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NOEL ROSA, SAMBA COMO TESTEMUNHA E VASCO NO CORAÇÃO

11 / dezembro / 2019

por André Felipe de Lima


Quando o craque José Monteiro, talvez o maior da história do Andarahy e tão elogiado por Mario Filho no livro “O negro no futebol brasileiro”, morreu em 1919, o menino Noel Rosa, nascido em Vila Isabel, bairro vizinho ao do charmoso clube alviverde, era apenas um menino de nove anos. Certamente ouvia o pai e muitos outros falarem das bravuras do Monteiro. Sem dúvida, Noel Rosa cresceu com uma quedinha pelo Andarahy, um clube que encarava sem temor os adversários endinheirados da zonal sul. Falo de Fluminense, Botafogo e Flamengo, além do tijucano América, o então mais forte e rico da zona norte. O Vasco viria somente na década seguinte. Não deu tempo do Monteiro enfrentar aquele timaço com feras vindas do Bangu, e a lista era recheada delas. Havia Bolão, Itália e, sobretudo, Fausto dos Santos, que cresceu bem pertinho do Noel Rosa, na Aldeia Campista, um pedaço de chão que cobre parte da Tijuca e de Vila Isabel.

Não há, contudo, registros se os dois se conheceram ainda adolescentes. Mas é bem possível, afinal Noel Rosa e Fausto eram assíduos frequentadores de rodas de samba em Vila Isabel e dos empolgantes botequins nas concorridas esquinas do Boulevard 28 de Setembro e adjacências. Esbarrarem-se neles era pule de dez. Tornaram-se amigos, de fato.

Noel Rosa, no começo dos anos de 1930, já se revelava como um dos principais nomes do samba na cidade. Fausto simplesmente era o “Maravilha negra”, melhor jogador do país e único a se salvar do “naufrágio” da seleção brasileira na primeira edição de uma Copa do Mundo, em 1930, no Uruguai.

“Noel Rosa gosta de passear na chuva sem qualquer agasalho e chapéu. É torcedor de futebol, assistindo os jogos noturnos e preferindo, como jogador, Fausto.”

Essa simples nota jornalística perdida em uma página de uma edição da revista Carioca, de 1936, pode ser (acredite) o registro mais assertivo de que Noel Rosa gostava de futebol e era vascaíno de — recorrendo à tradicionalíssima expressão portuguesa — quatro costados. A aparentemente inexpressiva nota pode ter dito muito mais do que se imagina sobre o que poderia acontecer com Noel Rosa no ano seguinte.

Tanto ele quanto Fausto tiveram destinos idênticos. As trajetórias, idem. Além de crescerem na mesma região, ambos amavam o samba. Enquanto um, o Fausto — diziam —, era um “pé de valsa” e bamba de bola inconteste, falavam de Noel que no violão e nas linhas musicais, entre pandeiros e surdos, era um sem igual. Mas os dois eram amigos, o que, lamentavelmente, poucos (ou praticamente nenhum) registros podem confirmar. Mas os indícios nos induzem a crer que eram parceiros nas etílicas rodas de samba da Vila, e sempre abraçados a muitas mulheres. Mas apenas uma parecia ser a companheira de ambos: a lua, a mais genuína “dama da noite”. Os três eram indefectíveis notívagos. Portanto o ocaso das duas legendas culturais daquela década só poderia ser mesmo traduzido por noites enluaradas e românticas sob o fundo musical do samba. A tuberculose acometeu os dois vascaínos. Noel morreria em maio de 1937. Fausto, no ano seguinte.

O Vasco foi — ao menos uma vez — cantado por Noel Rosa. O curioso é que o jogador citado na letra do samba “Quem dá mais?” não foi o amigo Fausto e sim o Russinho, o artilheiro das madeixas louras e olhos claros que começou a carreira (olhe ele aí de novo…) no Andarahy:

“Ninguém dá mais de um conto de réis?/ O Vasco paga o lote na batata/ E em vez de barata/ Oferece ao Russinho uma mulata.”

A “barata” citada no samba era um carro Chrysler que Russinho ganhou após vencer um concurso de jogador mais popular do país promovido pelos cigarros Veado.

Será que depois dessa despretensiosa crônica há ainda alguma dúvida da paixão de Noel Rosa pelo Vasco? O rubro-negro e também genial sambista Wilson Baptista, rival eterno do velho “Queixinho”, que o diga. O “Clássico dos milhões” entre ambos parece mesmo eternizado.

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