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HIPNOSE… ATÉ O TEIMOSO TELÊ ‘VIAJOU’ COM ELA

27 / março / 2020

por André Felipe de Lima


Há uns três anos ou quatro anos, presumo, jogadores mexicanos recorreram à hipnose para mudar o rumo de suas carreiras nos gramados. O primeiro deles a recorrer ao método do sono induzido foi o atacante francês André-Pierre Gignac, do Tigres. O cara não fazia gols de jeito nenhum. Estava convencido de que não nascera para jogar bola e pensara até em fazer outra coisa na vida. Treinava dia e noite, noite e dia, e nada. Nada de gols, que deveria ser seu ofício como o de qualquer atacante. Mas Gignac chegou a ficar dois meses sem marcar um gol sequer. A torcida do Tigres, obviamente, chiava, e com inteira razão. Foi aí que o jogador teve a ideia de procurar um terapeuta hipnotista profissional — o escolhido foi John Milton — antes de um jogo decisivo do campeonato mexicano de 2016 contra o Pumas. Algumas sessões e… Tigres 5 a 0, com três gols do francês.

Quem mais recentemente no Brasil recorreu à hipnose foi a Portuguesa de Desportos para tentar escapar do rebaixamento à série C do campeonato Brasileiro, em outubro de 2014. A missão coube ao ex-goleiro Olimar Tesser, que teve experiências com hipnotismo em vários clubes, dentre os quais o Guarani, a Ponte Preta, o Náutico e o Bahia. Mas foi vã a tentativa de Tesser na Lusa. O trabalho do especialista durou menos de um mês. Foram quatro jogos com derrota em todos. O time não conseguiu sair da lanterna e não somente caiu para série C como intensificou a amarga uma crise que perdura até hoje, em 2020, ano de seu centenário.

Mas o sucesso da hipnose no esporte tem um viés vitorioso. A extinta União Soviética sempre a usou com seus atletas olímpicos. Fazia o mesmo com soldados durante as duas grandes guerras mundiais no século passado. O que ganharam de medalhas não está no gibi. Aí a prova de que hipnose — quando bem aplicada — dá certo.

No futebol brasileiro, a terapia vem de longe. Do final dos anos de 1950. O primeiro a se empolgar com ela por aqui foi o polêmico médico Paes Barreto, o mesmo que citamos em nossa crônica anterior publicada no Museu da Pelada. Só para reforçar a memória, Barreto, quando esteve no Flamengo, foi acusado de dopar jogadores na campanha do tricampeonato carioca do rubro-negro em 1942, 43 e 44. Fato que ganhou os jornais e foi muito especulado ao longo dos anos, mas sem que houvesse prova contra o médico, que, por sua vez, nunca negou ter passado “bolinhas” aos jogadores de que cuidava.

Mas vamos à hipnose do Barreto, que a imprensa definia — cercada de obviedades por se tratar do polêmico médico — como “doping da alma”. “Conseguimos um tricampeonato para o Flamengo alicerçados nessa base”, disse Barreto ao repórter Ronaldo Boscoli. “Embora digam que dopei jogadores, continuo afirmando que a sugestão foi minha arma. Cativei meus comandados e estudei caracteres. Senti que a saída de Domingos da Guia lhes minaria o moral e a confiança. Usei a psicologia como arma. Muitas conversas, muitas confidências, e finalmente as pastilhas ‘mágicas’, o ‘doping’, ou o quer que seja, fê-los vencer um campeonato (nota do cronista: popularmente conhecidas no futebol como ‘bolinhas’)”, completou o médico, que alegara ter se inspirado na experiência de um time do Rio Grande Sul cujos jogadores “jogavam hipnotizados” e “venceram” muitos jogos.


Ídolo daquele Flamengo tricampeão, campeão com o Botafogo em 1948 e depois um treinador bem-sucedido, Pirilo foi o primeiro “paciente” do Paes Barreto, que declarou ter “levado o técnico até sua casa e o fez “ver” e “abraçar” sua mãe. O hipnotizado Pirilo — garantia peremptoriamente o médico — verteu “grossas lágrimas”. 

Barreto, que na época estava no Fluminense, justificava o uso da hipnose como um meio para deixar o jogador em “ordem psíquica” e até “física” para os times. 

No Tricolor, arriscou a técnica em alguns jogadores. Notoriamente com fama de “durão” e “teimoso”, Telê Santana submeteu-se a duas sessões com o médico, que afirmou ter sido uma hipnose de “ordem particular” e não destinada ao futebol. O “tratamento” no Telê foi registrado pelo fotógrafo Carlos Kerr, que acompanhava Boscoli na reportagem da Manchete Esportiva, também se submeteu ao teste. Fez tudo o que Barreto determinara, escrevera o jornalista. Os jogadores Robson e Jair Marinho, que morreu recentemente, também passaram pelas mãos do Barreto. O primeiro foi apenas “magnetizado”. Nada falou demais; o segundo, ao recobrar a consciência, confessou sentir-se sonolento, apenas. E quanto ao saudoso mestre Telê? Este “viajou” mesmo. De olhos fechados, ele “foi” à Minas Gerais, sua terra natal, sob o comando do médico. Até então incrédulos, como todos nós jornalistas até o último fio da alma, Boscoli e Kerr testemunharam tudo imersos em um mar de interrogações existenciais. 

Para Barreto, tudo era muito simples e sem chance às dúvidas: “Um homem hipnotizado não mente jamais”. Se a moda pegar…

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