a menina no alambrado
por Claudio Lovato Filho
Pois é, menina. O que eu posso te dizer?
Tem gente falando que você exagerou, que se arriscou sem necessidade.
Outros, que você só queria aparecer e que deu mau exemplo.
Será?
Eu não vi nada disso. Eu vi paixão.
Alguém poderia me perguntar: “E se fosse a sua filha, machucada daquele jeito por causa do arame farpado, correndo o risco de despencar do alambrado e se arrebentar?”
Pois é, menina. Como eu responderia a isso?
Não sei.
“Eu não posso por ser mulher?”, você perguntou quando foram lhe entrevistar depois do jogo.
Certeza que se em seu lugar fosse um menino a repercussão seria outra. Todo mundo sabe. O mundo é assim.
Você disse que queria voar, e, como não podia, subiu no alambrado.
Você tinha que extravasar de algum jeito, não é? Aquilo tudo no seu coração tinha que sair de algum jeito.
A verdade é que, naquele momento, o coração do El Cilindro era você.
O coração do futebol era você.
O futebol era você.
Marianela, Mari, o que você foi fazer, hein?
E o Yuri estava lá, no lugar certo, na hora certa, como costuma acontecer com todos os fotógrafos bons de bola.
Naquele momento, você era a mensagem; e ele, o meio.
Se você fosse minha filha eu talvez estivesse escrevendo tudo isto numa cama de hospital, caso tivesse sobrevivido ao infarto.
Mas cá estamos todos nós, todos firmes e fortes, você, o Yuri Laurindo, eu e todos nós que sabemos que a verdadeira essência do futebol está toda lá, simbolizada na foto.
A sua imagem no alambrado do El Cilindro.
Seu joelho cortado, seu braço “desansando” sobre o arame, suas lágrimas, seu amor por um clube, por um escudo. Tudo lá, naquela imagem.
O que mais eu posso dizer?
O CRAQUE DA MODA
por Elso Venâncio
Luiz Henrique, 23 anos, é o craque da moda do futebol brasileiro. Atacante canhoto, ele possui dribles e velocidade impressionantes para quem tem 1,82m de altura. Além de ser goleador, também dá assistências, deixando os companheiros na cara do gol.
Entre o final da década de 1960 e o início dos anos 1970, Paulo Cézar Caju, do Botafogo, recebeu do locutor esportivo Waldir Amaral, da Rádio Globo AM-RJ, o apelido de Craque da Moda. Campeão do mundo pela Seleção Brasileira em 1970, Caju era um meia adaptado à ponta-esquerda que desequilibrava em campo. O botafoguense João Saladanha ficava ao lado do Waldir Amaral nas Jornadas Esportivas. Era “o comentarista que o Brasil consagrou” e tinha opiniões marcantes.
— Esse PC é um garoto grande jogando bola no meio de crianças — dizia Saldanha.
Em ótima fase atualmente, Luiz Henrique tem momentos em que lembra Paulo Cézar Caju, só que jogando pela direita e usando a perna esquerda. O camisa 7 é o astro nas vitoriosas campanhas do Botafogo, líder do Campeonato Brasileiro e virtual finalista na Libertadores. Além disso, empurrou a capenga Seleção Brasileira rumo às recentes vitórias nas Eliminatórias. Saiu do banco nas duas últimas partidas, sempre para decidir. Primeiro marcou o gol da virada contra o Chile, nos 2 a 1, em Santiago. No jogo seguinte, contra o Peru, entrou já com 2 a 0 no placar para o Brasil, mas ainda deu passe para o gol de voleio do Andreas Pereira e fechou a goleada com um chute de fora da área.
Revelado em Xerém pelo Fluminense, em que chegou aos nove anos, Luiz Henrique foi negociado com o Real Betis, da Espanha, por 8 milhões de euros, em julho, de 2022. Para repatriá-lo, John Textor desembolsou 20 milhões de euros, sendo o maior e melhor investimento feito pelo Botafogo.
Pelé eternizou a camisa 10, que se tornou referência, sendo usada pelos craques dos times de futebol. O Botafogo é excessão à regra, pois tem a camisa 7 como mística. Foi esse o número usado por Jairzinho, Maurício e Túlio Maravilha, além do inesquecível Garrincha, a Alegria do Povo. Agora, Luiz Henrique é quem honra esse legado.
A próxima missão alvinegra na Libertadores é um jogo de risco, por ser no Uruguai, contra o Peñarol. Nas derrotas, os uruguaios costumam partir para a briga. Mas o célebre Papai Joel lembra que, “quando o Botafogo ganha, aparecem torcedores de tudo quanto é lado”. Confiantes, estão nas ruas, em sua maioria vestindo a gloriosa camisa de número 7.
ISSO VALE SIM, ARNALDO!
por Zé Roberto Padilha
Em meio ao mar de descaso na cessão de programas de iniciação esportiva gratuito às novas gerações, do jeito que tivemos o privilégio de desfrutar nos anos 70 e 80, eis que a TV Rio Sul, subsidiária da TV Globo no Sul Fluminense, organiza uma Copa de Futsal para crianças até 10 anos.
Crianças que estavam trancadas em seus quartos jogando no Playstation Barcelona X Real Madrid, deixaram seu sedentarismo de lado, calçaram seus tênis e foram eles, seus pés, que correram atrás da bola ao vivo, no lugar do joystick, em direção às quadras para suar suas camisas.
