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ÍDOLO DE UMA GERAÇÃO

17 / dezembro / 2020

por Marcello Pires


Píndaro, Pinheiro, Assis, Galhardo, Abelhão, Duílio, Ricardo Gomes, Válber, Alexandre Torres, Thiago Silva, Gum…. A lista é extensa e eu poderia escrever mais algumas linhas citando outros tantos grandes zagueiros que deixaram sua marca na centenária história do Fluminense. Mas por mais tempo que eu perdesse lembrando desse passado glorioso, nenhum outro defensor que vestiu as cores verde, branca e grená conseguiria superar minha adoração por Edino Nazareth Filho. Mais do que um craque em campo, Edinho foi uma referência fora dele, o ídolo da minha geração, o cara que segurou as pontas diante de Zico e Roberto Dinamite, os reis do pedaço naquela época, e manteve o torcedor tricolor vivo nos tempos de vacas magras que se sucederam logo após o “desaparecimento” da fantástica máquina tricolor bicampeã carioca de 1975 e 1976, na qual ele também fez parte no início de carreira.

A tarefa de manter o Fluminense competitivo não era nada fácil, afinal o Flamengo se apresentava para um Maracanã quase todo domingo abarrotado com Zico, Junior, Leandro, Tita e cia; o Vasco tinha Roberto Dinamite e Wilsinho e o Botafogo era orquestrado pelo talentoso Mendonça. Só fera. Mas Edinho não era um simples zagueiro daqueles que só marcaram e davam porrada. Era forte, dono de uma impulsão assustadora, aliava técnica à raça, tinha velocidade, e ainda marcava gols. Gol de título, inclusive. Foram 34 pelo clube, um número razoável para quem tinha primeiro a missão de defender. Líder nato, ele também cobrava faltas e pênaltis e praticamente se tornou o “dono” do Fluminense após a saída de Rivellino para o mundo árabe, em 1978.

Nascido dia 5 de junho de 1955, no Rio de Janeiro, Edinho chegou ainda menino às Laranjeiras, com apenas 13 anos, e até deixar o torcedor tricolor órfão em 83, quando se transferiu para o Udinese, foram 14 anos defendendo as cores do Fluminense. Depois de cinco temporadas na Itália e uma rápida passagem pelo Flamengo, onde conquistou a Copa União, fato que certamente diminuiu seus status de ídolo para alguns torcedores, ele voltou para casa em 1988, encerrando sua trajetória pelo Tricolor como jogador no ano seguinte após 359 partidas disputadas.


Mas não foi só a conquista da taça das bolinhas pelo clube rubro-negro que balançou sua relação afetiva com parte do torcedor tricolor. No mundo globalizado de hoje em dia, dominado pela mídias sociais e no qual somos capazes de assistir vários jogos ao redor do mundo ao mesmo tempo, os craques do passado muitas vezes acabam varridos para debaixo do tapete e caem no esquecendo. Não chega a ser o caso de Edinho, que atualmente trabalha como diretor técnico do Tombense. Mas em recente pesquisa realizada pelo Globoesporte.com para eleger o maior ídolo da história do Fluminense, na qual 100 jornalistas foram ouvidos e tiveram direito a voto, o ex-zagueiro ficou apenas na 12ª colocação, atrás inclusive de Thiago Silva, o preferido da geração digital na posição. Castilho, merecidamente, ganhou com o pé nas costas.

Não que o jogador do Chelsea não esteja à altura do eterno camisa 5 e entre os principais jogadores do clube. Muito pelo contrário, na história recente do Tricolor o capitão da seleção de Tite certamente é o maior zagueiro a passar pelas Laranjeiras. Mas a alcunha de ídolo no meu modo de ver vai muito além de números e estatísticas. Tem a ver com empatia, entrega, comprometimento, tempo de casa, conquistas e representatividade. Edinho engloba tudo isso num pacote só. Começou na base, desbancou experientes medalhões para ganhar sua vaga na famosa máquina tricolor com apenas 20 anos, decidiu o título de 80, levou o clube nas costas até o surgimento do timaço tricampeão carioca (1983, 1984 e 1985) e campeão brasileiro (1984) e disputou três Copas do Mundo (1978, 1982 e 1986).

Tudo isso somado à época que o ex-zagueiro brilhou pelo Flu. Se a fartura de craques consagrados ao seu lado em meados dos anos 70 o ajudou a se projetar nacionalmente, a quantidade de jogadores talentosos que ele precisou encarar para vencer na carreira certamente o colocaram num outro patamar. Afinal, não é qualquer marcador que alcança a fama e chega à seleção brasileira tendo que parar caras do quilate de Zico, Tita, Cláudio Adão, Roberto Dinamite, Serginho, Careca, Reinaldo, Éder, Maradona, Platini, Rummenigge, Boniek, Mario Kempes, entre tantos outros.

