por Zé Roberto Padilha
Felipe, meu neto, completou seis anos no sábado. Como ele ama o futebol em primeiro lugar, o Fluminense em segundo e o Atlético Mineiro em terceiro, tive que buscar inspiração para lhe comprar o presente, pois já ganhou todas as fitas do Playstation, tênis e chuteiras diversas, camisas até da Copa da UEFA, bolas diversas e figurinhas do álbum do Brasileirão. Encontrei uma bola diferente, de Rugby e mandei embrulhar. Ao recebê-la, abriu um sorriso de criança diante de algo diferente, agradeceu e saiu para bater pelada no campinho do sítio com os amigos. Pelada de bola redonda do futebol brasileiro. Do pai, ganhou de presente uma ida no domingo à Volta Redonda para ver o Fluminense jogar.
Quando partiu, parti junto com as minhas lembranças da primeira vez que fui ao Maracanã ver o nosso tricolor jogar: 18 de dezembro de 1960. Tinha oito anos e era decisão do Campeonato Carioca. Público pagante: 98.099. Placar: América 2×1, com gols de Nilo e Jorge, contra um de Pinheiro. Voltei de lá tão fascinado, e contrariado, que pedi uma chuteira para o meu pai e, como Van Damme e Bruce Willys, prometi um dia ser jogador de futebol do Fluminense para nos vingar daqueles vermelhos. Ela, a vingança, demorou 15 anos e estava na ponta esquerda quando Rivelino, diante de 96.047 pagantes, desferiu uma bomba como Hiroshima que dizimou não o Japão, mas um País. O goleiro do América. Para a vingança ser completa, faltaram ao estádio apenas 2.052 torcedores.
Chegando ao Raulino de Oliveira, Felipe encontrou na sua estreia apenas 2.860 pagantes. Não viu de perto o duelo de Castilho, Pinheiro e Altair versus Calazans, Quarentinha e Nilo. O nosso ataque era Maurinho, Valdo, Telê e Escurinho. Domingo, a disputa foi do Edson contra Fernandes, Gum marcando Ribamar. Em 1960, raros eram os passes errados, pois se a bola é que corria, não os jogadores, sua posse e uso era tratada com extremo carinho. Faltavam cinco minutos para terminar Fluminense x Botafogo e o “scout”da Globo já apontava 75 passes errados. Deve ter passado de um por minuto jogado. O próprio gol que decidiu a partida não saiu de uma jogada trabalhada. Saiu de um passe errado.
Quando acabou a transmissão, minhas memórias fizeram com o Felipe a viagem da volta. Fiquei a imaginar entrando no carro decepcionado, e no lugar de vir contando as obras de arte do Telê, o chute decisivo do Jorge, voltou calado perante a falta de inspiração do Salgueiro, que nem que se juntasse a Beija Flôr e a Mangueira, estaria a altura da camisa que foi do Gérson. E do Afonsinho. Fora Cícero e Scarpa, que poderiam vestir a 10 do Telê, se enfiando pelas pontas no lugar de centralizar suas jogadas, encostar no Fred, tabelar e procurar o gol. Que sempre será o grande momento do futebol.
Eram 20h30 quando chegou de Volta Redonda. Liguei para ele: “E aí? Gostou, Felipe?” Mais ou menos, respondeu. E devolveu: “ Vô, tem escolinha de futebol americano em Três Rios?”. Pelo visto, meu neto veio da estréia querendo se vingar também. Não do América ou do Botafogo. Mas do futebol brasileiro.
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