por Elso Venâncio, o repórter Elso
Didi, Di Stéfano e Puskás. Um trio dos sonhos. Tudo para dar certo no Real Madrid dos anos 50 e 60. Porém, com ciúmes, o argentino Di Stéfano boicotou o astro brasileiro. Como o húngaro Ferenc Puskas fez questão de deixar claro em seu livro:
“O maior inimigo de Didi no Real Madrid foi a sua fama.”
Apenas em 1959 o Real Madrid passou a ter um negro no time. Simplesmente, o melhor jogador de futebol do mundo. A FIFA inovou ao eleger, ao fim da Copa de 1958, na Suécia, o craque da competição. Apesar de contar com o garoto Pelé e o genial Garrincha, Didi foi o escolhido. Recebeu, do jornalista Gabriel Hanot, o apelido de ‘Mister Football’. Francês considerado o papa da crônica esportiva europeia, Hanot criou a Champions League. Tinha moral entre os seus.
Os espanhóis pagaram uma fortuna por Didi: 100 mil dólares e mais dois amistosos em Madrid, com renda dividida. Hoje o clube admite investir 250 milhões de euros pelo francês Mbappé, superando os 222 milhões que o Paris Saint-Germain desembolsou para ter o brasileiro Neymar em gramados franceses. Outros tempos…
Por que Didi não deu certo na Europa? Por que retornou ao Brasil meses depois? Segundo o jornalista Peris Ribeiro, biógrafo do ‘Gênio das Folhas Secas’, é preciso um certo cuidado, afinal, não se comentava sobre racismo na época. Houve, ao certo, ciúmes do argentino, que era o dono da equipe e sequer foi escutado em relação à nova contratação da equipe.
Se Puskás declarou em seu livro que o maior inimigo de Didi foi sua fama, vale dizer que o presidente do clube madrilhenho, Santiago Bernabeu, almoçava semanalmente com o brasileiro. Mas não com Di Stéfano, nem com Puskás.
Na estreia do meia campeão mundial em 1958, jogo válido pelo Torneio Ramón de Carranza, vitória de 6 a 3 sobre o Milan, com direito a um golaço de ‘Folha Seca’… Depois, 4 a 3 no arquirrival Barcelona, na grande final. Didi foi eleito o craque da competição. Aos 34 anos e em fim de carreira, Di Stéfano ficou mal-humorado e passou a boicotar o brasileiro. Didi tinha 30 anos. Puskas, dois a mais que ele.
Freitas Solich afagou Didi e Di Stéfano não gostou nem um pouco. Grupo dividido, derrotas, e mesmo evitando atritos Didi percebeu-se sem clima no clube madrilhenho. O técnico paraguaio acabou sendo demitido. E Peris Ribeiro explica o que aconteceu a partir de então:
“Didi escreveu para João Havelange e João Saldanha dizendo que queria voltar para o Brasil. Os dois foram juntos à Espanha e Saldanha conseguiu a liberação do craque, abrindo mão dos amistosos que o famoso Botafogo faria em Madrid.”
Em 1958, os jornalistas acompanharam, curiosos e à distância, Didi e Paulo Machado de Carvalho caminharem ao lado, nos jardins da bela concentração localizada em Hindas:
“Doutor… Pelé e Garrincha têm que jogar”, arguiu Didi.
“Mas o Garrincha não é louco?” – retrucou o dirigente.
“Não! Ele enlouquece, sim, seus marcadores. Com os dois na equipe, pode anotar, seremos campeões.”
João Havelange nutria enorme carinho por Didi, mas lembrou Di Stéfano ao passar a ter ciúmes de Paulo Machado, ‘O Marechal da Vitória’, ao longo de dois Campeonatos Mundiais vitoriosos. Tanto que o afastou da Copa da Inglaterra, em 1966, competição em que a falta de comando foi determinante para o fracasso da seleção.
Nos estúdios da Rádio Globo-Rio, antes do ‘Enquanto a Bola Não Rola’, programa de debates que apresentei aos domingos, observei o seguinte diálogo. Armando Nogueira, o ‘Machado de Assis da crônica esportiva’, comentou com Didi:
“Lembro da primeira vez que te vi…”
“Quando foi?”, perguntou o autor do primeiro gol da História do Maracanã.
“No Estádio Aniceto Moscoso. Você começou no banco, mas assim que entrou, contra o Madureira, olhei para o Luiz Carlos Barreto e disse:
“Aquele ali vai dar jogador. E dos grandes!”
Dito e feito.
Didi volta e meia era cotado, mas não pôde realizar o sonho de ser técnico do Brasil em uma Copa do Mundo. O ‘Velho Marinheiro’ Gentil Cardoso afirmava:
“A cor impediu que eu e Didi comandássemos a seleção brasileira.”
Ou seja, hoje falamos muito de racismo. Mas esse problema data de muito, mas muito tempo mesmo. Não é algo recente. E nem tão cedo passará.
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