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OMNES OMNIBUS

16 / maio / 2023

por Claudio Lovato Filho

Parece um navio que se aproxima lentamente, navegando solene, a proa mais nítida no horizonte conforme ele deixa para trás a névoa que encobre o mar (mar de asfalto).

Ou então talvez lembre uma nave vinda de uma alguma galáxia distante, depois de uma viagem marcada por uma profusão de imagens indescritíveis, agora pousando suavemente com suas luzes mercuriais que iluminam a pista à frente.

Ou ainda, quem sabe, sugira mais que tudo um animal gigantesco, ao mesmo tempo ancestral e futurístico, que avança a passos vagarosos e cerimoniais, da maneira cautelosa e altiva que seu tamanho pede e sua importância exige.

As pessoas se aglomeram ao longo do caminho, dando espaço, abrindo alas, construindo um corredor, e empunham bandeiras e trapos, e soltam fogos e acendem luzes como para indicar a rota que o enorme ser/objeto dotado de faróis e rodas e aço e vidro deve percorrer (como se ele precisasse).

No meio da multidão que não para de crescer, um homem e um menino acompanham tudo com muita atenção (na verdade, hipnotizados). O homem com o braço sobre o ombro do menino, o menino com os olhos muito arregalados, a respiração sobressaltada, o coração que aos trancos e barrancos, num galope.

Quando o navio, a nave, a criatura monumental passa bem perto de onde eles estão, e a massa aumenta a intensidade de suas saudações ruidosas e reverenciais com cânticos e fogos e a tremulação das cores mais importantes do universo, os portões enfim se abrem.
E nesse momento, quando a viatura sobrenatural passa bem em frente ao ponto onde estão o homem e o menino, um dos ocupantes acena, e o menino tem a certeza de que foi para ele – o menino que só pensa em futebol; o menino que para sempre amará o futebol.

Alguns instantes depois, quando os portões se fecham e o veículo mítico finalmente adentra território sagrado (a casa, o templo, o estádio, o estádio!), deixando para trás a euforia e as homenagens e a cantoria, o menino percebe – de uma forma que ele só conseguirá elaborar com clareza muito tempo depois – que, na vida, a distância entre sonho e realidade às vezes é nenhuma, e que no futebol isso ocorre com frequência ainda maior.

A vida. O futebol. Paixão e agonia. Virulência e poesia. Crueza e fantasia. Omnes omnibus. Tudo para todos.

P.S.: Omnes Omnibus (do latim, “Tudo para Todos”) foi o nome dado, em 1826, na França, à primeira companhia de ônibus da História.

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