E 234 equipes, de várias cidades cobertas pela emissora, tiraram os pais dos seus afazeres e os colocaram nas arquibancadas para torcer pelos seus novos heróis. E nada como ter o esporte, bem cedo, como escudo na vida daqueles que vão encontrar todo o azar de opções para destruir as suas vidas.
Então, Arnaldo César Coelho, nosso árbitro consagrado e comentarista de árbitragem respeitado, o responsável por esse grande feito da TV Rio Sul, a qual dirige, receba nossos cumprimentos.
Ah! Se todos fossem iguais a você, Arnaldo, o nosso país seria o país do esporte. Não aquele que trata o esporte como uma subproduto, e depois vai para Paris jogar nas costas dos seus atletas um desempenho da qual nunca contribuíram para alcançar qualquer podium.
Isso sim, Arnaldo, pode!
DA SÉRIE “NINGUÉM ME CONTOU. EU OUVI”
por Zé Roberto Padilha
Em 75, fomos receber Paulo Cézar Cajú no Galeão. Era uma das feras que Francisco Horta contratara para a Máquina Tricolor. Quase todos os jogadores foram até lá.
Toninho Baiano, para lembrar ao PC do meio ruim onde estava se metendo, foi logo perguntando:
– Que terno é esse, Caju? Horrível!
Ele nem deixou quitar:
– É, tem razão, custou barato. Cara foi a passagem!
E aí Toninho fechou :
– Que bom. Isso mostra que o mau gosto é universal!
Mesmo assim, com ou sem esse terno, fomos bicampeões carioca, duas vezes semifinalistas do Campeonato Brasileiro e Campeão do Torneio de Paris.
VIRADA DO SÉCULO
por Elso Venâncio
O jogo decisivo da Copa Mercosul de 2000 é considerado por muitos o maior da história entre os grandes clubes brasileiros. Por sua importância e pelo grau de emoção despertada, aquela final recebeu o apelido de Virada do Século.
O Palmeiras “só” precisava do empate, jogando no Estádio Palestra Itália, e fez muito mais do que isso no primeiro tempo. Foram três gols da equipe paulista num intervalo de nove minutos: com Arce, aos 36; Magrão, aos 37; e Tuta, aos 45. Logo, os torcedores começaram a gritar “É campeão… É campeão”.
Quatro dias antes, o vice-presidente de futebol do Vasco, Eurico Miranda, havia demitido o treinador Oswaldo de Oliveira. Tudo ocorreu depois de um empate por 2 a 2 com o Cruzeiro, num sábado, em São Januário. Eurico ficou intrigado ao ver um apressado Júnior Baiano apanhar no chão um bilhete de passagem aérea para Salvador, que tinha caído da mochila. Ao conferir a programação, o dirigente perguntou ao supervisor, Isaías Tinoco, por que motivo a apresentação seria na segunda-feira à tarde, se tinha decisão na quarta-feira.
— Passa para amanhã à tarde — ordenou Eurico.
Oswaldo de Oliveira ouviu e disse que a determinação da reapresentação na segunda-feira era dele.
— Tá demitido! — rebateu o dirigente, sem levantar a voz.
Alguns jogadores até pediram para que Eurico reconsiderasse a sua posição, mas a resposta foi a mesma: “Tá demitido!”, desta vez em alto e bom som.
Minutos depois, Romário estava a caminho da Barra da Tijuca quando atendeu o celular.
— Romário… (pausa).
— Fala, doutor!
— Liga para o Joel!
Na tarde do dia seguinte, domingo, Joel Santana já comandava o treino cruzmaltino.
Voltando à decisão em São Paulo… No intervalo, a comissão técnica e os jogadores do Vasco ficaram surpresos com a presença de Eurico Miranda no vestiário. Reza a lenda de que ele chamou Viola para uma conversa:
— Te contratei a peso de ouro. Você vai entrar e mudar o jogo.
Eis que Viola surge no lugar de Nasa para o segundo tempo. O atacante não fez gol, mas sua garra contagiou os companheiros.
De dominado, o Vasco passou a dominar. Aos 13 minutos, Romário descontou batendo pênalti. Logo em seguida, outra penalidade e novo gol do Baixinho. Um baque poderia ter ocorrido aos 32 minutos, quando Júnior Baiano foi expulso por jogo violento. Porém, a pressão continuou mesmo com 10 em campo, resultando no empate com Juninho Paulista, aos 40. E o que parecia impossível aconteceu aos 48. Foi Viola quem começou a jogada, antes do chute de Juninho Paulista sobrar para Romário. Coube ao Baixinho virar o jogo, concretizando a sua maior atuação com a camisa do Vasco, jamais igualada nos outros clubes em que passou.
Após a heroica vitória por 4 a 3, os telefones do estúdio da Rádio Globo AM-RJ não paravam de tocar. Eu ancorava a “Jornada Esportiva”, acionando Gérson, Luiz Mendes, repórteres e convidados. O botafoguense Agnaldo Timóteo gritou empolgado: “Que jogo é esse?! Histórico!”. Dona Marlene, esposa do lendário Antônio Soares Calçada, avisou que ele gostaria de entrar no ar. O presidente do Vasco chorou de emoção, a ponto de não conseguir falar. Quase no mesmo instante, alguém já avisava sobre um carnaval improvisado no bairro de São Cristóvão. Vários taxistas deixaram o ponto da Rua do Russel, na Glória, e se juntaram em uma carreata que não deixou a cidade dormir.
Lembrando de momentos como esse, chega-se à conclusão de que os torcedores vascaínos merecem uma nova grande conquista. E não tenham dúvidas: farão outra comemoração inesquecível, sem hora nem dia para acabar.