por Paulo-Roberto Andel
Para quem viveu o que foi o Maracanã entre 1950 e 2010, e mais especialmente entre os anos 1970 e 1980, as emoções não se limitavam ao verdadeiro carnaval de imagens fantásticas, que iam desde o colorido das torcidas até às maravilhosas jogadas que ficaram na memória, mas também passavam por uma experiência sonora fascinante.
Tudo começava bem antes de um clássico, por exemplo. Se você chegasse mais cedo e ficasse no corredor das arquibancadas, ali por volta das 14h, podia ouvir em intervalos regulares os gritos da multidão que chegava nos trens, desembarcando na estação Derby Club e formando um maravilhoso desenho de gente vindo e cantando, gritando, assobiando, fazendo da chegada ao estádio imortal uma verdadeira catarse.
Já nas arquibancadas, muitas vezes lotadas a partir das 15h, o espetáculo musical ficava por conta do samba. Muito samba, às vezes com a participação de baterias de escolas consagradas. Era a pulsante trilha sonora do pré-jogo e das preliminares, também acompanhada de gritos de guerra (pacífica) das torcidas.
Chegando às 16h45, tudo mudava: o Maracanã era tomado por certo silêncio de expectativa enquanto dezenas de bandeiras se alinhavam nas arquibancadas, tudo no aguardo da entrada dos times em campo. De repente, com a subida dos craques ao gramado, precedidos pela garotada correndo e se empilhando na entrada dos túneis, a arquibancada explodia: cantos, percussões, fogos, luzes, papel picado, papel higiênico, pó de arroz, fumaça colorida, balões e o ruído ensurdecedor de festa.
Durante o jogo, um barulho era inconfundível: “UUUUUUUHHHHHHH”, quando um chute de fora da área passava perto do gol ou era espalmado pelo goleiro para escanteio. A onomatopeia coletiva ia com toda força na cobertura de concreto no Maracanã e voltava, fazendo um eco inesquecível. Se saísse gol, bem, não precisava nem falar: era o orgasmo do futebol, exceto para o time que o levasse.
Durante muitos anos, o som abafado dos alto-falantes teve uma assinatura infalível, a do locutor oficial do Maracanã Victorio Gutemberg. Era dele o bordão “SU-DERJ IN-FORMA” com as substituições em campo, renda, público e jogos relevantes disputados noutros lugares. No intervalo, ele vinha com “LO-TE-RIA”, passando os resultados de momento das partidas da Loteria Esportiva, até então o jogo mais popular do país. Gutemberg sabia dar o tom exato das partidas: certa vez, num Vasco x Fluminense de 1980 no primeiro turno, ao mesmo tempo o Flamengo jogava contra o Bangu em Moça no Bonita. O Flu vencia o Vasco por 2 a 1, enquanto o jogo do Flamengo interessava a ambos os times. Perto do fim da partida, Victorio Gutemberg entrou com “SU-DERJ IN-FORMA: em Moça Bonita…”, fez alguns segundos em silêncio e anunciou “Mi-ran-di-nha” para depois explodir “BAN-GU 1, Fla-mengo 0”, com tricolores e vascaínos se esquecendo do próprio clássico para comemorar o gol alvirrubro.
E justamente nos finais dos clássicos é que surgia uma das maiores experiências sonoras do Maracanã: todo mundo ia com seus radinhos de pilha e cada rádio tinha uma vinheta de minutagem, geralmente usada nas transmissões de cinco em cinco minutos, mas executada a cada 60 segundos depois dos 40 minutos do segundo tempo. Imagine mais de cem mil pessoas com a massa sonora das rádios Globo, Tupi e Nacional também batendo na cobertura de concreto e reverberando em toda a arquibancada? Uma mistura de samba potente, Kraftwerk e Azymuth que só o maior estádio do mundo sabia proporcionar.
Outro ruído sempre presente, mas perceptível apenas nos jogos mais vazios, não vinha das arquibancadas mas da parte de baixo: a velha e saudosa geral, que já gerou estudos, documentários e celebrou o espaço mais popular do Maracanã. Mas isso fica para outra história; afinal, o eco fortíssimo dos sinalzões das rádios, bem descrito no penúltimo parágrafo, ainda está ecoando nestas linhas com força. E os geraldinos merecem uma coluna só para eles.
Muito boa tarde eu sou cunhado do Victorio Gutemberg do primeiro casamento dele foi com a minha irmã Thelma em 1958 e gostaria que colocacem o áudio do (gut) que era como nos o chamávamos
pra eu ouvir.