano quase tudo deu errado pra mim, mas o campeonato valeu muito a pena.

Muitos anos depois, foi o futebol que permitiu minha estreia em livro e, por gratidão, escrevi um monte de livros sobre o tema, vários ainda inéditos. Por causa do futebol vivi admirações, paixões e conheci minha esposa. Também conheci pessoas do Brasil inteiro, com quem converso sempre que posso – algumas colaboram com o meu site.

O futebol só não me ofereceu mais abraços do que minha mãe. Você conhece ou segue um artista, acaba gostando mais dele quando é um entusiasta do futebol. Ele me faz esquecer as dores no corpo, a minha tragédia pessoal, a melancolia cotidiana. Por uma hora e meia, mesmo que o jogo não seja bom eu tenho meu pequenino momento de felicidade. Tanto faz se é uma partida importante ou esdrúxula – o jogo começa, eu volto a ter dez anos de idade e meu olhar persegue a bolinha na tela da televisão.

Ah, se não fosse o futebol, como eu teria conversado com a Bibi Ferreira, o Gilberto Gil e a Letícia Spiller? E a Maria Bethânia? E o Italo Rossi? E como eu ia suportar o mundo agora, que me humilha todo dia enquanto sinto dores pelo corpo e choro por tanta gente humilhada feito eu?

É domingo à noite, tudo parece perdido, tenho vontade de desistir mas penso na terça-feira, tudo pode ser diferente e surgir pelo menos uma luzinha no fim do túnel. Pode ser que eu não tenha um único amigo, pode ser que eu não consiga vender e está tudo perdido, mas a terça-feira me serve de esperança. Vou pensar no jogo, vou conversar com colegas para chegar logo o horário da partida. Agora é uma noite melancólica como todas de domingo, onde esperamos ótimas semanas que nunca, mas nunca chegam – ao menos para mim -, só que eu carrego comigo o futebol, a minha esmolinha, os meus botões que minha mãe comprou com tanto sacrifício, as histórias que vi e escrevi, as histórias que ainda preciso contar quando era garoto e, na Copacabana de orla escura, chutava a bola na areia com os colegas mesmo sem vê-la direito, nem o goleiro e o gol – assim como só nos resta viver, nos campos da praia só nos restava jogar, pouco importando se a bola iria para a direção correta, ou se um gomo da bola estivesse soltando.

Aqui falo de quarenta ou quarenta e cinco anos atrás, que foram há um susto porque tudo é brevidade, mas a bola na praia, na vila, no playground do Gordinho e mesmo no Maracanã – meu pai me levou para ver não apenas o Fluminense, mas o America, o Bangu e até o Campo Grande, todos contra o Flamengo – eram tudo uma coisa só: um pequeno suspiro de felicidade.