por Rubens Lemos
A cabeleira de Dé, o Aranha, incorporação do malandro adequado aos sambas de Bezerra e Moreira da Silva, atiçava galeras, desafiava estruturas concretas do Maracanã. O povo amava o estilo black power de uma tendência febril entre os craques de talento e cobertura vasta acima do pescoço. Uma sílaba e futebol de pelada pura, Dé, sempre foi fácil de pronunciar, difícil de prever e certeza de golear.
Dé é uma imagem multiplicada em tantos craques irreverentes, machos ao encarar sem tremer, multidões de 150 mil pessoas no Maracanã, sutis no toque em que a bola não recebia agressões ou patadas. Carícias e trivelas no corte da ginga e do balanço afro de um Geraldo Assobiador, de um PC Cajú, de um Pintinho, de um Adílio em gestação. Suingue de escape musical e background de fintas desconcertantes.
Nas veias do boleiro no tempo do meu tempo que é o tempo do Museu da Pelada pulsava humanismo. Tomava cerveja em botecos, frequentava puteiros, inventava modas berrantes, colecionava chacretes, pagava em fascínios no quadrilátero em relva. Caneta, elástico, um-dois, toca e passa, vocabulário ritmado por chuteiras e estéticas berrantes e psicodélicas. Jogador espelhava o sonho do geraldino de Trem da Central.
O oposto ortodoxo de um tempo em VHS, é o androide Cristiano Ronaldo. É um momunento à safra jovem de pernas de pau acomodada em sofás convidativos ao sexo ao sono, eles, os babacas, jogando videogame ou o que seja em enlatado futebolês, babando o greco-português de mármore, um atacante sem tempero e um metrossexual cultuado por marmanjos de barba, pança e netos.
Cristiano Ronaldo é o artificialismo inimigo de todo saudosista. Nunca será Romário feiticeiro, Bebeto engomadinho e habilidoso, Careca destruidor técnico, Reinaldo, a graça humilhante e frágil. CR7 pode ser tudo em Euros, menos em paixão. Desde o dia em que deu cotovelada Odvaniana em uma fã que o filmava no celular, carimbou o símbolo do mercenário vilão de filme de 007. O Gajo é lindo? Elas decidem.
Belo mesmo seria vê-lo de bobo numa roda com Romário, PC Caju, Djalminha e Rivelino. E Dé, de black power, com areia na mão, para enfiar nos olhos de um ídolo de barro. Craque e criança formam a simbiose do amor à bola. CR7 idolatra o bolso e tomaria um fado elétrico dos malandros do Brasil.
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