por André Felipe de Lima
“Siam venuti qua. Siam venuti qua. Pra vedere giocare Kaká”. Traduzindo para o bom português: “Viemos aqui. Viemos aqui. Para ver Kaká jogar”. Esse era o grito enlouquecido dos torcedores do Milan no momento em que o craque brasileiro pisava no gramado do estádio San Siro, em Milão. Encontrar a camisa rossonera com o número 22 às costas era missão das mais difíceis na loja oficial do clube italiano. Não havia ídolo que se assemelhasse ao Kaká. E a imprensa local se incumbia de reforçar o oba-oba em torno do brasileiro, estampando efusivas manchetes, nas quais era comum se ler “Kakalcio espetáculo” ou “Kaká, esplêndido tenor”.
Quando o assunto é popularidade, ninguém era páreo para ele. Nem mesmo os jogadores italianos campeões mundiais de 2006, como Inzaghi e Pirlo, que foram companheiros de Kaká no campeoníssimo Milan.
O jovem meia-atacante Ricardo Izecson dos Santos Leite (esse o nome completo do Kaká) faz anos neste sábado, 22. O ídolo nasceu em Brasília, em 1982. No entanto, aos quatro anos, mudou-se com a família para Cuiabá. Com sete, chegou a Perdizes, bairro de classe média alta da capital paulista. A mãe do pequeno Ricardo seguiu o conselho de um professor de educação física e o inscreveu na escolinha de futebol do São Paulo. Tempos depois, a família Izecson trocou o apartamento de Perdizes por um no Morumbi, mais perto dos treinos de Kaká, que estudava pela manhã para poder jogar bola — ora na quadra, ora no campo — o restante do dia.
Sempre levou a sério o caderno… e a bola também. Mesmo assim, deparou-se com treinadores que não gostavam do seu estilo. Pode parecer surreal, mas Kaká —um dos maiores ídolos do futebol globalizado na década passada — foi reserva em todos os times de base do São Paulo. Do dente-de-leite aos juniores. Preconceito, talvez, pelo fato de o jovem vir de família abastada. Mas Kaká, religioso a toda prova, sempre se relacionou bem com os colegas dos tempos de base. Sobretudo os mais pobres. Invariavelmente convidava-os para um bolo em sua casa. Os mais chegados dormiam na residência de Kaká.
Humilde, Kaká nunca ligou para quem torcesse o nariz para ele. No futebol truncado que se disputa nos últimos anos, o jogador foi um verdadeiro oásis de talento.
Elegante, refinado, de toques de bola precisos, grande visão de jogo e bom poder de finalização. Com tantas qualidades, Kaká não demorou a ingressar no time de cima e, de prima, conquistou os exigentes são-paulinos, acostumados com a geração de Raí, que tantos títulos e alegrias proporcionou ao torcedor.
A performance do brasileiro na Liga dos Campeões da UEFA, em 2006/07, foi elogiada por ninguém menos que Pelé, que o comparou ao ex-comandante da “Laranja Mecânica”, o holandês Cruyff: “Ele tem progressão, velocidade, e é único quando parte com a bola dominada do meio-campo. Sabia que ele chegaria longe, mas cresceu mais do que eu esperava. Quando ele está bem, o Milan é devastador.”
Após cada gol, a reverência aos céus. Kaká, olhar fixo para cima, erguia o braço e o apontava como se tentasse tocar um dedo imaginário, porém divino. “Deus é fiel”. É o que se lê em seus lábios, quando revemos a imagem em que comemorava mais um belo gol. A cena lembra a magistral pintura de Michelangelo no teto da Capela Sistina. É isso! Kaká foi o “Michelangelo da bola”.
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