Um deles é testemunha de como era complicado enfrentar o ex-zagueiro tricolor. E olha que à época ele fazia parte do maior time do futebol brasileiro.

– Edinho foi um dos maiores zagueiros que eu vi jogar. Muita técnica, muita raça, muita qualidade, muita intuição, bom na hora de fazer as coberturas, sabia sair de trás tocando a bola e era um líder nato, principalmente no Fluminense, quando ele viveu uma fase excelente. Fomos adversários muito tempo, um grande amigo, jogava todos os jogos e um dos melhores jogadores que eu vi jogar. Muito dotado fisicamente, um zagueiro fora de série – elogiou Tita, um dos atacantes que mais deram trabalho ao ex-zagueiro.


Edinho levantou vários troféus com a camisa tricolor, mas nenhum foi tão importante e significativo para o camisa 5 como o Estadual de 1980. Com um time quase todo formado em casa, o Fluminense até então não parecia ser páreo para o Flamengo de Zico ou o Vasco de Roberto Dinamite. Com exceção do meia Gilberto e do experiente goleador Cláudio Adão, os outros nove jogadores comandados pelo técnico Nelsinho Rosa eram oriundos das categorias de base do clube. Mas sob a batuta do zagueiro, dono da braçadeira de capitão, o Tricolor desbancou os favoritos, conquistou a taça Guanabara e se classificou para a grande decisão contra o Vasco de Zagallo.

Jogo difícil, truncado, debaixo de muita chuva e com o gramado pesado. Até que aos 22 minutos do segundo tempo Arnaldo Cézar Coelho marca uma falta na quina da área do lado esquerdo a favor do Tricolor. Edinho pegou a bola, ajeitou com carinho, tomou pouca distância e cobrou, a pelota quicou na frente de Mazaropi, o goleiro vascaíno ainda tentou espalmar pra frente, mas ela espirrou para o canto direito e resvalou na trave antes de entrar no fundo da rede. Gol de Edinho, do título, festa tricolor no Maracanã diante de quase 110 mil pagantes.

Cérebro daquele meio-campo tricolor, Deley jamais se esquecerá daquele 30 de novembro de 1980. Orgulhoso por fazer parte de um time quase todo feito nas Laranjeiras, fato que dificilmente se repetirá no futebol mercadológico de hoje, o camisa 8 destaca a qualidade do ex-companheiro e acredita que naquele domingo chuvoso o destino conspirou a favor de Edinho.

– Ele foi um líder incrível naquele período, quando podemos afirmar que era o melhor zagueiro do Brasil, principalmente pela sua liderança técnica. Até porque éramos um time jovem e que só tinha o Gilberto e o (Cláudio) Adão que não tinham sido formados nas Laranjeiras, coisa que dificilmente vai voltar a acontecer. Lembro que nós éramos considerados meio que o patinho feio do estadual, por isso ele teve uma importância muito grande naquele time. Acho, inclusive, que o gol de falta na final foi um prêmio pelo campeonato maravilhoso que ele fez e pela fase espetacular que vivia naquele momento – reconhece Deley.


Assim como toda sua geração, Edinho não teve tanta sorte com a camisa da seleção. Em 87 partidas com a seleção olímpica e a principal, o ex-zagueiro acumula uma medalha de prata nos Jogos Pan-Americanos de 1975, na Cidade do México, um vice-campeonato no Mundialito de 1980/81, no Uruguai, e três eliminações frustrantes em Copas do Mundo. Em duas delas ele foi titular, sendo inclusive o capitão da seleção comandada por Telê Santana na Copa de 1986, no México, na outra reserva de Luizinho no inesquecível timaço de 1982.

Além de Flu, Fla e Udinese, Edinho ainda atuou no Grêmio entre 1989 e 1990, quando conquistou dois campeonatos gaúchos, uma Copa do Brasil e uma Supercopa do Brasil. Mas foi nas Laranjeiras que ele marcou época e mais se identificou. O ex-zagueiro ainda retornou ao clube como treinador em 1991 e, nas três passagens que teve, conquistou duas Taças Guanabaras e não foi tão bem sucedido como quando vestia a camisa 5. Mas pra quem teve o privilégio de vê-lo em campo vestindo verde, grená e branca por quase 400 vezes isso pouco importa e não faz a menor diferença. 

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